DOCE ÁCIDO

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A história de Walter Rodrigues se confunde com a profissionalização do mercado brasileiro de moda, que nas últimas duas décadas passou a ser tratado como assunto comportamental e virou destaque em reportagens sobre negócios. Seu trabalho figura com destaque na lista dos responsáveis por essa evolução, já que ele faz parte da primeira geração de estilistas a apoiar a organização de um calendário oficial de lançamentos, desfilando inicialmente na São Paulo Fashion Week e nos últimos anos fazendo parte do Fashion Rio. Natural de Tupã (SP), Walter é um ávido estudioso da interseção entre Arte e Moda, colocando suas criações num patamar que transcende a simples ideia de uma roupa para vestir. A convite de Jackson Araujo, diretor criativo e de conteúdo do ParkFashion Connection, ele é o estilista homenageado por sua contribuição intelectual à moda brasileira, com uma retrospectiva apresentada em forma de desfile na noite de abertura e uma exposição organizada pela jornalista Mariza de Macedo-Soares e o ator e cenógrafo Theodoro Cochrane. Como será essa sua participação no ParkFashion Connection? Walter Rodrigues – Este convite chegou na hora certa. Estou vivendo um momento muito especial, onde verdadeiramente tenho repensado a minha carreira e a minha contribuição para com a moda brasileira. A retrospectiva do meu trabalho, que será enfatizada na exposição e no desfile, marcará uma nova fase na minha vida profissional, possibilitando mostrar o meu olhar e minha ideia de elegância na hora de criar roupas. Sempre busquei em minhas coleções explicitar minha preocupação com a temporalidade e com a importância de contar uma historia, seja ela inspirada em viagens, livros ou filmes, tornando a roupa não apenas um item na arara, mas, sim, um produto desejável. Você é considerado um dos ícones da moda inteligente no Brasil. Esse título assusta ou, pelo contrário, faz sempre com que você queira melhorar e inovar? WR – Nunca sinceramente me preocupei com isso. Nunca pensei em perder minha “caipirice”, até porque eu sempre sou muito envolvido no “fazer”. Admito que amo pesquisar, desenhar e acompanhar todos os processos que marcam a construção de uma coleção. Sendo assim, não sobra tempo para pensar no glamour da minha profissão. Acredito que

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meu trabalho é feito de 90% de transpiração e 10% de flashs. E confesso que sou muito feliz assim! Nesses 20 anos, como avalia a evolução da moda no Brasil? WR – Nós somos muito novos no ramo. A moda brasileira começou nos anos 70 e só nos organizamos mais pra frente, na década de 90. Temos que fortalecer nossa visão de origem, quem somos, nosso colorido, enfim, nosso lifestyle que é cobiçado pelo mundo inteiro. Nós ainda não sabemos usar o potencial que temos. Se fizermos com a moda brasileira o que a música brasileira conseguiu, teremos um sucesso absoluto. Só precisamos olhar para nós mesmos e expressarmos nosso jeito de ser. Qual sua relação com Brasília? WR – Quando eu lancei minha primeira coleção, em 1992, ela estreou em uma loja de Brasília. Para mim, sempre foi uma cidade importante e tenho ótimas recordações dos desfiles e eventos em que aqui participei. Adoro a arquitetura e o verde desta cidade e vai ser muito bom estar bem perto de todos os meus amigos. Quais seus novos planos depois de se despedir das passarelas? WR – Vou me dedicar ao trabalho de consultoria, como a que faço para a Assintecal - Associação Brasileira de Empresas de Componentes para Couro, Calçados e Artefatos, coordenando o Núcleo de Design Assintecal-Abicalçados, projeto que leva a todos os pólos calçadistas do Brasil informações sobre como fortalecer os calçados e acessórios brasileiros com originalidade e identidade. Na Serra Gaúcha também tenho trabalhado em projetos que evocam a identidade local e como transferir esta riqueza para os produtos. O que você pretende fazer com o seu acervo de moldes? WR – Acabei de entregar ao Senac São Paulo todos os moldes das coleções para que seja iniciado um arquivo, que eles fiquem protegidos e possam inspirar mais pessoas. Já os moldes das roupas exclusivas e dos vestidos de noiva estão sob a proteção da UCS - Universidade de Caxias do Sul, e também poderão ser estudados. Espero que, com este exemplo, outros importantes criadores brasileiros iniciem aquilo que será necessário no futuro, a consolidação da moda brasileira e a possibilidade de que gerações futuras possam descobrir a importância destas histórias.


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