Serge Toubiana, diretor da Cinemateca Francesa
22
Jacques Tati fez poucos filmes: seis longas e três curtas-metra-
Em seus seis filmes, Tati percebeu algo essencial: a passagem do
gens em mais de quarenta anos. No entanto, não parou de tra-
tempo, o mundo em evolução, da vida rural à cidade moderna
balhar, guiado pela obsessão de inventar, de desenhar, de dirigir
e futurista de Tempo de diversão. Nesse mundo em transforma-
gags. Tati era um cineasta burlesco ao estilo de Keaton, Laurel e
ção surge uma figura, um homem alto, quase como se fosse fei-
Hardy ou Sennett Mack, a quem admirava.
to de borracha tal é sua aparência estranha e desconfortável: sr.
O que vemos nos filmes de Tati? A festa (Carrossel da esperan-
Hulot. Ele chega como se tivesse saído de um desenho esboçado
ça, seu primeiro filme), as férias (As férias do sr. Hulot), uma fa-
por Tati como uma cópia de si mesmo (Tati também era muito
mília com um tio muito incomum (Meu tio), acontecimentos
alto) para encarnar a confusão, o humor, a mudança resultante
excêntricos em um mundo futurista, mas que já está aí (Tempo
do confronto com o mundo moderno feito de objetos incomuns
de diversão). Na tela, o mundo se mostra sempre à beira do caos,
e às vezes inúteis, que só servem para decorar ou sobrecarregar
enquanto, nos bastidores, Tati trabalha como um louco. Esse
a natureza. Tati era um cineasta burlesco; Tati era um filósofo.
homem trabalhou toda a vida para nos fazer rir e aproveitar a
A bicicleta do carteiro é substituída pelos carros que correm sem
vida simples. Obrigado, Tati! Devemos a você todas essas horas
parar em torno de uma praça circular, porque o mundo perdeu
de prazer e alegria em um mundo reinventado na forma de um
sua direção. Esse trabalho é genial, generoso e universal. Jacques
parque de diversões.
Tati é o tio que todos nós gostaríamos de ter.