A Dramaturgia do Teatro-Baile - de Edu Brisa

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A DRAMATURGIA DO TEATRO-BAILE ED U BRISA




C T I - C i a Te at r o d a I nve s t i g a ç ã o Dramaturgias de Edu Brisa A r t i s t a s c r i a d o r e s - C a ro l G ui m a r i s, C r i s C amilo, Ed u Bris a, G eova ne Fe r ma c , G ustavo G ui marães e Ha r r y de C a stro Fo to s - Ac er vo d o Gr upo - G ustavo G ui ma r ães, Tall y C amp os, Ro g é r i o P i xo te, C ri sti a no de A ssi s, Mi che l e S araiva e C h u n . Ca r t a ze s - Ce l so C a r r a m e nha e Lui z Felip e M ac alé Xi l og rav u ra s e Logo C T I - Lui z Fe l i pe M ac alé O rg a n i za ç ã o Editoria l - G e ova ne Fermac

E s t a p ub lic aç ão é re s u ltado do projeto “ Teatro - B ai l e, u m a poé ti c a e m co n s t ruç ão. Te at ro é s angue e precisa circ ular ” conte m pl ado n a 30ª Edi ç ã o do Pro g rama Municipa l de Fomento ao Teatro para a Ci dade de S ão Pa u lo.

O s d i reito s d o s tex to s dra maturgicos que integram e s ta pu bl i c aç ão s ão reser va dos a o au tor Edu B risa. Tiragem 10 00 exemplares | Ano 2018


Índice

• Prefácio ....................................................................................................6 • A Dramaturgia do Teatro-Baile ............................................................8 • A poética em Construção do Teatro-Baile ..........................................10 • A Casa de Farinha do Gonzagão ...........................................................14 •

Um Recorte de A Casa de Farinha do Gonzagão ..............................................78

• A Olaria do Jackson do Pandeiro ..........................................................84 • A Feira de Chico, Gonzaga e Jackson ....................................................128 • Caruru ......................................................................................................162 • A Cia. Teatro da Investigação ...............................................................194


PREFÁCIO

FORRÓ, CARURU, CARIRI E CTI Eis uma rima para o belo poema que a Cia Teatro da investigação vem construindo. É música, comida, bebida e bom teatro. É festa! O povo tem a sua forma dramática de expressão através dos ritos. Ele sempre festeja. Festeja a chuva que germina a semente, festeja a colheita, festeja suas divindades festeja a cobertura da laje em mutirão, com um churrasco ou feijoada. O povo festeja no sentido mais bonito, que é a confraternização. O Teatro baile da CTI é isso, um encontro para festejar o teatro naquilo que ele tem de mais primordial e nostálgico: o encontro com as suas origens. Encontro feito na rua, na praça no parque, onde o povo está. Na indústria cultural, onde tudo se transforma em mercadoria, teatro dessa natureza não desperta o interesse da grande imprensa, da crítica e de certos setores do extrato social; para garantir a sua sobrevivência é necessário que se escolha para que parcela da sociedade se quer falar. A CTI com sua “poética em Construção” sabe muito bem como garantir a acessibilidade porque o seu projeto de teatro popular, não se limita apenas a uma proposta estética, mas a uma visão de mundo. Um teatro que nos remete ao mundo paralelo que o teatro do renascimento da praça pública praticava para suportar e denunciar as agruras da vida oficial. Aqui o povo não é mero espectador, às vezes ele se mistura aos atores para beber, comer, cantar, dançar e dividir a sua criticidade. Nesta coletânea, com dramaturgia de Edu Brisa entramos em contato com os textos que tecem o repertório da Companhia da Investigação. São antes, roteiros bem pesquisados na temática nordestina, a partir das crônicas extraídas das obras de Luiz Gonzaga, Jackson do Pandeiro com inspirações herdadas de Chico de Assis, que em seu conjunto, registram as dores, alegrias, saudades e esperanças dos migrantes nordestinos que vieram para o sul maravilha na segunda metade do século XX, construir a cidade e reconstruir suas vidas. Um 6


resgate, que festeja os ídolos de uma geração que carecia desses heróis para ajuda-los na afirmação de sua identidade e auto- estima. Para concluir, um salve aos fazedores: Edu Brisa, Geovane Fernac, Cris Camilo, Carol Guimaris, Gustavo Guimarães, Henry de Castro e Luis Felipe Macalé, que com alegria, talento e habilidade animam e “investigam a festa como possibilidade de mobilização social”. Um Teatro Popular dessa grandeza, é para se comemorar. Comemoremos, pois! Ednaldo Freire

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A Dramaturgia do Teatro-Baile Fundada em 2003, a (CTI) Cia. Teatro da Investigação, desenvolve desde então a pesquisa continuada de experimentação cênica e dramatúrgica, que investiga o homem e a mulher comum do Brasil. A partir de 2012 com o advento do centenário do nascimento de Luiz Gonzaga, o rei do baião, principia-se o Teatro-Baile e sua Dramaturgia. “A CASA DE FARINHA DO GONZAGÃO” foi o primeiro trabalho deste ciclo, seguida de “A OLARIA DO JACKSON DO PANDEIRO”, “A FEIRA DE CHICO, GONZAGA E JACKSON” e por fim “CARURU” (Teatro-Bailinho) ambos advindos de processos colaborativos com dramaturgia de Edu Brisa e que tem como núcleo de criadores atualmente, no ano da graça de 2018, Carol Guimaris, Cris Camilo, Geovane Fermac, Gustavo Guimarães e Harry de Castro. Além da participação do “TRIO MARROM” na execução das músicas de “A CASA DE FARINHA DO GONZAGÃO”, de Fernando Alabê na direção musical e composição de músicas para o espetáculo “CARURU” que também tem na concepção de encenação a diretora Cida Almeida. Ao final dos seus primeiros 15 anos a CTI traz à luz a primeira publicação de seus textos teatrais. Com uma narrativa que investiga a festa, a cultura popular nordestina e tem o povo brasileiro como protagonista, juntando teatro, música, dança, literatura de cordel, comida e bebida no encontro com o público, instaura-se a festa da vez no espaço poético do Teatro-Baile. Tendo como material disparador as obras de Chico de Assis, Luiz Gonzaga e Jackson do Pandeiro, base de um trabalho que investiga o modo de vida da gente comum do Brasil, despertando o interesse de um público novo para o teatro, a 8


maioria, e é maioria mesmo, das pessoas que participam das nossas apresentações são de pessoas que estão num evento teatral pela primeira vez ou que não tem o hábito de ir ao teatro, Mas se interessam e vem de encontro ao Teatro-Baile pelo imaginário instaurado nelas pelas obras destes ícones da nossa Cultura. O Teatro-baile é uma abertura para a atualização da festa!​ Colocando o público como atuador, que interfere e acrescenta à obra. Uma ode à Brasilidade. Aqui é o Brasil mais profundo! Boa leitura!.

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A poética em construção do Teatro-Baile

T E AT R O - B A I L E é s o b r e, e f e i t o p a r a o p ovo. Esse é o principal motivo da nossa existência e por isso o realizamos onde o público pode ser ele mesmo, dentro da sua comunidade, em frente às suas casas, onde ele não passa por nenhum procedimento formalizador que tire sua naturalidade, o que é essencial para sua interação com o espaço poético do Te at ro - B a i l e. 10


É teatro e é baile onde, agenciado pelo elenco, o público também é atuador e lhe é ofertado o espaço de expressão. Aqui cada um representa a si mesmo, de maneira suave, sem qualquer berlinda ou constrangimentos. O que o elenco proporciona é a instauração do espaço poético a partir do qual cada um pode se colocar como desejar e se desejar. Esta é a poética em construção do TEATRO-BAILE. O TEATRO-BAILE instaura a FESTA. Estabelece ali a mudança no cotidiano, e faz a proposição de um espaço poético para participação do público. A festa se faz presente em todas as sociedades, seja ela, celebração, comemoração, fruição, diversão, espetáculo, ritual, brincadeira, investimento, trabalho, religião. Inúmeras são as festas, ao mesmo tempo em que são únicas, singulares. Cada uma delas exprime o modo de viver dos grupos sociais, que nelas produzem e reproduzem sentidos e significados diversos. Desse modo, diz de nós mesmos, de nossas sociedades e das relações que as pessoas estabelecem entre os grupos com seus mitos, com o sagrado, o simbólico, uma ancestralidade, a história. Numa perspectiva sócio-antropológica investigar sobre a festa, portanto, é compreender um pouco mais sobre nós mesmos e nossa vida em sociedade. O conceito de “Teatro-Baile” Objeto de pesquisa da Cia. Teatro da Investigação que une Teatro, Música, Dança, Gastronomia e o Público a fim de ampliar as possibilidades de um alcance significativo, onde o público, além da fruição comum a todos espetáculos “entram na dança” são convidados a participar do espetáculo dançando, comendo, bebendo, compartilhando suas experiências de vida enfim, festejando. A investigação do lugar do púbico no nosso fazer teatral, nos é muito caro, estamos experimentando desde 2012 uma relação mais estreita pela quebra da dicotomia de espetáculo – espectador. O Teatro-Baile vem inserir o público no jogo cênico tornando-o ator imprescindível para a constituição da Encenação.

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Nos seis anos de trajetória do Teatro-Baile que se inicia com o espetáculo “A Casa de Farinha do Gonzagão” desenvolvemos estratégias de aproximação com o público para provocá-lo a participar da obra de maneira orgânica, construímos assim um importante mecanismo de formação de público. Pelo seu formato interativo este trabalho ganha frescor e potência a cada apresentação e se faz necessária sua continuidade para que possamos acessar novos públicos. C T I – C i a . Te a t r o d a I n v e s t i g a ç ã o à q u e l a d o Te a t r o - B a i l e

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A Casa de Farinha do GonzagĂŁo na Cidade de Suzano SĂŁo Paulo ano 2014 foto Tally Campos.


A Casa de Farinha do Gonzagão. Apresentação Pode entrar a casa está aberta e a imaginação à solta! A música de Luiz Gonzaga dá origem ao espetáculo, que é um híbrido de teatro, música, dança, culinária e o público, e escolheu o teatro popular como meio de comunicar suas reflexões, trazendo elementos da vivacidade do povo nordestino que se redimensiona na força e intensidade da poesia que pulsa na obra do Gonzagão. A CASA DE FARINHA DO GONZAGÃO é um importante instrumento de formação de público, por difundir características legitimas do povo brasileiro. Proporcionando a participação efetiva do público, que tem aqui seu lugar de atuador respeitado e garantido. Conscientes de que o teatro assim como qualquer manifestação artística / cultural é um direito do cidadão e deve ser por ele usufruído se faz necessária a continuidade da difusão deste trabalho Quase três décadas depois de sua morte, o mito Luiz Gonzaga é cada vez mais incensado. Não apenas sua caudalosa obra continua constantemente regravada, como também academicamente dissecada. Para o jornalista e professor José Mário Austregésilo, autor de “Luiz Gonzaga, o homem, sua terra e sua luta”, este constante debruçar sobre a música de GONZAGÃO é uma das razões de o artista ser tão lembrado. E não apenas no Brasil, ressalta, apontando que há disserta16


ções sobre ele até em Oxford, Inglaterra: “A grande descoberta sobre a música de Luiz Gonzaga, que pouca gente se dá conta, é que ela não é tradicional, mas moderna. Gonzaga levou o rural para o urbano, foi um tradutor, no sentido etimológico da palavra, que significa transportar”. A Casa de Farinha do GONZAGÃO tem como conceito BRASILIDADE, a originalidade cantada por Luiz Gonzaga esse artista genuinamente brasileiro com seu legado intangível para o nosso deleite. A obra de Luiz Gonzaga retrata de maneira singular o povo do Brasil. Os desejos, os infortúnios, a labuta do dia-dia, o gozar e o penar de quem vive neste país continental, sempre com a alegria que renova, em cada um de nós, a esperança de dias melhores. Os personagens das músicas do Gonzagão são fascinantes; além de contarem nossa história, contam também quem foi esse artista e as transformações que ele provocou, percebidas não só no Brasil. Nossa homenagem, portanto, acontece na transposição dos personagens das músicas de Luiz Gonzaga para uma casa de farinha, a cozinha do sertão, e lá na sua intimidade criativa dar-lhes a chance de dizer como estão; o que trazem no peito; o que anseiam; o que ainda resta daquele tempo; daqueles costumes; onde e como passaram esses 29 anos sem o Rei do Baião lhe cantando novas coisas. Qual é o tamanho da saudade do seu criador? Consideramos ser de extrema importância que as novas gerações desse país conheçam a obra de Luiz Gonzaga. Nossa intenção é que o espetáculo jogue luz nos personagens, os conflitos e as esperanças contido na obra do Gonzagão e também em cada um de nós.

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Cris Camilo, Geovane Fermac, Harry de Castro e Edu Brisa em A Casa de Farinha do Gonzagão no Parque Raul Seixas São Paulo -SP ano 2016 foto Tally Campos.


SINOPSE Te a t r o - b a i l e b a s e a d o n a o b r a d e L u i z G o n z a g a , d i v i d i d a e m t r ê s p a r t e s s e m i n t e r v a l o . 1ª Parte - BAILE Saudando o Sertão. O elenco recebe o público com bebida, comida e dança. 2ª Parte – Peça teatral baseada na obra de Luiz Gonzaga. Os personagens das músicas de Luiz Gonzaga são transportados para uma casa de farinha, a cozinha do sertão, e lá, em sua intimidade criativa, tem a chance de contarem seus “causos”, suas vidas. 3ª Parte – BAILE “O forró de Mané Víto” Arrasta pé ao vivo com o repertório de Luiz Gonzaga.

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Cartaz A Casa de Farinha

Cartaz circulação ano 2015 arte por Celso Carramenha


A atriz Juliana Crifes A Casa de Farinha do Gonzagão na Cidade de Rio Branco no Acre no FESTAC ano 2015 foto Tally Campos.

A Casa de Farinha do Gonzagão na Praça Roosevelt São Paulo ano 2013 foto Alecio Cezar


PRINCIPIOU-SE Música - Baião da Penha (Concentração - conexão elenco e público) 1º Baile Recepção do público / saudando o sertão! CONTADOR Boa! CORO Boa! CONTADOR A praça é do povo como o céu é da Asa Branca! Sejam bem vindos à terra de Luiz Gonzaga, o Rei do baião. O Gonzagão! Este artista nacioná, internacioná que como já disseram, trouxe o rural para o urbano, esse homem que foi um tradutor, no sentido etimológico da palavra, que significa transportar. E aqui estamos nós da Cia. Teatro da Investigação para transportar as personagens de suas músicas para o Teatro. Ou melhor, pro teatro-baile. Aqui é assim: é Teatro e é Baile, o negócio é dividido em três partes: A 1ª é um baile que parece teatro, mas é baile. (Antão ocê pode comer, pode beber, dançar e se adivertir) A 2ª é um teatro que parece teatro e é. (Aí num tem escapatória) A 3ª é um baile que parece baile, quando dé fé que não, é teatro. (Ocês tão me intendenu, num tão) Antão é assim. Pode ficar a vontade, podem comer,beber, dançar! E se precisar de arguma coisa, qualquer coisa mermo ... Derna de que num seje dinheiro, é só falar comigo. Viva o forró de Zé lagoa! 22


Música - Velho Novo Exu (Luiz Gonzaga – Silvio Moacir De Araújo) “Já já, futuca seu Felipe

Vamos pro Araripe

Que os Gonzaga vão chegar...” (Entra a base musical de SAMARICA PARTEIRA.)

REYMUNDO Oi sertão! CORO Ooi! REYMUNDO Eu dou viva o sertão! Oi sertão! CORO Ooi! REYMUNDO Sertão dos cabra valente... CATA MILHO Tá falando com ele! REYMUNDO E dos cabra frouxo também. CATA MILHO Já num tô dento. 23


CORO Há, há, há... [risos] REYMUNDO Sertão das muié bonita... CORO ôoopa REYMUNDO E dos cabra fei também CORO Há, há, há... [risos] REYMUNDO Viva o sertão de tudo quanto ai da feira de caruaru! Sertão dos vaqueiros, dos aboios, da vaca estrela e do boi fubá, sertão dos antadores, dos violeiros, da porteira e do currá! Viva o sertão da seca, da roça, da prosa, do causo e do avexo! Viva o sertão da mandioca, da farinha, do beiju, da crueira e da paçoca! Sertão da jaca dura, da jaca mole, da manteiga de garrafa, do cuzcuz e do milho assado! Sertão do Mandacaru, da fruta de palma, fruta do conde e da fruta-pão! Viva o sertão da mão grossa da labuta, da poeira, do pau-de-arara, da esperança na chuva e na fartura! Eu dou viva o sertão! Oi sertão! CORO Ooi! RAQUÉ Viva o sertão! Sertão de meu padim padre Cíço! Sertão de Virgulino Lampião! Sertão de Maria bonita! Sertão de Antônio conselheiro! Sertão de Mestre Vitalino! Viva! 24


CORO Viva! RAQUÉ Sertão do cordel, do reisado, de Patativa do Assaré, de Suassuna, de Frei Damião! Viva! CORO Viva! RAQUÉ Sertão dos políticos enganadores! [vaias] Sertão dos políticos enganadores! [vaias] Do jumento nosso irmão! Viva o sertão do xote, maxixe, xaxado e do baião. O sertão da fugueira, balão, pamonha, canjica e quentão! Viva são João! CORO Viva! RAQUÉ Viva o sertão de Luiz Gonzaga! Da sanfona, triângulo e zabumba! Viva o Rei do baião! Viva o Gonzagão! CORO Viva! REYMUNDO Viva o Gonzagão! CORO Viva!

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REYMUNDO Viva o Gonzagão! CORO Viva! KAROLINA Eu vou mostrar pra vocês, Como se dança o baião. E quem quiser aprender, É favor prestar atenção. Moreno chega pra cá, bem junto ao meu coração, agora é só me seguir, pois eu vou dançar o baião. Música – BAIÃO (Luiz Gonzaga - Humberto Teixiera) “Eu vou mostrar pra vocês

Como se dança o baião

E quem quiser aprender

É favor prestar atenção”

CONTADOR Minha gente! Rumbora dançá. Arrastá a chinela, levantá a poeira! Pode ficá a vontade que já tá tudo pago. Só quero pedir procês guardar um dinheirinho aí, que mais logo tem o lélão! E o prêmio Principá desse ano vai ser o que? O bode! Esse povo tá falando aí que esse bode é o mermo do ano passado, que arremataru e o bode vortô pra trás! É mentira! É bodinho novinho da Carninha mole, nem cheiro de bode num tem. é um bode tão novin que ocê botô na pressão, no primeiro xaxado que a panela dá o bode tá pronto! E vamô seguir com esse Baile. Homi, segura o menino que eu agora vô dançar! 26


Música - NUMA SALA DE REBOCO (Luíz Gonzaga / José Marcolino) “Todo tempo quanto houver pra mim é pouco pra dançar com meu benzinho numa sala de reboco” REYMUNDO É tão bonzim um samba numa sala de reboco. Rá! (ri) Inda mais quando a gente tá dançano cuma danada que agente gosta dela. O negócio é assim: o caboclo vai casá, então ele resolve convidar os cumpanheiro pra ajudá a fazê a casinha dele. E lá na feira ele se desocupa mais cedo e vem esperá os cumpanheiro cá na ponta da rua, naquela bodega onde ele custma guardá a faca dele. Os cumpanheiro vão apariceno ele vai fazeno os cunvite: pois é colega vou dá uma casada, já falei cum padre, vai ser de hoje a oito dia, vou fazê minha casinha amanhã, to convidano os amigo pra me ajudá, já inscontei o materiá, cipó, caibro as vara, o barreiro já ta incaminhado, vou matá um bode, que eu arrematei no leilão (um bodin novin, ném cheiro de bode num tem) pra mó di fazê um pirão, pra gente armuçá. Se a gente fizé a casa amanhã, se ela ficá pronta, de noite mermo a gente dança nela que é pra ir incaicano o chão da sala! Prático né? E de noite tava todo mundo lá. E eu? Eu fui arrecompensado, na hora da dança tô veno uma muié diferente lá no meio das outras. Mué alta, lazarina, morena, (Burburinho) Digo, Galega! Duas fulô no cabelo, quem será quela? Será carulina? Chegeui perto dessa mulé e miti o psilone nela: Vosmicê é que é carulina? sabe o que ela fez? KAROLINA Acho que sô. REYMUNDO Qué dançá mais eu? 27


KAROLINA Só se for agora! REYMUNDO Abufelei. Música - O Cheiro da Carolina (Zé Gonzaga – Amorim Roxo) “Carolina foi pro samba, Carolina Pra dançá o xenhenhém, Carolina Todo mundo é caidinho, Carolina

Pelo cheiro que ela tem, Carolina

Hum, hum, hum, Carolina hum, hum, hum Carolina

hum, hum, hum Carolina” REYMUNDO Aí chegou a dona da casa. A dona da casa chegou com a mulesta. Chamou atenção de D. Karolina e: DONO DA CASA D. Carolina venha cá. O povo anda falando aí que a senhora tem um cheiro diferente, é verdade? KAROLINA Moça, sei disso não, é invenção do povo. DONO DA CASA Ah, é invenção do povo, não é? KAROLINA É sim senhor 28


DON0 DA CASA Então me dê a com licença Hum, hum, hum Carolina, hum, hum, hum Carolina CONTADOR Cabô! Cabô, mas ainda tem. Calma lá. Primeiramente, eu quero agardicê oces terem vindo aqui, que arrematatu as coisinhas do lélão. REYMUNDO Que lelão? Tu viu lélão? CONTADOR Rapaz, ocê num viu o lelão mermo não. Ocê tá aí, dançano com a fia do zôto, com a muié do zôto, com a mãe do zôto, com o zôto. Ocê num viu o lelão mermo não. REYMUNDO Acho que teve esse lelão mermo! CONTADOR Eu quero dizê que essa bandona todinha aí vai tocá no Forró de Mané vito. Tá todo mundo convidado. Mané vito mandou fazer um banquete, vai ser um forró de lascá. Agora nós vamo fazê a derradeira, apruveita pra dançar que é a derradeira. E dança mermo. Porque dança é bom pra tudo. Se ocê tiver com quarquer coisa, dança que passa. Vamo abrir aqui a latada pro ceis dançá, pro ceis apruveitá, pro ceis se adivertir, pro ceis vadiá. Porque eu nesse coco não vadeio mais! Música - DERRAMARO O GÁI (Luiz Gonzaga – Zédantas) “Eu nesse côco num vadeio mais

Apagaro o candeeiro, derramaro o gai...”

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Danuza Novaes, Carol Guimaris, Josi Rouse, Camila Borges, Harry de Castro e Geovane Fermac em A Casa de Farinha do Gonzagão São Paulo 2016 foto Rogério Pixote


CONTADOR Pois é, minha gente, como já dissemo, essa bandona todinha aí, vai tocá no forró de mané vito e tá todo mundo convidado. Agora vamo cunversá sério. Aqui é assim: primeiro a diversão depois o trabalho! Sejam bem-vindos à Casa de farinha do GONZAGÃO! É aqui, na casa de farinha, a cozinha do Sertão, onde não se faz só a farinha, se faz também o imaginário de um povo. A casa de farinha é em essência uma alegoria da transformação. Da mandioca em: farinha, alimento, sustância, sustento, renda... Esta é a atividade de muitas famílias que sobrevivem do cultivo da mandioca e na produção da farinha e outros derivados: Beiju, polvilho, tapioca e a crueira. Nesse processo tudo se aproveita a farinha dá o sustento, a sustância, é parte da cultura e fonte de inspiração, como o ditado popular que diz: “A FARINHA RENDE O POUCO, ESFRIA O QUENTE E SUSTENTA A GENTE”... É na casa de farinha, a cozinha do sertão, que se faz as relações familiares, estreitam-se os laços, cultivam-se os sonhos, e cresce junto com a massa do beiju a esperança, a teimosia e a força do nordestino/sertanejo que como disse Euclides da Cunha, “... É antes de tudo um forte”... É aqui na casa de farinha, a cozinha do sertão, na sua intimidade criativa que os personagens das músicas de Luiz Gonzaga, terão a chance de recontarem seus “causos”, suas vidas. Poder fazer farinha, fazer imaginar, imaginar fazer. Um punhado de farinha e dois dedos de prosa. Pode entrar. A casa está aberta e a imaginação à solta.

CENA 01 Na casa de Farinha Zefa e Raqué trabalham. REYMUNDO (Na roça. Faz um aboio. Ele é o vaqueiro e é boi. É o Sertão). Ê Boi! ÊÊE Boi! Música - Baião da Penha (Guio de Moraes e David Nasser) 32


“Penha, Penha

Eu vim aqui me ajoelhar

Venha, Venha

Trazer paz para o meu lar...”

(Durante esta música Reymundo realiza sua procissão solitária até a casa de farinha. As mulheres continuam trabalhando e acompanhando a música com o som do trabalho. Reymundo entra na casa de farinha e despeja a mandioca no chão). ZEFA Misericórdia! hum-hum-hum! O que é isso? Mais mandioca? REYMUNDO Não. É jaca! ZEFA Aqueta jegue véi. Ão ão ão o jumento é nosso irmão! REYMUNDO Ã ã ã jumenta é nossa irmã! RAQUÉ Rumbora trabaiá mais e cunversá menos. REYMUNDO Mas esse povo daqui é besta, viu. Tá tudo lá em cima do fí de Mané Vito que chegô do sú. Parece que nunca viru gente! RAQUÉ Apois! ZEFA 33


Quá! (silêncio) E tu? Foi caçá o que lá? REYMUNDO E a roça num é lá na bêra deles? ZEFA Viesse pro fora. REYMUNDO Sê besta! O solão que tá aí fora, tá rancano o coro de quarqué vivente. Eu vô vim por esse descampado? Eu vem é pro dentro, que eu corto caminho e aproveito o riachão enquanto ele num seca. O bichim tá que é só um rego d’agua. Num tem quem diz que é o riachão grande. RAQUÉ Faz dó. REYMUNDO Mas ninguém tá nem aí... eu vi dizê que Mané Vito mandô matá dois boi gordo. Vai fazer uma festança lascada, diz que vai ter cumida que num acaba mais. O côro vai cumê dois dia e duas noite. Eu vi dizê que ele contatô uma Sanfuneira, baixinha, taludinha, pique tamburete de forró, que vai tocá até os dedo fazê calo e sangrá. SANFUNÊRA Eu mermo não! ZEFA E ele? Tu viu? REYMUNDO Ele quem? 34


ZEFA Ele quem? Ele quem? O fí do homi. REYMUNDO Viiii. Nem parece aquele mulequim que saiu daqui. Era maléro, bochudo, cabeça de papagaio, zambeta, feeei pa peste! Qual o quê! O nêgo agora tá gordo que parece um major! É uma Gasemira lascada! Um dinheiro danado! Enricou! Tá rico! E o bicho num veio no nosso Pau-de-arara nosso não. Um quis nem sabê de subi no Gonzagão. Vei foi de carro, um carrão grande danado de 120 macha. É muita macha! ZEFA Ele falô com tu? REYMUNDO Apois ele me convidô foi pra festa. RAQUÉ E tu vai? REYMUNDO Eu!?

ZEFA Apois eu é que num perco. (Para Raqué) Rumbora nóis. RAQUÉ E os menino? ZEFA Dêxa os menino durmino. 35


RAQUÉ Eu!? Vou levar eles tudo pra pocá o bucho lá. ZEFA Tu vai levá essa renca de menino pro mei de gente? RAQUÉ Vô. Nós tamo a semana toda só cumeno umas fogo-pago que eles anda caçano. ZEFA Rumba só nóis, que nóis apruveita mais. REYMUNDO O que é que tu vai caçá lá? Vai caçá o pricipício! ZEFA Eu vou é ó: (dança alguns paços com base na música “nega zefa”). REYMUNDO Eita nega da mulestia pra dançá coco e baião! RAQUÉ Pode matá que é bicho! Aiai, aiai laiga disso Zefa, rumbora trabaiá! REYMUNDO Rumbora trabaiá que Mané Bento encomendô mais cinco saco lá pro armazém. Faz força Zefa! ZEFA Força nada! Eu quero é mais é sair daqui! Arruma um homi que me sustente! 36


REYMUNDO Só se for o jegue! ZEFA Bem que tu queria! REYMUNDO Se eu tiver por aí sem nada pra fazer, até que...eu óh, óh! RAQUÉ Aiai, aiai laiga disso sujeito! Rumbora trabaiá! REYMUNDO Trabaiá, Zefa! Trabaiá tu num qué. ZEFA Eu mermo não. Eu gosto é do que é bom. RAQUÉ E trabaiá num é bom não? ZEFA É bom pra uns, pra outros não. (silêncio) Eu quero mermo é ir me embora! Caçá um lugá bem meló. RAQUÉ Lá vem ela com essa cunversa de ir pro sú. ZEFA Eu vou mermo! Vou suvertê. Eu vou é vivê no bem bom. RAQUÉ Tu vai é passá fome pras casa do zôto! REYMUNDO 37


Eu vou é buscá mais mandioca, que essa daqui num dá os cinco saco que Zé Antão encomendô não. ZEFA Ê bicho que gosta de pegá numa mandioca. Rarai! REYMUNDO Ê Zefa, eu vô é te mostra a mandioca pra tu, viu. Pra tu pegá, viu! ZEFA Essa mandioquinha aí, eu num tenho interesse nela não. Eu gosto é de mandioca de verdade. REYMUNDO Deixa de cunvercêro. Rumbora trabaiá. (saindo) Faz força Zefa. ZEFA Rumbora nóis pra forró de Mené Vito. Deixa os menino durmino. RAQUÉ Que isso, Zefa. Tadim dos bichim. ZEFA Tadim de tu. Tu nunca mais se advertiu. O trabai não vai fugí não. Vai gastá essas energia com outras coisa. RAQUÉ Eu mermo não. ZEFA Eu é que não quero isso pra mim. Eu vô é me embora daqui. Márcia disse que arruma um lugar pra mim se eu quisé. Ele tá vortano pro sul na semana que vem O Gonzagão vai sair depois 38


do forró de Mané Vito. E tem vaga pra mim. E eu vô. Márcia disse que lá é danado de bom. A bicha tá numa gazimira lascada. RAQUÉ Márcia tá é falada. Tu nem sabe o que é que ela faz. ZEFA Ela é garçonete. Disse que arruma pra mim também. RAQUÉ Rum! Garçonete. Num se fia em cunversa de márcia não. Márcia tá na boca do povo. ZEFA O povo é que cunversa demais. Esse povo daqui é que num tem o que fazê. RAQUÉ Num vai não. Cria juizo. Se for pra tu ir, vai cum tudo certo. Cum casa, emprego, tudo certo. ZEFA Mas eu num tô dizeno que Márcia, vai arrumá lá pra mim. RAQUÉ Tu é que sabe. (um tempo) Faz força Zefa, faz força!

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As atrizes Juliana Crifes, Natalia Baviera e Cris Camilo em A Casa de Farinha do GonzagĂŁo em SĂŁo Paulo ano 2014 foto Tally Campos.


CENA 02 - ROSINHA. Rosinha chega ressabiada, rodeando a casa de farinha, Remdando passarinho. Raqué e Zéfa trabalham. Rosinha é percebida por Raqué seguida de Zéfa. RAQUÉ Quem é Tu? (Silêncio) ZEFA Ôxe! Perdeu a língua? RAQUÉ Quem é Tu? ZEFA Tu num cunversa não, é? ROSINHA Cunverso! ZEFA Antão cunversa. ROSINHA Ôxe! ZEFA Tu vei fazê o que aqui? ROSINHA O que tiver pricisão. RAQUÉ 42


Tu é fia de quem? ROSINHA Seis num cunhece não. RAQUÉ Ôxe! Quem é que nós num cunhece? Se fô daqui, nóis cunhece. ROSINHA Num é daqui não. RAQUÉ Apois ta certo. Sabe fazê farinha. ROSINHA Sei fazê inté beiju! Pamonha, cuscuz, brevidade, avoadô, paçoca, cunzido e assado... RAQUÉ Eu perguntei farinha. ROSINHA Sei sim. Das fina e das grossa! ZEFA Essa é das minha! RAQUÉ Antão, panha uma faca e vai rapá aquela mandioca ali porque cunversa num enche a barriga de ninguém. (silêncio) Caminha!

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ROSINHA É só a senhora me botá na bêra do serviço que num tenho priguiça não. ZEFA É aqui ó! Senta aí e encarca o pé que serviço aqui num falta! Rosinha canta (Todas trabalham). Musica: Terra vida e esperança. (Jurandy da Feira) “Estou no cansaço da vida

Estou no descanso da fé

Estou em guerra com a fome Na mesa, fio e mulher...”

(Entra Reymundo com a mandioca.)

REYMUNDO Êita quentura! Isso num é mais sol, isso é castigo! (um tempo) Ôxe quem essa? Quem é tu bichinha? RAQUÉ Dexéla! Ela num é de cunversa não. REYMUNDO Eu cunhecéla. ZEFA Dá onde? Que ninguém aqui cunhecéla. REYMUNDO Eu sô Reymundo, cunheço deus e mundo! 44


RAQUÉ Agora pronto! REYMUNDO É Rosinha! Ô Rosinha, tcheu nome num é Rosinha? É ela mermo. Ela num vê. Seis num alembra daquela menina que o pai furo o zói pra num vê a seca? Refrão – MEU DEUS, MEU DEUS ZEFA Num foi o pai dela que furo o zói, foi um garrancho de unha de gato que bateu no zói dela. Ela tava na garupa do pai, o pai baxô aí o garrancho foi e furo os dois zó dela duma vez só. Refrão – AI AI AI AI RAQUÉ Antão essa é aquela que fica remedano passarin? É tú? REYMUNDO É ela. Remeda aí um passarin pra nóis. ROSINHA Eu não! ZEFA Quem furo teu zói? ROSINHA Ninguém não. Eu nasci assim. Foi Deus que quis. RAQUÉ E Cadê teu povo? 45


ROSINHA Disarnaru nu mundo! RAQUÉ E Tu num foi? ROSINHA Eu fui. Mas caí do GONZAGÃO. Aí fiquei. Refrão – MEU DEUS, MEU DEUS AI AI AI AI RAQUÉ Rumbora Trabaiá! (Todos trabalham e cantam) Música – Farinhada (Luiz Gonzaga e Zé Dantas) “Na farinhada

Lá na serra do Teixeira Namorei uma cabocla

Nunca vi tão feiticeira

A meninada

Descascava a macaxeira”

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As atrizes Carol Guimaris e Natalia Baviera em A Casa de Farinha do GonzagĂŁo na Cidade de Guarulhos SP ano 2015 foto Tally Campos.


CENA 03 Dicumê (Dasdô chega com um balaio na cabeça, junto com Bichinha que traz uma garrafa de café e os copos. Dentro do balaio o dicumê.) DASDÔ e BICHINHA Boa! RAQUÉ e REYMUNDO Boa! ZEFA Boa! Já era tempo! REYMUNDO Pensei que hoje Num tinha mei dia! Tô cum a barriga grudada nas costa! ZEFA Ô bicho morta-fome! DASDÔ Oxen! Quem é essa? BICHINHA É quem? REYMUNDO Cês num cunhecéla também não? Num disse. Só que é que cunheço. É bichinha. Tu num cunhece bichinha? BICHINHA Bichinha? Que Bichinha? REYMUNDO 48


Aquela que o pai furo o zói pra num vê a seca! ZEFA Ê mentira! Foi o garrancho de unha de gato, que furo o zói dela. DASDÔ Ah! Eu sei quem é. É ela mermo. Num foi nada disso não. Dizem que ela oiô pru ecrips daí bateu um vento e ela fico sega du zói. Num foi Bichinha? BICHINHA Foi! RAQUÉ Laiga de cunversa. Seis avexa a menina. Rumbora cumê. DASDÔ Rumbora! REYMUNDO Êita Dasdô que tua cumida chêra mió do que cangote das morena! ZEFA Quem vê pensa, que isso chêra cangote. Só se fô o cangote do jegue! REYMUNDO Se eu te pegá te soco a mão! RAQUÉ Toma Reymundo tcheu prato. Senta e come. REYMUNDO 49


Primeiro eu vô rezá pra vê se chove, é que é pro meu milho dá vinte espiga em cada pé! DASDÔ Eu tenho é medo de chuva! BICHINHA E eu então! RAQUÉ Vira essas boca pra lá. Que medo de chuva colé nada. Deus castiga. Rumbora cumê. Que quem fala demais dá bom dia cavalo! Música - Baião de dois (Luiz Gonzaga e Humberto Teixeira) “Abdom que moda é essa

Deixe a trempe e a cuié Home não vai na cozinha

Que é lugá só de mulhé...”

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CENA 04 - VIAJANTE ZECA DE SONHINHA Ô de casa! (Silêncio) Ô de casa! (Silêncio) Louvado seja nosso Senhor Jesus Cristo! REYMUNDO E TODO MUNDO Para sempre Seja Deus Louvado! ZECA DE SONINHA Me arruma um copo d’água aí, que eu to cuma sede de três ontonti. REYMUNDO Inhentra pra dentro. (Zeca entra) Num bota reparo não, nós ta na hora do di cumê. Tome sua água! ZECA DE SONINHA Águinha saloba! REYMUNDO Aqui nesse pé de serra é tudo assim, mermo. Ocê é da onde? ZECA DE SONINHA Eu sou do mundo! ZEFA Ôxe! Agora pronto! RAQUÉ Num to dizeno!

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DASDÔ Quá! BICHINHA Agora eu vi! ZEFA Tem nome não? ZECA DE SONINHA Meu nome é Zeca! RAQUÉ Zeca de quem? ZECA DE SONINHA Ainhãnhã... Zeca de Soninha! RAQUÉ Zeca de quem? ZECA DE SONINHA Zeca de Soninha! REYMUNDO Ô gente! É Zeca de Soninha Gente! Ói Zeca gente! DASDÔ Misericórdia! É tu, Zeca? RAQUÉ Dêxa eu ti vê Zeca! É Zeca mermo! Purquê tu num falô logo, sem vergonha! Fica aí espantanu a gente!

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ZEFA E tu tava onde, esse tempão todo? Ni São Paulo? ZECA DE SONINHA Ni São Paulo, no Rio de Janêro, eu rivirei aquilo tudo! REYMUNDO Laiga de ispiculá o homem. Bóra cumê mais nóis Zeca. Bota o dicumê pra Zeca aí. Caminha! DASDÔ Senta Zeca! E Soninha já sabe que tu chegô? ZECA DE SONINHA Sabe oquê!? Eu parei aqui mermo, pra tomar um copo d’água, pra acabar de chegar. E só vô cumê também, porquê tem é três dia que só como puêra! Em riba do caminhão, naquele estradão sem fim. Pensava que eu nunca chegava! ZEFA Essa tua cunversa, ta meia fora do prumo. Cuma é que a pessoa viaja, fica esse tempão todo e vorta pra terra natá sem nem um carro próprio. Deus me Livre! REYMUNDO Num vai na cunversa de Zéfa não. O juízo de Zéfa é de galinha. DASDÔ Rumbora cumê minha Gente. RAQUÉ Na hora de cumê, cumê! Na hora de cunversá, cunversá! Quantas boca seis tem? 53


(todos comem) Música - Boi Bumbá (Luiz Gonzaga e Luiz Gonzaga e Jr) “Vamos repartir o boi, pessoa?

Vamos!..

Pra onde vai a barrigueira?

Vai pra Miguel Pereira E a vassoura do rabo?

Vai pro Zé Nabo

De que é o osso da pá?

De Joãozinho da Fornemá....”

ZEFA E tu fazia o quê lá, onde tu tava? ZECA DE SONINHA Di um tudo. Já fiz di um tudo nessa vida! Fui taxista, alfaiate, cozinheiro, mecânico, feirante, Bancário... TODOS Ôxe! Bancário? ZECA DE SONINHA E quem trabáia no banco é o quê? Eu só num mexia cum dinheiro, mas o resto tudo eu fazia. REYMUNDO E tu vêi fazê o quê aqui, Bancário? ZEFA Sem nem um carro próprio! RAQUÉ e DASDÔ 54


Zefa! ZECA DE SONINHA Vim casá! ZEFA Êita, cabra macho! Tá vêno Reimundo. Tu num faz nada, tem que vim os homi de fora pra pudê as mué daqui casá. REYMUNDO Ô bicha besta! ZEFA Rarai! REYMUNDO Se eu te pegá, te soco a mão! Se eu te pegá te soco a mão! ZECA DE SONINHA Eu truxe aqui umas lembrancinha prô seis. Umas novidade! Reymundo! Pra tu eu trôxe um rádio, AM, FM, TOCA FITA e GRAVADÔ! E é bi volt 220 e à pilha!... Raqué, pra tu eu trôxe foi um troca pulsêra! Relógio! Relógio troca pulsêra. À prova d’água! 07 pulsêra, uma pra cada dia da semana! Pra Zefa, eu trôxe logo foi um RAY BAN! Original! É só abrir as perna e infiá a cara! Pode deixar vim o sol. Esse num trinca, num pega fogo, num imoiga. É original. Vem com o nome escrito na lente! Pode lê. ZEFA (Lendo) r-a-y RAY b-a-n BAN – RAY BAN! ZECA DE SONINHA Num disse! Dasdô mais Bichinha, é pras duas viu. Toma procês um WALKMAN com fone de ouvido e tudo. AM, FM e fita! 55


E tá com as pilha nova! DASDÔ e BICHINHA (Lendo) w-a-l WAL (K) m –a-n – MAN - ALQUIMEN! ZECA DE SONINHA Rosinha! REYMUNDO E tu cunhece Rosinha? ZECA DE SONINHA E quem num cunhece Rosinha? Toma pra tu Rosinha. Uma máquina fotográfica, já com filme de 36 pose! Pode sair fotografando Deus e o mundo! (todos ficam com cara de pasmaceira, se entre olhando) RAQUÉ Quem vai no forró de Mané vito, hoje? ZEFA É hoje? DASDÔ É hoje. REYMUNDO É... Eu vi dizê. ROSINHA Diz que ele mandô matá dois boi. BICHINHA Nós vamo tudo pocá o buxo! 56


ZECA DE SONINHA Ué minha gente, seis num gostaru dus presente, não? Se num subé mexê eu insino. REYMUNDO Não. Qué isso!? RAQUÉ Gostemo! ROSINHA Rum! DASDÔ e BICHINHA Ê diá! ZEFA Cê ta atrasado! Crendióspadi! Isso aqui nem minino qué mais. Tu saiu de lá ni que ano? Quá! Novidade! Aqui tem tudo que é muderno. Essas coisas já foi tudo passada pra trás! ZECA DE SONINHA Antão me devolva pra cá. ZEFA Nós vamo ficá. Que é pra num fazê disfeita. ZECA DE SONINHA Eu achano que era tudo novidade... RAQUÉ Deixa isso pra lá, Zeca. O importante é que cê vai casá. REYMUNDO 57


É, o importante é que cê vai casá! DASDÔ Tu vai casá mais quem? BICHINHA Mais quem, mermo? ZECA DE SONINHA Mais Ana! ZEFA Ana? Só se fô Ana! ZECA DE SONINHA Ôxe! ZEFA Ana suverteu. Ninguém tem nem nutícia! Se enrabichô mais um forastêro e abriu o cabo no mundo! ZECA DE SONINHA Num me fala isso! Antão, eu perdi minha viagem! ROSINHA Ué! Purquê tu num ligô? Aqui tem telefone. BICHINHA Tem até zapzap! RAQUÉ Te avexa! Vai trabaiá. Fica assim não. Tu arruma ôta noiva aí. Vai no forró de Mané Vito hoje que lá vai tê mué que nem piôio! 58


ZECA DE SONINHA A gente fizemo jura de amô. Eu saí daqui iscurraçado pela seca. Depois que o sol tinha tostado as foia, bebido o Riachão. Eu fui atrás de vida melhor, pra mim mais Ana. Tô voltanu istrupiado. Eu Penei, mas aqui cheguei. Mermo assim tinha alegre o coração. Esse tempo todo eu tava fingindo di vivê. Apois é isso mermo. Vou toma meu rumo. Que minha vida é andá. Pra ver se um dia eu discanso! Té mais vê. (Sai). REYMUNDO Tá cedo! RAQUÉ Rumbora trabaiá que nóis ganha mais! REYMUNDO Eu vô é buscá mais mandioca que se eu ficá aqui sozin mais esse monte de mué, eu ném sei! ZEFA Tu num dá conta nem das cabrita, que dirá de nóis quatro. REYMUNDO Vai caçá um jegue! (sai). Ajeita aí Zabé! RAQUÉ É Raqué. Raqué. E rumbora trabaiá! Pode vim mandioca adoidado, que nóis dá conta! ZEFA, DASDÔ e BICHINHA Êita!

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ROSINHA e BICHINHA Mué macho sim sinhô! RAQUÉ Sai pra lá peste! (todas trabalham) Ô Dasdô. Dasdô. Vê se tu bota um juízo na cabeça de zefa, que ela ta cum essas cunversa e se imbora mais Márcia. Que Márcia num sei o que, que Márcia num sei o que lá. Cunversa mais ela aí. ZEFA Nem adianta. Depois do forró de Mané vito eu vô é me imbora! DASDÔ Ô Zefa! Rumbora cunversá. ZEFA Rumbora trabaiá! RAQUÉ Quem vê pensa! Ôvi Dasdô. DASDÔ Ô Zefa, tu é muito Subre-si. Tu vai se fiá ni Márcia? BICHINHA Rum! DASDÔ Tu num exempra não? Tu viu aí Zeca de Soninha? Vortô prá traiz sem um ricurso. Trôxe essas quinquinharia aí pra botá banca.

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BICHINHA Que num deve tê diêro nem pra cagá. ZEFA Eu sô eu! RAQUÉ Escuta Dasdô. Dasdô já foi pra lá, já vei pra cá. Lá num é assim que nem o povo conta não. Essa vida nossas aqui é vida boa! Aqui nós faz o que nós qué. Na terra do zôto a gente tem que inguli é seco! DASDÔ É a vida aqui sim é que boa! Nem se compara! Tu tem é que estender as mão pro céu e agradecê. BICHINHA Isso aqui é que é vidão! ZEFA Deus que me livre! ROSINHA Quando pai mais mãe sairu daqui eles falaru: Se o nosso destino, não for tão mesquinho, pro mesmo cantinho, nós torna a voltar. De modos que nunca ele pode só vive devendo e assim vai sofrendo. É sofrer sem parar. ZEFA Eu sô eu! RAQUÉ Dexâ de sê subri-si.

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ZEFA Eu sô subri-si mermo. Quem manda ni mim, sô eu. Eu vô é caçá futuro! Aqui num tem mais nada que me segure. Vou saí desse calvário. Minhas mão parece uns raladô, vivo cum os zói tudo chei de puêra. Aqui o dinhêro é pôco e fome é muitcha! Eu vô é caçá futuro! Tá tudo certu pra mim já. Já tenho lugá prá ficá, imprego arranjado, vô levano o pôco que eu juntei. Eu vou é... tafuiá no mundo! Quando eu vorta aqui seis nem vai me cunhecê. E eu vorto com carro prórprio e tudo. REYMUNDO (Entrando) O que é que Zefa tá cunversano aí Zabé? RAQUÉ É Raqué. Raqué! ZEFA Rarai! Êita que tem uma Zabé que anda zumbizano no zovido desse homi. REYMUNDO Tem mermo, tem mermo. É uma namorada minha que eu tinha. E esses dias eu tava alembrano dela! ZEFA Êita, namorada! Quem que é a doidcha? Quem que é a doida? (dança e sacaneia Reymundo). REYMUNDO Bem que tu quiria. ZEFA Se eu tiver por aí, sem nada pra fazer, até que eu óh, óh! RAQUÉ 62


Rumbora trabaiá, rumbora trabaiá. Laiga de cunversêro, que senão nóis num acaba com essa impreita! REYMUNDO Êita! Eu tava se isquecenu! Eu tenho duas nutícia pra dá procês. Uma é boa e a outra é mió ainda! Qual que cês qué ouvi primeiro? RAQUÉ Manda a ruim. Manda a ruim. ROSINHA e BICHINHA ÔXEN! REIMUNDO Ôxe! Mas eu disse nutícia ruim? RAQUÉ Eu sei que tem. Vino de tu, Ram! ZEFA Num tô dizeno. Esse bicho é chei das treita. REYMUNDO Que treita, que nada. Eu passei ali assim, encontrei com Zé Antão. E ele incomendô quinze saco de farinha, pra Segunda-feira de manhã. Eu disse que nóis dá conta! ZEFA E qual é a ôtra? REYMUNDO Se nóis acabá a tempo, nóis vamo tudo pro Forró de Mané Vito, inclusive eu. 63


ZEFA Te avexa! Apois eu vô. Cum farinha ou sem farinha eu vô. Eu mandei foi fazer rôpa. Márcia vai pintá minha unha. Eu vô me embelezá toda. E vô encarcá o pé na dança! DASDÔ Quém trabaia tem que se adivirtí. BICHINHA Eu quero vê o puerão aleventá. REYMUNDO Insprica pra essa infiliz aí. Esse ano, milho... RAQUÉ Num deu. Nem embunecô. DASDÔ, ROSINHA E BICHINHA Apois! REYMUNDO Feijão... RAQUÉ Num deu. Nem uma cuzinhada. DASDÔ, ROSINHA E BICHINHA Rum! REYMUNDO Arroz... RAQUÉ Num deu. Nem prantemo. Onde é que tem brejo aqui? 64


DASDÔ, ROSINHA E BICHINHA Ai ai! REYMUNDO Argudão... RAQUÉ Deu uns capucho de nada. Que num dá nem pra tapá os buraco dos zuvido. DASDÔ, ROSINHA E BICHINHA Quá! REYMUNDO Nós tem que se apegá é com essa farinha. Apruveitá essa mandioca que deu de teimosa. Que num era nem pra tê dado. Rumbora trabaiá! ZEFA Eu mermo não. Eu quero é mais. Num vô ficá aqui ralano minha mão nessa casa de farinha aqui não. Depois do forró de Mané Vito, eu vô é me imbora. REYMUNDO Apois vai Zefa, vai. Que tu e nada é a mesma coisa. RAQUÉ Dexéla! Que essa mandioca, fraca desse jeito, vai dá malémá uns Dez saco. E dez num é quinze. É mió ela ajudá na venda da farinha lá na feira. Chega lá Zé Antão fica de butuca em riba dela, fica cum os dez saco paga os quinze e nem recrama. Lambe é os beiço. Dexéla! ZEFA Eu mermo que num vô pra feira. 65


RAQUÉ Vai bestona! Tu vai gostá de lá. Assim tu passia! Lá tem de tudo que aí no mundo! Tem massa de mandioca, Batata assada, tem ovo cru, banana, laranja, manga,Batata, doce, queijo e caju, cenoura, jabuticaba, guiné, galinha, pato e peru, tem bode, carneiro, porco, se duvidá... inté cururu. Bunecos de Vitalino, que são cunhecidos inté no Sul, de tudo que há no mundo, tem na Feira de Caruaru. ROSINHA Tem o homi que grita: - Ó copo pra bebê veneno! Tem o otrô que vende aquela garrafada e grita: - é pá trinta duênça! E na barraca de fruto o ôtro grita assim: Ó a melancia Putaiáda! DASDÔ Num é putaiáda. É pur taíada! cês num sabe o que é taiada não? Taiada de melancia. RAQUÉ Pra cunversá seis num tem priguiça. Vai Zefa. Vai te aprontá pro forró que nóis acaba aqui. Aí tu vai mais Reymundo Segunda-fêra na fêra. REYMUNDO Apois vai Zefa. Vai se Impiriquitá! ZEFA Vô! E num vô? Eu mandei fazer foi rôpa pra essa festa! DASDÔ Eu também vou chegano... Rumbora Bixinha.

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ROSINHA E eu? RAQUÉ Vai. Vai ceis tudo. Seis num é acustumada a trabaiá, vai que cai a espinhela docês. Aí seis num dança! (saem) REYMUNDO Vai Zefa, vai. Vai cês tudo. Que nós num tem medo do trabai não. Num é Zabé? RAQUÉ É Raqué! É Raqué! R-a RA q-u-é QUÉ. RAQUÉ! Bora trabaiá. Música - Oi eu aqui de novo (Antonio Barros) “Óia eu aqui de novo, xaxando

Óia eu aqui de novo, para xaxar...” (Raqué e Reymundo trabalham durante a música e vão finalizando o dia de trabalho. Os demais preparam o espaço para o forró de Mané Vito).

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Cris Camilo, Edu Brisa, Juliana Crifes, Geovane Fermac, Carol Guimaris, Dani Guimarães, Judson Thápioka e Ana Cristina Ramos A Casa de Farinha do Gonzagão Espaço Clariô Taboão da Serra SP ano 2012 Foto Ricardo Kraftman


S E G U N D O B A I L E - O F O R R Ó D E M A NÉ V I T O CONTADOR Ôh meu povo! Eu num disse pra vocês que essa bandona todinha aí, ia tocar no forró de Mané Vito? Pois antão Chegô! Ocês pode ficá à vontade. Dançar, cumê, bebê, se adiverti. Viva o forró de Mané Vito!! CORO Viva! Música - Vem Morena (Luiz Gonzaga e Zé Dantas) “Vem, morena, pros meus braços

Vem, morena, vem dançar

Quero ver tu requebrando

Quero ver tu requebrar...” Música – Sabiá(Luiz Gonzaga e Zé Dantas) “A todo mundo eu dou psiu (Psiu, Psiu, Psiu) Perguntando por meu bem (Psiu, Psiu, Psiu)

Tendo um coração vazio Vivo assim a dar psiu

Sabiá, vem cá também...”

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A HORA DA COTA ZECA DE SONINHA Hora da Cota! Quém num pagá, num dança. REYMUNDO Num tô dançano. Música - Vou te matar de cheiro (João Silva e Luiz Gonzaga) “Tô doidinho, prá me deitar naquela cama Tô doidinho, prá me cobrí com teu lençol

Doidinho, prá te matar de cheiro, soprá no candeeiro deitá nos travesseiro e começá

nosso forró...”

Música - O forró de Mané Vito (Luiz Gonzaga e Zé Dantas) “Bitola no Ganzá

Preá no reco-reco

Na sanfona de Zé Marreco

Se danaram pra tocar

Praqui, prali, pra lá Dançava com Rosinha

Quando o Zeca de Soninha Me proibe de dançar...”

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ZECA DE SONINHA - Quem num paga, num dança. REYMUNDO – Pare o fole.

RISC A FAC A uma briga de facas entre Reymundo e Zéca de Soninha.

KAROLINA Morreu! ROSINHA Quem morreu? KAROLINA Foi Zeca! ROSINHA Zeca de quem? KAROLINA Zeca de Soninha! CORO Meu Deus! Meu Deus! Aiai! Aiai! REYMUNDO Ô seu delegado, por nossa senhora dotô. Eu num matei o homem não. Só dei uns risquim. O cabra é que era morredô.

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H ora da Q U A D R I L H A . Os atuadores e o público formas seus pares e dançam a quadrilha junina, puxada por um dos atuadores. MÚSICA - Pagode Russo (João Silva e Luiz Gonzaga) “Ontem eu sonhei que estava em Moscou

Dançando pagode russo na boate Cossacou...”

Música - Quero Chá (José Marcolino e Luiz Gonzaga) “Morena eu quero chá, eu quero chá, eu quero chá morena velha

eu quero chá...”

FIM DA QUADRILHA Música - Forró no escuro (Luiz Gonzaga) “O candeeiro se apagou O sanfoneiro cochilou A sanfona não parou

E o forró continuou...”

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DESPEDIDA DE ZEFA - Zéfa vai pro sul. Suverter!! Ela está com uma mala nas mãos e se despede de todos. Reymundo pega a mala das mãos de Zéfa. REYMUNDO Vamo gente! Vamo levá Zefa até o Gonzagão! CORO Vamo! Música - Último Pau-de-arara (Venâncio, Corumbá e José Palmeira Guimarães)

“A vida aqui só é ruim

Quando não chove no chão Mas se chover dá de tudo

Fartura tem de montão Tomara que chova logo

Tomara, meu Deus, tomara

Só deixo o meu Cariri

No último pau-de-arara...” Música - Viva o Rei (José Amâncio e Zé Gonzaga)

“Luiz Gonzaga não morreu

Nem a sanfona dele desapareceu 74


Seu automóvel na virada se quebrou

Seu zabumba se amassou

Mas o Gonzaga não morreu...” TODOS Luiz Gonzaga não morreu! Luiz Gonzaga não morreu! Luiz Gonzaga não morreu! Luiz Gonzaga não morreu!

Findou-se

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Edu Brisa, Curisco, Geovane Fermac e Zé Luiz em A Casa de Farinha do Gonzagão na Cidade de Presidete Prudente - SP ano 2018 foto Gustavo Guimarães


A Casa de Farinha do GonzagĂŁo Um Recorte em 4 movimentos


1º MOVIMENTO Sobre uma pilha de paletts encontram-se instalados os integrantes da CTI todos raspam mandioca. REYMUNDO – Sejam bem-vindos! A casa está aberta. Muito prazer! Eu sou a Cia. Teatro da investigação, mas pode de chamar de CTI. Fiquem à vontade tem de comer tem de beber, podem se servir. Aqui tem sanfona, triângulo e zambumba! Tem poesia, mandioca, farinha e dança. Pode entrar na dança! Mas cuidado que quando tu balança dá um nó na minha pança! Vocês num bote reparo não que nós tamo aqui na lida. Fiquem despreocupados que nós estamos entre amigos. CEGO-ASSUM – Amigos não. Que eu num lhe dou ousadia! REYMUNDO – Xiiii. É que ela é revoltada, porque ela num vê. E Ninguém aqui sabe porquê! DASDÔ – Eu sei. Seis num alembra daquele menino que o pai furô o zói pra num vê a seca? BICHINHA - Num foi o pai dele que furo o zói, foi um garrancho de unha de gato que bateu no zói dela. Ela tava na garupa do pai, o pai baxô aí o garrancho foi e furo os dois zó dele duma vez só. RAQUÉ - Seis num sabe é de nada. Disseru que ele era menino, deu um eclipse, ele oiô pro sol, beteu um vento e ele ficô sego do zói.

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ZÉFA – Ele ficô cego foi de amô! CEGO-ASSUM – Rumbora trabaiá. (Os demais integrantes interagem, comentam e reiteram). Música – Farinhada.

2º MOVIMENTO Os integrantes ralam mandioca. CONTADOR – Eu sou um caboclo feliz. Se eu nascesse de novo eu ia tornar a fazer tudo que fiz. Se eu nascesse de novo e pudesse escolher, mas do que eu sou, eu não queria ser! Eu queria ser a CTI – E num ia ser mole chegar até aqui. Derna de 2003. Caminhando meu chão trazendo poceis Luiz Gonzaga o Rei do Baião! O Gonzagão! Este artista nacioná, internacioná que como já disseram, trouche o rural para o urbano, esse homem que foi um tradutor, no sentido etimológico da palavra, que significa transportar. E aqui estamos nós da Cia. Teatro da Investigação para transportar as personagens de suas músicas para o Teatro. Ou mió pro Teatro-baile. Aqui é teatro e é baile. Pode comer, pode beber, dançar, se adivertir que eu num tô nem aí. Se eu nascesse de novo e pudesse escolher, sabe onde eu queria tá agorinha mermo¿ aqui, no Casarão do Belvedere, contano essa história aqui pro ceis. Viva o Casarão do Belvedere! O Casarão do Belvedere é o povo como o Céu é da Asa Branca! Se eu nascesse de novo e pudesse escolher, eu queria tá aqui na Casa de Farinha do Gonzagão, ralando mandioca! A mandioca que alimentou e alimenta o povo Brasileiro derna de antes da colonização. A mandioca que foi uma das res80


ponsáveis pela fundação da Cidade de São Paulo. Essa cidade aqui em que nos encontramos. Porque em São Vicente não dava mandioca, mas em Piratininga dava. Daí José de Anchieta, aquele mermo, o Jesuíta, sabendo disso se mandou pra cá. Rezou a missa e daí a gente já sabe! Pra você vê que Anchieta sabendo da importância da mandioca na alimentação nativa correu pra perto da mandioca. Já Zefa, aquela ali. Quer corre pra longe da mandióca! Ela que pensa! (os demais integrantes interagem, comentam e reiteram. Aqui a mandioca sendo espremida.)

3º MOVIMENTO A partida da Zefa Os integrantes peneiram a massa de mandioca. DESPEDIDA DE ZEFA - Zéfa vai pro sul. Suverter!! Ela está com uma mala nas mãos e se despede de todos. Reymundo pega a mala das mãos de Zéfa. REYMUNDO Vamo gente! Vamo levá Zefa até o Gonzagão! CORO Vamo! Música - Último Pau-de-arara (Venâncio, Corumbá e José Palmeira Guimarães)

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“A vida aqui só é ruim

Quando não chove no chão Mas se chover dá de tudo Fartura tem de montão Tomara que chova logo

Tomara, meu Deus, tomara Só deixo o meu Cariri

No último pau-de-arara...”

4º MOVIMENTO CENA DO ZECA Zeca traz uma carta de Zéfa. ZECA – Ô de Casa! (Silencio) ZECA – Ô de Casa! (Silencio) ZECA – Louvado seja nosso senhô Jesus Cristo! TODOS – Pra sempre seja Deus Louvado ZECA – Eu só parei aqui mermo pra tomá um copo d”água. Pra eu acabar de chegar. E também porque eu trouxe aqui uma carta de Zéfa. (A carta vai passando de mão em mão na fila.) - Lê aí pra nós - Lê tu. 82


- Eu não. - Lê aí. CEGO-ASSUM – Dá pra cá que eu leio. TODOS – OXENNN! CEGO-ASSUM – A derradeira coisa que vi, foi as letras escritas na carta de despedida de Rosinha. Rosinha que era a luz dos zóio meus! E tava escrito, que quando voltasse de lá pra cá uma mensageiro de boas novas, minha visão ia vortá. E vortô. Qual é o espanto? Agora deixa ei lê essa carta. Mas vou lê aqui não. (Sai) (todos saem num pequeno cortejo até um local onde se vê Zefa ao longe, a carta que é escrita no dia da apresentação é lida enquanto Zefa toca)

FINDA

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Geovane Fermac, Flรกvio Pessoa, Harry de Castro e Carol Guimaris em A Olaria do Jackson do Pandeiro em Curitiba PR ano 2015 foto Tally Campos.


A Olaria do Jackson do Pandeiro Apresentação

Luiz Gonzaga abre passagem para Jackson do Pandeiro. É teatro e é baile, É baile e é teatro, Viva o Brasil, o país da contradição. Aqui deu o rei do ritmo, aqui deu o rei do baião. Morar é preciso, viver não é preciso não. Da luta, labuta. Do barro, tijolo, teto, Da luta, labuta, Do barro, fortaleza, alegria, tristeza, Vamos fazer desse lugar nosso lugar de comer, beber, morar. Bora, Comer-morar Viva o povo brasileiro! Viva Jackson do Pandeiro!

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A Olaria do Jackson do Pandeiro investiga a aguda situação da falta de moradia digna na cidade de São Paulo e é urgente que se jogue luz sobre esta questão para que possamos quebrar paradigmas sobre as ocupações e seus desdobramentos. Homens e Mulheres, trabalhadores sem teto são estigmatizados pela imprensa de massa e por consequência também por grande parte da população que os veem como vândalos, oportunistas, desocupados e etc. Famílias inteiras são escorraçadas de seus lugares de morar em nome de uma lógica de mercado que oprime e aumenta a cada dia as diferenças sociais num método maniqueísta. É de interesse público abrir um espaço para essa reflexão! Partindo da obra de Jackson do Pandeiro, propomos a criação de um espaço poético que possibilite e potencialize a presença dos personagens da sua obra, onde o público e espetáculo possam conviver como um organismo. Partiremos de um espaço cênico pré-determinado, uma ocupação de trabalhadores sem teto. A OLARIA do título, (onde o próprio Jackson trabalhou com seu pai na primeira infância), espaço de trabalho de homens e mulheres comuns, contidos em sua obra é uma alegoria para discutir, questões de comunidade, moradia, transformação, trabalho e ritmo. Compartilhamos com o público também o espaço do baile, aquele mesmo baile que Jackson do Pandeiro, nosso inspirador, animou durante toda a sua carreira; a conversa entre estes dois espaços, ocupação e baile, fará a comunhão pretendida aqui, que chamamos de TEATRO-BAILE. Estes trabalhadores comuns, personagens de sua obra, colocados como protagonistas, dividem com o público suas histórias, seu espaço de trabalho, seu comer, seu beber e o seu baile, realizado na cozinha comunitária da ocupação, onde todos poderão dançar e se divertir ao repertório de Jackson do Pandeiro executado pelos próprios trabalhadores sem teto.

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Sinopse

Beto Bellinati em A Olaria do Jackson do Pandeiro Avenida Paulista SĂŁo Paulo - SP ano 2016 foto Cristiano de Assis.


Carol Guimaris em A Olaria do Jackson do Pandeiro Avenida Paulista São Paulo - SP ano 2016 foto Cristiano de Assis.

A Olaria do Jackson do Pandeiro é um trabalho em processo que já levantou diversos materiais artísticos e que ainda não se esgotou. Tendo como base o encontro da Obra de Jackson do Pandeiro com a temática da ocupação de moradia. Um retrato do país da contradição, levando à cena a festa e a luta de trabalhadores e trabalhadoras que lutam por moradia digna!


Cartaz circulação ano 2015 arte por Celso Carramenha


Julia Silva, Katherine França, Michel Xavier e Carol Guimaris A Olaria do Jackson do Pandeiro Sede CTI São Paulo 2018 foto Gustavo Guimarães

Gaby Leão, Vanessa Santos, Cris Camilo e Beatriz Santos A Olaria do Jackson do Pandeiro Sede CTI São Paulo 2018 foto Gustavo Guimarães


A OLARIA DO JACKSON DO PANDEIRO PRÉ-PRINCÍPIO CONTADOR ONLINE – Hoje vai acontecer uma coisa importante aqui! ... Hoje vai acontecer uma coisa muito importante aqui! Entrada da trupe Entram carregando seus instrumentos-objetos, os apresenta ao público. Música Ôh Mãe, corta o meu cabelo; Como é que eu vou pra reza; No dia seis de janeiro; Papai não quer que eu corte;

Papai não quer deixar;

Como é que eu vou pra reza;

Com o cabelo sem cortar;

PRINCÍPIO – Apresentação da trupe CONTADOR ONLINE - Muito prazer! Eu sou a Cia. Teatro da Investigação, mas pode me chamar de CTI! TRUPE - CTI!

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CENA 1 MARIA DO ASSOPRO - Estamos prontas? CORO - Pro que der e vier! MARIA DO ASSOPRO - Então vamos à Luta! Porque quem não luta… CORO - Tá morto! (Como uma reza os 2 grupos ao mesmo tempo) grupo 1 - Hoje é a véspera, amanhã é o dia; - Quem não dorme, sou eu Maria; grupo 2 - Tô dormindo ao relento; - Valei-me nossa senhora; CONTADOR ON-LINE - O que eu vim fazer aqui hoje? Alguém chuta? Eu vim dar o furo. De reportagem! Já estamos com 03 pessoas on-line. Além de todos vocês que estão o quê? Off-line. Me desculpem mas vocês estão off-line. Continuem assim. E vocês aí de casa continuem on! Como eu prometi pra vocês hoje é o dia! Vai acontecer alguma coisa aqui hoje. Mas o que será? Coloque aí nos comentários. E vamos seguir que Deus é grande e o céu é longe! (MARIA PRETA, puxa a cantoria: Eu vou pro samba, mas não deixo de levar o meu pandeiro) Eu não disse! Está acontecendo! Vejam vocês com seus próprios olhos!

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Musica – O Samba e o Pandeiro (Ivo Martins e Jackson do Pandeiro) “Eu vou pro samba, mas não deixo de levar o meu pandeiro Ele vai, ele vem, ele vem, ele vai comigo na frente” MARIAZINHA - Luiz Gonzaga abre passagem para Jackson do Pandeiro! MARIA DAS GRAÇAS - Senhora Rainha do Mundo; Rogai por nós; Desta terra varonil; Agora e na hora; De lutar pelo Brasil; Saem em cortejo (durante o cortejo o NARRADOR ON LINE, narra com mímica para a web e para o público local). Musica – O Samba e o Pandeiro (Ivo Martins e Jackson do Pandeiro) “Eu vou pro samba, mas não deixo de levar o meu pandeiro Ele vai, ele vem, ele vem, ele vai comigo na frente” (Chegam diante do lugar de morar. Ficam por um tempo olhando. Sonhando. Esperando o momento certo de entrar.) CONTADOR ONLINE - Elas param. Todas! ... Estamos com 27 pessoas on-line. Novo recorde. Re-cor-de! ... Pra você que chegou agora, que ainda não sabe o que tá acontecendo. Eu também não. Fique aí. Não saia daí. Vamos descobrir juntos! Elas estão admirando esse lugar. Que lugar é esse? Quem são essas mulheres? Esse é o verdadeiro jornalismo investigativo! 94


VOZES – MÚSICA - Dá licença aê, - Dá licença aê - Dá licença aê, - Dá licença aê MARIA DO ASSOPRO - Aqui começa a Olaria do Jackson do Pandeiro... Na olaria se faz tijolo e telha que viram paredes, que viram tetos, casas, lares, direito, vida, valor, dignidade! Aqui vai ser nossa morada. Morada de trabalhadoras que lutam e relutam! Estamos prontas? CORO - Pro que der e vier! MARIA DO ASSOPRO - Então vamos à Luta! Porque quem não luta… CORO - Tá morto! MARIA DO ASSOPRO - Vamos fazer festa! Viva Jackson do Pandeiro! Viva o povo brasileiro! CORO - Viva!!! (As mulheres, metem o pé na porta e entram no espaço. Surge uma bandeira com as inscrições: OCUPAÇÃO A OLARIA DO JACKSON DO PANDEIRO – MULHERES EM LUTA! - EU QUERO MORADIA! EU QUERO MORANOITE! O espaço está ocupado. Do lado outra bandeira da CTI - Silêncio.) CONTADOR ONLINE - (Lê a bandeira) OCUPAÇÃO A OLARIA DO JACKSON DO PANDEIRO – MULHERES EM LUTA! EU QUERO MORADIA! EU QUERO MORANOITE! ... É uma ocupação minha gente! É uma ocupação de mulheres. Mulheres em luta. Luta por moradia! Eu falei que ia acontecer 95


uma coisa importante aqui hoje. Isso aqui é muito importante! ... Meu Deus! Tá acontecendo uma coisa importante aqui. E eu tô aqui. E vocês também. Eu vou registrar esse momento histórico. E vocês vem comigo, que sozinho eu não vou conseguir! Meu Deus! 279 pessoas on-line! É top trends! ... Deus é grande e o céu é longe! (Ouve-se a movimentação dentro da ocupação. Algumas janelas vão se abrindo). Aqui é bom lugar de se parar, bom lugar de se acordar, bom lugar de se dormir. É aqui, porque as pernas já não podem mais andar, é hora de tornar a fazer ninho que já já, gavião sente o cheiro e vem peneirar... Já sinto um cheiro de comida. Olha! Uma janela se abriu, duas! Elas estão “embonitando” esse lugar! Esse lugar agora tem vida! Sintam a vida minha gente! Sintam a vida! (O espaço vai se modificando e ganhando cara da moradia). VOZES - Eu tô vendo o mundo de dentro pra fora! - Nossa filha vai nascer morando! - Nós vamos viver morando! Música - Não Me Falta Nada – (Jackson do Pandeiro e Durval e Vieira) “No meu barraco não me falta nada;

Não me falta nada

e eu não devo pra ninguém;

No meu barraco não me falta nada;

Não me falta nada e eu vivo muito bem...” (Arrumam a cozinha comunitária!)

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CENA 2 CONTADOR ONLINE - Hoje tá pra mim! Vem pra roda Iaiá. Vem pra roda Ioiô. Bate o BAQUEMORÉ. Já deu meia noite. E o galo cantou. O meu galo cantou! Estamos on-line para mais de 300 pessoas! Eu disse 300? Eu disse tre-zen-tas! MARIA SOCIAL - A Cozinha comunitária ficou pronta!! (Elas começam a tocar. Todas tomam um café-baile-improvisado-comunitário. Compartilham com o público, o comer, o beber e o dançar). MARIA PRETA - (AO MICROFONE ) A cozinha comunitária ficou pronta, aqui, o muito ou o pouco é de todo mundo. Fiquem à vontade pra fazer uma boquinha com a gente! Nós somos mulheres em luta, por moradia digna. Eu sou Maria Preta. _ Eu sou Maria… _ Eu sou Maria… _ Eu sou Maria… _ Eu sou Maria… (Todas se apresentam). MARIA DAS GRAÇAS - Certamente vocês, se vocês não passaram por isso, conhecem alguém que passou ou já ouviram falar nos movimentos de luta por moradia. Estamos em luta permanente! Junte-se a nós. Esse aqui é o momento de compartilhar, comer, beber, dançar. Venham! Vamos fazer a festa e a Vigília. Não podemos descuidar!

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Geovane Fermac em A Olaria do Jackson do Pandeiro SĂŁo Paulo 2017 foto Michele Saraiva


1º BAILE (Aqui acontece o 1º Baile com abertura ao publico)

CONTADOR ONLINE - Temos aqui uma representante dessa ocupação. Diz aí pra aquela câmera, quem são vocês? MARIA PRETA - Ôh meu Deus! Eu já tô atrasada de novo. Gente eu tô indo. Hoje sou eu que abro o salão. Já tem um monte de cliente marcada. Não vou esperar ninguém. Ôh Maria! A outra Maria. Cuida aí que hoje eu só venho depois da facul. Fui que eu não sou obrigada! CONTADOR ONLINE - Elas estudam! Elas trabalham. Aqui é a informação é em tempo real! Oque mais elas fazem? Coloquem nos comentários. Sigam o canal! ... êi êi, onde você está indo? Conta aqui para o meu público. MARIA DAS GRAÇAS - Ôh Maria! A outra Maria. Meu bilhete! cadê meu bilhete! MARIA SOCIAL - Toma mulher. Vai logo. Senão tu chega atrasada, perde o emprego, aí eu quero ver! MARIA DAS GRAÇAS - Eu não quero nem ver! Pra você vê como é: A gente chega atrasada, desconta. A gente falta, desconta. Ninguém leva em consideração os perrengue da gente! Esse ano eu já perdi três empregos, porque a vida da gente é inconstante, agora quem quer saber? MARIA SOCIAL - Vai Mulher! Que tu perde esse emprego também. MARIA DAS GRAÇAS - Vira essa boca pra lá! CONTADOR ONLINE - E você. Oque me conta? ... estamos aqui com uma legítima representante.... MARIA SOCIAL - Maria! A outra. Eu vou ter que ir, já. Fica de 100


olho. Qualquer coisa me chama que eu venho. Queria dormir o dia todo! Mas como eu não nasci rica. Tenho que aguentar o rojão de dois empregos. Vamos trabalhar! Minha mãe dizia que trabalho não mata. Mas aleija! CONTADOR ONLINE - Filosofia de mãe! ... “trabalho não mata. Mas aleija!” ... em que será que ela trabalha? Coloquem nos comentários... MARIA DAS DORES DO PARTO - (Tocando seu triângulo) olha o picolé. Só compra quem quer! Olha o picolé. Têm de leite e de café. Olha o picolé se não compra dá no pé! CONTADOR ONLINE - Moça. Aqui todo mundo chama Maria? MARIA DAS DORES DO PARTO - Tem de cupuaçu, umbu, caju. Jabuticaba, leite de cabra, compra logo senão acaba. (Sai) CONTADOR ONLINE - Essas mulheres vieram de longe? Que infância tiveram? Tiveram barriga cheia? Saneamento básico? Que oportunidades tiveram? Coloquem aí nos comentários!

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Harry de Castro em A Olaria do Jackson do Pandeiro SĂŁo Paulo 2017 foto Michele Saraiva


CENA 3 CONTADOR ONLINE - Tá no meu DNA o gene da investigação. Vocês estão testemunhando um repórter investigativo em ação. Vamos entrar e descobrir tudo. Tudo, tudo, tudo! Vamos lá que Deus é grande e o céu é longe! MARIA DA PÁ VIRADA - Hoje eu tô triste! Ainda não matei ninguém! CONTADOR ONLINE - Valha-me Deus o Senhor São Bento, Buraco velho tem cobra dentro. (Eles lutam um arremedo de capoeira) Música: Capoeira Mata Um – (Alvaro Castilho e De Castro) “Zum zum zum, zum zum zum

Capoeira mata um

Samba que balança é bom

Samba que balança não cai

O meu samba tem que ser no

Tom a pedido do meu pai...” CONTADOR ONLINE - Estou com a faca no pescoço! Estou correndo risco! Meu Deus! ... Mil pessoas on-line! MIL! Mil, mil, mil, mil, mil. Aproveitem para doar para o meu crowdfunding! Doa, doa, doa, doa! A conta está aí na descrição do canal. (Ela tira a faca e se afasta) fica moça. Fica. Vejam vocês eu estou correndo risco de morte. Doa! MARIA DA PÁ VIRADA - (Faz um risco no chão) se passar desse risco morre! CONTADOR ONLINE - Vocês viram. Eu fui formalmente ameaçado! Dez mil pessoas on-line! 104


CENA 4 (Entra o Cosplay-Feito e a tropa de choque de gestão). CONTADOR ONLINE - O que será isso? Quem chamou a polícia? Coloquem nos comentários. Vamos ficar de olho. (Com o Cosplay-Feito à frente, com a mãozona demolidora, eles tomam o espaço. MARIA DA PÁ VIRADA, tenta em vão resistir. Ela é dominada e retirada). COSPLAY-FEITO - Bagunça! (A tropa de choque de gestão, destrói tudo que há no espaço. Cobrem as bandeiras com uma bandeira cinza. Saem levando pertences das moradoras. Acrescentar sons, vídeos, depoimentos, elementos de histórias reais de desapropriações. O Cosplay-Feito fica em cena, estático com a mãozona) CONTADOR ONLINE – Gente! E agora? O que será dessas Marias? Deus é Testemunha. Eu sou testemunha. Vocês são testemunhas. Nós somos testemunhas disso que aconteceu aqui... Alguém tem o WhatsApp de alguma delas pra gente avisar? Elas precisam saber disso... Você aí que tá me seguindo, compartilha! Vamos fazer isso chegar até as Marias. Repito. O que será delas? Que será de mim? O que será de vocês? O que será de nós, nesse mundo?

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Natalia BAviera, Camila Borges, Harry de Castro, Geovane Fermac, Cris Camilo e Danuza Novaes em A Olaria do Jackson do Pandeiro SĂŁo Paulo 2016 foto Cristiano de Assis


CENA 5 (As mulheres retornam do dia de trabalho e se deparam com a destruição do lugar e uma barreira que impede seu acesso. Do lado de dentro está o Cosplay-Feito com a mãozona. Elas chegam e ficam incrédula olhando. retorna Maria da pá Virada). MARIA DA PÁ VIRADA - Balançaram a roseira, foi tanta fulô no chão. CONTADOR ONLINE - Foi a tropa de choque. Eles entraram. Quebraram. Pisaram. MARIA DA PÁ VIRADA - Balançaram a roseira, foi tanta fulô no chão. CONTADOR ONLINE - Foi o choque. Saíram levando coisas. E levando Maria. Enfiaram ela no camburão e saíram canto pneu. MARIA DA PÁ VIRADA - Balançaram a roseira, foi tanta fulô no chão. CONTADOR ONLINE - No Brasil não tem terremoto, nem furacão, nem vulcão, nem tsunami... e nem terrorismo! CORO DE VOZES Graças a Deus! VOZES - Vem pra cá Maria. - Vem pra cá. - Vem.

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CENA 6 Música – Mundo Cão (Jackson do Pandeiro e Rogério Ribeiro) “Eu não sei, não sei não; O que é que eu vou fazer;

Pra continuar vivendo nesse mundo cão.”

MARIAZINHA - Gente! Todo mundo já sabe, vamos ter que sair daqui e procurar lugar de viver. Mais uma vez saímos perdendo. Precisamos dar um jeito de pegar nossos panos de bunda. Dá no pé! MARIA DAS GRAÇAS- Como? Se tá tudo lacrado. Com esse cara aí. MARIA PRETA - Vamos falar com ele. Ô trabalhador. Nós somos trabalhadoras também, nós precisamos entrar aí pra pegar nossas coisas. MARIA DAS DORES DO PARTO - Tudo que a gente tem tá aí dentro. MARIA DAS GRAÇAS - Libera aí. MARIA DO ATRASO - Libera aí pra nós. MARIA DAS GRAÇAS - Com esse cara não vai adiantar. Vamos ter que falar com alguma autoridade. MARIA PRETA- Com quem? MARIAZINHA - Quem é por nós nesta vida, senão nós mesmos. MARIA DAS DORES DO PARTO - Vamos atrás do prefeito. Ele tem que nos ouvir. 109


MARIA SOCIAL - Eu não saio daqui. Vamos mandar um recado por esse rapaz da internet. CORO DE VOZES Queremos falar com o prefeito! Queremos falar com o Prefeito! Queremos falar com o prefeito! CROSPLAY-FEITO - (Tira parte da fantasia de trabalhador) Sejam rápidas! Eu tenho uma reunião agora nesse minuto com meus prefeitos regionais! CORO DE VOZES - O Prefeito! MARIAZINHA - Que isso seu prefeito. Isso é coisa que se faça. MARIA DAS DORES DO PARTO - Tirar nosso lugar de morar? MARIA SOCIAL - Como é que é isso? MARIA DAS GRAÇAS - Eu votei no senhor. CORO DE VOZES Votou? MARIA DAS GRAÇAS - O voto é secreto. COSPLAY-FEITO - Fez muito bem. Embora eu não precisasse, pois eu tive 3.085.187 votos. MARIAZINHA - E a gente aqui seu prefeito? COSPLAY-FEITO - Na minha gestão. Sim eu sou um gestor. Na minha gestão não admitirei, invasores. Transgressores. MARIA PRETA - Isso daqui é uma ocupação legítima! Legitimada pela nossa necessidade. Pelo que está escrito na constituição. E pela falta de uso deste imóvel há mais de 10 anos. COSPLAY-FEITO - Eu peço desculpas, mas tenho um compro110


misso de última hora. Inclusive se me permitem, eu já contratei uma assessoria para cuidar desse tipo de evento. Como prova do meu apreço pela causa de vocês. MARIAZINHA – Seu Papo é Firme, é muito chic! CORO – Mas não sou eu que vou cair nesse trambique. MARIAZINHA – Pra entrar nesse chaveco, era preciso que eu fosse um zé mané. COSPLAY-FEITO – Congela! ... Estou como sempre estive, aberto ao diálogo e o bem desta cidade linda, é prioridade na minha gestão. Então sejam lindas! Não sejam invasoras. Não sejam contraventoras. CORO – Descongela! MARIAZINHA - Se nós somos contraventoras, invasoras, o senhor também é seu prefeito. E a viela? Porque o senhor não devolve a viela? VOZES - Devolve a viela! - Devolve a viela! - Devolve a viela! MARIAZINHA - Responde prefeito. Vai devolver a viela? ... Responde. VOZES - Responde! - Responde! - Responde! (Ele recoloca a fantasia de trabalhador e fica imóvel) MARIA PRETA - Quem diz, sou eu ou é tu? 111


MARIAZINHA - Tu. Música - Coco do norte (Rosil Cavalcanti) Oi responda esse coco com palma de mão; CORO - Isso é coco do Norte, nunca foi baião. Oi responda, responda com palma de mão; CORO - Isso é coco do Norte, nunca foi baião. Música – Eu quero Moradia eu Quero Morar Noite (Edu Brisa e Carol Guimaris) TODOS Tem gente que pensa que a gente não é gente; Que a gente não tem que morar nem viver; Que pensa que a gente não pensa; Que a gente não sabe saber; Ô abre teu olho que aí tu vai ver! Música - Coco do norte (Rosil Cavalcanti) Oi responda esse coco com palma de mão; CORO - Isso é coco do Norte, nunca foi baião. Oi responda, responda com palma de mão; CORO - Isso é coco do Norte, nunca foi baião. Música – Eu quero Moradia eu Quero Morar Noite (Edu Brisa e Carol Guimaris)

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TODOS Nós somos de paz, não somos de guerra; Aqui nessa terra, nós vamos morar; Tira o chicote da mão, não vou dar minhas costas pro açoite; Eu não quero bater e nem quero apanhar! Eu quero moradia, eu quero moranoite! Música - Coco do norte (Rosil Cavalcanti) Oi responda esse coco com palma de mão; CORO - Isso é coco do Norte, nunca foi baião. Oi responda, responda com palma de mão; CORO - Isso é coco do Norte, nunca foi baião.

Geovane Fermac, Carol Guimaris e Josi Rouse em A Olaria do Jackson do Pandeiro São Paulo 2016 foto Cristiano de Assis


CENA 7 (MARIA DA PÁ VIRADA, invade o espaço e coloca a faca no pescoço do prefeito) VOZES - Não Maria. - Não Mata. - Calma Maria. - Sai daí Maria. MARIA DAS GRAÇAS – Gente vamo aproveitar e pegar nossas coisas lá dentro. MARIA SOCIAL – Não sei não. Ficar com faca no pescoço dessa criatura, pode complicar pra nós. MARIA DAS DORES DO PARTO – Já complicou. Minha filha não vai nascer sem nada! MARIA DAS GRAÇAS – E nós não podemos viver sem nada. MARIAZINHA – Maria fica assim, não mata. MARIA PRETA - A gente vai entrar depois libera o refém. CONTADOR ONLINE – Refém! Tem refém! Gente, eu acho que eu também estou sendo sequestrado, ainda não sei. Acompanhem pra vocês ficarem por dentro. Aqui é em tempo real. (Elas entram e vão em busca de seus pertences). MÚSICA – O canto da Ema (Alventino Cavalcante, Ayres Viana e João do Vale) “A ema gemeu 114


No tronco do juremá

A ema gemeu

No tronco do juremá...”

MARIA DA PÁ VIRADA– Ei você da internet. Vem filmar aqui dentro. CONTADOR ONLINE – Eu acho que eu fui realmente sequestrado! ... eu fui sequestrado também? MÚSICA – O canto da Ema (Alventino Cavalcante, Ayres Viana e João do Vale) “Você bem sabe

Que a ema quando canta

Vem trazendo no seu canto

Um bucado de azar Eu tenho medo

Pois acho que é muito cedo Muito cedo, meu benzinho

Para esse amor se acabar”

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Harry de Castro em A Olaria do Jackson do Pandeiro SĂŁo Paulo 2017 foto Tally Campos


CENA 8 (Elas retornam todas)

MARIA PRETA - As pessoas precisam saber tudo que aconteceu aqui. Destruíram tudo que era nosso! Derrubaram as casas com gente dentro. MARIAZINHA – Só me restou o que tava comigo. O dinheiro que eu tinha guardado no buraco da parede, sumiu junto com a parede. MARIA DAS DORES DO PARTO – O enxoval do bebê, nosso colchão… Desligaram minha geladeira, derreteu os picolé tudo... MARIA DAS GRAÇAS – Meu documentos, minha carteira de trabalho... MARIA SOCIAL – Minhas roupas, minhas perucas, minhas maquiagens, como é que vou fazer meus shows? MARIA DA PÁ VIRADA – Eu fui torturada, estuprada, mijaram em cima de mim. MÚSICA – O canto da Ema (Alventino Cavalcante, Ayres Viana e João do Vale) “Vem morena (vem, vem, vem)

Me beijar (me beijar)

Dá-me um beijo (dá-me um beijo)

Pra esse medo (se acabar)”

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CONTADOR ONLINE – E agora o que vocês vão fazer? MARIA PRETA – O que sempre fizemos. Vamos à luta. Porque quem não luta... CORO – Tá morto! MARIA DAS DORES DO PARTO - Amarra o prefeito! Só vamos soltar depois de resolverem nossa situação. COSPLAY-FEITO – Eu não sou o prefeito! Eu sou uma trabalhadora! MARIA PRETA– Conta outra prefeito. COSPLAY-FEITO – Eu não sou o prefeito! Eu sou uma trabalhadora! CONTADOR ONLINE – Gente, esse não é o prefeito, ele está ao vivo no seu canal da internet. ... Eu sigo ele. Vem ver ... olha ele aí. MARIA DAS DORES DO PARTO– Conversa! CONTADOR ONLINE – É ele. É ao vivo! MARIA SOCIAL– E esse aí quem é? COSPLAY-FEITO – Eu sou essa! Sou Maria também. MARIA DAS GRAÇAS – Libera ela aí, pra gente ver a cara dela. Libera aí. MARIAZINHA – Maria, libera. Não é o prefeito. (A trabalhadora é liberada) MARIA DAS GRAÇAS – Não é ele mesmo não. MARIAZINHA – Cadê o prefeito? TRABALHADORA – Ele já foi embora. Ele fica mal mal 15 minutos, depois se manda. 118


MARIA DAS DORES DO PARTO – O que tu veio fazer aqui? TRABALHADORA – Eu tô só trabalhando. MARIA DA PÁ VIRADA – Se manda! TRABALHADORA – Eu quero ficar. Eu sou Maria também. Eu não tenho lugar de morar, também... eu posso ajudar vocês aqui. MARIA PRETA – Quer ficar, fica. Mas aqui o trabalho é pesado. CONTADOR ONLINE – Gente isso é inédito. Não deu no NEW YORK TIMES! Não deu na TV aberta! Não deu na TV a cabo. Esse furo só eu dei!

CENA 9 CONTADOR ONLINE – Vocês vão embora? Pra onde? Porque vocês não fazem outra festa daquela? MARIA DA PÁ VIRADA – Alguém explica pra ele aí. Porque eu acho que ele não entendeu. MARIA SOCIAL – Eu explico. Meu filho: ocupar é fazer A Festa! Nós fazemos a festa como uma forma de resistir e aproveitamos para levantar fundos para as demandas comuns do coletivo. Portaria, limpeza, essas coisas. MARIA DAS DORES DO PARTO – Aproveitar pra fazer o chá de bebê. Vender picolé. MARIAZINHA – Passar o chapéu. MARIA SOCIAL – Fazer minha apresentação musical lacradora! MARIA PRETA – Agora me diz como que a gente faz esse baile, nessas condições?

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MARIA DAS GRAÇAS– Se não sobrou nada. CONTADOR ON-LINE – se a gente fizer uma campanha aqui no meu canal? Meu público é humano. Eles me seguem aonde eu for ... coloquem nos comentários ... vocês querem o baile? Vão participar? Doem coisas de baile ... comes, bebes… Meu público é humano. Mariazinha e Maria o assopro começam a tocar uma música. como sinal de que vão permanecer. As outras Marias, se preparam para irem embora. _ Vambora! _ Vambora! _ Vambora nós! MARIA DA PÁ VIRADA - Mas nós vamos pra onde? Silêncio MARIA DAS DORES DO PARTO - Aqui também não dá pra ficar. Silêncio MARIA DAS GRAÇAS - A gente arruma. Reorganiza. Começa tudo de novo. Já estamos aqui. Mão a obra! Quem fica? MARIA DA PÁ VIRADA - Todo mundo fica. Somos forte juntas! MARIA DO ASSOPRO - Se é pra entrar de novo, começar do começo, vamos entrar com festa. Vamos fazer a festa! Ocupar é fazer festa, se vamos ocupar, vamos fazer a Festa! MARIA DAS DORES DO PARTO– E nós vamos fazer essa festa? Daqui a pouco eles voltam e tiram a gente daqui na força! MARIAZINHA – Pode ser que sim. Mas como já disse nosso mestre Jackson do Pandeiro: “se a esperança é a última que morre, então vamos esperar cantando”. 120


MARIA DO ASSOPRO - Que que foi? Tá com medo? Porque veio? Nosso povo não tem medo. Aqui ninguém tem medo. Não podemos ter medo da festa! Estamos machucadas? Estamos e muito. Mas a nós não é dado o tempo de lamber as feridas… Vamos fazer festa de verdade, sem medo. É isso que eles querem. Que a gente se encolha, mas aqui ninguém abaixa a cabeça! Somos mulheres em Luta! Mulheres sem medo! Vamos fazer a maior festa que já fizemos! MARIA PRETA – Então vamos! Sem preguiça! Música Sina de cigarra - Jackson do Pandeiro e Delmiro Ramos “Nasci com uma sina de cigarra Aonde eu chegar, tem farra...” MARIA SOCIAL - Gente, chegou um monte de doação pra nossa cozinha. CONTADOR ONLINE - Não disse? Meu público é humano! MARIA DO ASSOPRO - Tá vendo aí! Não estamos sozinhas! Tem mais gente com a gente! MARIA DAS GRAÇAS - Gente, venham aqui pra dentro, vem fazer a festa! Vamos ficar todo mundo aqui dentro. Vem ocupar com a gente. Aqui dentro. Ocupem! Aqui é a festa do POVO SEM MEDO! (Instauram a festa. Convidam o público para participar desde a preparação. A festa é um sarau com microfone aberto, comidas, bebidas e apresentações das moradoras).

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MARIA DAS GRAÇAS Viva o Brasil; O país da contradição; Dois pesos e duas medidas; Pra uns sim; Pra outros não; Viva o Brasil; O país da contradição; Onde morar é preciso; Viver, não é preciso não;

Viva a coragem da mulher; A coragem de lutar; E de ser o que é; Viva a força da mulher; De segurar o rojão; E festejar; Quando der; Aqui é Teatro-Baile; É Teatro e é Baile; É Baile e é Teatro; 122


Vamos ao Baile; O caso não é de comemoração; É de resistência; É de afirmação; Fazer festa é mostrar que se está vivo; “É de lei, é de lei Este samba para nós é de lei É de lei a gente cantar É de lei a gente batucar É de lei a gente sambar É de lei a gente balançar Balançar, balançar O meu samba não pode parar Balançar, balançar É de lei a gente balançar”

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Atraz Carol Guimaris, Gustavo Guimarães, Geovane Fermac, Cris Camilo, Vanessa Santos e Julia Silva à frente, Michel Xavier, Gaby Leão, Harry de Castro, Gabi Alves, Ketherine França e Beatriz Santos em A Olaria do Jackson do Pandeiro Sede CTI São Paulo 2018 foto Edu Brisa


Música - A Ordem é Samba (Jackson do Pandeiro e Severino Ramos) “É samba que eles querem

Eu tenho

É samba que eles querem

Lá vai

É samba que eles querem

Eu canto

É samba que eles querem

E nada mais ...”


F i n dou - se

A Olaria do Jackson do Pandeiro Avenida Paulista SĂŁo Paulo - SP ano 2016 foto Cristiano de Assis.


A Feira de Chico, Gonzaga e Jackson A prese n ta รง รฃ o


Bom dia Dona de casa! Na minha barraca tem de um tudo; Um tudo que se possa imaginá; Pague um e leve dois; Não deixe pra depois; A vida é agora e é já; Sejam bem-vindos à Feira de Chico, Gonzaga e Jackson; Três cabras arretados; Que por esse mundo passaru; E botaram pra quebrá!

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Edu Brisa, Geovane Fermac, Harry de Castro e Carol Guimaris. em A feira de Chico, Gonzaga e Jackson Curitiba, PR 2018 foto Gustavo GuimarĂŁes


É na feira que tudo e todos se encontram. Atores/feirantes e público/donas e donos de casa são atuadores e atuadoras de suas próprias histórias, compartilhando seu espaço de trabalho, de consumo e de encontro. Na Feira de Chico, Gonzaga e Jackson tem de um tudo: de comer, de beber, de ver, de ouvir, de dançar e de cantar. É Interativo, como só poderia ser, o teatro-baile que se faz com a matéria humana do dia. Propomos a criação de um espaço poético que possibilite e potencialize a presença dos personagens das obras de Chico de Assis, Luiz Gonzaga e Jackson do Pandeiro, onde o público e instalação cênica possam conviver como um organismo. Partimos de um espaço cênico pré-determinado, uma FEIRA, espaço de trabalho e encontro de homens e mulheres comuns, contidos nas obras de Chico de Assis, Gonzagão e Jackson para discutir, questões de comunidade, moradia, saneamento, vontades e sonhos e compartilhar causos e receitas a feira é o nosso terreno fértil para uma aproximação com o público, oferecendo a ele uma porta aberta para a interação com a obra artística. Iremos compartilhar com o público também o espaço do baile, aquele mesmo baile, que Jackson do Pandeiro e Luiz Gonzaga, nossos inspiradores, animaram durante suas carreiras assim como no movimento teatral que Chico de Assis que propôs em sua rica dramaturgia em especial em seus estudos sobre o cordel que aproxima o público através das ações convidando-os a uma reflexão do papel do homem comum; a conversa entre estes três espaços/elementos, a feira, a cena teatral e baile, fará a comunhão pretendida aqui, que chamamos de Teatro-Baile.

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Cartaz da Feira de Chico, Gonzaga e Jackson 2018 arte por Luiz Felipe MacalĂŠ


A Feira de Chico, Gonzaga e Jackson 2018 Em Campinas - SP 2018 Foto Gustavo Guimarães

Sinopse Reunindo as obras do Mestre da Dramaturgia Chico de Assis, do Rei do Baião Luiz Gonzaga e do Rei do Ritmo Jackson do Pandeiro na poética do Teatro-Baile! 134


A FEIRA DE CHICO, GONZAGA E JACKSON É Chico de Assis, é Teatro, É Gonzaga e é Jackson, é Baile! É Cia. Teatro da Investigação; É Teatro-Baile! A poética que junta teatro, música, dança, culinária, literatura de cordel, artesanato e o público. No espaço democrático da feira! A feira nordestina que tem tudo que há no mundo! 135


Edu Brisa em A Feira de Chico, Gonzaga e Jackson São Paulo Sp 2017 foto Tally Campos

A FEIRA DE CHICO, GONZAGA E JACKSON A prese n ta ç ã o da T rupe


Muito Prazer! Eu sou a Cia. Teatro da Investigação, mas pode me chamar de CTI! A Trupe CTI!

PRINCÍPIO Música Essa é a Feira; De Chico, Gonzaga e Jackson; De Chico, Gonzaga e Jackson; (2x)

PRÉ-ABERTURA CONTADOR A FEIRA DE CHICO, GONZAGA E JACKSON: Pré-Abertura! O Mestre, dramaturgo, Chico de Assis, entre tantas coisas inscreveu anssim: “Deste mundo a gente leva Só o bem vivido e rido Deste mundo a gente leva O que se fez divertido Deixa pra lá Tudo o que for sem graça Bota pra trás

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O que for triste passa O que não presta Não serve para ser vivido A vida tem de ser festa Viver é tão divertido! Olhar o céu é riso Cheirar o mato é riso Correr no campo é riso Tomar cachaça é riso Beijar mulher é riso Contar estória é riso Brigar de faca é riso Fazer trapaça é riso Dormir na palha é riso Viver assim é riso São causos da vida Que vi no caminho Que guardo pra mim É estória pra ser contada.” Então tomando pra nós da CTI as palavras de Chico de Assis... Começamos: Mais uma bossa, um jeitão de recontar E são os causos, estórias, lendagens. Por falar, me bateu um... Então eu conto...

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ABERTURA CONTADOR A FEIRA DE CHICO, GONZAGA E JACKSON: Abertura! Música ABOIADOR Bom dia Dona de casa! Quem chega na hora não se atrasa; CORO Quem chega na hora não se atrasa; Bom dia Dona de casa! ABOIADOR Na minha barraca tem de um tudo; Um tudo que se possa imaginá; CORO - Pague um e leve dois; Não deixe pra depois; A vida é agora, a vida é já; ABOIADOR Sejam bem-vindos; À Feira; Aqui não tem que se queixar;

CORO É de Chico, Gonzaga e Jackson; 139


Três cabras muitcho arretados; Que por esse mundo passaram; E botaram pra “quebrá”!

ABOIADOR Nessa feira tem de um tudo De dançar e cantar; De Lê, de assistir;

CORO De cumê e bebê; De vê e ouvi; Rapadura, café e cariri;

ABOIADOR Esse é o teatro baile; Como ser, só podia;

CORO Aqui tem divertimento A todo e quarqué momento; Pra tu e tua famía. 140


Música Essa é a Feira; De Chico, Gonzaga e Jackson; De Chico, Gonzaga e Jackson; (2x)

Embolada CORO Tu já falô o nome de três, Quero vê arrepetir,

EMBOLADORES Arrepito um de cada vez, Para quem quiser ouvir;

EMBOLADOR I Primeiro é Chico de Assis; Dramaturgo brasileiro É um homem de teatro; Um artista por inteiro; Com ele não tem falácia; Seu nome é chico de Assis Um cidadão da galáxia! 141


EMBOLADOR II Primeiro é Chico de Assis, Diretor e novelista; Fez de um tudo nessa vida; Foi ator, foi um artista Esse hómi não morreu se foi pra dentro da gente Nos deixou cheios de teatro; Dramaturgia viva, latente!

CORO Tu já falô o nome de três, Quero vê arrepetir,

EMBOLADORES Arrepito um de cada vez, Para quem quiser ouvir;

EMBOLADOR I O segundo é Luiz Gonzaga; Aquele Rei do Baião; Aquele da asa branca; 142


Do assum preto e do sertão; O sanfoneiro do povo; Que Nunca desafinô; Dançô xote e xaxado e a poeira alevantô

EMBOLADOR II O segundo é Luiz Gonzaga; Esse hómi não morreu; Sua sanfona ainda toca E não desapareceu; O sanfoneiro do povo; O sanfoneiro da gente Sua sanfona encantada Deixou muito descendente

CORO Tu já falô o nome de três, Quero vê arrepetir,

EMBOLADORES Arrepito um de cada vez, Para quem quiser ouvir;

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EMBOLADOR II Terceiro é Jackson do Pandeiro; O Mister Tamborim-man; Tem pandeiro até no nome; Quero vê quem mais que tem Era um negro miúdim da voz fina como o quê; Resistiu até à fome; Resistiu ao yê yê yê;

EMBOLADOR I Terceiro é Jackson do Pandeiro; Nasceu com nome de Zé Conquistou o mundo inteiro Rei do ritmo ele é Com ele a ema gemeu; O tio sã se escafedeu; O povo dançou e riu Quero ver tu dançar mais eu

CORO Tu já falô o nome de três, Quero vê arrepetir, 144


EMBOLADORES Eu já falei o nome de três, E vou parando por aqui;

CONTADOR Eu falei o nome de três; Agora vou arrepetir; Arrepetir um de cada vez; Viva Chico de Assis! Viva Luiz Gonzaga! Viva Jackson do Pandeiro! Viva o povo Brasileiro! Viva nós! Viva vocês! Viva todo mundo de uma vez!

Música Essa é a Feira; De Chico, Gonzaga e Jackson; De Chico, Gonzaga e Jackson; (2x)

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1ª Quadra - ROSA CONTADOR A FERIA DE CHICO, GONZAGA E JACKSON, 1ª quadra! (Dois varais grandes esticado em x. Rosa com uma bacia com 04 lençóis. De longe é observada por um homem que amola sua peixeira, bebe cachaça e chama por Rosa. Rosa estende os lençóis nos varais). O Mestre, dramaturgo, CHICO DE ASSIS também escreveu assim: “Era uma vez uma história e dentro da história tinha outra história e dentro da história da história Tinha mais uma porção de história. Quem contou? Quem contou foi certo velho, Certo dia em certa estrada, Na qual fazia seu caminho, Em tempo muito passado. Lembrança boa guardei, tique por tique, Os acontecimentos da narração. História muito interminável, Entremeada nos dramas das peripécias. Povoada de um despotismo de personagens, Tanto mais muito como na sagrada escritura. História que de tão grande, Pra contar de inteira havia de passar mais de ano. Sem nem para pra comer ou dormir. Não guardo de meu uso. Conto. Faço mesmo gosto de contar e recontar. 146


Só por diversão de ver as caras mudarem de jeito quando a história muda de jeito. Escolho as partes curtas, Que dão bom lugar de começo, meio E um bom ponto certo de paragem... Fim? Não... que só com morte ou cataclismo.” Da obra de Jackson do Pandeiro:

HOMEM Rosa! Música - Rosa (Ruy de Moraes e Filho) “Rosa, Rosa, vem ô Rosa Estou chamando por você Eu vivo lhe procurando Você faz que não me vê Eu vivo lhe procurando E nem sinal de você. Rosa danada Minha morena faceira Minha flor de quixabeira Não posso mais esperar. Fique sabendo, Se casar com outro homem, O tinhoso me consome, Mas eu lhe meto o punhá.” (O Homem a persegue de peixeira na mão. No carrossel de varais, divido pelos lençóis. Até que a encontra na ponta da peixeira . Rosa está morta, pendurada nos varais junto com as roupas). 147


Música História de Lampião (Severino Ramos e José Gomes Filho “Não, não, não; Mulher não nasceu pra sofrer Não, não, não, não E não devia morrer.” CONTADOR Apreciamos, Da obra de Jackson do Pandeiro: ROSA! Encenada pela CTI – Cia. Teatro da Investigação! Aquela do Teatro-baile. (Aplausos!)

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Cris Camilo, em A Feira de Chico, Gonzaga e Jackson Campinas-SP 2018 foto Chun Fotografias


2 ª Q U A D R A - V I S I T A ÇÃ O CONTADOR A FEIRA DE CHICO, GONZAGA E JACKSON 2ª QUADRA: A FEIRA! Música - Vendedor de Caragueijo – Gordurinha “Caranguejo Uçá

Olha o gordo guaiamum

Quem quiser comprar eu tenho

Cada corda de dez, eu dou mais um

Caranguejo Uçá Caranguejo Uçá

Apanho ele na lama

e boto no meu caçuá...”

CONTADOR A feira está aberta para visitação; Tem barraca de todo tipo; Pra encher os olhos; O bucho e o coração!

A P R E S E N T A ÇÃ O D A S B A R R A C A S 149


Cris Camilo, Carol Guimaris e o público em A Feira de Chico, Gonzaga e Jackson Perus São Paulo -SP 2018 foto Gustavo Guimarães

O público em A Feira de Chico, Gonzaga e Jackson Vila Aurora São Paulo -SP 2018 foto Gustavo Guimarães


AS FEIRAS! CONTADOR Ali, a Feira do Vinil e dos eletrônicos - Fale com essa moça, aqui! Essa é a Feira de vê e ouvi! Aqui, a Feira do Dicumê - De comê e de Bebê! - Fale com essa moça e com esse moço. Tem rapadura, café e Cariri. Acolá, a Feira do Cordel - Tudo quando é história de tudo quanto há - Fale com esse Rapaz, que essa é a feira de lê e de folhear. E esparramado por todo lado, a feira do artesanato! Fale comigo, que conheço tudo isso desde menino. Venham apreciar a arte de mestre Vitalino! E não se esqueça de tirar sua foto com o bode! Vem que pode! ( Visitação. O elenco agencia o público durante a visitação)

Carol Guimaris e o público em A Feira de Chico, Gonzaga e Jackson Curitiba PR 2018 foto Gustavo Guimarães


3ª QUADRA - RIPIÓ LACRAIA CONTADOR A FEIRA DE CHICO, GONZAGA E JACKSON, 3ª quadra! E logo ali na barraca de cordel, Da obra de chico de Assis, Ripió Lacraia! (Ripió se apresenta ao público durante a fala que lhe descreve) É de longe que eu venho. O pé que leva. Andanças que só eu só, jeito de vida. Assim fui sempre, desde menino, Moleque pequeno, guri... Gosto. Há os que ficam, então se fincam. Gente que diz: é bom dar parada e criar raiz. Sei lá, pobre nunca tem nada de seu. Então, eu ando, sei lá. Ando porque anda andarilho andejo. Por ser assim, eu sou que nem Ripió Lacraia. Quem é? Pois é o Lacraia! Não me admira que não se conheça por esse nome. Tem muitos nomes e sobrenomes, Alcunhas, apelidos, pronomes, Assim como caras, roupas, disfarces e peles. Já vi chamar “Seu Ripió” de tantos... 152


Como: Zeferino, Taturana, Pedro Corneta, Godofredo Barrios, Barrica, Benevides, Tatu, Lau, Tito, Dois, Treis, Decamarte, Desidério, Carnegão E por aí vai indo assim, Até muitos que nem sei eu Dei no esquecimento Já se viu quem o topasse Como Vaqueiro, mascate, doutor, Soldado, fantasma, farmacêutico. E até como Bispo, padre, mulher, menino... Assim é seu Ripió. Muda muito: de jeito, de lugar, de nomes. Pois no respeito de não ter parada, Sou como Ripió que sempre dizia assim: RIPIÓ LACRAIA Eu me fiz ser como semente de paineira pequena. Logo que a paineira ganha tamanho, disposta a dar lenha, paina e sombra, ou flor, subo do chão, me estalo no alto e me mando de novo a voar. CONTADOR Apreciamos da obra de CHICO DE ASSIS: RIPIÓ LACRAIA!

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4ª QUADRA A MORTE DO VAQUEIRO CONTADOR Mais uma bossa, um jeitão de recontar E são os causos, estórias, lendagens Então eu conto:

A FEIRA DE CHICO, GONZAGA E JACKSON, 4ª quadra! Era uma vez ... (Raimundo Jacó, o vaqueiro. Foi morto, mas seu aboio ainda é ouvido nas quebradas do sertão. Durante a música, sua viúva o paramenta para o seu sepultamento). MÚSICA – A Morte do Vaqueiro (Luis Gonzaga e Nelson Barbalho) Ei ... Gado oi ...

Numa tarde bem tristonha

Gado muge sem parar

Lamentando seu vaqueiro Que não vem mais aboiar

Não vem mais aboiar

Tão dolente a cantar

Tengo, lengo, tengo, lengo,

tengo, lengo, tengo

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(Durante a música, sua viúva o paramenta para o seu sepultamento. Raimundo Jacó, o vaqueiro. Foi morto, mas seu aboio ainda é ouvido nas quebradas do sertão). Ei, gado, oi

Bom vaqueiro nordestino Morre sem deixar tostão O seu nome é esquecido

Nas quebradas do sertão

Nunca mais ouvirão

Seu cantar, meu irmão

Tengo, lengo, tengo, lengo,

tengo, lengo, tengo

Ei, gado, oi

CONTADOR Raimundo Vaqueiro, Raimundo Jacó, Raimundo Doido, Raimundo é meu Primo! Foi o maior vaqueiro que eu conheci em minha vida. Tinha um aboio que era uma beleza! Aquele sim! Aquele sabia aboiá. Eu aprendi aboiá com ele. Morreu na luta. Na labuta. Morreu na madeira. Na lenha braba. Ainda por cima morreu matado, covardemente. A justiça do homem, deu pro mundo. Nem inquérito abriram. Só sobrou mesmo essa canção. A MORTE DO VAQUEIRO! Não só a canção, como também A MISSA DO VAQUEIRO que foi criada em homenagem a sua alma. Raimundo, teu primo tá aqui Raimundo, denunciando a covardia do homens e o desinteresse da lei pra defender um pobre, morto covardemente por 155


interesses políticos. A vida do vaqueiro é tão importante, que quando ele parte pra outro mundo, Deus perdoa os pecado tudo. RAIMUNDO JACÓ! RAIMUNDO DOIDO! O VAQUEIRO ENCANTADO! (Agora o sepultamento) MÚSICA – A Morte do Vaqueiro (Luis Gonzaga e Nelson Barbalho) Sacudido numa cova

Desprezado do Senhor

Só lembrado do cachorro

Que inda chora

Sua dor

É demais tanta dor

A chorar com amor

Tengo, lengo, tengo, lengo,

tengo, lengo, tengo

Tengo, lengo, tengo, lengo,

tengo, lengo, tengo

Ei, gado, oi E... Ei...

CONTADOR 156


Apreciamos da obra de Luiz Gonzaga: A MORTE DO VAQUEIRO! Encenada pela CTI – Cia. Teatro da Investigação! Aquela do Teatro-baile.

(Aplausos!)

Geovane Fermac em A Feira de Chico, Gonzaga e Jackson São Paulo Sp 2017 foto Tally Campos 157


ENCERRAMENTO CONTADOR Esta foi a Feira, De Chico, Gonzaga e Jackson!

Música Essa foi A Feira; De Chico, Gonzaga e Jackson; De Chico, Gonzaga e Jackson; (2x) Contador O Mestre Dramaturgo, Chico de Assis, não escreveu, mas disse assim: “Hoje quando vocês forem para casa dormir, antes de se deitar na cama, caminhem até o espelho. Observem atentamente e estranhem o seu rosto, e, vejam uma das grandes maravilhas da realidade. Depois olhe a sua mão e veja que essa mão é uma coisa construtora. Depois, você vai se deitar, não adormeça na mediocridade do seu quarto. Adormeça onde você realmente está: na galáxia!” CONTADOR Essa foi a feira de chico, Gonzaga e Jackson! Encenada pela CTI – Cia. Teatro da Investigação! Aquela do Teatro-baile. (Aplausos!)

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FIM DE FEIRA. Música – Virado no Tetéu ( Edu Brisa, Carol Guimaris e Geovane Fermac) Essa foi a feira, E foi virada no Tetéu, Eu não vejo outra maneira, A não ser olhar pro céu, A não ser olhar pro céu, Eu não vejo outra maneira, Essa foi a feira, E foi virada no Tetéu, E foi virada no Tetéu, Eu não vejo outra maneira, Agradecer a vida inteira, Ao Rei do Ritmo, Rei do Baião, Rei do cordel, Ao Rei do Ritmo, Rei do Baião, Rei do cordel, Agradecer ao nosso público, Agradecer essa presença com gosto de Kariri, Limão e mel, Com gosto de Kariri Limão e mel, Também não posso deixar de passar o meu chapéu! 159


Também não posso deixar de passar o meu chapéu! Essa foi a feira, E foi virada no Tetéu, Eu não vejo outra maneira, A não ser olhar pro céu, A não ser olhar pro céu, Eu não vejo outra maneira, Essa foi a feira, E foi virada no Tetéu, E foi virada no Tetéu, É Teatro-Baile e é na Rua, Se puder tu contribua, assim a arte continua, Em cima do Chão, E debaixo do Céu! Debaixo do Céu! E em cima do Chão, Se puder tu contribua, assim a arte continua,

É Teatro-Baile e é na Rua!

FINDA-SE 160


Cia Teatro da Investigação e o Público em A Feira de Chico, Gonzaga e Jackson MarsilacSão Paulo SP 2018 foto Gustavo Guimarães


CARURU – Teatro-Bailinho A prese n ta ç ã o


Eu sou o Teatro-baile; Que de tanto Teatro-Bailar; Virei Teatro-Bailinho; É o Teatro-Baile-Criança; É a festa primeira; Que mora dentro da gente; É o Teatro-Baile-Criança; É o despertar da vida; Do brincar; Da dança; Salve a Criançada!! Vem pra Festa!!!

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Geoavne Fermac, Carol Guimaris, Harry de Castro e Cris Camilo.em CARURU SEDE CTI 2018 foto Gustavo GuimarĂŁes


Da cabaça se fez o mundo e aqui a cabaça é o elemento que é Ressignificado, criando um mundo de encantamentos CARURU é um espetáculo Infantojuvenil da Cia teatro da investigação que completa 15 anos de trajetória fazendo um teatro popular levando à cena as pessoas comuns do Brasil. O espetáculo escolhe os festejos populares como lugar de encontro das crianças. o Texto escrito por Edu Brisa contou com a direção de Cida Almeida, direção musical de Fernando Alabê e preparação corporal e vocal de Carlos Simiomi. ​

Carol Guimaris em CARURU Parque Raul Seixas São Paulo -SP 2018 foto Gustavo Guimarães


Lá vem o Teatro-Bailinho; Trazendo Teatro, festa, brincar; Brincar-inho Promovendo o convívio; A convivência sem dicotomia; A vida é pra se levar junto; Dia e noite; Noite e dia; A arte de fazer junto; Preparamos a festa, o teatro; Agora vai começar a encenação; Preste muita atenção desde o primeiro ato! A encenação vem com a batida do coração; Continuamos fazendo juntos; É pra sair da rotina; É teatro-brincar; É teatro-festa; É teatro-festa-brincar-inho; É teatro que não tem cortina; É o Teatro-Bailinho! Lá vem o Teatro-Bailinho; Trazendo Teatro, festa, brincar; Brincar-inho! 167


Sinopse

Tem muita coisa nesse mundo que se é de admirar! ​ No lugar onde o rio que corre parou de correr, Luzia a menina lavadeira, já não consegue mais lavar suas roupas e quando sua estória se encontra com a de “Mininu”, aquele que segue uma estrela em busca de uma festa de aniversário, suas estórias são transformadas. Seguindo o Zé Viajeiro eles vão até o terreiro do fundo da casa de Zabé a Bonequeira, em busca de realizarem seus sonhos! Dizem que foi lá que o mundo se deu tal qual a gente conhece! 168


Cris Camilo em CARURU SEDE CTI 2018 foto Gustavo GuimarĂŁes


Cartaz CARURU 2018 arte Luiz Felipe MacalĂŠ


Geovane Fermac, Carol Guimaris, Harry de Castro e Cris Camilo em CARURU Parque Raul Seixas São Paulo -SP 2018 foto Gustavo Guimarães


PRÓLOGO (MURUCIKANGA e PÉ DE CAJUEIRO, são respectivamente o rio e o cajueiro. Acordando de um longo sono.) MURUCIKANGA - Tem duas coisas nesse mundo que se é de admirar: é o trem correr na linha, o navio correr no mar. PÉ DE CAJUEIRO - Tem três coisas nesse mundo que se é de admirar: é o trem correr na linha, o navio correr no mar, a galinha comer milho, beber água e não mijar. MURUCIKANGA - Tem quatro coisas nesse mundo que se é de admirar: é o trem correr na linha, o navio correr no mar, a galinha comer milho, beber água e não mijar, e esse pé de cajueiro, que não tem o que fazer, tirou o dia pra me atazanar. PÉ DE CAJUEIRO - Tem cinco coisas nesse mundo que se é de admirar... MURUCIKANGA – Tá bom, Tá bom. Todo mundo já entendeu. Mas me diga você, o porquê de já está de pé, se ainda não é tempo de acordar? PÉ DE CAJUEIRO – Primeiro, que eu sou um pé de Cajueiro, ficar de pé é só o que dá. Segundo que é tempo sim, tempo pra você e tempo pra mim. MURUCIKANGA – Dessa vez eu fico. É tu quem vai. PÉ DE CAJUEIRO – Eu sou o Pé de Cajueiro, eu que fico. Todos os dias o tempo inteiro. Eu sou a referência, a sombra, o abrigo, sou o pilar. Sou a ligação da terra com o céu. Ficar é sina minha. Não posso sair senão tudo se desalinha. Vamos! Tu é Murucikanga o rio que corre, é sina bonita. Tu é livre! Vai. Que aqui tu só me irrita.

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MURUCIKANGA – Cada qual com sua sina. Eu vou buscar as crianças! Um menino e uma menina! PÉ DE CAJUEIRO – E eu fico. Eu cuido. Eu resguardo. Eu vou preparar a festa. Hoje é dia de obrigação. É a festa das crianças: Doum, Cosme e Damião. MURUCIKANGA – Dos Ibejis, dos Eres e caboclinhos. É festa das crianças! Vai ter comida, vai ter bebida, vai ter dança! Música - transição - transformação dos encantados - PÉ DE CAJUEIRO se transforma em ZABÉ e MURUCIKANGA se transforma em ZÉ VIAJEIRO. ZABÉ - Todo ano acontece os encantamentos, desse nosso encontro aqui: Eu agora sou Zabé, a bonequeira, a festeira que prepara o terreiro, o comer e o beber. ZÉ VIAJEIRO – E eu o Zé Viajeiro, que preciso ir ligeiro. Encontrar as crianças para a festa que é preparada por Zabé. É aqui nesse lugar que o encantamento se dá. Durante a maior parte do tempo eu sou o rio que embeira o terreiro, tenho por nome Murucikanga, um ser supremo que de tanto chorar secou seus olhos e quando me torno Zé Viajeiro fico assim: Cego. ZABÉ - O rio Murucikanga se serpenteia pelo sertão atravessando as terras secas, sedentas, com o que lhe restou de lágrimas. Aqui no terreiro do fundo da casa o pouco de lágrimas que lhe restam é um riacho barrento. De onde eu tiro o barro pra fazer meus calunguinha e tirar o meu sustento! ZÉ VIAJEIRO – Uma vez por ano é assim que é: Eu vou em busca das crianças para festa preparada por Zabé. ZABÉ - Pé na estrada Zé Viajeiro. E vê se não se perde por aí. E deixa que aqui no terreiro, minhas obrigação eu vou cumprir.

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ZÉ VIAJEIRO - (saindo. UM APARTE) O bonito mesmo é o que se conta daquele terreiro do fundo daquela casa. Dizem, e eu também sei, que é um lugar mágico e cheio de encantamento. Chegam mesmo até a dizer, e eu também digo, que foi ali que o mundo começou, tal qual a gente conhece.

CENA 1 ZABÉ - (Começa a preparar a festa de Cosme, Damião e Doum). Canta: São Cosme mandou fazer / Duas camisinha azul / São Cosme mandou fazer / Duas camisinha azul / No dia da festa dele / São Cosme quer caruru / No dia da festa dele / São Cosme quer caruru/ Eu sou um acumulado de sonhos! Tantos sonhos já passaram por aqui e tantos de mim já saíram que me tornei esse montante todinho. É sonho que não acaba mais! É sonho de ser menina, moleque, gente grande ou pequenina. Ser pipa, papagaio. Estilingue. Ser balão de são João e ir pro espaço, achar um tanto de outros sonhos. Sair correndo até virar passarinho. É tanto sonho que passa aqui. Que para aqui e que sai... que às vezes acho que nem volta. Mas não é que volta?! Sonho é sonho... Tu tem sonhos? Tem sim que posso ver nesse brilho todo que vem dos teus olhinhos... Isso é brilho de minino. Minino que cresce os olhos no giro perfeito do peão aqui na palma de vossa mão. Tu viu?! Num deixa de lado isso não minino! Corre ao encontro dos teus sonhos! Tem mais olhos aqui na sua mão do que estrelas no céu! Assim como a estrela da guia, que guia esse menino aqui. Um menino que tá perdido ou achado, nesse mundão de meu Deus!

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MENINU – Hoje é meu aniversário. Eu já fiz sete e hoje eu faço quatorze. Quando eu fiz sete eu vi a estrela que me guia. Desde esse dia eu sigo a minha estrela, mundo a fora, noite a dentro. ZABÉ - E Tu? fica só de olho no sonho alheio? Vamos criar um procê! Um ioiô! É um sonho que vai e volta. Mas tem um barbante pra não deixar ele ir se embora. Igual que nem a lavadeira Luzia, que ia, mas não foi. LUZIA – Cantando: Mandei, caiá meu sobrado / Mandei, mandei, mandei / Mandei, caiá meu sobrado / Mandei, mandei, mandei. ZABÉ - Tem sonho que de primeira parece impossível. Não desiste! Insiste, criança! Insiste! É vosso! Quem num sonha, num avôa! Sonha! Sonha! Sonha! Quem sonha corre! ... Carrego comigo todos os sonhos do mundo. Do meu chão, da minha gente. Que acorda cedo pra pegar no batente. Sabe enfrentar a vida de peito aberto, com a sabedoria de gente que é gente da gente. Eita gente sonhadera! ... Deixa eu cuidar das minhas obrigação. Hoje tem festa aqui! É a festa dos meninos!

Música - São Cosme mandou fazer / Duas camisinha azul / São Cosme mandou fazer / Duas camisinha azul / No dia da festa dele / São Cosme quer caruru / No dia da festa dele / São Cosme quer caruru/ Vadeia Cosme Vadeia/ Vadeia Cosme Vadeia/

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CENA 2

MENINU - Onde é aqui? Legal aqui. Eu vivo caminhando! De noite, sempre de noite porque eu sigo uma estrela que me guia, por isso eu ando de noite e durmo de dia! Eu tinha medo de andar de noite. De noite tem muita sombra! Mas eu fui vendo que a sombra é as coisas com luz de um lado só. Aí eu fiquei tentando sempre desvendar a sombra que assombra. Do outro lado o que é que há? Vi que cada coisa tem uma forma dependendo de onde a gente olha, dependendo de onde a gente tá... daí perdi o medo e me ponho a caminha noite a dentro, mundo a fora! Hoje é meu aniversário! É! Sete mais sete. É! Eu fiz sete no dia que eu sai seguindo minha estrela. Era meu aniversário como hoje. Meu pai e minha mãe, guardavam meu presente de baixo da cama, eu tava doido pra saber o que era, daí eu fui lá e peguei o presente e fui pro terreiro da frente pra abrir, é esse aqui todo ano eu abro de novo o meu presente. Oque será que é? Vou abrir. (Abre a caixa, faz as possibilidades do que pode ser a cabaça, conta como foi no ano 07, 08 09, 10, 11, 12, 13 e o que pode ser agora com 14) Canta música! Música o que é o que é (Geovane Fermac e Fernando Alabe) Música: O que é o que é? / pode ser o que você quiser / basta imaginação pode ser um balão / o que é o que é? / pode ser o que você quiser /Se tá na beira do rio pode ser um Navio / o que é o que é? / pode ser o que você quiser / Se eu der um Peteleco pode ser um boneco / o que é o que é? / pode ser o que você quiser / se como uma moqueca pode ser uma rabeca. 176


Eu ando muito por aí. Conheço gente de tudo quando é jeito. Já conheci gente de circo, de parque, com roda gigante e tudo e também os conhecedores da literatura de cordel. Com eles aprendi a ler e escrever:

“Esse verso eu aprendi com um cordelista; Eu ando por esse mundo; Eu sumo sem deixar pista; Cordelista é quem faz cordel; Tem uns que usam pena; Eu uso pincel; O pé caminha o chão; A cabeça viaja o céu!”

Agora eu quero escrever uma carta. Pro meu pai e pra minha mãe. Você conhece meu pai? Eu tenho uma foto dele aqui. (mostra um espelho) Ele é bonito? Você conhece a minha mãe? Eu tenho uma foto dela aqui. (mostra um espelho) Ela é bonita? O que eu podia escrever pro meu pai e pra minha mãe? Uma palavra: ( ... ) isso. Essa eu sei escrever. (escreve no papel, faz um aviãozinho e jogo ao vento). 177


CENA 3 LUZIA – (lavando roupas na beira do rio). Meu nome é Luzia, desde que eu nasci, meu nome é Luzia, eu sou daqui desse lugar. Sou lavadeira, de família de lavadeiras. Minha tataravó era lavadeira, minha bisavó era lavadeira, minha avó era lavadeira, minha mãe era lavadeira e eu sou oque? (...) Lavadeira! É minha sina! Sou lavadeira desde menina... que ainda sou!... Tô aqui esperando a roupa quará, desde sempre. Desde o tempo que o rio corria. Música: A Beirada de Luzia (Edu Brisa, Carol Guimaris e Geovane Fermac) Música: O Rio trazia o que O que é que o Rio trazia? /O Rio trazia o que pra beirada da Luzia? (Refrão)

Aqui passava barco / Jangada e canoa / Peixe, calango, cobra, coisa ruim e coisa boa. (2x)

Foi aqui na beira do rio que eu aprendi tudo. Aí o rio secou e eu tô aqui esperando a roupa quará. Antigamente, nem faz tanto tempo assim, depois que eu enxaguava a roupa eu tomava um banho de rio. Banho de rio é bom demais, lava a alma, lava tudo que é ruim. Mas aí o rio parou de correr. Música: O Rio trazia o que O que é que o Rio trazia? /O Rio trazia o que pra beirada da Luzia? (Refrão) O Rio trazia as oia lá do pé de cajueiro / Cada foia uma história que contava o mundo inteiro. (2x)

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Nas águas eu via refletida a imagem de um pássaro vuadô! Era grande, era misterioso, era colorido. Não parecia coisa daqui não, era encantado... eu só via quando olhava pra água, quando eu olhava pro céu ele sumia. Ele queria me levar com ele por esse mundo, era uma passarãozão, muito grande! Eu queria ir, mas tinha medo. Até que um dia eu resolvi que eu ia, aí o rio parou de correr... Música: O Rio trazia o que O que é que o Rio trazia? /O Rio trazia o que pra beirada da Luzia? (Refrão)

Tudo quanto é coisa dessa gente encantada / De vaqueiro, milagreiro e cantores de toada. (2x)

Cris camilo e o Público em CARURU Parque Raul Seixas São Paulo -SP 2018 foto Gustavo Guimarães


CENA 4 (O menino adentra a cena, olhando pro céu e pisa nas roupas de Luzia) LUZIA – Olha a roupa aí, infeliz. MENINU – Eu sou feliz. LUZIA – Vou ter que lavar tudo de novo. Pisou em toda minha roupa. Quem pisa nas roupas, tá com a cabeça na nuvem. MENINU – Melhor a cabeça nas nuvens do que os pés enterrados no chão. LUZIA - Tá fazendo o que aqui? MENINU -Tô indo. Ou tô vindo. Já não sei bem. LUZIA – Eu sei quem tu é. É o Menino que anda seguindo uma estrela! MENINU – Quem te disse? LUZIA – Eu vi. Li tua estória na folha do cajueiro. Quando o rio corria, as folhas desciam rio a baixo cheias de estórias e a tua tava lá. O menino que segue a estrela e faz aniversário todo ano! MENINO – Eu sei quem tu é também. LUZIA – Sabe nada. MENINU – Sei. “É Luzia, a menina lavadeira que nunca foi a feira, que daqui nunca saiu, a menina lavadeira que vive a vida inteira, aqui, presa na beira do rio”. LUZIA – Eu não tô presa. MENINU - Então sai daí que eu quero ver. 180


LUZIA – Quem te contou isso? MENINU – Foi o velho cordelista. Ele sabe tudo quanto é estória daqui... ME diz uma coisa? Quando o rio corria, pra que lado que ele ia? LUZIA – Pra quê tu quer saber? MENINU - É que o velho cordelista me disse que na cabeceira do rio tem um terreiro que tem um PÉ DE CAJUEIRO que tem uma festa bonita. E hoje é meu aniversário... se eu for na festa eu vou ter uma festa de aniversário. Mas eu não sei se o rio tá indo ou se o rio tá vindo. LUZIA – o rio tá indo. MENINU – Sim. Mas indo pra onde? Pra lá? Ou pra cá? LUZIA – Pra lá. MENINU - Então Adeus! LUZIA - Não, não. O rio pra indo pra cá. MENINU - Então Adeus! LUZIA – Quer dizer... pra lá. Ou será pra cá? Sei lá. Já não sei mais. Espera aqui. Vai que o rio corre de novo aí a gente vê... Se eu pudesse sair eu ia junto. Porque na cabeceira do rio, onde tem o PÉ DE CAJUEIRO, o rio corre, aí lá eu posso lavar minhas roupas. eu quero ir pro lugar onde o rio ainda corre. Lá é lindo! Eu li nas folhas do PÉ DE CAJUEIRO. MENINU - Então vamos! Eu tiro você daí. LUZIA –Duvido! MENINU - Não duvida de mim! Eu sou de circo! (Tenta em vão tirar luzia das margens do rio. Tira do bolso um lenço infinito que usa de corda para tirar luzia do atoleiro. Tenta de várias formas até cair de bunda e desistir). 181


LUZIA – De circo é? MENINU - É que eu ainda tô ganhando experiência! Cansei! LUZIA – Espera o rio correr. As vezes ele corre, depois para. (Eles esperam).

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Geovane Fermac e Cris Camilo em CARURU Vila Sonia São Paulo -SP 2018 foto Gustavo Guimarães


CENA 5 (ZÉ VIAJEIRO canta, Luzia e o Meninu se assustam). MENINU – o que será isso? LUZIA - É o canto do rio. É “mal-assombro”! É LIVUSIA! Aqui tem LIVUSIA! MENINU – Meu Deus! LUZIA – Tu tem medo de LIVUSIA? MENINU – Eu não tenho medo de nada. Eu apenas sou sensível. Daí me dá tremedeira! LUZIA – Tremederona!... olha! O rio tá correndo. Abre os olhos infeliz. MENINU – Eu sou feliz! Tá mesmo! Pera aí. (Tira do bolso um lenço infinito que usa de corda para tirar luzia do atoleiro. Ela desatola sozinha). Não Disse que eu sou de Circo? (ação do rio correndo) LUZIA – O rio parou de correr. Olha aqui uma folha do PÉ DE CAJUEIRO... essa é a estória do MENINU e LUZIA... Oxe! Eles se encontram na beira do rio e vão seguir a sua sina até a cabeceira do MURUCIKANGA, lá tem tudo que eles procuram. MENINU - É nós? LUZIA - É nós! MENINU - É nós Queiroz! LUZIA – Vamos embora, rio acima! Me ajuda pegar as roupas! Cata tudo! (Música. Eles cantam e enfrentam os obstáculos da aventura. Acontece de tudo no caminho. Eles se perdem).

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Musica: Murudú (Edu Brisa, Carol Guimaris e Geovane Fermac) Cobra que não anda, não engole sapo / sapo que não pula não come besouro / garimpeiro que não garimpa não encontra ouro / sobe murumdú, desce barranco / pé na estrada até ficar manco/ dia e noite, noite e dia / é Meninu é luzia/ que caminham sem parar / o calango do rabo cortado / e o jacaré banguelo/ Já não podem me assustar LUZIA - Será que a gente não chega nunca? MENINU – Nunca diga nunca. LUZIA - nós viemos de lá ou de cá? MENINU - É que de dia eu não sei como caminhar. Não vejo minha estrela guia. LUZIA - Será que não é pra lá? Ou pra cá?

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Harry de Castro em CARURU Sede CTI São Paulo -SP 2018 foto Gustavo Guimarães


CENA 6 (Eles avistam ZÉ VIAJEIRO que está parado onde o rio faz a curva). LUZIA – Fiche! É LIVUSIA! MENINU - Não fala isso que eu sou sensível. ZÉ VIAJEIRO – Deixa de tremedeira! Sou só um velho, cego. Podem me chamar de Zé. ZÉ VIAJEIRO. Como meu nome já diz eu viajo o tempo inteiro. MENINU – Se viaja o tempo inteiro porque que tá aí parado? LUZIA – Xiu! ZÉ VIAJEIRO – Eu preciso de ajuda pra chegar até a cabeceira do rio MURUCIKANGA. LUZIA – A gente tá indo pra lá também. MENINU – Xiu! É. Mas a gente se perdeu. Não sabemos mais como é que é que chega lá não. Adeus! ZÉ VIAJEIRO – Eu sei chegar lá. MENINU - Então diz aí. Como é que chega? ZÉ VIAJEIRO – Eu sei ir indo. Não sei ir ficando. MENINU – Como é que tu sabe ir sem ver? ZÉ VIAJEIRO – Eu só não vejo o “a cores”. Mas o ao vivo eu vejo! LUZIA – E o que é que tu vai fazer lá? ZÉ VIAJEIRO – Eu vou lá porque lá é o lugar mais lindo que existe. Lá é o começo e o fim. Lá é o entroncamento que divide o tempo e o caminhar. Vou lá pra encontrar o que é meu. 185


Lá é que é o lugar. MENINU – Fiche! Ele é aluado! LUZIA – Aluado? MENINU - Lunático. LUZIA - Lunático? MENINO – Doido. LUZIA – Ah! ZÉ VIAJEIRO – Eu conheço a estória de vocês. O Meninu que segue a estrela guia. E Luzia a lavadeirinha! LUZIA – Sou Luzia lavadeira! MENINU – E eu sou de Circo! ... quer ver só? Eu sou o maior cabaçarista que eu conheço! (Faz a cena dos malabares de cabaças). As vezes falha! ZÉ VIAJEIRO - A cabaça é um ser da natureza que se transmuta! Vocês sabem disso! LUZIA – Sei disso não! MENINU – E nem eu! ZÉ VIAJEIRO - A cabaça é uma coisa que vira outra coisa, que vira outra, que vira outra. Foi da cabaça que nasceu o mundo! Lá no Terreiro do fundo da Casa de ZABÉ, de baixo do PÉ DE CAJUEIRO. Foi lá que a cabaça foi partida ao meio e deu origem a tudo: a festa, o rio que corre e tudo que é vivo! Vamos! O caminho é por aqui. (Um aparte) MININU - Nós não vamo, não! LUZIA – Vamo sim! 186


MININU – Vamo não! LUZIA – Vamo sim! A gente tá perdido. E ele sabe chegar lá. MININU - Sei não, viu! LUZIA – Bora! ... Vem! (Música - eles percorrer o caminho cheio de peripécias, sobe, desce, escorrega até chegarem). Música: Lôa do Rio

(Fernando Alabe)

Seguindo o rio Que não corre vida a toa Pelo caminho encontrando gente boa Se é viajeiro que não que não vê O quanto é longe Pisa justo e segue forte Pois tem fé no teu pisar No fim do tempo tem um pé de Cajueiro Onde pousa uma estrela Guia linda de um menino Que de sete em sete anos Corre gira de brincar La vai Luzia, lavadeira em companhia De menino e viajeiro Chegando no terreiro onde Zabé fez Caruru Chegando a sete sua mesa esta formada 187


Sete menino, sete faixas À beira do rio vieram brincar Prepara a festa e pega água na cabaça Água limpa, água santa Do velho Murucicanga Que o pé do cajueiro abençoa e faz brotar.

CENA 7 188

Geovane Fermac, Harry de Castro e Cris Camilo em CARURU Parque Raul Seixas São Paulo -SP 2018 foto Gustavo Guimarães


O encontro de todas as personagens – a festa de Cosme, Damião e Doum. ZABÉ terminando de paramentar o terreiro, preparando a festa, primeiro coloca a comida dos santos.

ZÉ VIAJEIRO - Ô de dentro! ZABÉ - Chegô! Chegô os Menino! Chegô! MENINU - Ô de dentro! ZABÉ - Salve a criançada! Salve Cosme, Damião, Doum! Salve Crispim, Crispiniano! Salve as crianças de Antônio, Bárbara, Conceição. As Marias, os Josés. Salve os filhos de Jorge! Esse menino, essa menina, os filhos de nós tudo! Salve as Crianças, Ibejis, Erês, Curumins! Salve Unibejada!! LUZIA- Ô de dentro! ZABÉ - Ô de fora! MENINU - É aqui a festa? ZABÉ - Só faltava vocês, se acheguem! MENINU - Hoje é meu aniversário. ZABÉ - E de mais gente também. Se acheguem! MENINU - É a primeira vez que eu vou numa festa. ZABÉ - O melhor da festa é esperar a festa. Se acheguem. É só atravessar a Pinguela! MENINU - Eu sou de circo! Sou o maior atravessador de pinguela que eu conheço. LUZIA – (Atravessando a pinguela) É verdade! O rio ainda corre aqui! E tem uns pontos onde dá pra lavar roupa! MENINU - (Atravessa a pinguela como uma corda bamba). 189


Não disse que eu sou de circo?! Eu vim pra festa! LUZIA – Eu vim pro rio que corre! ZÉ VIAJEIRO – Eu preciso chegar até o cajueiro velho. ZABÉ - A festa é aqui! O rio que corre é aqui! O Cajueiro é aqui. E velho é a mãe. É o cajueiro milenar, vive aqui desde sempre. Ele é nosso abrigo, nossa força e resistência. Olha ele aí. MENINU – Ele não vê não. ZÉ VIAJEIRO – Eu não vejo o “a cores”, mas o ao vivo eu vejo! MENINU - Já vai começar a festa? ZABÉ - Vai. Vai sim! Mas espera só um tiquinho? É que preciso trocar dois dedos de prosa com os outros tantos de convidados.

Carol Guimaris e Público em CARURU

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SEDE CTI São Paulo - SP 2018 foto Gustavo Guimarães


EPÍLOGO ZABÉ – Tem muito mais coisa no mundo que se é de admirar: É a sina da cabaça ser Cabaça e outras coisas ela virar. É a cabaça virar mundo pra gente poder brincar. É a criança imaginar futuro e o mundo reinventar. É o teatro poder ser festa pra gente festejar. É o baile virar Bailinho e mundo se “Acriançar”. Eu preciso de cinco crianças pra roda poder girar. Eu preciso de cinco criança, cinco é só pra começar. (Entrega cinco bonecos de cabaça para as crianças que se juntam a MENINU E LUZIA. Música de Caruru - As crianças se sentam para comer, realizando O RITUAL DO CARURU – OS SETE PRATOS – AS SETE CRIANÇAS). ZABÉ – Tem muito mais coisa no mundo que se é de admirar: Essa estória aqui por desde sempre se repetir e nunca se acabá! E se acaba, acaba em festa. Nossa sina é festejar. Eu falei de cinco crianças que era só pra começar. Se juntando às outras duas, e sete poder virar. Agora a festa é de todo mundo. Vem pra roda rodar. Vamos! Vamos! Vamos comer, beber, cantar, dançar! É Teatro-Bailinho; Vamos “Criançar”; (Formam uma roda/ciranda em volta das CRIANÇAS/BONECOS)

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Trecho de Música: MENINOS DE HUAMBO - versão modificada de Paulo de Carvalho + Martinho da Vila REFRÃO:

Os meninos à volta da fogueira

Vão aprender coisas de sonho e de verdade Vão aprender como se ganha uma bandeira Vão saber o que custou a liberdade


Música: São Cosme e Daminhão São Cosme mandou fazer / Duas camisinha azul / São Cosme mandou fazer / Duas camisinha azul / No dia da festa dele / São Cosme quer caruru / No dia da festa dele / São Cosme quer caruru/ Vadeia Cosme Vadeia/ Vadeia Cosme Vadeia/ Cosme Damião vem comer teu Caruru/ Eu ei de todo ano fazer Caruru pra Tu/

FINDA


C TI Cia. Teatro da Investigaç ão Àquela da Teatro Baile

Muito prazer, Sou a Cia. Teatro da Investigação, Mas pode me chamar de CTI. Venho com meu TEATRO-BAILE, Mas não foi mole chegar até aqui; Venho lá de dois mil e três, Lá se vão quinze anos, Vividos um de cada vez, Paixão, vocação, abnegação, devoção, Inspiração, Transpiração, transpiração, transpiração; Na orquestra do meu peito Batem muitos corações, Cores, ações; Trago no peito o sentimento do mundo, O desejo transformações; Na estrada que traço até aqui, Sempre me reinvento, Reinvento a fé, 194


O fazer, a força, o prazer, o querer; Até que em dois mil e doze, Iluminado pela obra de Luiz Gonzaga, Se reavivou o meu fazer teatral, Foi um divisor de águas, Que me fez dar um passo além do normal; Chamo de TEATRO BAILE, O Teatro, Que põe o público pra dançar, Dançar o jogo do Teatro, Que é o jogo que eu sei jogar; E agora esse é o farol, Que ilumina o meu caminhar Eu vou seguindo com o meu TEATRO-BAILE Teatro-Bailando sem parar; Agora é a vez de INSTAURAR A FESTA, Juntando a Luiz Gonzaga, Jackson do Pandeiro e Chico de Assis; E do homem e da mulher comuns, cada vez mais, Me aproximar; Me aproximar por inteiro; 195


Atualizar o espaço da festa, Do povo brasileiro; Do homem e da mulher, A festa popular; Do povo periférico, Do povo marginal, Que me faz imaginar; A porta está aberta, Pode entrar; Muito prazer, Sou a Cia. Teatro da Investigação, Mas pode me chamar de CTI.

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Fundada em 2003, desenvolve desde então pesquisa continuada de experimentação cênica e dramatúrgica, que investiga o homem e a mulher comum do Brasil. Ao longo destes 15 anos a Cia. realizou 17 espetáculos, participou de festivais importantes como o Mostra de dramaturgia do Arena, Festival de Curitiba 2011, III Festival de Cenas cômicas do espaço Parlapatões 2009, 2ª Mostra Cena Breve Curitiba 2006 e I Mostra de dramaturgia Contemporânea do Teatro do Centro da Terra 2005. Foi contemplada em 2014 com o edital ProAC 14/2014 Circulação para Teatro de Rua realizando circulação com a peça baile “A CASA DE FARINHA DO GONZAGÃO” por 15 cidades da grande são Paulo atingindo um público aproximado de 5000 pessoas. Em 2015 é contemplado com a 2ª Edição do Prêmio Zé Renato com o projeto TEATRO BAILE INSTAURANDO A FESTA que circulou por 16 regiões da periferia da cidade de São Paulo. Em 2017 é comtemplado pela 30ª edição de Fomento ao Teatro para a cidade de São Paulo com o Projeto TEATRO-BAILE, UMA POÉTICA EM CONSTRUÇÃO – TEATRO É SANGUE E PRECISA CIRCULAR.A CTI põe em ação o homem e a mulher comum do Brasil e busca captar com humor e profundidade a alma do seu povo. Vem exercitando a experimentação cênica no espaço público: rua, parques, tendas, praças, na busca de diversidade de linguagem e possibilidades de investigar a fundo a relação do público com o nosso material artístico, colocando o público como participante do evento teatral, não só como contemplador, mas principalmente como atuador, que interfere e acrescenta à obra. Acreditamos que o teatro é o lugar de encontro, e assim sendo, buscamos a cada novo trabalho criar um espaço para a participação do público sem a dicotomia de palco e platéia, ressignificando o espaço da Rua. O Teatro-baile promove uma interação do público com o bem cultural interferindo positivamente na rotina da Rua e do público e busca captar com humor e profundidade a alma do seu povo.

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www.teatrobaile.com projetos@teatrobaile.com


C TI. Cia. Teatro da Investigação Àquela da Teatro Baile


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