CUMANANA XXXVII-POR

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Cumanana

Boletim Virtual da Cultura Peruana para a África MINISTÉRIO

DAS RELAÇÕES EXTERIORES

Artigo 1:

Entre souks e ccatus: o legado cultural e o pechinchar no

"Nesse bairro viviam as vendedoras da praça do mercado, os operários e carregadores que trabalham em funções cívicas, os gendarmes, os empregados das poucas lojas de comércio; ali estavam os armazéns onde se alojavam os litigantes dos distritos, os tropeiros e os viajantes mestiços. Era o único bairro onde havia “chicherias” (casas onde se vende a bebida ‘chicha’). Aos sábados e domingos tocavam harpa e violino nas de maior clientela, e dançavam huainos e marineras.

José María Arguedas, "Los ríos profundos", 1958.

Por um lado, os souks marroquinos –denominação dada aos mercados de rua tradicionais dos países árabes –, desde a sua origem na época medieval, têm sido o epicentro do comércio e da vida urbana em cidades como Marraquexe, Fez e Tânger. Como destaca um autor anônimo, "para o marroquino, o Souk é tão necessário quanto o alimento: nele busca notícias, nele resolve problemas familiares; nele adquire compromissos ou faz contratos" (Azzuz, 1952, pp. 66). Nessa linha, a estrutura – tanto espacial quanto social – desses mercados tem estado intrinsecamente ligada aos princípios norteadores da religião islâmica. Ainda que a ocupação espanhola e a influência francesa tenham introduzido uma série de reformas comerciais que desafiaram as dinâmicas tradicionais, o reconhecimento dos valores

Fuente: sciendo.com O Souk na Praça Rahba Kedima - uma parte turística da medina de Marraquexe

Diferentemente da época colonial, com a independência do Marrocos em 1956, o objetivo de manter a autenticidade e integridade dos mercados de rua tradicionais ficou fora da política urbana, através da bazarização e da terceirização – entendidas como o abandono da fabricação de produtos e o auge da pura comercialização destes –, e a boutiquização – ou a venda de bens de luxo a preços elevados e a comercialização de produtos falsificados ou de baixa qualidade, mas atrativos para os turistas (Kania e Kalaska, 2018). Embora essas mudanças provocadas pelo desenvolvimento da indústria turística em um contexto globalizado tenham se aprofundado desde o início do século XXI, a inclusão de diversas cidades marroquinas na Lista do Patrimônio Mundial da UNESCO permitiu que tanto as tradições quanto os produtos locais voltem a assumir um papel central nas dinâmicas do comércio e do turismo dos souks.

Neste contexto – embora originário das práticas comerciais dos souks e mercados medievais –consolidou-se o pechinchar como forma de estabelecer relações e garantir justiça nas transações, refletindo a arte da negociação que era essencial no comércio transaariano. Ainda que as regras informais do pechinchar tenham evoluído, a habilidade de negociar preços segue sendo uma parte integrante da experiência de compra e venda no Marrocos; a ponto de se converter em um componente central da vida econômica marroquina, refletindo não só a dinâmica comercial, mas também as normas culturais e sociais que regem as trocas nos ntercambio e

mercados locais.in

Por outro lado, o intercâmbio comercial peruano durante a época pré-colombiana era baseado nos princípios de escambo e ayllu (grupo ligado por laços de consaguinidade que compartilhava terras e recursos). Os mercados de rua das cidades ou ccatus – instituição de origem pré-inca que, posteriormente, contou com a supervisão das autoridades incas – seguiam uma dinâmica de escambo baseada no excedente produtivo ou na troca varejista por produtos. Inclusive, práticas como a yapa – ou adehala – formavam parte das trocas comerciais do Peru pré-colombiano (Quiroz, 2020). Não obstante, com a chegada dos espanhóis no século XVI, o comércio e os mercados locais experimentaram transformações significativas. Tanto a introdução de produtos europeus quanto a imposição de novas estruturas econômicas e políticas modificaram os padrões de consumo e os produtos disponíveis nos mercados peruanos. Como resultado, os mercados coloniais se tornaram centros de troca não apenas de bens, mas também de ideias e culturas; ocasionando que as práticas comerciais indígenas se adaptassem às novas realidades coloniais. oloniales.

los mercados locales
Fonte: southamericaexploor Mercado SAN PEDRO

Em meio às dinâmicas proporcionadas pelo intercâmbio cultural em centro dos mercados de rua, locais, é preciso destacar que o pechinchar como prática difundida no Peru – embora não se encontre informação a respeito na época pré-colombiana – contou com uma importante influência por parte dos migrantes árabes. No final do século XIX e início do século XX, não só se experimentou a chegada de uma onda de migrantes árabes, palestinos e turcos, mas também sua participação ativa no circuito comercial sul e andino, entre as cidades de Arequipa, Cuzco e Puno. Embora as práticas comerciais árabes fossem itinerantes – ou seja, não se integraram por completo ao mercado local –, durante esse período, vivenciou-se a introdução da cultura de pechinchar e as facilidades de pagamento como ferramentas de vendas por parte, especialmente, dos imigrantes de origem árabe (Cosamalón, 2020).

Por outro lado, de forma similar ao caso marroquino, com a independência do Peru no século XIX, os mercados locais continuaram evoluindo, refletindo as tensões entre tradição e modernidade. Ainda que se tenha experimentado um processo de diversificação de bens e da própria produção, os mercados de rua tradicionais continuaram sendo um pilar importante da vida cotidiana em muitas comunidades. Não obstante, a maior transformação para o Peru veio de mãos dadas com o auge do turismo como uma indústria motriz da economia. Embora os mercados de rua tenham visto um aumento positivo no afluxo de turistas, os vendedores começaram a se concentrar mais em artigos que atraem os visitantes do que nos produtos tradicionais. Mesmo que essa adaptação tenha gerado uma espécie de comercialização das tradições – com a criação de produtos especificamente desenhados para o mercado turístico –, os mercados conseguiram se reinventar ao longo do tempo, continuando a ser um reflexo vibrante da cultura e da identidade peruana (Kani & Kalaska, 2018).

Fonte: peru.travel pisac market CUSCO

Apesar das diferenças nos contextos temporais, culturais e religiosos do Peru e do Marrocos, ambos os países exibem semelhanças notáveis em suas práticas comerciais até a atualidade. Além da evidente resistência das tradições nos mercados de rua peruanos e marroquinos, existe uma dinâmica comercial compartilhada: o pechinchar, que acaba funcionando como um mecanismo para preservar e expressar as identidades culturais locais. Esse costume não é apenas uma forma de negociar preços, mas também um ritual social que fomenta a relação entre comprador e vendedor (Ogliastri & Salcedo, 2008). Entre a agitação dos souks de Marrakech e Fez ou os mercados locais de San Pedro em Cusco e San Camilo em Arequipa, pechinchar é quase uma arte: os vendedores esperam que os clientes participem no jogo da negociação, e os compradores, por sua vez, procuram obter uma pechincha por meio de um diálogo animado e perspicaz. Dessa forma, este processo – longe de ser uma simples troca econômica – envolve uma série de códigos e normas que permitem a ambas as partes demonstrarem respeito, astúcia e certa vivacidade, três características de ambas as

Em conclusão, os elementos comuns dos mercados de rua peruanos e dos souks marroquinos – tanto em termos de história compartilhada quanto de práticas semelhantes – destacam a capacidade das práticas culturais para se adaptar e sobreviver através de mudanças históricas, evidenciando a resiliência das tradições comerciais em um mundo em constante evolução. Por mais que as influências externas – sejam elas religiosas, coloniais ou das dinâmicas do turismo – tenham influenciado o desenvolvimento dos mercados locais, a persistência do pechinchar e as práticas culturais particulares mostram a riqueza dos legados históricos do Peru e do Marrocos e a importância de manter viva a essência de suas tradições comerciais no mundo

Referências

Functional and spatial changes of souks in Morocco’s imperial cities in the context of tourism development. https://sciendo.com/article/10.2478/mgrsd-2019-0002

The Souq and the Foundouk. The Genesis of the Markets and Medinas of Morocco (Book Architecture and Urban Transformation of Historical Markets: Cases from the Middle East and North Africa).

https://www.taylorfrancis.com/chapters/edit/10.4324/9781003143208-12/souq-foundoukhassane-kharmich-khalid-el-harrouni

El zoco, centro de actividad comercial en marruecos. https://dialnet.unirioja.es/descarga/articulo/2494080.pdf

La moneda en el mercado interno peruano colonial. https://www.bcrp.gob.pe/docs/Publicaciones/libros/2020/historia-de-la-moneda-en-el-peru .pdf

Compendio de Historia Económica del Perú. https://www.bcrp.gob.pe/docs/Publicaciones/libros/historia/4-economia-de-la-primera-cent uria-independiente.pdf sociedades. contemporâneo.

Artigo 2:

A interculturalidade entre o Peru e o Marrocos através

da música Gnawa de origem africana

Ministro Conselheiro Mohamed Akhouya

A música, como linguagem universal que transcende as barreiras geográficas e linguísticas, tem a capacidade única de tecer vínculos entre diferentes culturas, entrelaçando histórias e criando pontes entre continentes. Um exemplo vivo dessa convergência cultural é demonstrado pela música "Gnawa", um gênero musical de origem africana radicado no Marrocos e que, surpreendentemente, ressoa com ecos quase semelhantes na rica tradição musical peruana.

Esta viagem musical e artística nos convida a explorar as convergências culturais entre estas duas nações: o Peru e o Marrocos, revelando como a história, as migrações e a fusão artística puderam criar um género musical comum e parecido entre essas duas nações.

De fato, a música Gnawa, com raízes profundas nas comunidades de africanos escravizados que chegaram ao Marrocos no século XVI, é uma expressão cultural rica em simbolismo e espiritualidade. Seus cantos, acompanhados por instrumentos como o "krakeb" (formado por duas peças de metal unidas entre si por uma argola), o "guembri" (um instrumento de três cordas com um som grave e melancólico) e o "Tbel" (tambores que marcam o ritmo ancestral), invocam os espíritos e os ancestrais, criando uma experiência musical única que funde tradição e ritual. Na cidade marroquina de Essaouira, que recebe, uma vez por ano, festivais de música Gnawa, a tradição se manteve viva, atraindo músicos e espectadores de todo o mundo, que mergulham na magia desse gênero.

No entanto, o vínculo entre a arte Gnawa e alguns tipos de música peruana não se limita a uma simples coincidência. A presença da música africana na cultura peruana é uma realidade tangível, profundamente enraizada em sua história. O legado da escravidão, que também marcou o desenvolvimento histórico do Peru, deixou uma marca indelével na música do país sul-americano. O ritmo e o fervor que encontramos, hoje, na música afro-peruana, como a "zamacueca" ou o "landó", apresentam claros paralelismos com a música Gnawa do Marrocos. Em ambas as tradições, a percussão desempenha um papel fundamental, as letras são carregadas de emoções e a música é usada para celebrar, para curar e para se conectar com o mundo espiritual, criando um diálogo fluido entre o corpo e a alma.

Fonte: ritmosglobales.com ritmos de marruecos

Por outro lado, a influência da música africana na música peruana se evidencia, ainda, na presença de instrumentos como o "cajón", um instrumento de percussão de origem africana que se tornou um elemento fundamental da música afro-peruana. A forma como se toca o "cajón", com os seus ritmos complexos e a sua capacidade para expressar uma ampla gama de emoções, faz lembrar o "Tbel" ou "Ganga", um dos instrumentos principais da música Gnawa, estabelecendo uma interconexão musical entre ambos os instrumentos.

O vínculo intercultural entre o Peru e o Marrocos se torna ainda mais profundo quando se leva em conta o papel da diáspora africana na história de ambos os países. A migração forçada de africanos para a América e o Norte da África criou uma conexão invisível que se manifesta na música, nas tradições e na gastronomia, entre outros campos.

Na atualidade, a música Gnawa não se limita às fronteiras do Marrocos. De fato, músicos de várias partes do mundo tem se interessado por esse gênero, reinterpretando-o e fundindo-o com outros estilos musicais. Essa expansão global da música Gnawa é um exemplo da vitalidade dessa tradição, bem como de sua capacidade para transcender as fronteiras e se conectar com diferentes culturas, criando um diálogo intercultural por meio da música.

Portanto, a convergência cultural entre o Peru, o Marrocos e a África por meio da música Gnawa é um testemunho vivo do poder transformador da música. Esse intercâmbio artístico, que foi se desenvolvendo durante séculos, nos lembra que as culturas não são ilhas isoladas, mas sim estão entrelaçadas por fios invisíveis que são tecidos através da história, da migração e da expressão artística. A música Gnawa, com suas raízes africanas, sua presença no Marrocos e suas diferentes influências no Peru, é um exemplo inspirador de como a música pode ser uma ponte entre continentes, uma linguagem universal que une culturas, tradições e a história em comum, criando um tecido cultural que nos conecta a todos.

Fonte: elperuano.com zamacueca
Fonte: Europeana.eu INSTRUMENTO VENCEDOR

Logo, explorar essas conexões nos permite compreender melhor a riqueza e a complexidade das culturas, e nos convida a olhar para além das fronteiras geográficas para descobrir as histórias por trás de cada ritmo, de cada melodia e de cada canto. Assim, a música Gnawa, arte inscrita em 2019 na Lista Representativa do Patrimônio Cultural Imaterial da Humanidade, aspira a se transformar não apenas em um entretenimento, mas em um poderoso veículo para a comunicação e a compreensão intercultural, uma linguagem universal que nos permite compreender e celebrar a

diversidade cultural do mundo. elementos que a música Gnawa e a música afro-peruana compartilham.

Dessa forma, as influências africanas se deixaram sentir na música peruana de diversas maneiras, criando uma miscigenação musical que enriquece a cultura do país. A percussão, a intensidade emocional e o uso da música para celebrar a vida e para se conectar com o mundo espiritual são

Fonte: ritmosglobales.com Gnawa, a música espiritual de Marrocos

Referências

https://elperuano.pe/noticia/90771-zamacueca

https://www.europeana.eu/es/item/09102/_CM_0952423

https://ritmosglobales.com/gnawa-la-musica-espiritual-de-marruecos/

Receita : Pastilla Marroquina

A Pastilla Marroquina (também conhecida como ‘Bastela’ Marroquina ou torta de frango marroquina) é um prato tradicional que combina doce e sal, típico das celebrações no Marrocos. É elaborado com finas camadas de massa folhada que envolvem um recheio suculento de carne de ave, especiarias e amêndoas. Este prato, muitas vezes decorado com açúcar de confeiteiro e canela, é uma amostra da requintada culinária marroquina.

Ingredientes

500 g de peito de frango ou pombo

1 cebola picada

1 xícara de amêndoas torradas e picadas

4 ovos

1/2 xícara de açúcar de confeiteiro

1 colher de chá de canela em pó

1/4 xícara de salsa picada

8 folhas de massa folhada

1/2 xícara de manteiga derretida

1/2 colher de chá de gengibre em pó

1/2 colher de chá de cúrcuma

Sal e pimenta a gosto

Preparo

Cozinhe o frango em uma panela com a cebola, o gengibre, a cúrcuma, o sal e a pimenta. Depois de cozido, desfie a carne e reserve o caldo. No caldo do frango, bata os ovos e cozinhe em fogo baixo até engrossar. Adicione o frango desfiado, as amêndoas, a salsa, o açúcar e a canela. Misture bem.

Pré-aqueça o forno a 180°C. Unte uma forma redonda com manteiga. Coloque uma folha de massa folhada na forma, deixando as bordas pendendo para fora. Pincele com manteiga e repita com mais 4 folhas. Recheie com a mistura de frango e dobre as folhas de massa folhada sobre o recheio. Cubra com as folhas restantes, pincelando com manteiga entre cada camada. Asse por 25-30 minutos ou até ficar dourada e crocante. Polvilhe a torta com açúcar de confeiteiro e canela antes de servir.

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