A prática da contradição no mutirão autogerido

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em exercer a mesma função na obra; aqueles que reunissem essas condições – e eram poucos os que reuniam – seriam os coordenadores de cada grupo especializado de tarefas como, por exemplo, o grupo de escavação, de alvenaria, de hidráulica, de elétrica, etc; depois consultavam os demais sobre quais seriam as tarefas de maior interesse para cada um, de forma a compor cada grupo. Definida esta primeira configuração dos grupos, organizavam-se pequenos cursos práticos básicos referente às tarefas a serem realizadas em obra, numa dinâmica que, segundo relato, pareceu se aproximar da relação mestre-aprendiz. Os cursos práticos já estavam em andamento quando os trabalhos de terraplanagem e fundação começaram. Para a locação dos primeiros 8 edifícios, a associação contratou os serviços de um topógrafo e, em seguida, começou o trabalho de movimentação de terra. Nesta fase, não havia recursos para a contratação de equipamentos para a terraplanagem, o que implicou num uso extensivo da mão-de-obra dos futuros moradores aos finais de semana, na base da pá e do carrinho de mão. Seguiu-se, então, a fase de implantação das estacas, depois a construção dos vigamentos de fundação e os trabalhos da empresa contratada para a montagem da estrutura de circulação vertical. Toda sexta-feira era elaborado entre os coordenadores dos grupos uma programação das tarefas a serem realizadas no final de semana onde, também, eventuais dúvidas eram esclarecidas entre coordenadores, o mestre de obras e a Usina. E, foi durante esses encontros que, assim como aconteceu no processo de construção da primeira sede, chegaram à conclusão de que a obra demoraria muito a ficar pronta caso se mantivesse os trabalhos apenas aos finais de semana, o que poderia acarretar em novas ondas de desmobilização.

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A solução definida foi semelhante à anterior, mas com o diferencial de que a mão-de-obra que trabalharia durante a semana seria contratada, quando possível, entre os próprios membros da associação. Esta dinâmica de trabalho já havia sido adotada na contratação de um dos membros da associação como mestre de obras. Segundo seu relato, como já havia exercido esta função em empregos anteriores começou oferecendo ajuda para tocar a obra e orientar os trabalhos no canteiro. Neste ínterim, entre a construção da primeira sede e o início das obras dos edifícios, a direção da associação fez uma proposta de contratação de seus serviços como mestre de obras, ressaltando, no entanto, que não conseguiriam equiparar a remuneração com as do mercado de trabalho. Este morador, que já fazia parte da coordenação e estava desempregado na época, aceitou as condições da contratação e passou a trabalhar como mestre de obras, com trabalho remunerado nos dias de semana, e trabalho não pago aos fins de semana. Da mesma forma, ocorreu com os trabalhadores que foram contratados, entre as próprias famílias da associação, na fase de construção da primeira etapa. E, quando as possibilidades de contratação entre os associados não eram suficientes, procurava-se a contratação entre seus parentes e amigos, ou mesmo nas regiões do entorno do conjunto. Porém, ainda que a contratação tenha sido feita entre aqueles trabalhadores com experiência na construção civil, houve a necessidade de verificação dos conhecimentos em construção e de uma instrução básica para trabalhar com o sistema construtivo de alvenaria estrutural, que difere dos sistemas convencionais de viga e pilar de concreto. Este trabalho executado durante a semana era mais direcionado para agilizar e complementar os trabalhos executados aos finais de semana. Neste sentido, os operários contratados tocavam


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