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UM SONHADOR COM OS Pés na realidade
Visionário, Darcy Ribeiro enfrentou o desafio de criar a Universidade de Brasília e levar educação ao maior número possível de crianças
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Texto Caroline Bchara e Lara Silvério
Minha filha foi lançada na vida. Eu dizia que minha filha era uma prostituta. Mas por amor, porque eu queria salvá-la”, afirmava Darcy Ribeiro, se referindo à Universidade de Brasília (UnB) e decepcionado com o caminho que ela havia tomado após um período de ditadura militar que a fez tão diferente dos rabiscos iniciais. A universidade que Darcy encontrou ao voltar do exílio, em 1976, em nada se parecia com a inaugurada no início da década de 1960. O interesse pelo ensino foi influência direta do educador e escritor brasileiro Anísio Teixeira. Se antes divergiam em muitas questões, acabaram por virar grandes amigos. Integrantes do Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos do Ministério da Educação (Inep), saíram juntos em defesa do ensino público democrático nos debates sobre a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), promulgada mais recentemente em 1996, com Darcy Ribeiro como relator. Com a nova LDB, o Brasil começou a conhecer um lado de Darcy que era, até o momento, latente: o de educador. Encarregados de planejar a rede de ensino primário e médio que seria instalada na nova capital, Darcy e Anísio começaram a cogitar também o superior. Assim surgiu, em 1959, a ideia de se criar uma universidade inovadora, que “correspondesse às necessidades da formação científica moderna”. O projeto da Universidade de Brasília foi aprovado e implementado na capital por meio dos esforços não só dos idealizadores: Juscelino Kubitschek encaminhou o projeto ao Congresso Nacional e criou a comissão responsável por arquitetar a universidade; Jânio Quadros confirmou a mesma, criada por JK; e João Goulart promulgou a lei para criar a UnB e nomeou o primeiro reitor, Darcy Ribeiro. “Por um lado, a alta qualificação científica e por outro, a completa liberdade e a perfeita autonomia acadêmica”, defendia Darcy. A proposta era que todos os estudantes passassem, nos primeiros dois anos de curso superior, pe-
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los chamados Institutos Centrais. Lá, conheceriam mais os campos do saber e teriam toda a base intelectual e científica necessária para o seguimento em cada faculdade. Após o término dos cursos introdutórios, um novo universo se abriria aos estudantes. A liberdade conferida a eles para compor livremente os próprios currículos permitiria a formação de generalistas, sem obrigá-los a especializar-se. Professor emérito da Universidade de Brasília, Isaac Roitman afirma que a ideia de Darcy para a UnB era a de uma universidade diferenciada. “Sem catedráticos e com espaço suficiente para a cultura universitária, onde o aluno poderia explorar várias áreas do conhecimento com dois anos para ser instrumentalizado e conhecer as várias possibilidades de carreiras”, relembra o professor. O plano urbanístico do campus universitário, de Lucio Costa, previa a construção de oito áreas para os Institutos Centrais – o que equivaleria a mais de quarenta edifícios que ainda deveriam ser planejados. Em tom de brincadeira, Darcy Ribeiro dizia que, por preguiça, Oscar Niemeyer projetou o Instituto Central de Ciências (ICC) como ele é: resumiu o plano de Lucio Costa em um único edifício, com 780 metros de comprimento por 80 de largura.
Darcy visionário
Anísio e Darcy pensaram juntos em fazer uma universidade inovadora, pois até então elas eram incapazes de ser agentes da transformação e desenvolvimento do Brasil. Em 1960, Darcy assim se expressou: “Comecei então a arguir sobre a necessidade de criar uma universidade e sobre a oportunidade extraordinária que ela nos daria de rever a estrutura obsoleta do ensino superior brasileiro, criando uma capaz de dominar todo o saber humano e colocá-lo a serviço do desenvolvimento nacional”. As universidades da época reproduziam o conhecimento provindo do exterior, a pesquisa não privilegiava os te-