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CENÁRIO

FOTO: DIVULGAÇÃO SEMEXE

VÁ DE BICICLETA

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Mais que instrumentos de lazer e saúde, as bicicletas vêm se tornando uma excelente opção na melhoria da mobilidade urbana. Mas ainda há muito que se pedalar para seu uso ser maior, como também o respeito dos motoristas ao modal

Cada vez mais, transportes alternativos tomam conta das cidades. Seja por uma questão de economia ou saúde, seja para gerar menos poluição, eles também ajudam a melhorar a mobilidade urbana. Para se ter uma ideia, São Paulo, a maior metrópole do País, sofre com o trânsito e com a poluição, mas em contrapartida é a cidade com a maior malha cicloviária brasileira, com 681 km de extensão. Os dados são da prefeitura da cidade.

Segundo levantamento da pesquisadora Glaucia Pereira, do Instituto de Pesquisa Multiplicidade Mobilidade Urbana (IPMMU), a capital paulista conta com 1,6 milhão de bicicletas. Como a cidade tem cerca de 12 milhões de moradores, há 13 bicicletas para cada cem habitantes. Por outro lado, dados da Companhia de Engenharia de Tráfego (CET) indicam que apenas 9 mil delas circulam todos os dias. Mas as “magrelas” se transformaram em símbolo da mobilidade sustentável.

A Holanda é o país com maior número de bicicletas, com um total de 16 milhões de bikes para uma população de 16 milhões de pessoas. Calcula-se que em torno de nove pessoas em cada dez habitantes usam bicicletas como parte de suas rotinas e viagens. Em âmbito nacional, são 70 milhões de bicicletas no Brasil. Para uma população atual perto de 213 milhões de habitantes, temos em média uma bike para cada três pessoas.

De acordo com Cyro Gazola, vice-presidente do Segmento de Bicicletas da Associação Brasileira dos Fabricantes de Motocicletas, Ciclomotores, Motonetas, Bicicletas e Similares (Abraciclo), as cidades que incentivam o uso desse modal melhoram seu nível de qualidade em mobilidade urbana e o fluxo do trânsito, sem falar dos benefícios para o meio ambiente graças à redução da emissão de gás carbônico. Além disso, a bicicleta garante mais qualidade de vida para a população, pois melhora a condição física e reduz o estresse.

“O uso da bicicleta cresceu muito durante a pandemia, com o brasileiro redescobrindo esse meio de transporte. Hoje, vemos muitas famílias retomarem o hábito do pedal. Há ainda aqueles que a usam para deslocamentos urbanos e como instrumento de trabalho. Pedalar em segurança é a prioridade. Para estimular o uso da bicicleta como veículo de transporte, é necessário criar políticas públicas que implantem e melhorem a malha cicloviária nas cidades. Isso é fundamental no planejamento urbano dos próximos anos”, conta Gazola.

MUDANÇA DE MENTALIDADE

Segundo o vice-presidente da Abraciclo, no Brasil grande parte das pessoas ainda usa o carro como principal meio de locomoção. Isso, no entanto, está mudando. Hoje, as pessoas nas grandes cidades querem fugir dos congestio-

namentos e seu consequente estresse. Aliado a esse fator, elas perceberam que pedalar melhora a qualidade de vida, reduz o risco de doenças cardiovasculares e contribui para diminuir a poluição ambiental.

“Acreditamos que a demanda por bicicletas deverá continuar em alta. Esse veículo permite que as pessoas cheguem mais rápido ao seu destino, sem enfrentar o trânsito caótico das grandes cidades. Acreditamos que, no futuro, as cidades vão se adaptar para promover e estimular os deslocamentos a pé ou de bicicleta. Além disso, o desenvolvimento de novas tecnologias, como a bicicleta elétrica, irá permitir deslocamentos cada vez mais ágeis, práticos e sustentáveis”, defende Gazola.

Para estimular o uso das “magrelas” como meio de transporte, Gazola acredita que seja necessário o envolvimento do poder público na ampliação da malha cicloviária nas cidades, possibilitando uma locomoção com mais segurança aos usuários. “Temos o Programa Bicicleta Brasil, sancionado em outubro de 2018 pelo então presidente Michel Temer. Mas, infelizmente, pouco foi feito. O projeto prevê ampliar a construção de ciclovias, ciclofaixas e faixas compartilhadas, implantar pontos de locação de bicicletas a baixo custo em terminais de transporte coletivo, centros comerciais e locais de grande fluxo, e até realizar campanhas de incentivo ao uso.”

A Abraciclo desenvolve diversos trabalhos e parcerias para a inclusão da bicicleta como meio de transporte e para transformar as cidades em amigas dos ciclistas. Exemplo disso é a parceria firmada pela entidade com a União de Ciclistas do Brasil (UCB) e o Instituto de Políticas de Transporte e Desenvolvimento (ITDP Brasil) para a plataforma Ciclomapa. Atualmente, o Ciclomapa já conta com mais de 29 mil quilômetros mapeados em 563 cidades, incluindo ciclovias, ciclofaixas, ciclorrotas e calçadas compartilhadas. Com essa parceria, foi possível ter mais acesso às oportunidades e carências dos ciclistas brasileiros para seguir buscando soluções que fortalecem o setor de bicicletas e, consequentemente, as fabricantes nacionais.

AMIGO DA BICICLETA

Gazola afirma que, infelizmente, no país não existem muitas cidades amigas da bicicleta. “Ainda precisamos desenvolver e implantar uma cultura favorável a seu uso. Para tornar isso viável, é preciso ter mais projetos de ciclovias, ciclofaixas, faixas compartilhadas e bicicletários. Também é preciso contar com sinalização específica para garantir a segurança dos ciclistas, promover a integração do transporte por bicicleta ao transporte público, e, principalmente, desenvolver campanhas educativas, das quais uma das mais importantes é sobre respeito no trânsito. Todo mundo conhece aquela regra do mais forte proteger o mais fraco”, diz.

Nas ruas e avenidas, os motoristas precisam zelar pelos ciclistas que, por sua vez, devem estar atentos aos pedestres. Esse é um dos temas abordados no Guia do Ciclista Seguro que a entidade lançou em 2019. Produzida em parceria com o Instituto Ciclo BR, a publicação mostra ao ciclista o que deve ser checado antes de sair com sua bicicleta, como pedalar nas grandes cidades e circular em vias com ou sem infraestrutura cicloviária e os cuidados que devem ser observados nos passeios com as crianças, além de fornecer dicas de como sair de situações de risco. O guia está no site da Abraciclo (https://www.abraciclo.com.br/site/), disponível para download. Além disso, a associação realiza palestras e participa de discussões com a sociedade.

MAIS ACESSO ÀS BICICLETAS

Fundada em janeiro de 2019, a Semexe se tornou, em pouco mais de dois anos, a plataforma online de referência na compra e venda de produtos novos e usados dentro do universo da bicicleta. A startup une tecnologia, segurança, conteúdo, atendimento especializado e a paixão pelo ciclismo para oferecer o produto ideal ao fã de duas rodas.

De acordo com Rodrigo Afonso, Gerente de Parcerias da Semexe, os meios de transporte em geral apresentam grandes desafios. No que tange à bicicleta, percebeu-se que nos últimos anos houve uma evolução ainda tímida, mas progressiva. Com a expansão de ciclofaixas e ciclovias, além da melhora da qualidade de asfalto, o número de ciclistas tende a aumentar exponencialmente. “Desde a infância, somos incentivados a pedalar, logo o ato de andar de bicicleta traz memórias afetivas muito fortes, auxilia o meio ambiente, diminui a emissão de gases poluentes e melhora a saúde do praticante. Então, com mais oferta de quilômetros, mais pessoas tendem a utilizar.”

Ele defende mais investimento no transporte cicloviário não só pela questão de ser

O uso da bicicleta cresceu muito durante a pandemia, com o brasileiro redescobrindo a bicicleta

Cyro Gazola, vice-presidente da Abraciclo

Hoje, gestores, políticos e técnicos, com algumas exceções, é claro, já falam muito em bicicletas e planejamento cicloviário

Zé Lobo, Diretor-Executivo da Associação Transporte Ativo (TA) uma empresa que vende o modal. “Em julho deste ano, a revista científica Environmental Research divulgou um estudo sobre o impacto do sistema de bicicletas compartilhadas na saúde dos estadunidenses. Como resultado, eles perceberam que houve redução de 4,7% de mortes prematuras e economia de 36 milhões de dólares aos cofres do país, pois a prática de exercícios melhora a qualidade do ar e de outros fatores, que levam menos pessoas aos hospitais. Esse é apenas um dos milhares de estudos realizados nas últimas décadas, em diversas regiões, demonstrando a efetividade da adoção do pedal no dia a dia.”

Andar de bicicleta, seja para deslocamento urbano ou lazer, melhora a qualidade física e mental do praticante, estimula diversos músculos, gera um senso mais aguçado de colaboração e sensibilidade no trânsito e auxilia na diminuição da poluição do ar, entre outros aspectos.

MOBILIDADE URBANA E BICICLETAS “CAMINHANDO JUNTAS”

No que tange à relação entre mobilidade urbana e maior uso de bicicletas, Afonso entende que são dois pontos que caminham juntos. Para ele, a melhora da qualidade urbana brasileira passa pela integração dos meios de transporte e a oferta de equidade para quem deseja ir a pé, de carro, metrô, ônibus, moto ou bicicleta. Privilegiando um meio, acaba-se deixando os outros de lado. Por isso, é importante que a pessoa possa escolher o meio ideal e tenha segurança no percurso. No caso da bicicleta, o espaço médio ocupado por ela em comparação com o carro, por exemplo, pode auxiliar na diminuição de congestionamentos e na melhora física do praticante.

“Conferir a distância entre locais de origem e chegada ajuda nessa adoção. Sabemos que se a pessoa começar a pedalar curtas distâncias, em breve ela expandirá e terá confiança para trajetos maiores. Então, acreditamos que a convivência entre os meios é a melhor solução. Na Europa, mais especificamente na França, Itália e Países Baixos, esses fatores estão unidos. E todos eles seguem as diretrizes previstas para diminuir os gases poluentes da atmosfera e contribuir com o meio ambiente mais limpo”, diz.

Para ele, grandes cidades precisam investir na expansão de ciclovias e ciclofaixas, na adoção de medidas educativas de trânsito para evitar acidentes, em fiscalizar melhor os espaços urbanos e incentivar que as pessoas, cada dia mais, se sintam seguras e apoiadas para pedalar. “Neste período de pandemia, a Organização Mundial da Saúde (OMS) indicou a bicicleta como principal meio de transporte para evitar a proliferação do Covid-19. E vários países criaram projetos públicos e de incentivo para adotar as duas rodas. É um movimento que vai ganhando forças. Quanto mais cedo as pessoas aderirem, melhor será a qualidade de vida delas e da população em geral”, complementa Afonso.

INVESTIR EM TRANSPORTE CICLOVIÁRIO SÓ TRAZ BENEFÍCIOS

“A falta de preparo das vias para receber ciclistas, o descaso dos gestores para com o tema, a falta de educação e respeito dos motoristas e a violência de nosso trânsito. São todos desafios relativamente fáceis de serem resolvidos a partir do momento que os gestores tomarem conhecimento do potencial das bicicletas para a solução de problemas nas grandes cidades.”

Essa é a opinião de Zé Lobo, Diretor-Executivo da associação Transporte Ativo (TA), Organização da Sociedade Civil voltada para qualidade de vida pela utilização de meios de transporte a propulsão humana nos sistemas de trânsito. Ele é um grande defensor e ativista do uso de bicicletas como alternativa aos meios tradicionais de transporte.

Para ele, investir em transporte cicloviário é investir na cidade como um todo: no trânsito mais saudável e seguro, em cidadãos mais saudáveis, felizes e tranquilos, na menor emissão de gases poluentes e causadores do efeito estufa, em menos ruído. Uma cidade planejada para as bicicletas e para os seres humanos é sempre mais atrativa e com maior qualidade de vida. Sem contar os custos muito mais baixos da infraestrutura para bicicletas e pedestres que para motorizados, gerando economia não só na implantação mas também na manutenção. Zé Lobo cita o estudo realizado pela prefeitura de Copenhague, na Dinamarca, que revelou que a cidade gasta aproximadamente 50 centavos por quilômetro rodado em carro e economiza aproximadamente 30 centavos por quilômetro rodado em bicicleta.

Mas o diretor-executivo acredita que ainda há a necessidade de maior conscientização dos motoristas com relação às bicicletas. “Atualmente, as cidades estão preparadas para um convívio pacífico entre carros, motos e bicicletas, pois ele

independe do espaço urbano, embora o desenho e a velocidade das vias tenham enorme influência. Quem parece não estar preparado para esse convívio são muitos motoristas que se julgam donos das vias, e cujas irregularidades cometidas não recebem a devida punição. Esse é um problema que vai além das bicicletas, é uma questão de educação e respeito ao espaço público e ao próximo. Se você for ver as cidades do exterior onde as bicicletas rodam com segurança e consequente alto volume, o respeito pelo próximo nas ruas é a primeira coisa que se nota.”

O diretor da TA espera que, criando infraestruturas seguras, reduzindo a velocidade dos motorizados nas vias urbanas, mudando o desenho das vias para algo mais voltado ao ser humano e aos deslocamentos ativos, o uso de bicicletas nas cidades brasileiras seja mais viável. “Lembrando que, se tratarmos os ciclistas com educação e respeito, o gasto com infraestrutura é praticamente desnecessário. Mas esse seria um segundo passo. Primeiro educa-se coletivamente na marra, com regras rígidas para o uso das vias e, em paralelo, educa-se o cidadão como indivíduo, o que pode levar uma geração ou mais para ter um efeito massivo.”

“Hoje, gestores, políticos e técnicos, com algumas exceções, já falam muito em bicicletas e planejamento cicloviário, mas ainda não têm isso interiorizado em seus pensamentos. É algo superficial, muitas vezes greenwashing, ou para ‘sair bem na fita’ como gestor moderno, antenado. E, claro, pra colocar no relatório da gestão: ‘olha como eu sou legal!’. Então, o que falta é conhecimento profundo dos benefícios da bicicleta, não apenas para o trânsito, mas para logística, turismo, saúde e economia. Que isso seja parte da informação de qualidade e das decisões dos gestores e dos que pensam e decidem as cidades”, aponta.

Para Zé Lobo, a tendência, não só no Brasil, mas no mundo, é de crescimento exponencial do uso de bicicletas nos próximos anos. Independentemente de esforços governamentais, esse movimento já está acontecendo por diversos motivos já citados aqui: saúde, bem-estar, agilidade, economia e transporte eficiente, principalmente se bem integrado ao transporte público. “Dados coletados em diversos locais pelo mundo comprovam que cidades com mais bicicletas têm trânsito mais seguro e eficiente. Por essa informação, podemos prever uma melhora considerável na mobilidade urbana das cidades que abraçam as bicicletas e os modais ativos”, conclui.

FOTO: DIVULGAÇÃO CALOI

PERFIL DO CICLISTA BRASILEIRO

• 75,8% - Usam para ir ao trabalho • 25,4% - Escola/faculdade • 55,7% - Compras • 61,9% - Lazer • 82,5% - Pedalam cinco dias ou mais por semana • 59% - Usam como meio de transporte há mais de cinco anos • 8,2% - Utilizam a bicicleta em combinação com outro meio de transporte • 40,3% - Têm renda entre um e dois salários • 55% - Levam entre dez e 30 minutos em suas viagens de bicicleta • 25,7% - Têm entre 25 e 34 anos de idade

Fonte: Associação Transporte Ativo (2018)

PAÍSES COM MAIS BICICLETAS POR HABITANTES NO MUNDO

1º - Holanda 2º - Dinamarca 3º - Alemanha 4º - Suécia 5º - Noruega

Fonte: https://top10mais.org/ 6º - Finlândia 7º - Japão 8º - Suíça 9º - Bélgica 10º - China

CIDADES COM MAIOR MALHA CICLOVIÁRIA NO BRASIL

• São Paulo (SP) • Brasília (DF) • Rio de Janeiro (RJ) • Fortaleza (CE) • Salvador (BA)

Fonte: Portal G1 • Curitiba (PR) • Rio Branco (AC) • Goiânia (GO) • Florianópolis (SC) • Belém (PA)

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