Crônicas em Papel de Pão

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Crônicas em papel de pão



Faber Num

Crônicas em papel de pão


Copyright © Faber Num Projeto Editorial Elcias Moreira Diagramação Alonso Alvarez Capa INDIE 6 – Design Editorial Revisão Bárbara Parente Grafia segundo o Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa de 1990, em vigor no Brasil desde 2009. Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Elaboração: Aglaé de Lima Fierli, CRB-9/412) N914c

Num, Faber. Crônicas em papel de pão / Faber Num [pseudônimo de Elcias Júnior Moreira Nunes]. – Manaus, 2017. 134 p. ; 14x21 cm

ISBN: 978-85-923334-1-6

1. Crônicas brasileiras. 2. Ensaios brasileiros. 3. Contos brasileiros. 4. Literatura brasileira – Coletânea. I. Título. CDD B869.8

Índice para catálogo sistemático Crônicas brasileiras : Literatura B869.8 Ensaios brasileiros : Literatura B869.4 Contos brasileiros : Literatura B869.3 Literatura brasileira : Coletânea B869.8

2017 Todos os direitos de publicação reservados ao SELO EDITORIAL TEMPORAL. seloeditorialtemporal.com.br


Sumário

Prefácio, 13 Depoimentos de leitores, 15 PRIMEIRA PARTE Crônicas, 17 O que me faz sorrir, 17 O ausente, 19 As aventuras de Mel, 21 Tara Moura, 23 A coleção de dragões, 27 A paixão na melhor idade, 31 O passeio do dia 21, 37 Mania de você, 41 Panelas arqueológicas, 45 O divã, 49 A sopa, 53 O Muppet, 57 Os sessenta anos, 61 Os selvagens da noite, 65 A mesa com Chico, 67 SEGUNDA PARTE Contos, 71 A casa, 73 O último romântico, 77 Nas ondas do rádio, 95


TERCEIRA PARTE Ensaios, 103 O que me faz pensar, 103 Quando o amor mata, 105 Os dinossauros no shopping, 107 O café da tarde, 113 A mudança de hábitos, 117 Felicidade clandestina, 119 Uma manhã de dezembro, 121 Nosso mundo, 123 A nossa luta, 125 O inventário das coisas, 127 Adeus, senhor Paulo!, 129


Aos meus filhos Anna Júlia, Ámon Gabriel e Ariana Beatriz. À minha esposa Solange Guimarães. À minha mãe Esperança Lopes. Ao Franklin Wilson e Patrícia (Motonorte). Ao Alonso Alvarez da Ficções. Ao Lucas Campos da Indie6. Ao Antônio Ferreira Lima (pelas dicas). Ao Jakson da Mata da Porto de Lenha. À Alefe Fauve (pela sua amizade). À Eliane Brito (pelos anos de dedicação). Aos professores pela sua importância. Aos meus familiares e amigos.



Agradeço ao apoio incondicional do grupo seleto de pessoas que me ajudaram na concretização desta obra: Aos amigos na fé → Adamor Cavalcante e Miguelina; Edson Araújo e Luiza; José Dimas e Nelza; Hélio Seixas e Adala; Ivone Nascimento (in memoriam Helder Leite); Wellyngton Miranda e Marina. Aos amigos de infância e juventude → Arnaldo Júnior; Cláudio Chaparro; Cláudio Oliveira; Elisângela Rocha; Gisely Hauradou; Marcos Reinaldo; Sheila Nascimento. Aos irmãos sanguíneos → Elza Nunes, Johny Souza, Helena Nunes, Silene Lopes e João Paulo Nunes. Aos amigos de admiração pelas suas vitórias → Aucemira Nahamias (C.E.A); Cristiano Cruz; Floriano Júnior (C.E.A); Dr. José Hilton Barros ; Dr. Jonas Gomes.



“Por essa razão, o homem deixará pai e mãe e se unirá à sua mulher, e os dois se tornarão uma só carne.” Efésios 5:31



Prefácio

Acredito que todo mundo tem um cantinho especial que goste de estar. Alguns nos jardins, nas praças, no próprio quarto ou no balanço da árvore de seu quintal. Este meu latíbulo especial, assim como o da maioria dos profissionais de letras, são as livrarias, os sebos ou as bibliotecas; pois encontramos uma afinidade especial nesses lugares, apreciamos o universo da criação. O grande Borges, um escritor, poeta e ensaísta argentino que tanto admiro, certa vez disse que “sempre imaginou que o paraíso fosse uma espécie de livraria”. Uma frase bem significativa! Apesar de que no original Jorge Luis Borges tivesse se referido às bibliotecas. Ao visitarmos uma livraria, descobrimos um paraíso antes escondido no âmago de seus criadores. Folheamos por horas as páginas dos livros e ficamos encantados com a vastidão de histórias que poderiam cair no rol do esquecimento caso não passassem pelas mãos dos escritores. Da mesma forma, as histórias encontradas neste livro que você tem em mãos, onde terá a oportunidade de viajar no universo do autor como se estivesse junto, em cada acontecimento descrito. 13


Em Crônicas em Papel de Pão nos deparamos com uma linguagem leve, simples, com pitadas de humor e ironia. Com suas crônicas cômicas e concisas, contos ou memórias que se desenrolam num sabor reflexivo, o autor nos leva a situações comuns vividas no dia a dia, como o desdobramento de uma conversa acerca do melhor tipo de café, em O Café da Tarde; uma visita às bancas de revistas da Praça Heliodoro Balbi, em Uma Manhã de Dezembro; a relação entre Volnito Télaris e uma jovem senhora, em Panelas Arqueológicas; ou no biriteiro e “especialista” na arte de cagar em latas, em A Casa. De forma peculiar, a narrativa breve do autor, característica comum dos cronistas, apresenta ao leitor uma leitura descontraída, revelando o que normalmente nos passa despercebido na vivência diária. Jackson da Mata, autor de A Próxima Cartada

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Depoimentos de leitores

“A escrita é agradável e cuidadosa, bem como muito atrativa, o que desencadeia uma leitura envolvente, uma vez que Faber Num se aproxima de quem lê, característica principal das crônicas, fazendo ainda com que o leitor interaja com os fatos e até se identifique com as ações tomadas pelas personagens, como aconteceu comigo, como se estivéssemos em uma conversa descontraída e informal. O cronista Faber Num dialoga conosco sobre fatos, até mesmo alguns de ordem pessoal com naturalidade.” Gisely Hauradou Bacharel em Ciências Econômicas

“As primeiras palavras de “Crônicas em Papel de Pão” são um aceno, um convite a sentar, deixar-se ficar e ouvir com os olhos. Então, cativada sua audiência, o autor Faber Num conduz o leitor na agilidade descontraída e sensível de sua escrita, apresentando histórias e personagens que têm muita carne e alma em sua tinta. Cenários e cenas do cotidiano são desenhados ora com encantadora delicadeza, ora com ironia afiada, mas sem nunca perder a leveza que nos faz sentir o desaguar das páginas como uma agradável conversa com um velho amigo.” Lucas Odersvank Arquiteto e Escritor



PRIMEIRA PARTE

Crônicas

O que me faz sorrir

“Um dia sem risada é um dia desperdiçado” Charlie Chaplin



O ausente

Volnito Télaris foi um amigo de escola, estudei com ele nos dois últimos anos do ensino fundamental, o antigo 1º grau. Ele sempre chegava atrasado às aulas — o atraso era sua marca registrada — seria difícil imaginar Télaris destituído do habitual atraso. Volnito era inimigo das palavras e seu silêncio incomodava. Entrava nas aulas todos os dias, procurava o fundo da sala, alojava-se durante todos os tempos de aula, ali. Tinha se passado um semestre. Num dia, desses improváveis, onde tudo acontece diferente. Télaris ergueu-se de sua cadeira, era intervalo, abriu a porta e saiu. Gláucia aproximou-se de mim e perguntou-me: — Aquele sujeito que saiu começou a estudar hoje! Olhei nos olhos de Gláucia e explodi numa sonora gargalhada, contudo, tive a coragem de perguntar-lhe “Tu estás falando sério realmente?” Ela afirmou que sim; logo lhe disse que ela e Volnito tinham participado, pelo menos quatro ou cinco vezes, da mesma equipe nos trabalhos escolares. Fiquei levantando várias hipóteses como uma pessoa que todos viam diariamente passasse tão despercebida. 19


É como tornar-se invisível “Quando se esquece de alguém, esse se torna invisível!”. — Terá Volnito descoberto o segredo da invisibilidade do próprio Sócrates, o pai da filosofia. — O filósofo dizia que tinha a capacidade de tornar tudo ao seu redor visível ou invisível. Tudo era muito simples: — Ignoro a existência de algo, e este deixa de existir — professava o filósofo. Como morava na mesma rua que Volnito, fazia tempo que sabia que ele dormia aproximadamente 15 horas, todos os dias. Sua cama era seu local preferido de todos, por isso se dedicava a ela com grande paixão, quando as pessoas perguntavam por que dormia tanto, ele com seriedade respondia que por recomendações médicas praticava um novo e revolucionário tratamento: a sonoterapia. Todos achavam que esse tratamento tinha outro nome: preguiçoterapia. Volnito caminhava ao meu lado em total silêncio quando voltávamos da escola, estudávamos à noite. Apenas ouvia as minhas palavras, era incapaz de tecer qualquer comentário. Se meu amigo tinha alguma virtude, essa seria a do silêncio. Costumava discursar os meus pontos de vista: filosofia, literatura, ciência, política, comportamento e “o raio que o parta”, porém Volnito no final de toda a minha eloquência e persuasão apenas respondia “É né?! Você tem razão!” Para ele sempre eu tinha razão. Hoje, olhando o passado, tenho dúvidas das palavras do meu amigo Volnito Télaris sobre as razões que atribuía aos meus discursos. 20


As aventuras de Mel

Fui apresentado ao Mel na década de oitenta. Ele era amigo do Juarez, que fundara um fã clube do Raul (Raul Seixas). Juarez apresentou-me Jamel numa dessas reuniões, e fiquei quase dez anos sem contato nenhum com ele. Quando trabalhava com vendas já no século XXI, isto é, no início de 2000, reencontrei-o. Naquele ano via-o com certa frequência, pois, vez por outra, o Mel passava lá no escritório para jogar conversa fora. Engraçado que ele só aparecia na hora do almoço ou no horário do lanche. Mas engraçado mesmo eram as narrativas fantásticas de Jamel no mundo das armas, sindicatos, guerrilhas, artes marciais, esquemas envolvendo grandes somas de dinheiro, embora, que me lembre, jamais o vi com grandes somas de dinheiro no bolso; porém recordo que uma vez ele tinha cinco reais em moedas de dez centavos. Passaram-se quase quinze anos, fui num pequeno posto de lavagem, aqui mesmo no conjunto. Quando manobrei o veículo, a fim de estacioná-lo, eis que em minha frente estava o Mel sentado em uma cadeira, fumando um cigarro de tabaco, sem camisa e descalço. O dono do posto perguntou-me: 21


— O senhor vai esperar aqui ou prefere que o leve, contamos com este serviço. Agradeci ao homem e disse que iria esperar, ali mesmo. Uma oportunidade dessas de ouvir as velhas estórias do Mel era algo precioso. Sentei ao seu lado do outro lado da rua estreita. Ele lembrou-se de sua antiga e única companheira, ela vivera durante três anos ao seu lado. — Os dois eram unha e carne, — andavam abraçados debaixo do sol do meio-dia e sob a lua da meia-noite e do sereno da madrugada e das tempestades das manhãs; enfim aquele amor parecia eterno. Até que um dia, ele descobriu que ela estava se envolvendo com um sujeito da pesada, um traficante. Mel ainda advertiu Daniele que ela era uma ingrata, pois ele a tinha tirado de um bordel e cuidara dela durante estes anos. De repente, ele parou sua narração, olhou em sua volta, certificou-se de que ninguém nos ouvia, aproximou-se um pouco de mim e falou-me em voz baixa: — A Daniele sabia que eu era perigoso e podia mandar ferro nela! Eu respondo por dois homicídios! E minha pistola só estava escutando a nossa conversa, a qualquer momento poderia mandá-la para o quinto dos infernos! Na verdade, o Mel nunca matou uma mosca sequer, e sua pistola estava apenas na sua imaginação e o suposto traficante que ele dizia que Daniele se envolvera era apenas um rapaz franzino e de bom coração. A imaginação de Mel era fértil, tal qual a do personagem de Cervantes, Dom Quixote de La Mancha, ambos transformavam árvores em monstros, riachos em oceanos, realidade em fantasia. 22


Tara Moura

Era uma aula de Teoria da Literatura, quando conheci Tara Moura. Ela tinha pele clara, o sorriso aberto, toda vez que sorria era possível ver os seus 32 dentes, os cabelos eram negros e meio cacheados. Inicialmente, achei Tara muito séria e compenetrada. Porém o tempo passa, os conceitos mudam e é justamente aí o xis da questão: a mudança. Nas conversas ela sempre dizia: — Trabalho bastante, ganho pouco, meu marido me ajuda com vale-transporte para vir à faculdade! Moro com ele num pequeno apartamento. Meu sonho é comprar minha casa! Sempre me falaram que quando algumas mulheres ingressam no curso de graduação, ficam totalmente malucas, com as ideias viradas. —Achava que as pessoas tinham uma imaginação fértil demais, jamais acreditei nestes boatos. O primeiro semestre foi de estudo e foco, entretanto o segundo foi de bem menos foco e bem menos estudo. Aquelas conversas disfarçadas de intelectualismo de boteco e amizade camuflada com segundas intenções; tinha ocasionado estragos em lares, carreiras promissoras e 23


estabilizadas, perdas de emprego, separação conjugal, mudança de sexualidade, traições e até debilidade mental. Davi nunca mais se recuperou dos foras que levava de todas as meninas que se aproximava. Dizem que anda lendo manuais de autoajuda para conquistar mulheres. Lembro que sua agonia era tanta para arrumar uma namorada que vivia implorando para qualquer uma tirar um selfie com ele, somente para depois comentar que a pegou. No segundo semestre todo mundo relaxa um pouco, solta as tensões. O perigo reside em pensar que ali é um local cem por cento reservado para a incessante busca do conhecimento, ledo engano. A lei de Pareto 80/20 se aplicaria facilmente porque somente vinte por cento estudam realmente, os outros oitenta parcialmente. Tara Moura começou a dialogar com um Cabeludo. Quando entrava na faculdade, lá estava Tara e o Cabeludo; no intervalo lá estava o Cabeludo e Tara; ao término das aulas lá estavam os dois juntos dialogando. Era uma conversa sem início, meio e fim que feria os princípios vitais de todo ciclo. Numa aula, na qual fazia um trabalho de dupla, interpelei-a. — Desculpe, porém tenho curiosidade em saber o que você conversa tanto com aquele Cabeludo... Ela respondeu-me: — Somos amantes do rock sinfônico, isso nos liga e é algo em comum, temos os mesmos gostos musicais!!! O rock sinfônico tornou-se um brega dor de cotovelo, eles se apaixonaram. Esse foi o “xis” da questão. Tara Mou24


ra largou o marido, o emprego, a faculdade. O cabeludo largou os filhos, a esposa, o emprego e o curso e ambos largaram-se e o ciclo infinito chegou ao fim; o relacionamento dos dois durou trinta dias. Foi um desastre para os dois e para aqueles ligados diretamente a eles. Todos sofreram, até eu sofri com a perda da colega de classe, a qual estimava e tinha grande carinho, pois era minha parceira nos trabalhos e possuía um grande sorriso e um imenso coração.

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