sua individualidade, que se consuma
Exatos vinte anos após a estreia da
em uma trama de sobreposições
ópera – quando Mozart já estava morto
melódicas, um contraponto ao
e Da Ponte já havia se tornado cidadão
mesmo tempo musical e dramático
norte-americano – ao redigir suas
(lembremos que apenas recentemente
memórias, o libretista mandou às favas
assistimos a esses espetáculos com
a modéstia quando, ao recordar de seus
legendas eletrônicas, o que dá uma
anos na corte vienense, se referiu ao
ideia do desafio que Mozart – e
Don Giovanni como “a melhor ópera
posteriormente uma infinidade de
do mundo”. Não que ele se referisse de
outros compositores por ele inspirados
forma narcisista ao seu texto, pois, ao
– lançava à sua audiência com esse tipo
redigir essa sentença, Da Ponte tinha
de configuração).
plena ciência da mágica simbiose entre música e drama que ele e Mozart
Porém, não foi apenas nesses
haviam criado.
momentos que o compositor empregou sua maestria. “Visto à distância”, conseguimos vislumbrar na partitura de Don Giovanni uma sólida coesão musical, um invisível mas plenamente
Leonardo Martinelli compositor e professor
audível fio condutor trançado a partir de um laborioso trabalho de harmonia e de orquestração, no qual as ideias musicais se conectam com perfeição aos diferentes elementos do enredo e às características de suas personagens. É esse trabalho, no nível da escritura musical, que confere notável singularidade a essa obra: mais do que uma mera sonorização de um texto, a partitura de Don Giovanni constitui um discurso dramático autossuficiente, algo que apenas um grande sinfonista como Mozart seria capaz de criar.
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