Moda uma filosofia lars svendsen

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Apêndice: Crítica de moda*

Por que a crítica de moda é importante? A resposta é simples: o campo da moda precisa de crítica séria se quiser ser levado a sério como prática estética. Se a moda for simplesmente mais uma mercadoria, como leite, papel higiênico e areia sanitária para gatos, essa crítica não é muito necessária. Mas ela pretende ser muito mais. Quando examinamos a história da moda, vemos que os estilistas tiveram pouco prestígio social até a segunda metade do século XIX. Parece quase inacreditável para nós, num mundo da moda em que tanta coisa depende dos nomes dos estilistas, que até essa altura os nomes dos costureiros simplesmente não fossem revelados. Eles eram de fato anônimos. Mas o costureiro quis se tornar um estilista, algo mais próximo de um artista. É especialmente nesse contexto que a crítica de moda se torna crucial. Uma razão importante para a moda não ter alcançado o mesmo reconhecimento que outras formas de arte é que existem tradições de crítica séria nos campos das artes visuais, da música, da literatura, do cinema etc., ao passo que no campo da moda isso está em grande medida ausente. Nos jornais sérios, muito espaço é dedicado a críticas e análises substanciais das artes, mas em geral procuramos em vão por alguma coisa semelhante sobre moda. Há, é claro, matérias ocasionais sobre uma tendência importante, como a moda ecológica, ou o perfil de um estilista famoso, mas raramente vemos a análise e a avaliação cuidadosas de uma coleção, como as dedicadas às artes. Quem escreve sobre moda não deveria ser visto como um mero criado do estilista. Há uma dependência mútua aí, pois o que é escrito sobre a moda é decisivo para o estabelecimento e a validação de um estilista. Em outras palavras: os críticos de moda desempenham um papel decisivo na “criação de criadores”, como o expressou Pierre Bourdieu. E deveriam desafiar os estilistas, impelindo-os a se superar. Bourdieu salienta que a tarefa dos críticos e jornalistas é produzir uma crença nos objetos dos campos sobre os quais escrevem – algo que por sua vez fortalece sua própria posição. Isto é bastante óbvio no jornalismo de moda, mas há uma tendência nele a ser excessivamente acrítico para parecer digno de crédito. As ligações entre a imprensa e a indústria nesses casos são tão estreitas que é difícil considerar a imprensa de moda como outra coisa senão uma extensão dos ateliês. A moda sempre se viu num lugar entre arte e capital, no qual muitas vezes abraçou o lado artístico para abrandar seu lado financeiro. Os aspectos comerciais, no entanto, tendem a sufocar a possibilidade de crítica genuína. O jornalismo de moda é visto em grande medida como uma extensão do


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