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É

difícil acompanhar os tempos. Se antigamente havia um estereótipo masculino do homem de barba rija, que usava o mesmo after shave desde a adolescência, bebia cerveja e acompanhava todos os times de futebol internacionais, hoje as coisas não são assim tão simples. O século XX foi prolífero em ajudar o individualismo a ganhar terreno, mas no século XXI o fenômeno intensificou-se e homens e mulheres esqueceram o preconceito e saíram do armário com as suas manias e os seus fetiches. Para isso, muito contribuiu o mundo do espetáculo e da publicidade, ao divulgar imagens de homens como até então nunca se tinha visto. Primeiro, foi o fenômeno das boys bands, em que grupos de rapazes com pouca barba na cara e, aparentemente, heterossexuais, se apresentavam vestidos a rigor, coordenados entre si e carregados de acessórios como brincos, colares e pulseiras, camisas abertas até ao umbigo, tatuagens cuidadosamente localizadas e cabelos longos com tiara. Acompanhando esses novos tempos, as revistas femininas começaram a dizer que as mulheres estavam fartas da insensibilidade masculina, que os homens precisavam entrar em contato com as suas emoções para conseguirem compreender as namoradas e companheiras, e que conter o choro, como os paizinhos lhes tinham ensinado, era bloqueador do espírito. Se era isso que elas queriam, foi exatamente o que elas tiveram. Um novo tipo de homem, mais feminino por dentro e também por fora. Finalmente, os homens poderiam dividir com as namoradas truques de maquiagem, raspar os pelos das pernas e do peito, furar as orelhas e ver desfiles de moda, sem que lhes chamassem nomes menos bonitos. Assumido o movimento, metrossexuais em todo o mundo procuraram um representante máximo, alguém que os fizesse sentirem-se masculinos, apesar de tanta mania feminina. A escolha não poderia ter sido mais certeira. David Beckham, além de dar chutes na bola, um esporte indiscutivelmente masculino, pintava as unhas, usava lingerie feminina, brincos, elásticos e tiaras no cabelo, adorava vestir qualquer coisa assinada por Dolce & Gabbana, calças

Metrossexual Uma espécie que terá começado a ganhar adeptos com a moda das boys bands e cujo exemplo máximo é o futebolista David Beckham. Ao contrário do que se pensou no início, este exemplar não faz as delícias da maior parte das mulheres, que rapidamente se aborrecem de ter de emprestar as suas máscaras de beleza aos namorados, as suas pinças para eles arquearem as sobrancelhas e, acima de tudo, o fenômeno mais temido, de terem de partilhar experiências sobre depilação definitiva. Sim, porque metrossexual que se preze tem a pele mais lisa do que uma galinha depenada. Verdadeiramente assustador. É que quando as mulheres gritavam em alto e bom som que queriam que os homens entrassem mais em contato com o seu lado emocional, ou feminino, não estavam lhe dizendo para se tornarem travestis. Ou seja, o fenômeno da metrossexualidade não passa de mais um exemplo da falta de comunicação entre os gêneros, sustentado recentemente por um estudo da Universidade de Sheffield, no norte da Inglaterra, que concluiu que os homens têm dificuldade em processar a voz feminina. Mesmo não compreendendo exatamente o que nós lhe pedíamos, não precisavam ir tão longe. Na verdade, o homem metrossexual, além de ser mais vaidoso do que um pavão, está em plena conexão com as suas emoções, e por isso não partilha da máxima “boys don’t cry”, aliás, não tem vergonha de dizer que chorou como uma Madalena arrependida quando foi transmitido o último episódio de “Sex and the city”. Mas, afinal, quem é que se lembrou de catalogar o novo homem do século XXI? O termo metrossexual ouviu-se pela primeira vez em 1994, num artigo escrito pelo jornalista Mark Simpson. Mas foi só depois

SÉCULO XXI

METROSSEXUAL – Estereótipo: David Beckham – Gadget: iPod com capa em couro Louis Vuitton – Filme favorito: “Prêt-à-Porter”, de Robert Altman – Peça de roupa: Qualquer uma de Dolce & Gabbana – Bebida: Cocktails e água com gás Perrier – Hobby: Fazer compras – Manias irritantes: Andar sempre com a pinça para tirar os supérfluos e conta as calorias de cada refeição Por Consuêlo Badra – Fotos: Divulgação

rasgadas e nunca deixava os seus óculos espelhados em casa. Não se sabe ao certo por que, mas nos últimos anos as mulheres cansaram-se desses bonecos espevitados. Talvez estivessem fartas de os ouvirem dizer que não podiam consertar um cano porque estragava as unhas. Aos poucos, a revolução retrossexual ganhou terreno e em 2004 já não se falava de outra coisa. Aproveitando artigos satíricos nas revistas femininas, que diziam que as mulheres não suportavam mais namorar homens afeminados, exemplares masculinos em todo o mundo tomaram a dianteira do movimento e inundaram a Internet com códigos de conduta e palavras de ordem. O homem de barba rija estava de volta, e com força total. Mas como o mais importante nestas coisas é encher páginas de revistas, nos últimos meses novos prefixos para a palavra sexual ganharam forma e conteúdo. Por exemplo, o urbanossexual e o tecnossexual, duas espécies masculinas que vivem em grandes cidades, gostam de se vestir bem, como os metrossexuais, choram de vez em quando, só mesmo quando um filme é muito, mas muito emotivo, e gastam rios de dinheiro em novidades tecnológicas. É um gênero que há muito vinha ganhando forma. Desde a revolução tecnológica que milhares de homens em todo o mundo viviam obcecados com as novas tecnologias. Quando entraram no mercado de trabalho e começaram a ganhar rios de dinheiro com os conhecimentos que só eles tinham, o útil juntou-se ao agradável e nasceu o tecnossexual.

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