Nova Safo, Visconde de Vila-Moura

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Vi s c o n d e d e Vi l a - M o u r a

Saímos rapidamente, e foi já no tramway de Guimarães que paguei a amabilidade de Maria Peregrina dizendo o nome e explicando que passeava pelo Minho e ia àquela cidade tirar impressões novas das coisas velhas, visto andar muito ao avesso das glórias contemporâneas. Fez-se silêncio sobre a minha informação. Lemos a um tempo os nomes trocados. Verificámos que nos conhecíamos. Ela lera um livro meu, com que simpatizara, disse, mercê das suas rebeldias. Por minha parte, esclareci, tinha lido os seus volumes — Nova Safo e Emparedada. Este era um livro em que ela ampliara, segundo o seu caso, os desgostos de um poeta brasileiro — o Poeta Negro. Este lutara contra o preconceito de cor, sofrera todo o desprezo geralmente votado à sua casta e fizera deste desprezo um capítulo de Evocações, doloroso. Maria Peregrina Álvares de Lorena e Vila-Verde, que eu conhecia pelas revistas e por aqueles livros, urdira a Emparedada — a sua obra-prima, para editar dores íntimas. As paredes que mostrava ao público — a um pequeno público, eram os preconceitos de toda a ordem que lhe entravavam a acção. Sofrera más vontades, vexames e desabafara em páginas notáveis, mau grado serem decadentes, doentias. Para toda a parte para que voltava o espírito encontrava paredes escuras e espessas, tatuadas de obscenidades, alusivas a predilecções suas. A sociedade destinara-lhe uma cela estreita, quando a natureza lhe dera um talento largo e uma sensibilidade enorme, caldeados de um certo fatalismo sensual que lhe abarcava e impopularizava a obra.


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