CENAS DA PANDEMIA NO BRASIL RETRATOS
DE
ECONÔMICA
E
UMA
CRISE
SANITÁRIA
POLÍTICA, (2020-2021)
"Grito do Subúrbio", imagem feita pelo fotógrafo Brenno Carvalho, ex-aluno da UFRRJ, para o Jornal O GLOBO, ganhadora do 43° Prêmio Vladimir Herzog, em 2021
UNIVERSIDADE FEDERAL RURAL DO RIO DE JANEIRO INSTITUTO DE CIÊNCIAS HUMANAS E SOCIAIS CURSO DE JORNALISMO
2020 - 2021
Projeto de construção de FOTORREPORTAGEM , desenvolvido por estudantes de Jornalismo da UFRRJ, nos laboratórios de Convergência Digital I e II (cursados de fevereiro a maio de 2021) e Inovação na Narrativa Jornalística (cursado de setembro a dezembro de 2021).
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A publicação encontra-se no formato e-book.
Supervisão e edição geral:
professora Simone Orlando (UFRRJ)
Consultoria ad hoc:
professora Cecília Moreyra (UFRRJ)
Editores discentes voluntários:
Lidiane de Oliveira Nóbrega Roberto Jones Garcia Vieira
Revisão geral: Bárbara Clara Melo Fontes
Repórteres discentes participantes:
Alexandre Almeida Juliano Júnior Ana Beatriz do Nascimento Rosa Bárbara Clara Melo Fontes Gabriele de Souza Freitas Izabelle Caroline Quirino Nogueira Jessica Martins do Nascimento Lucas França de Almeida Mendes Mariane Souza de Freitas Mayara Santos Dias Rafael Gutierrez Goncalves
editorial Vivemos tempos nunca antes imaginados. Em meio à esfuziante folia do carnaval de 2020, há quase dois anos atrás, não adivinharíamos a composição de um quadro global que se forjaria pouco tempo depois de modo tão estarrecedor: o aparecimento de um vírus, de rápida transmissibilidade, que teve o poder de paralisar todo o planeta Terra. Um vírus que já contaminou mais 263 milhões de pessoas no mundo e, desse universo, matou quase 5,3 milhões nos sete continentes. O Brasil pulou do terceiro para o segundo no ranking global do número de infectados e mortos pela Covid-19. Foram mais de 22 milhões de contaminações, quase 620 mil mortes (dados de 14 de dezembro de 2021, quando encerramos esse projeto) e 138 milhões de imunizados com duas doses, perdendo apenas para os EUA (49,7 milhões de contaminados, com quase 800 mil mortes). Diante desse cenário, numa tentativa de mapear o tempo presente, eis que, num laboratório de prática jornalística digital e, depois, numa disciplina optativa, ambas vivenciadas durante o ensino remoto, foi co-criada essa proposta de realizar uma fotorreportagem num formato de e-book, pelas mãos de uma sagaz equipe sintética de alunos e da professora que aqui escrevinha esse texto. A ideia do projeto foi contar, através de imagens fotográficas publicadas por veículos jornalísticos do main stream (mas também pelos pequenos), o panorama da crise sanitária que acometeu o mundo, com olhar atento para o caso brasileiro, conjecturando-se às circunstâncias impostas outras duas crises (econômica e política), ambas dimensionadas para o período de março de 2020 a dezembro de 2021. Assim, organizamos nossa narrativa por imagens e textos-legenda, forjada tal qual um espetáculo cênico, composto por quatro atos. Se pensarmos o contexto teatral, ato (do latim actu) seria uma das divisões ou unidades que compõem uma peça ou uma ópera. Cada ato é dotado de certa autonomia quanto à ação, tempo, espaço, estrutura da intriga ou atuação dos personagens, o que lhe confere tornar-se uma unidade em relação ao todo. E, assim, o número de atos de uma produção pode ser variável dependendo de como o autor estrutura a sua obra. Esses quatro atos desse livreto, portanto, espelham um contexto dramático e angustiante, que, ao mesmo tempo, transborda-se e transveste-se de humanidade e esperança. As cortinas se abriram, quando o vírus chegou 'mundo afora', alardeando a China e a Europa. Alcançou, poucos meses depois, o Brasil.
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De março a julho de 2020, temos o primeiro ato, período em que se tateia, ainda que às cegas, o problema que está posto, denotando o início do isolamento social, as primeiras internações e mortes, as falas negacionistas do governo brasileiro (uma "gripizinha" em curso), acompanhadas tardiamente de panelaços de protesto. O conturbado jogo de xadrez da troca de ministros (da Saúde, da Justiça e da Educação), a percepção dramática da vulnerabilidade econômica e social, que levou o governo a pautar a fórceps uma política assistencial (o famigerado auxílioemergencial). As máscaras faciais e o álcool em gel passaram a compor nossa rotina. Hospitais de campanha são montados em todos os estados, para auxiliar a superlotação dos leitos de UTI e na triagem da doença. No segundo ato, de agosto a dezembro, uma pseudo sensação de desaceleração da transmissão do vírus, uma aparente queda do número de casos, seguida de picos regionais de contaminação, culminaram num relaxamento coletivo global e numa consequente segunda onda que se impôs, mais agressiva e alarmante, apontando para um descontrole sobre a doença. O auxílio emergencial se estende, num panorama político de instabilidade, de incentivo ao tratamento precoce e desvalorização da ciência, de falta de autonomia para a gestão da crise sanitária por parte das autoridades municipais e estaduais. O PIB, com uma queda de 9,7%, passa a acenar para uma evidente recessão econômica, que, posteriormente se agravaria. Apesar dos parcos incentivos do Ministério da Economia, assistimos ao fechamento de milhares de empresas, indústrias e comércios em geral. As eleições municipais em novembro atingiriam um patamar elevado de abstenções. No apagar das luzes de dezembro, o Ministério da Saúde lança o plano nacional de imunização, prevendo a chegada dos primeiros lotes de vacina para o próximo ano. Marcas de imunizantes como a CoronaVac, Astrazeneca, Janssen, e mais tardiamente a Pfizer, tornam-se as escolhidas para o solo brasileiro. O Brasil demorou para propor as negociações internacionais com as empresas fabricantes, bem como andou a passos bem lentos para o incentivo da produção nacional. O terceiro ato apresenta, no raiar de 2021, a tragédia anunciada da falta de oxigênio no território amazônico. Ao mesmo tempo, temos a aplicação das primeiras vacinas e a proposição de um calendário que pretendia cumprir com a imunização em massa para o segundo semestre. Os grupos prioritários (idosos, gestantes, população indígena e quilombola, adultos com comorbidades) ainda não haviam recebido todos a segunda dose. Mas a crescente produção nacional de vacina - com destaque para a Fiocruz que chega a entregar mais de 130 milhões de doses desde o início da produção da Astrazeneca - passa a propor uma virada nos quadros de imunização. Vimos, paradoxalmente, o voluptuoso crescimento do número de mortes, em função de novas cepas, mais transmissíveis e incontroláveis. Só que, dessa vez, as UTIs passaram a absorver uma população jovem, sem resquício de doenças pretéritas. Ainda nesse período, instaura-se, em abril de 2021, como uma possível tentativa de propor transparência a todo o processo de gestão da crise sanitária, a CPI da Covid, cujo desfecho ainda não resultou em dados e ações concretos, de fato, no findar do ano. No entanto, destaca-se que o trabalho da comissão parlamentar, que durou cerca de 6 meses, propôs, em seu relatório final (entregue no mês de outubro), o indiciamento de 78 pessoas, dentre as quais, do presidente Jair Bolsonaro.
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A investigação da CPI também jogou uma enorme lupa tanto nas irregularidades e esquemas de corrupção na compra da vacina indiana Covaxin pelo governo, quanto no caso de conduta criminosa da operadora de planos de saúde para idosos, a Prevent Sênior. No mês de junho, o Brasil registra o marco de 500.000 mortos. A vacinação em massa da população adulta (primeira dose) acena para um aparente controle da doença e a queda do número de óbitos e da superlotação nos leitos de UTI. Como consequência, há um grande movimento de liberação de atividades no campo da cultura (artistas passam a fazer uma agenda de shows presenciais) e ampliação das atividades de espaços públicos de serviço (lotação de bares e restaurantes, por exemplo). O mercado de turismo volta a reaquecer. O quarto ato, em curso, apresenta, por um lado, cenas marcantes de melhoria do panorama pandêmico, e, por outro, o agravamento da crise econômica brasileira. Agosto se inicia com calendário para vacinação de adolescentes de 12 a 17 anos. Mas também apresenta inflação galopante, desemprego em alta, colocando o Brasil com os pés inteiros dentro do mapa da fome. Até dezembro, vimos disparar o preço da gasolina, do gás e da conta de luz, como não ocorria há 17 anos. Bolsonaro fez presença em três eventos internacionais nesse período. Compareceu, em setembro, com extensa comissão, à 76ª Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU), em Nova York (EUA). Em seu discurso, distorceu dados sobre meio ambiente, economia, além de defender tratamento ineficaz contra Covid. Por não usar máscaras durante a estadia na cidade americana, ele e sua equipe (o que inclui o Ministro da Saúde, contaminado pela doença, na ocasião) são impedidos de entrar em locais públicos. Em outubro, faz presença à reunião do G-20, em Roma (Itália). Isolado, apresenta uma agenda esvaziada e é completamente ironizado pela imprensa italiana. Em novembro, chega a participar, através de vídeo gravado e enviado ao evento, da COP 26 (Conferência das Nações Unidas sobre o Clima), que ocorreu em Glasgow (Escócia). Exalta, no vídeo, que o Brasil é uma grande potência verde, mas esconde dados sobre o desmatamento na Amazônia, que, em agosto, foi o maior em 10 anos. Em outubro chegamos ao número de 600.000 mortos, ao mesmo tempo que temos 75% da população adulta com as duas doses. Findamos o ano de 2021 , com parte da população idosa vacinada com a terceira dose de reforço e com uma consequente queda no número de mortes pela doença. No entanto, temos a presença preocupante de uma nova variante, a ômicron, que já se espalhou por 63 países e, inclusive, já chegou ao Brasil. Nesse palco, as cortinas ainda não se fecharam. Há muitos atos a se encenarem nessa peça. Por ora, apenas contextualizamos e didatizamos para o leitor, num ofício do fazer jornalístico, um horizonte já estabelecido. Convido a todos para uma imersão nessa imagens e nessa retrospectiva, cuidadosamente sumarizada para apresentar uma breve análise de conjuntura, desse que é um dos quadros temporais mais significativos para o século XXI. Simone Orlando
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As cortinas se abrem: o vírus aparece...
por Mariane Freitas
Créditos: Reuters
Em dezembro de 2019, a população mundial foi surpreendida com a descoberta de um novo vírus em circulação, que trouxe uma doença, ainda desconhecida, ao cenário global: a COVID-19. Com alto e rápido nível de contágio, o SARS-COV-2 (mais conhecido como Corona vírus), causador da doença, foi disseminado ao redor do globo numa velocidade em que a ciência não pode acompanhar. Até então tratada como “doença misteriosa”, a enfermidade causou um “efeito dominó” — na tentativa de tratamento dos enfermos. Também pela falta de conhecimento sobre as particularidades dos EPIs (equipamentos de proteção individuais) necessários, os profissionais de saúde acabavam se contaminando e, dessa forma, o número de infectados aumentava gradativamente. No dia 11 de março de 2020, foi declarada, oficialmente, pela Organização Mundial da Saúde, o início de uma pandemia global, ampliando, a cada dia, o número de vítimas pelo mundo. Na foto acima, observa-se o atendimento a pacientes num Hospital de Campanha, em Wuhan, na China, primeiro local datado como de contaminação pelo vírus.
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Créditos: Noel Celis/ AFP
Foi no mercado atacadista de frutos do mar em Wuhan, na China, o local do primeiro surto de COVID-19 registrado no mundo, ainda em novembro de 2019. A partir de então, iniciouse o mapeamento sobre os casos, que se alastravam, de modo incontrolável, rapidamente em diferentes localidades do país. No final de fevereiro do ano seguinte, Itália, Coreia do Sul e Irã vivenciaram surtos descontrolados da doença. O sistema de saúde italiano entrou em colapso. A Europa, começou a ser considerada o epicentro da doença pela OMS em 13 de março de 2020. O diretor-geral da organização, Tedros Adhanom, destacou em coletiva à imprensa: “Mais casos estão sendo confirmados na Europa diariamente do que a China relatava, no auge da epidemia no país. Em todo o mundo, mais de cinco mil pessoas já morreram. Um marco trágico”. Em 14 de março, a Espanha decretou lockdown. Neste período, os casos na Europa dobravam em períodos de 2 a 4 dias.
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Créditos: Reuters
Do outro lado do planeta, no contexto latino, a falta de infraestrutura trazia cenas de corpos mortos em casa e estendidos pela rua. Foi o caso da cidade de Guayaquil (Equador), muito castigada pela doença, em abril de 2020. No dia 7 de maio, a capital econômica do Equador se tornaria o epicentro da pandemia do novo coronavírus no país. A prefeita da cidade, Cynthia Viteri, que, na época, também se recuperava da COVID-19, informou que um terço dos 2,7 milhões de habitantes de Guayaquil foram contaminados. O local chegou a receber doações de caixões de papelão para poder enterrar os mortos . O colapso do sistema funerário ocorreu em diversos países da América Latina e chegaria a atingir o Brasil também em alguns momentos, sobretudo na virada do ano de 2020 para 2021.
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Créditos: Carlos Vargas/Reuters
Ainda no cenário latino, a falta de estrutura e saneamento básico foram grandes aliadas para a proliferação do vírus na região. O número de casos nas cidades de La Paz e Cochabamba, no oeste da Bolívia, avançou de forma tão rápida a ponto de ocorrer o mesmo quadro do Equador: o colapso do sistema funerário. Na operação de apenas cinco dias, que ocorreu entre 15 e 20 de julho de 2020, somente na cidade de Cochabamba, 191 cadáveres foram retirados das casas ou das ruas. Em La Paz, sede do poder boliviano, familiares tiveram de aguardar para enterrar seus entes queridos (mesmo sem poder chegar perto do caixão) por falta de espaço nos cemitérios. Diante dessa situação, foram utilizados tratores e caminhões para abrir valas e comportar esse número de vítimas, sem quaisquer precauções de contaminação. A falta de espaço para enterrar os mortos de Covid foi uma situação recorrente, vivida em diversos países do mundo, inclusive no caso brasileiro, em diversas cidades.
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primeiro ato: o início da pandemia no brasil
Gabriele Freitas Izabelle Nogueira
Créditos: Brenno Carvalho/ Jornal O Globo
Enquanto o planeta assistia à doença se alastrar pelo continente europeu, de forma avassaladora, no caso brasileiro a primeira morte anunciada, causada pela covid-19 se deu em solo paulista. A vítima foi Manoel Messias Freitas Filho, de 62 anos, que morreu em 16 de março de 2020, no Hospital Sancta Maggiore. Em julho (junho), após revisão pelo Ministério da Saúde e com a conclusão de exames laboratoriais, a pasta confirmou que o primeiro óbito, na verdade, ocorreu alguns dias antes, em 12 de março. A vítima foi uma paciente de 57 anos, sem nome divulgado, internada no Hospital Municipal Doutor Carmino Cariccio, também na cidade de São Paulo. No dia 20 de março de 2020, o Brasil já registrava 801 casos e 11 mortes. Chegamos a dezembro de 2021 com com mais de 22 milhões de contaminações e quase 620 mil mortes.
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Créditos: Reuters
Em 23 de março de 2020, o comércio por todo o país foi fechado, para reduzir o risco de contágio pelo novo coronavírus, com exceção de RJ e SP, que adotaram a restrição no dia seguinte. A quarentena obrigatória permitia o funcionamento de apenas alguns serviços, os considerados essenciais, como farmácias, supermercados, padarias e petshops. Bares e restaurantes só puderam trabalhar por entregas em domicílio. O presidente Jair Bolsonaro mostrou posição contrária ao decreto, alegando ser prejudicial à economia. O fechamento do comércio simbolizou um início de quebra de empresas, aumento do desemprego e percepção da necessidade de se criar um plano de apoio aos trabalhadores informais, considerados, estatisticamente, a maioria. O lockdown durou cerca de dois meses na maioria dos estados brasileiros. Créditos: Reuters
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Créditos: Reuters
Anunciado como uma medida, instituída pela lei federal n. 13 982 de 2020, para conter o impacto da crise econômica que se apresentava, o auxilio emergencial começou a ser pago no dia 9 de abril de 2020, alcançando mais de 66 milhões de pessoas. Até agosto, o valor pago foi de 600 reais, chegando a 1200 para mães, chefes de família. Já, de setembro a dezembro, o valor foi de 300 reais. O benefício foi concedido a trabalhadores informais e de baixa renda, microempreendedores individuais e também contribuintes individuais do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). Para ter acesso ao auxílio, foi necessário se cadastrar no aplicativo ou site da Caixa. O paradoxo desse processo se deu pela constatação de que 39,8 milhões de brasileiros não teriam acesso à internet e 43,8% não saberiam utilizá-la, segundo dado da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad C). Além disso, foram geradas aglomerações nas filas dos bancos para o recebimento do benefício. Também problemas técnicos foram encontrados no aplicativo, benefícios negados sem explicação, fraude, o que originou atrasos e aprovação indevida de aproximadamente 7,3 milhões de pessoas.
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Créditos: Camila Lima/SVM (G1)
O ano de 2020 trouxe consigo novos hábitos a todos. Aprendemos, por força do contexto imposto, a usar máscaras de proteção facial nas ruas, utilizar álcool em gel e a 70% nas mais variadas superfícies e nas mãos, manter o distanciamento social. E todo esse protocolo fez aquecer um outro mercado. O Procon fez uma pesquisa, em abril de 2021, praticamente um ano após o início da pandemia, e detectou um aumento de 233,72%, nesse período, no preço do álcool em gel. Em fevereiro de 2020, o frasco de 500ml custava em média R$ 6,00. O produto já chegou a ser vendido a cerca de R$ 20,00, nas farmácias e comércio em geral. Já as máscaras faciais simples (descaráveis) também tiveram um aumento exorbitante no período, de acordo com o mesmo órgão. Produtos como a máscara tripla com elástico tiveram o preço da caixa com 50 unidades aumentado de R$ 4,50 em janeiro para R$ 45 em abril de 2020, e o preço se manteve assim até então.
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Créditos: Ueslei Marcelino/ Reuters
Em 16 de abril, Luiz Henrique Mandetta foi exonerado do Ministério da Saúde. O ministro ganhou expressiva notoriedade no combate à pandemia, em seu início, por valorizar o SUS em seu discurso e atuar de modo contundente, na transparência dos dados sobre a doença, em boletins públcios diários produzidos, no formato coletiva de imprensa, com sua equipe. Bolsonaro se sentiu ofuscado pelo protagonismo de Mandetta, que, em algumas situações, chegou a contrariar o Presidente da República. Em um pronunciamento público, após sua saída, declarou à imprensa haver exageros no confinamento social, ajustando-se ao discurso do presidente. Posteriormente, passou a defender que fossem mantidas as medidas de isolamento determinadas pelos governos estaduais. O médico e exdeputado federal enfrentou forte resistência do presidente pela ação de isolamento horizontal contra o vírus, além de discordar do uso da cloroquina. Acabou sendo substituído por Nelson Teich. Mandetta tem declarado, já há algum tempo, interesse na disputa para as eleições em 2022. O ex-ministro da Saúde que é do DEM é um dos nomes em jogo para ser vice-presidente na chapa de Sérgio Moro (afiliado ao Podemos). Por enquanto, são só especulações.
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Créditos: Dida Sampaio/Estadão
Menos de um mês após assumir o Ministério da Saúde, Nelson Teich decidiu, em 15 de maio, pedir demissão da pasta, ficando 29 dias somente no cargo. Em pronunciamento público, o médico oncologista, que também é empresário do setor da saúde, afirmou que deu o melhor de si e que não saberia estar à frente do ministério no período de pandemia de Covid-19. Teich acabou não mencionando as causas que o levaram ao pedido de demissão. Fato foi que, assim como Mandetta, teve claras discordâncias com o presidente Jair Bolsonaro sobre as medidas para combate à Covid19. A começar pela questão da famigerada cloroquina para o tratamento da doença. Teich não concordava com sua recomendação. Também o exministro, à época, era contra o decreto do governo que propôs ampliar as atividades essenciais no período da pandemia que pretendia incluir setores do comércios como salões de beleza, barbearia e academias de ginástica. Cerca de um ano após sua saída do ministério, prestou depoimento na CPI da Covid.
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Créditos: Jornal O Globo
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No dia 22 de abril, uma fatídica reunião ministerial se tornou um dos maiores burburinhos da mídia. O encontro, de caráter privado, teve a participação do presidente Jair Bolsonaro, do vice, Hamilton Mourão, de Paulo Guedes, de Sérgio Moro e outros ministros. Ao todo, participaram 25 autoridades. A divulgação do vídeo desse encontro, até então mantida em sigilo, foi autorizada pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Celso de Mello, o que criou um mal-estar nacional. Durante a reunião, o presidente chamou João Doria de ‘bosta’ e Wilson Witzel de ‘estrume’, dentre várias outras falas polêmicas e muitos palavrões. No evento, além de insultar os governadores, atacou as instituições e falou também do risco de impeachment. Ricardo Salles, Ministro do Meio Ambiente, defendeu, publicamente, que se deveria “passar a boiada” e mudar regramento ligado à proteção ambiental e à área de agricultura afim de evitar críticas e processos na Justiça, enquanto a mídia estava com a atenção voltada para a Covid-19.
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Créditos: Adriano Machado/ Reuters
No dia 24 de abril de 2020, o ex-juiz Sergio Moro anunciou a sua demissão do Ministério da Justiça. Moro deixou a pasta após um ano e quatro meses no primeiro escalão do governo do presidente Jair Bolsonaro. Essa decisão foi tomada após o presidente trocar o diretor geral da Polícia Federal, Maurício Valeixo, indicado ao posto pelo ex-ministro. Bolsonaro admitiu querer ter alguém na PF que lhe desse informações sobre inquéritos e investigações em andamento no Supremo Tribunal Federal (justamente com o interesse de acompanhar acusações contra seus filhos). Moro discordou sobre tal atributo ser função da PF e afirmou que só trocaria o diretor por alguma causa específica, como, por exemplo, um erro grave. Ele ainda afirmou que saiu do ministério para preservar a própria biografia e para não contradizer o compromisso que assumiu com Bolsonaro: de que o governo seria firme no combate à corrupção. Todo essa ruptura da dupla Moro-Bolsonaro catapultou o ex-juiz para a corrida eleitoral de 2022. Pesquisas já o apontam como o 3o lugar na preferência do público (atrás de Lula, 1o lugar e Bolsonaro, 2o lugar) , ultrapassando a candidatura de Ciro Gomes e se consolidando, nas primeiras especulações de especialistas, como a cara da 'terceira via´.
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Créditos: Reuters
Um dia após a saída de Teich, Pazuello é confirmado como o seu substituto, assumindo interinamente o comando do ministério oficialmente em 15 de maio de 2020. O militar, que já foi coordenador logístico das tropas do Exército durante os Jogos Olímpicos e Paralímpicos e das operações da Operação Acolhida, não possuia nenhuma experiência na área da saúde. Com apenas dez dias no cargo, já havia mudado o protocolo do Ministério para permitir a prescrição de cloroquina até para pacientes com sintomas leves da covid-19. Além disso, demitiu funcionários com alto grau de qualificação profissional na área sanitária, para nomear militares sem qualquer vínculo com a área. Passou, igualmente, a colocar em destaque a quantidade de doentes que se recuperavam, deixando de lado a publicização dos dados sobre número de mortos. Pazuello deixou o ministério em 15 de março de 2021. Com um salário de 47 mil reais, assumiu, em 1º de junho desse ano, o cargo de secretário de Estudos Estratégicos, órgão ligado à Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República.
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Créditos: G1
O Ministério da Saúde deveria ser a principal fonte sobre os dados de evolução da pandemia. O governo de Jair Bolsonaro estabeleceu, no entanto, limitações e restringiu o acesso a esses números. Ainda na gestão de Mandetta, o horário de divulgação dos dados (em coletiva diária), antes às 17h, passou para as 19h e depois para as 22h. Depois, o governo não operou mais com tais boletins. Numa tentativa de buscar as informações necessárias, em junho de 2020, os veículos G1, Extra, O Globo, UOL, Folha de São Paulo e O Estado de São Paulo decidiram trabalhar de forma colaborativa, criando um consórcio de veículos de imprensa, que passou a dividir tarefas e compartilhar as informações que obtinham para que se pudesse saber a evolução e o total de óbitos provocados pela Covid-19. Além dos números consolidados de casos testados e com resultado positivo para o novo coronavírus, os jornalistas começaram a coletar os números de mortes e contaminados nas secretarias de saúde e divulgá-los em conjunto às 20h, diariamente. Créditos: G1
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Créditos: Mateus Bruxel / Agencia RBS
A testagem em massa passou a ser um procedimento preventivo, ainda que desordenado, como medida protetiva de combate à Covid-19. Tanto o teste de exame de sangue (no dedo) quanto o RT-PCR (narinas) começaram a ser disponibilizados no sistema público brasileiro, por drive thru e em postos e hospitais, como no mercado privado de farmácias e laboratórios. O Brasil, no entanto, acabou não tendo êxito nessa empreitada. Dados do Ministério da Saúde apontam que o Brasil seguiu realizando 105 testes para cada mil habitantes. O quantitativo é muito inferior a outros países do mundo. Esse número denota, para muitos especialistas, a adoção de um modo ineficiente de manter o rastreamento e monitoramento da doença. A estimativa é que, de abril de 2020 a dezembro de 2021, cerca de 66 milhões de testes tenham sido realizados. Calcula-se que a população adulta do Brasil seja de 160 milhões de brasileiros.
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segundo ato: a crise instaurada
por Bárbara Fontes
Créditos: Amanda Perobelli/Reuters
Com o comércio fechado, em diversos momentos da pandemia, houve evidente queda nas rendas das famílias e restrições impostas à atividade econômica. Isso trouxe um impacto negativo, há muito tempo não visto e até mesmo inédito em alguns setores da economia. Nas vendas, o grande vencedor foi o comércio on line, que registrou altos recordes no faturamento e a adesão de novos clientes. Segundo dados da Associação Brasileira de Comércio Eletrônico (ABComm), em parceria com a Neotrust, as vendas digitais tiveram um aumento de 68% em 2020. A pesquisa ainda apontou que cerca de 20 milhões de consumidores fizeram uma compra on line pela primeira vez em 2020 e que 150 mil lojas passaram a vender também por meio das plataformas digitais. Os dados não foram diferentes para o ano de 2021, período em que mais que dobrou o número de vendas digitais. Em entrevista ao site Uol, o economista Rodolpho Tobler, da Fundação Getúlio Vargas, explicou que esse processo acelerou a digitalização do ecommerce ao longo da pandemia, "justamente para minimizar os impactos negativos da queda de circulação de pessoas nas lojas físicas", observa.
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Créditos: Marcos Serra Lima/G1
Ignorando a proibição de permanência na areia por causa da pandemia do novo coronavírus, banhistas lotaram as praias país afora. No feriado de 12 de outubro de 2020, por exemplo, praias ficaram cheias em Pernambuco, Bahia, Ceará, Alagoas, Paraíba. No Rio de Janeiro, especificamente, o quadro de lotação seguiu de modo progressivo, na passagem da primavera para o verão, o que pode ter colaborado para o aumento expressivo no número de casos e mortes pela Covid-19, no findar do ano. No feriado de finados, a Europa retomava o confinamento com 70% da população em casa e o mundo chegava a 1,2 milhão de mortes. No Brasil, a população seguia aglomerando no cenário praiano, com 160 mil mortos.
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Créditos: Jornal O Globo
Em 15 de novembro de 2020 começaram as eleições municipais no Brasil. Na tentativa de evitar que o processo eleitoral propagasse ainda mais a doença, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) adotou medidas preventivas rigorosas. Dentre as medidas, destacou-se o uso obrigatório de máscara facial (quem chegasse ao local de votação com o rosto descoberto poderia ser barrado), uso do álcool em gel (o eleitor foi recomendado a passar o produto nas mãos antes e depois de votar), horário de votação ampliado (de 7h às 17h, sendo de 7h às 10h preferencial para idosos acima de 60 anos) e o uso da própria caneta para assinar o caderno de votações. No entanto, mesmo com todas as medidas restritivas, muitos eleitores se sentiram inseguros, optaram por não exercer o voto obrigatório e ficaram em casa.
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Créditos: Marcelo Casal Jr./ Agência Brasil
Em coletiva com o presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministro Luís Roberto Barroso - que aparece na imagem acima-, apontou como os números foram maiores que o desejáveis, levando em conta que as eleições foram feitas em meio a uma pandemia que consumira, até aquele momento, 170 mil vidas, e pessoas com temor deixaram de votar, muitas por medo, outras por estarem com a doença e muitas por estarem com os sintomas. Segundo dados da Agência Senado, a abstenção no processo eleitoral de 2020 foi a maior verificada nas últimas décadas. Um número bem superior aos processos eleitorais mais recentes (2018, 2016 e 2014), quando o índice ficou em torno de 21%. Número também muito superior ao verificado nos demais pleitos para prefeitos e vereadores em 2012 (19,12%), 2008 (18,09%), 2004 (17,3%), 2000 (16,2%) e 1996 (19,99%).
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Créditos: Agência Brasil
Na imagem anterior, vemos Bolsonaro e seu Ministro da Saúde, à época (Eduardo Pazuello), sem máscaras, durante o lançamento do plano de imunização contra Covid-19. O Ministério da Saúde anunciou neste dia, quarta-feira, 16 de dezembro, a inclusão da Coronavac, do Butantan, em uma lista chamada “adesão do Brasil às vacinas”. Em meio à politização do processo de imunização contra a Covid-19 e com o presidente Jair Bolsonaro liderando um discurso antivacina, esse anúncio se deu no Palácio do Planalto durante cerimônia para apresentação de uma nova versão do plano nacional de imunização. Apesar disso, o governo não havia afirmado, até então, se havia um acordo fechado com o Butantan. Na apresentação, o secretário de vigilância, Arnaldo Medeiros, citou que a lista envolvia planos de acordos e memorandos de intenção para possível compra.
Créditos: Isac Nóbrega/ PR
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terceiro ato: vacina como meta?
Jessica Martins do Nascimento Lucas França Mayara Santos Rafael Gutierrez Goncalves
Créditos: Jornal O Globo
Após meses de espera e atrasos na negociação da compra dos lotes de vacina devido à guerra política e à crise sanitária, finalmente chegou ao Brasil a primeira remessa, depois da aprovação do uso emergencial do imunizante pela Anvisa. No dia 17 de janeiro de 2021, a primeira pessoa foi vacinada contra a Covid-19 no país, a enfermeira Mônica Calazans, de 54 anos, voluntária e portadora de diabetes, obesidade e hipertensão, que trabalhava há oito meses na linha de frente do Instituto Emílio Ribas, em São Paulo. A enfermeira recebeu uma das doses da CoronaVac, desenvolvida pelo Instituto Butantan, em parceria com a farmacêutica chinesa Sinovac. João Dória, governador do estado de SP, aproveitou a ocasião (o evento) para capitalizar a iniciativa para seu governo. Na primeira fase de vacinação, o plano nacional previu como público prioritário os trabalhadores da saúde, idosos a partir de 80 anos, pessoas entre 75 e 79 anos e indígenas com mais de 18 anos. Dória, em novembro de 2021, venceu as prévias de seu partido (PSDB) e sairá candidado à presidência da república em 2022.
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Créditos: Bruno Kelly/Reuters
Desde o início da pandemia, Manaus sempre esteve dentre os estados que mais precisavam de cuidados. O aumento drástico nos casos de contaminação e internação por Covid-19 bateram recordes, pois pacientes precisaram ser enviados para regiões vizinhas, por conta da superlotação dos leitos de UTI. A capital amazonense vivenciou, nos dias 14 e 15 de janeiro, um colapso no sistema de saúde por conta da falta de oxigênio, essencial para tratar casos graves da doença. O colapso presenciado na capital, pela falta do insumo nas unidades de saúde, estendeu-se rapidamente para o interior do Estado. Um outro fator preocupante foi os cemitérios lotados, que levou à instalação de câmaras frigoríficas em hospitais de Manaus. Foram mais de 12 mil mortes confirmadas, nesse período. A classe artística, principalmente, foi decisiva na promoção de campanhas de doação de cilindos de oxigênio para mininimizar a crise na região.
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Créditos: Sérgio Lima/ Poder 360
Com as recorrentes falas negacionistas desde o início da pandemia, Jair Bolsonaro criticou o processo da vacinação no país com a seguinte frase em pronunciamento público: "Se você virar um jacaré, é problema seu". A "brincadeira" esteve associada a uma questionamento do presidente a respeito dos possíveis efeitos colaterais das vacinas contra o coronavírus, tomando como exemplo a da Pfizer/BioNtec. Inclusive, por conta dessa postura, houve demora na negociação com os laboratórios e a marca do imunizante demorou a chegar ao país (os primeiros lotes só vieram no final de abril). Fato é que, naquele momento, o número total de mortos e infectados voltava a bater recordes. Tomar a vacina e "virar jacaré" acabou virando um 'meme' altamente viralizado em redes sociais, adotado amplamente como um modo de "humor sarcástico". Na foto, tirada no dia 31 de janeiro de 2021, mulher musicista vai a um atoperformance, com cerca de 30 manifestantes, vestida de jacaré, na Praça dos Três Poderes, em Brasília.
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Créditos: Correio Brasiliense
No dia 15 de março de 2021, o presidente Jair Bolsonaro nomeou Marcelo Queiroga como o novo Ministro da Saúde. O cardiologista foi o quarto a ocupar o cargo desde o início da pandemia da Covid-19, sendo apresentado como um quadro técnico à população. Apesar de defender publicamente o uso de máscaras e o distanciamento social, Queiroga rezou, em muitas ocasiões, a cartilha de Bolsonaro. Num aceno de agrado ao presidente, esquivou-se em fazer declarações sobre tratamento precoce e uso da hidroxicloroquina. Virou testemunha na CPI da Covid e manteve, como depoente, discurso altamente evasivo, o que dificultou a apuração de informação para as investigações. O auge da ausência de decoro, no entanto, foi o ministro ter feito gestos obscenos a manifestantes que protestavam contra o governo brasileiro, em ocasião da ida dele em setembro, junto a comitiva e ao presidente, para a reunião da ONU, em Nova Iorque. Foi também lá diagnosticado positivo para Covid-19 e isto gerou grande constrangimento entre autoridades participantes do evento.
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Créditos: Arthur Stabile/UOL
O primeiro grupo a receber a vacinação no Brasil foi o de profissionais da saúde (cerca de 7,4 milhões de trabalhadores). Depois veio o grupo prioritário formado por idosos (acima de 60 anos), indígenas, quilombolas e ribeirinhos, mulheres grávidas e pessoas com comorbidades. O Brasil iniciou o calendário de vacinação de idosos em fevereiro de 2021. No caso da faixa etária da terceira idade, atendeu, primeiramente pessoas com mais de 90 anos (cerca de 890 mil pessoas), depois de 80 (cerca de 3 milhões de pessoas), 70 (cerca de 9 milhões de pessoas) até chegar a mais de 60 anos (16,8 milhões de pessoas). Fechou o ciclo de duas doses em julho de 2021, atendendo mais de 80% desse contingente. Indivíduos com comorbidades e gestantes juntos contabilizam em torno de 22 milhões de pessoas. A população indígena estimada pelo Ministério da Saúde, que deveria ter sido vacinada, seria de 414 mil. Já os quilombolas e ribeirinhos somariam cerca de 1,8 milhões. Dados recentes apontam que somente 48% dos indígenas, ribeirinhos e quilombolas tiveram acesso à vacinação completa. Essa baixa aderência pode ter relação com a presença massiva desses grupos em locais de difícil acesso, concentrados no Norte do país.
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Créditos: Agência Senado
A CPI da Covid, um dos principais acontecimentos políticos do ano de 2021, foi criada, no âmago do senado federal, para investigar supostas omissões e irregularidades nas ações do governo federal durante a pandemia de covid-19 no Brasil. Iniciou seus trabalhos, oficialmente, em 27 de abril de 2021 e concluída, com a apresentação e votação do relatório final, no dia 26 de outubro de 2021. Teve o senador Omar Aziz como presidente e os senadores Randolfe Rodrigues e Renan Calheiros como vice-presidente e relator, respectivamente. O relatório da investigação teve mais de 1000 páginas, com destaque para a omissão do governo na compra de vacinas, todos os pontos envolvendo o tratamento precoce e o caso da Prevent Senior, o caso de corrupção na compra da vacina indiana Covaxin, além de indiciar por crimes 78 pessoas e 2 empresas privadas, inclusive o presidente da república Jair Bolsonaro.
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Créditos: Jornal O Vale
No dia 25 de junho, a CPI ouviu os irmãos Luis Miranda, deputado federal, e Luis Ricardo Fernandes Miranda, chefe da divisão de importação do Ministério da Saúde, levando a público um suposto esquema fraudulento na compra da vacina indiana Covaxin. Em depoimentos para CPI e para importantes veículos de imprensa, os irmãos denunciaram indícios de fraude em notas fiscais que seriam direcionadas para a empresa Madison Biotech, sediada em Singapura num paraíso fiscal e pertencente a um laboratório cujo não constava no contrato. Ainda segundo Luis Miranda, o presidente Jair Bolsonaro, seu filho Eduardo Bolsonaro e o então ministro da saúde, Eduardo Pazuello, foram alertados à época.
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Créditos: Fábio Rossi/ Agência O Globo
No dia 19 de junho de 2021, o Brasil chegou a 500 mil vidas perdidas pela covid-19, desde o início da pandemia. O levantamento feito pelo consórcio de veículos de imprensa apontou 17.822.659 casos confirmados até então. Em números absolutos, somente os EUA tiveram mais vítimas da covid nesse período, com mais de 600 mil pessoas mortas. O presidente da república, Jair Bolsonaro, manteve silêncio no dia em que o país atingiu a triste marca, se pronunciando apenas dois dias depois do ocorrido, quando voltou a defender o tratamento precoce. Esses números são muito significativos para mensurar percentuais da população brasileira. O IBGE aponta, por exemplo, que, dos 5.570 municípios do Brasil, só 49 têm mais de 500 mil habitantes. Em números absolutos, o Brasil perdeu 0,23 % de sua população para a doença.
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Créditos: Uol
No dia 17 de julho, o Brasil completou 6 meses de vacinação e até esse dia mais de 41% dos brasileiros já haviam recebido ao menos uma dose da vacina. A população adulta, entre 18 e 59 anos, cumpriu um extenso ciclo, entre os meses de abril a novembro de 2021, para garantir as duas doses. Faltou insumos, houve atraso na entrega de lotes. As estatísticas apontam o seguinte quadro, em dezembro de 2021: 320 mil doses aplicadas (somando a primeira dose, a segunda, a única e a de reforço) , 139 mil pessoas completamente vacinadas, o que corresponde a 65,6% da população adulta brasileira. Ao esmiuçar os dados, temos ainda 77,1% da população com ao menos uma dose e 9,6% com a dose de reforço.
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Créditos: Marcelo Camargo/ Agência Brasil
Um dos indicadores sociais mais afetados pela pandemia foi a geração de empregos. No trimestre que se encerrou em maio, o Brasil fechou a taxa de desemprego em 14,6% de acordo com o IBGE. O número de 14,8 milhões de brasileiros à procura de emprego foi o segundo maior desde 2012, quando se começou a contabilizar essa série, ficando atrás apenas do trimestre anterior. Outro indicador que apresentou números preocupantes foi o de desigualdade social. Em levantamento feito pela FGV Social, o primeiro trimestre do ano renovou o o recorde histórico, com o índice de Gini crescendo 0,674. Dados de novembro de 2021 apontam que, num ranking com 44 países, o Brasil tem a 4ª maior taxa de desemprego do mundo.
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Créditos: Arquivo/ Agência Brasil
Além da crise política e econômica, a insegurança alimentar foi uma das principais adversidades do período pandêmico. Em estudo divulgado em 2021 pela Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional (Rede Penssan), quase 20 milhões de brasileiros passam 24 horas sem se alimentar em alguns dias e cerca de 55% da população sofria de algum tipo de insegurança alimentar no período que se fechou em dezembro de 2020. Em contrapartida, o bolsa-família, única fonte de renda de diversas famílias brasileiras, não acompanhou o aumento da inflação e o benefício não sofre reajuste há mais de três anos.
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Créditos: Helene Santos/ Diário do Nordestel
O enfrentamento popular frente à pandemia teve mais um empecilho em 2021. Isso porque o Brasil apresentou o menor nível de chuvas em 90 anos, corroborando com uma crise hídrica e acendendo o alerta na população com a bandeira tarifária no vermelho. em todo o país. Com os reservatórios mais afetados sobretudo as hidrelétricas das regiões Sudeste e CentroOeste, o aumento da taxa de luz para R$ 9,49 por 100 KWh consumidos, atingiu de modo ostensivo as regiões que possuem, juntas, cerca de 50% da população brasileira, de acordo com pesquisa do IBGE em 2019. Em 2022, o quadro tende a piorar. A conta de luz deve sofrer, em média, reajuste de 19% no ano que vem, por conta da alta de custos da geração de energia, provocada pela seca.
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Créditos: Gazeta do Povo
Em agosto de 2021, a gasolina sofreu seu nono reajuste no ano. O preço médio do combustível girou em torno de R$ 6,40, cerca de R$ 2,00 a mais em comparação ao mesmo período no ano anterior. A alta nos preços se deve entre outros fatores, à política de Preço de Paridade Internacional (PPI), imposta pela Petrobras, com base na variação do petróleo no mercado internacional, fixado no dólar. Além disso, os impostos federais e estaduais e o lucro dos postos de combustíveis também são fatores importantes na fixação do preço. O papel do Governo Federal no aumento dos preços, sendo o principal acionista da Petrobras seria a não intervenção na política do PPI. O presidente Jair Bolsonaro, inclusive se eximiu de culpa, atribuindo o aumento ao tributo estadual ICMS e atacando os governadores. No entanto, fato é que o caixa da União se beneficiou fortemente da alta do preço da gasolina, do diesel, do etanol e do botijão de gás. Engordou os cofres do governo federal, que devem arrecadar ao menos R$ 70,1 bilhões até o fim deste ano com os recursos vindos do setor. Em dezembro, nas principais capitais brasileiras, a gasolina chegou ao preço médio de R$ 7,50 reais.
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quarto ato: é a vida voltando ao normal?
Alexandre Almeida Juliano Júnior Ana Beatriz do Nascimento Rosa
Créditos: Prefeitura de Niterói
Em setembro, o Ministério da Saúde aprovou que adolescentes de 12 a 17 anos tomassem a vacina da Pfizer - o grupo representa mais de 20 milhões de pessoas no Brasil. Em meados do mesmo mês, o governo Jair Bolsonaro mudou as regras da campanha de imunização contra a Covid-19 e passou a indicar que adolescentes sem comorbidades não fossem vacinados. Alguns dias depois, houve um recuo nesta decisão, quando foi comprovado que a morte de uma adolescente de 16 anos no interior de São Paulo não tinha relação com a vacina e que os benefícios seriam maiores que os riscos dos efeitos adversos. Aliada a essas informações, existia também o risco crescente de exposição ao vírus por conta da volta às aulas presenciais. No estado de São Paulo, em novembro, cerca de 1 em cada 4 testes RT-PCR feitos em jovens de até 17 anos da rede pública era positivo para o vírus.
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Créditos: Revista Examee
No dia 7 de setembro, data em que se comemoraria a Independência do Brasil, Bolsonaro incentivou uma aglomeração sem precedentes, comparecendo a protestos que ocorreram a favor do governo em todo o país. Em discurso para 125.000 pessoas, num palanque montado na Avenida Paulista (SP). o presidente ameaçou abertamente o STF (Supremo Tribunal Federal) , ao dizer que não seguiria mais as ordens judiciais do ministro Alexandre de Moraes. Além de outras falas, afirmou categoricamente que "nunca será preso" por "canalhas". O fim da manifestação foi marcado por bolsonaristas que, além de exaltados, agrediram e expulsaram jornalistas do evento. Jair Bolsonaro foi multado pela sétima vez por não usar máscara em São Paulo.
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Créditos: Jornal El País
No dia 02 de outubro, pouco mais de 3 semanas após a comemoração da independência do Brasil, cerca de 100 mil pessoas se reuniram na Avenida Paulista (SP) com a finalidade de protestar contra o presidente Jair Bolsonaro. A manifestação contou com a presença de alguns líderes de esquerda, como Fernando Haddad (PT), Guilherme Boulos (PSOL) e Ciro Gomes (PDT). Haddad se pronunciou afirmando que o motivo do protesto estava acima de qualquer partido político. "Nós estamos aqui em nome de uma causa suprapartidária. Se formos nos deixar levar por isso, vamos perder uma causa maior, que é a luta pela justiça e pela democracia. E hoje não temos no Brasil nem justiça e nem democracia."
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Créditos: G1
Em setembro, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) viajou a Nova York, com grande comitiva, para participar da 76a Assembleia Geral da ONU. A viagem foi marcada pelo seu negacionismo característico. Em seu discurso, defendeu, de modo evasivo, uma 'política ambiental' para o Brasil e o tratamento precoce contra a Covid-19. Posicionou-se contra o "passaporte de vacina". O prefeito da cidade o marcou numa publicação em redes sociais, indicando locais de vacinação e, por não estar vacinado, precisou comer pizza em pé, na rua, pois foi barrado em restaurantes, junto a alguns membros de sua extensa comitiva (18 pessoas), que incluía o Ministro da Saúde, Marcelo Queiroga (contaminado com a Covid durante a viagem). Também houve a presença de manifestantes na porta do hotel de Bolsonaro, os quais foram chamados de "acéfalos' por ele em suas redes sociais.
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Créditos: Nelson Almeida (AFP)
Documentos vazados, a partir de 3 de outubro de 2021, nas investigações da Pandora Papers, operação jornalística conduzida pelo Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos, trouxe à tona a existência de diversas empresas offshore de importantes figuras públicas brasileiras. O ministro da Economia, Paulo Guedes, foi um dos acusados em manter empresas em paraísos fiscais fora do Brasil. Guedes aparece como acionista da empresa Dreadnoughts International Group, registrada nas Ilhas Virgens Britânicas. Os documentos revelam que o ministro possuía em 2014 pelo menos oito milhões de dólares (43,3 milhões de reais, pelo câmbio atual) investidos na companhia, registrada em seu nome e nos de sua esposa, Maria Cristina Bolívar Drumond Guedes, e filha, Paula Drumond Guedes. Esse número subiu para 9,5 milhões no ano seguinte, segundo as informações obtidos pela investigação. O ministro afirmou não ter feito nada de errado em relação a sua sociedade extraterritorial. Declarou ter deixado a sociedade no final do ano de 2018, sem apresentar, contudo, documentos comprobatórios a esse respeito.
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Créditos: Agência Brasil
No dia 30 de outubro de 2021, o presidente Jair Bolsonaro participou da Reunião de Cúpula do G20, congregação que engloba as 19 maiores potências mundiais e a União Europeia, em Roma, na Itália. Em seu discurso, o presidente se contradisse e omitiu informações sobre a própria vacinação e recessão econômica brasileira. Exaltou o avanço da imunização no Brasil, mas deixou de lado o fato de que ele mesmo não se vacinou. Também omitiu que o país era o segundo no ranking com mais mortes pela doença no mundo, atrás apenas dos Estados Unidos. Na sequência, afirmou ainda que seu governo implantou uma agenda econômica eficiente para superar os feitos da crise econômica causada pela pandemia. Ignorou, nesse contexto, a evidente alta nos preços, o aumento da inflação e o crescente desemprego. No evento, Bolsonaro esteve isolado e não participou da foto oficial de líderes do G20, na Fontana di Trevi.
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Créditos: Breno Esaki/Agência Saúde-DF
A dose de reforço da vacina contra Covid-19 foi aprovada pelo Ministério da Saúde para toda a população adulta, com início, em setembro de 2021, para a população idosa (maiores de 60 anos), profissionais da saúde e imunossuprimidos. O ministro da saúde, Marcelo Queiroga, anunciou, em 16 de novembro, que a terceira dose seria liberada para todos os maiores de 18 anos. O intervalo entre as doses, que era de 6 meses entre uma aplicação e outra, passou a ser de 5 meses, a fim de acelerar o processo de imunização. Resta saber se, até início de 2022, teremos dados que apontem uma boa taxa de proteção em massa a essa atual população de mais de 130 mil vacinados com a segunda dose. O Ministério da Saúde declarou que, por enquanto, a partir do próximo ano, apenas dois imunizantes fazem parte do Plano Nacional de Imunização (PNI): Pfizer e Astrazeneca. Já as marcas Coronavac e Janssen poderão integrar a campanha nacional de vacinação caso obtenham o registro definitivo na Anvisa.
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Créditos: Manuela Scarpa/ Brazil News
Em momentos de esperança, pela ampliação da vacinação da população, os tempos sombrios insistem em permanecer. Por um lado, temos, no findar do ano de 2021, uma expressiva melhora com a baixa taxa de ocupação de leitos de UTI e a redução do número de mortes pelo coronavírus. Uma sensação de vida voltando ao normal, com casas de shows e artistas a todo vapor, comércio e viagens internacionais liberadas (com o passaporte da vacina). Esses são alguns dos elementos de liberdade que estão sendo ameaçados por uma nova onda que assola outros países e espreita o Brasil (a ômicron). Especialistas dizem que a ideia de vida normal para 2022 deve ser repensada para que possamos evitar ter de passar por tudo novamente. Comemorações coletivas, que geram aglomeração, como o Carnaval e Réveillon, já estão sendo canceladas por todo o país. Na foto acima, a artista Cláudia Leitte, em show na capital paulista para uma multidão, no dia 27 de novembro de 2021, foi muito criticada, por ter tido uma evidente plateia de centenas de pessoas sem máscaras de proteção facial.
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Créditos: BBC (Getty Image)
O mês de dezembro começa com o alerta mundial de que a nova variante da covid 19, a ômicron, presente em 63 países, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), parece se propagar mais rápido que a delta, mas de modo mais brando: os contaminados têm apresentado sintomas mais leves da doença. A variante foi descoberta em 11 de novembro de 2021, na Botsuana, país que faz fronteira com a África do Sul, onde a cepa também foi encontrada dias depois e se alastrou. Numa tentativa de conter a disseminação do vírus, diversos países, entre eles os EUA, todos os 27 membros da União Europeia (UE) e o Brasil, impuseram restrições para viagens com origem na África do Sul e vizinhos. Japão e Israel chegaram a fechar suas fronteiras paras estrangeiros. Em entrevista ao site G1, Margareth Dalcolmo, pneumologista e pesquisadora da Fiocruz, aponta a principal medida de proteção para o caso brasileiro: ‘Importante é que nós tenhamos certeza de que para entrar no Brasil as pessoas estejam vacinadas.’.
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