Cumanana IV - POR

JULHO 2021

NÚMERO 4

Cumanana BOLETIM VIRTUAL DA CULTURA PERUANA PARA A ÁFRICA MINISTÉRIO DE RELAÇÕES EXTERIORES

A CONJUNTURA DA INDEPENDÊNCIA Os afrodescendentes no processo de independência

MULHERES ESPANHOLAS E MOURAS NO SÉCULO XVI Influência do norte da África no Peru colonial

RECEITA sabores peruanos de influência africana

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A CONJUNTURA DA INDEPENDÊNCIA E AS PRIMEIRAS DÉCADAS REPUBLICANAS * MARIBEL ARRELUCEA BARRANTES E JESÚS COSAMALÓN AGUILAR HISTORIADORES, ESPECIALIZADOS EM ESCRAVIDÃO, IDENTIDADE E GÊNERO (ARRELUCEA), E HISTÓRIA SOCIAL E DEMOGRÁFICA DO PERU ENTRE OS SÉCULOS XVIII E XX (COSAMALÓN) A conjuntura de protestos e fortes movimentos políticos e sociais do final do século XVIII se prolongou com as guerras de independência e as lutas dos caudilhos, gerando novas oportunidades de erosão da escravidão: das fugas, banditismo –agora com um novo tom político– e palenques, às possibilidades de uso da linguagem liberal. Um aspecto interessante foi também a possibilidade de percorrer novos caminhos para a liberdade e a ascensão social. Por exemplo, muitos africanos e afrodescendentes juntaram-se às tropas monarquistas e patrióticas sob a promessa de liberdade, embora isso não tenha sido cumprido em todos os casos.

Para Andrews (2007: 98), o século XVIII foi uma experiência difícil com grandes lições para as autoridades hispano-americanas, portanto, a política em relação aos africanos e afro-descendentes foi matizada ao longo do tempo. Por exemplo, no final do século XVIII eles foram incorporados às forças militares monarquistas, eliminando vários requisitos e oferecendo várias vantagens. No entanto, a independência nacional foi rapidamente associada à liberdade e à abolição da escravatura, um aspecto perceptível em algumas referências. Por exemplo, em 1818, o vice-rei relatou em uma carta que os escravos de Lima haviam "optado abertamente pelos rebeldes, de cujas mãos aguardam a liberdade".

O medo da desordem decorrente do descontrole dos escravos e da possibilidade de revoltas precederam as guerras de independência, especialmente na capital do vice-reinado. No entanto, além de rumores e intenções, as autoridades mantiveram Lima como uma praça sólida (Bonilla e Spalding, 1972; Lynch, 1976; O'Phelan, 1988; Fisher, 2000; Basil, 1980). Em épocas anteriores, esse esforço também foi detectado. Por exemplo, durante o século XVII em Cusco, numerosos afrodescendentes chamados "mulatos livres" entraram nas oficinas de artesãos como aprendizes para conhecer o ofício.

Conforme detalhado por Tardieu, eles foram colocados por seus pais, mães, avós e ex-proprietários com um contrato notarial (1998: 143-144). Hall, um marinheiro inglês que visitou Lima em 1821, assinalou que a elite de

Lima vivia aterrorizada com a possibilidade de um motim, que ele não considerava possível: «A crença, da intenção espalhou-se e acolheu com o desejo doentio de terror, que a população escrava da cidade, ela planejava aproveitar a ausência das tropas para se levantar em massa e massacrar os brancos. Quanto a mim, não acredito que isso tenha sido possível porque os escravos nunca tiveram tempo de tomar tal medida e seus hábitos não eram de união e companhia, sendo todos servos e espalhados por uma vasta cidade, com raríssimas ocasiões de tratamento sigiloso. "(citado por Contreras e Cueto, 2007: 53).

Os dois líderes do processo de independência, José de San Martín e Simón Bolívar, inicialmente simpatizaram com a eliminação da escravidão ao recrutar centenas de escravos africanos e afrodescendentes como soldados sob a promessa de liberdade. Posteriormente, eles mudaram de posição, aplicando medidas graduais como "Liberdade das barrigas" e ao mesmo tempo aprovaram leis rigorosas para controlar e sancionar a população escrava e livre. Tanto San Martin quanto Bolívar concordaram que a escravidão era uma herança lamentável do passado colonial, mas difícil de eliminar naquela época (Andrews, 2007: 100; Aguirre, 2005: 163). Porém, africanos e afrodescendentes aproveitaram as oportunidades dessa nova conjuntura histórica e se uniram aos dois lados. Assim, Hünefeldt se perguntou qual era o elemento político unificador: a origem africana?

As experiências de ser escravos?

Reconhecendo-se como 'negro'? Ou a convergência de todos os itens acima? Ela propôs

Tapada limeña Francisco “Pancho Fierro” (ca. 1840) (C) Google Arts & Culture

PÁGINA 2 que aqueles que decidiram ser os soldados do rei foram os africanos Focinho, enquanto aqueles que ficaram do lado dos exércitos independentes eram os escravos e livres africanos com experiência de artesãos, confrades, mercadores e empregados domésticos (2010: 271).

Pertencer às fileiras dos dois lados trazia diversas vantagens como jurisdição militar, exercício de certo grau de autoridade, mobilidade territorial, renda salário e direito consensual de saque - e prestígio. Quase metade do esquadrão de Lorde Cochrane e dois terços do exército de San Martin eram descendentes de africanos; O general Miller, em suas memórias, observou que eles eram soldados que se distinguiam por sua coragem, perseverança e patriotismo (citado por Tardieu, 2004: 24). Numerosos escravos de Ica, Chincha e Cañete fugiram de suas fazendas para se juntar ao recémchegado exército de San Martín. Por exemplo, os escravos da Fazenda Caucato formaram uma tropa patriótica conhecida como "Los infernales" por usar chapéus e ponchos vermelhos, destacando-se por sua bravura. Um dos poucos nomes que sobreviveu é o de Ildefonso, um escravo de Chincha, que realizava missões de espionagem na costa central. Ildefonso foi enviado em missão a Pisco, onde foi descoberto pela cavalaria espanhola; sendo perseguido, atirou-se ao mar aos gritos que preferia "morrer mil vezes pela causa do país a obedecer a um espanhol". Depois de resgatado seu corpo, ele foi enterrado como um herói por seus companheiros de armas (Tardieu, 2004: 26).

Por sua vez, as tropas monarquistas também incorporaram afrodescendentes. Para atrair mais escravos e libertos, o vice-rei Joaquín de la Pezuela prometeu-lhes liberdade em troca de cinco anos de serviço contra os inimigos: «Serás vestidos, alimentados, pagos e considerados como as tropas veteranas do Exército Nacional ”(Citado por Tardieu, 2004: 26).

Posteriormente, temendo que San Martín atacasse Lima, o vice-rei La Serna alistou 1.500 escravos da cidade e arredores, prometendo-lhes a liberdade após seis anos de serviço (Anna, 2003: 227).

Foi, no entanto, um novo cenário onde africanos e afrodescendentes adquiriram uma nova linguagem para litigar nos tribunais, outros se revoltaram nas fazendas exigindo liberdade ou o direito a um tratamento melhor.

Aguirre estudou o que considera um "despertar jurídico" em africanos e afrodescendentes porque aprenderam que sua condição não era "natural" ou irreversível e que poderiam apelar à justiça quando seus direitos fossem violados (Aguirre, 1990: 152). Coincidentemente, para Hünefeldt, as lutas pela independência desencadearam os laços de dominação e forneceram uma nova linguagem para o litígio e a negociação (1979b: 82).

As três raças ou A igualdade perante a lei Francisco Laso de los Ríos (ca. 1859) (c) Museo de Arte de Lima

Outros escravos aproveitaram a oportunidade para se libertar formando milícias não tão disciplinadas e gangues temíveis que aprenderam a negociar com os senhores da guerra em serviço ou a vagar por conta própria, percorrendo o território nacional e desafiando a ordem frágil dos primeiros anos republicanos (Walker, 1990 : 116120; Aguirre, 2005: 165). Suas vítimas eram pessoas comuns e fazendeiros, cobradores de impostos e burocratas. Por exemplo, o coronel da milícia de Santa, Ángel González del Riego, foi morto com 23 facadas por seus escravos, forçando a intervenção das tropas da fragata Monteagudo. Da mesma forma, em 1835, um piquete de escravos de Cañete percorreu as fazendas para libertar os trabalhadores escravizados (Walker, 1990: 124-125). A documentação disponível apenas os menciona como bandidos, assassinos e montoneros, hoje diríamos que são libertadores porque tentaram eliminar a escravidão sem esperar decretos do Estado.

Entre o rescaldo do vice-reinado e a república, viveram numerosos afrodescendentes que ascenderam, ganharam estatuto e gozaram de prestígio público, em meio a esses anos turbulentos. Alguns eram músicos, pintores, professores de dança, intelectuais, religiosos, entre outros, que viveram entre a sociedade colonial e republicana.

Entre os mais destacados encontram-se José Manuel Valdés (músico, médico e político), José Gil de Castro (retratista) e Francisco “Pancho” Fierro (pintor tradicional).

* Extrato do artigo original, disponível em La Presencia Afrodescendiente en el Perú, Séculos XVI-XX, Ministério da Cultura, 2015, pp. 90-97

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TENSÕES NAS ORIGENS DO PERU COLONIAL. ESPANHOLAS E MOURAS NO SÉCULO XVI* LEYLA BARTET. ESCRITORA Y SOCIÓLOGA A sociedade pré-colonial aparece, desde o início, como uma sociedade dividida. Esta fratura deverá estender-se por toda a Colônia e depois da Independência deverá assumir novas formas durante a República. A separação entre vencedores e vencidos e as bases jurídicas que a sustentam dificultam o funcionamento interno do sistema colonial desde uma fase inicial. O especialista francês Bernard Lavallé defende, com razão, que o século XVIII foi o mais representativo do conflito étnico e, portanto, acolheu levantes e movimentos diversos que atestam a difícil evolução para uma miscigenação complexa e disputada. (…)

A atitude dos conquistadores nos primeiros anos, sua relativa rejeição à miscigenação e a vontade de trazer mulheres europeias para garantir a formação de uma sociedade hispânica no Peru são elementos interessantes nesta busca. Mas, sem dúvida, a questão crucial é que os primeiros "espanhóis" a cumprir essa função essencial são na verdade escravos mouros, que os hispânicos preferiram às mulheres indígenas quando chegaram ao Peru. As razões dessa preferência devem ser buscadas na história da relação da Espanha católica com a ideia de alteridade e no "projeto" de sociedade que elas trouxeram.

As características da presença mourisca no país constituem o eixo deste trabalho.

Espanha na América É preciso insistir em um aspecto fundamental: o que chega da Espanha à América com a conquista está longe de ser homogêneo. A Espanha está permeada e marcada por sua relação de oito séculos com a brilhante civilização de al-Andalus primeiro e, posteriormente, com as negociações e conflitos de tipo político-militar estabelecidos entre a Taifa e os reinos cristãos.

O conceito de alteridade que o conquistador traz é herdeiro de sua relação com o árabe. Basta uma rápida olhada nos textos dos primeiros cronistas. Por exemplo, Pedro Cieza de León designa os templos indígenas como “mesquitas”. Bernal Díaz del Castillo também afirma que o expedicionário Francisco Hernández de Córdoba

descreve a primeira grande cidade asteca que encontra a caminho de Tenochtitlán como "Grande Cairo" e o próprio Cortez a compara a Granada. (…)

Segundo o historiador peruano Nelson Manrique, os mouros que vêm para a América, com algumas exceções, pertencem a uma condição modesta. Entre os conquistadores presentes em Cajamarca apenas um, Cristóbal de Burgos, teria sido de origem mourisca. Não há confirmação de mais nada. Mas, como indica o historiador Guillermo Lohman, detectar com certeza a presença de mouros no vice-reino é quase impossível porque a maioria deles tinha nomes espanhóis. Aqueles que chegaram ao longo do século XVI o teriam feito como escravos, a maioria dos quais eram mulheres. (…)

Os mouros, escravos de ascendência muçulmana, eram em sua maioria berberes caucasianos, espanhóis de nascimento e convertidos ao cristianismo. Eles tinham o espanhol como língua materna. Os mulatos - já cultivados - geralmente nasceram na Espanha ou em uma antiga colônia. As escravas de ambos os tipos que se tornaram amantes dos espanhóis conquistaram sua liberdade em pouco tempo e ocuparam seu lugar entre os espanhóis, o que foi relativamente fácil, considerando seu local de nascimento. (…)

“Alguns permaneceram em posições marginais, como servos, outros assumiram o papel de espanhóis e houve alguns que alcançaram uma condição social elevada” (Manrique, op. Cit.). Um bom exemplo deste último é o caso citado pelo historiador José Antonio del Busto. É sobre Dona Beatriz de Salcedo que, apesar do sobrenome, era mourisca. Lockhart, que também cita o caso, afirma que ela veio para o Peru em 1532 como escrava conhecida sómente como Beatriz. A concubina do feitor de Pizarro, García de Salcedo, acabou-se casando com ela, legalizando seu status. Beatriz de Salcedo se tornou a primeira mulher falante da língua espanhola da cordilheira dos Andes. Ele acompanhou sua concubina a Cajamarca quando o inca Atahualpa ainda estava preso´

PÁGINA 4 no Peru, depois de recuperar alguns grãos mal moídos de uma certa farinha que veio da Espanha. De fato, um documento oficial assinado pelo vice-rei Conde de Nieva reconhece que não foram as hidalgas castelhanas que introduziram o cultivo do trigo no país, mas as escravas mouras. Mas o assunto é delicado, pois quase todas as espanholas que chegaram ao Peru antes de 1537 mouriscas ou não - reivindicaram a mesma homenagem. (…)

Com o passar dos anos, a presença dos mouros foi diluindo-se. Mas seus vestígios ainda são encontrados em 1554, quando a moura Lucía de Herrera serviu de avanço do caudilho Francisco Hernández Girón, líder da revolução de 1554. E em 1560 a Inquisição entregou vários mouros à justiça ordinária.

Senhora com mantilha Estudo Muñíz y Charton (ca. 1869) (C) Museu de Arte de Lima

e conseguiu estabelecer uma certa amizade com as irmãs e mulheres do deposto inca. Ela mesma relata o encontro deles: "Porque como fui a primeira mulher a entrar neste reino, em Casamalca, estive com eles e tratei e conversei com eles.

Que esta testemunha sabe bem porque esteve e viveu muitas vezes com eles. Ela morava com eles porque cuidavam para que ela não morasse com os homens do anfitrião".

Depois de uma estadia em Cajamarca e outra em Jauja, ela se estabeleceu em Lima com o marido em uma casa localizada em frente à do governador, perto do rio Rimac.

Visto que os oficiais reais não deviam ser mercadores, ela cuidava principalmente dos negócios do feitor. Ali a escrava viveu as agonias de seu senhor que, in articulo mortis, casou-se com ela para torná-la herdeira de sua encomienda de índios. Beatriz de Salcedo —que tinha vocação de dona— tornou-se assim uma exceção nas Índias Ocidentais: a única encomendera e mourisca da história da América. Mas Del Busto atribui-lhe outro mérito: o de ter sido quem semeou trigo pela primeira vez

Em conclusão Não queremos deixar de evocar aqui a difícil natureza da miscigenação hispano-indígena no Peru desde o início do Vice-Reino. Foi uma sociedade muito estratificada, marcada por castas e raças, estratificação que persistiu por toda a Colônia e não desapareceu com a Independência. (…) Por volta de 1570, quando terminou a Conquista, o país estava ocupado por uma extrema minoria de emigrantes brancos e crioulos. Não são mais de 150 mil que, somados aos 250 mil escravos negros e mulatos, chegam a apenas 5% da população total. O Peru do vice-rei Toledo é maciçamente indiano. Mas em 1650 já existem tantas "castas" quanto índios. Em geral, do século XVI ao XVIII, a população indígena diminuiu e os vários cruzamentos aumentaram. Essas fraturas étnico-culturais continuam após a Independência, conduzindo a uma república que, para além de seus esforços para finalmente se tornar um estado multicultural de cidadania compartilhada e equilibrada, continua a sofrer de forma velada e perversa, racismo e assimetrias.

* Extrato do artigo original, disponível em "Mujer e Independencias", Centro Virtual Cervantes, 2016, https://cvc.cervantes.es/literatura/mujer_independencias/bartet01.htm

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RECEITA: PICARONES Novamente para retomar, para o bairro que eu deixei, a velha guarda é, os meninos de ontem.

Não existem mais os picarones, da boa Isabel, Tudo, tudo, se foi os anos correndo.

Felipe Pinglo, De volta ao bairro, 1934

INGREDIENTES Abóbora - 1 quilo Batata doce - 750 gr Fermento Seco - 10 gr Farinha não preparada - 650 gr Açúcar - 60 gr Anis - 2 colheres de sopa Água de abóbora - 100 ml Água de batata doce - 200 ml Sal - 1 colher de chá PREPARAÇÃO

Numa panela, adicione a batata-doce cortada em cubos. Adicione água e cozinhe em fogo médio por 10 minutos.

Reserve a água do cozimento. Bata a abóbora cozida até formar um purê. Em outro recipiente, adicione a abóbora cortada em cubos. Cubra com água e cozinhe em fogo baixo por 10 minutos. Reserve a água do cozimento. Bata a abóbora cozida até formar um purê.

Em outro recipiente, misture 200 mililitros de água de batata-doce (quente) e 100 mililitros de água de abóbora (quente). Adicione o anis, o açúcar , o sal e o fermento seco. Integre para infundir. Despeje 500 gramas de purê de abóbora e 300 gramas de purê de batata-doce e integre até que não haja mais caroços. Adicione a farinha previamente peneirada. Misturar.

Bata a massa, tampe e guarde em local aquecido por 2 horas. Em seguida, descubra e bata a massa novamente. Cubra e guarde em local aquecido por mais 2 horas. Então, a massa deve ficar com uma textura amelcochada.

Num copo d'água, adicione 1 colher de sopa de sal, integre e reserve. Esta solução vai servir para molhar os dedos e evitar que a massa grude no manuseio.

Frite os pedaços da massa em fogo médio alto. Espere a massa inflar e faça furos com um palito.

Sirva os picarones cobertos de mel