6B. BIOS - Biografias e Identidades. 2011|2012

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Ao escrever a mesa mexe e a pedra faz sons.

Bios em 2012. Samuel Guimarães*

A criação de biografias e identidades – BIOS – como um modo de criar e refletir sobre a realidade de hoje pensando e agindo sobre binómio indivíduo– paisagem. O ato de contar, em diferentes suportes e modos, a vida de uma pessoa, de um objeto, de uma planta ou animal permite perspetivar a singularidade e necessariamente interrogar o seu tempo e o tempo histórico. Das pessoas que habitam, vivem e visitam estes lugares, da fauna e flora, das pedras às coisas perdidas ou guardadas, às paisagens diversas e em mutação, o projeto permitiu o levantamento e construção de uma coleção de BIOS que falam sobre tensão entre novo e antigo, entre memória e futuro. E como a criação e construção do (património) imaterial – como produção de conhecimento – é um foco incontornável de discussão entre instrumentalização e emancipação.)

Este é o texto que definiu como ponto de partida, vontade e expectativa o fazer deste trabalho. Agora que o projeto se finaliza e se abre para outras possibilidades, abro esta hipótese de colocar em escrita o que se viveu durante um ano. Assemelha-se quase à tarefa, condição e figura do escritor fantasma. Normalmente, o ghost writer é o escritor contratado para escrever a auto(!)biografia de uma personalidade, mais ou menos famosa, mais ou menos cor-de-rosa. É um escritor na sombra. Então, tomemos esta designação traduzida do inglês – ‘escritor fantasma’ – e demos-lhe um valor mais literal: aqui quem escreve está implicado no processo, nas escolhas e nas decisões. Não é então uma escrita objetiva e descritiva mas uma escrita com sombra. No observar o que se faz, e quando o que se faz assenta e tem trave mestra no corpo e deste na relação com o lugar que habita, vive, ou visita é sempre sobre um resíduo em retrospetiva que se pode escrever. Não se relata a imaterialidade dos acontecimentos – das vozes das histórias contadas e recebidas, da queda de dois corpos ligados por uma parte e de olhos fechados, da repetição que faz voar. Esta perda, que é da ordem do inefável, contém, por espelho, esta vontade tão humana de transformar resíduo em forma, outra vez. Melhor então do que documentar, já que se reitera que o movimento dos corpos, o mexer nos materiais humanos, orgânicos ou inorgânicos, os gestos que os acompanham não são fixáveis. Assim, nesta publicação, decidimos, criar com imagens, com tentativas gráficas de criar ruídos (sons?) com registos fotográficos, gráficos e textuais dos nossos arquivos, com textos nossos e de outros (de professores que acompanham o nosso processo de trabalho) e em confronto, por ilustração ou contraste com o trabalho de autores de diferentes universos e biografias, como Agustina Bessa Luís, Sophia de Mello Breyner, Mark Twain, Marguerite Yourcenar, Jean Luc Nancy, Douglas Gordon e Philippe Parreno (em Zidane), Giuseppe Arcimboldo, Tiago C. Bôto, entre outros. *responsável pela programação e coordenação do Serviço Educativo do Museu do Douro. Núcleo de Investigação em Educação Artística NEA - I2ADS . FBAUP-UP.


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