{GENTE}
Confira a seguir um rápido bate-papo com o profissional de comunicação e como ele entende e capta a essência e a importância do futebol amador praticado na cidade.
» Conte alguma história interessante que você já viu, ouviu ou viveu na várzea... Eu conheço um presidente de time chamado Júlio, famoso Julião, de uma equipe chamada Arco, do Jardim Consórcio, Zona Sul. Entrevistei-o várias vezes e em todas ele me contou um título que o Arco ganhou no estádio do Morumbi em 1978. Nas fotos que ele mostra, vi uma linda taça e o questionei sobre a existência dela. Quase chorando, Júlio me contou que quando o Arco perdeu sua sede, era um bar, foi perdido ou roubado aquele enorme e lindo troféu. Em 2013, chamei alguns amigos da várzea para produzirmos uma réplica da taça. Conseguimos um desenhista, uma loja de troféus e até uma grande festa. Fizemos a réplica e o dia da entrega foi, sem dúvida, o mais emocionante da minha vida na várzea.
» Qual a importância desse universo de futebol de várzea para a os bairros e a cidade de São Paulo como um todo? Eu costumo dizer que os times de várzea acabam servindo como ONGs dentro dos bairros, realizando trabalhos que deveriam também ser de responsabilidade do poder público. Existe um time que sua origem explica perfeitamente isso, o “Quase Nada”, que é dos bairros de Pirituba e Morro Doce. Quando perguntei o motivo do nome disseram que no bairro onde eles viviam não tinha um parque para as crianças, shopping perto, cinema, não tinha nada. Com a fundação do time, o bairro deixaria de não ter nada para ter “Quase Nada”. Não é demais?
» Os campos continuam sumindo em virtude da especulação imobiliária na cidade ou ainda existem muitos? Se não me engano, existem mais de 300 CDCs, que são os clubes da comunidade catalogados na Prefeitura de São Paulo. Mas existem outros vários que sobrevivem na capital. Os campos vão diminuir, mas não acredito que vão acabar. Claro que desde que comecei a pesquisar já vi alguns campos acabarem e nunca vi um
nascer. Vai chegar uma hora em que o número de campos será um só, sem acabar nem crescer. Assim espero.
» O que você particularmente acha dessa transformação dos campos, que antes eram de terra e hoje tem grama sintética? Eu sou muito romântico para gostar da transformação dos campos de várzea. Para mim, campo de várzea é no terrão, o resto é sintético. Vai tirar o brilho varzeano, sem dizer que tecnicamente os jogadores não serão mais obrigados a driblar as dificuldades de um campo esburacado. Estamos perdendo nossa identidade. No entanto, entendo que é uma tendência, um mal necessário e um caminho sem volta.
» Você acha que as autoridades enxergam a importância do futebol de várzea? Eles contribuem com algo? Na prática, as autoridades entregam os campos de várzea nas mãos de agentes de liderança das comunidades para se safar de um problema. Não há preocupação em realizar grandes campeonatos ou regulamentar a atividade. Muitos times de várzea, por exemplo, deveriam ter direitos por jogadores que formam. Mas cadê as federações estaduais para orientar os presidentes de times sobre o assunto? Claro que existem muitos vereadores parceiros de times, que conseguem uniformes, grama sintética para os campos. A gente sabe que o que eles querem é o seu voto, mas eu ainda acredito que existam pessoas bem intencionadas neste meio. n Revista Olhar São Paulo | 17