23-05-2010

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▶ ESPORTES ◀

/ NOVO JORNAL / NATAL, DOMINGO, 23 DE MAIO DE 2010

O HOMEM DA FIFA... FOTOS: HUMBERTO SALES / NJ

BRUNO ARAÚJO

DO NOVO JORNAL

À PRIMEIRA VISTA o suíço Alain Ge-

gauf é mais um estrangeiro que se apaixonou pelo clima quente e o povo hospitaleiro do Brasil. Mas, se você conversar por mais de cinco minutos com ele, perceberá que existe muito mais por trás dos óculos de armação angulada e o forte sotaque alemão. Há mais de 30 anos em solo tupiniquim, Gegauf, conselheiro da Fifa há 15, concedeu entrevista exclusiva ao NOVO JORNAL, e sem pestanejar disparou: “Natal nunca esteve ameaçada de perder a Copa”. Mas antes mesmo de passar a ser o homem da entidade maior do futebol em Natal, o suíço de 59 anos – até agosto, “então não coloque 60”, como ressaltou ele mesmo sorrindo – foi diretor de futebol da categoria juvenil e de relações internacionais do São Paulo. Com respostas curtas e firmes, Gegauf lembrou sua chegada ao Brasil no meio da década de 70, quando se casou com uma suíça que já morava no país. “Vim para cá depois que casei. Morava em Itu, a 40 quilômetros de São Paulo. Eu sempre fui ligado ao futebol e ao tênis”, conta o exlateral direito do Zurique Futebol Clube – que jogou também pela seleção sub-20 da Suíça em amistoso contra a Romênia – e amigo de Joseph Blatter, presidente da Fifa e ex-jogador de uma equipe da segunda divisão do país.

AMIGO BLATTER

Sobre a amizade com o dirigente maior do futebol mundial, Gegauf garante ter acontecido por acaso. Segundo ele, foi num eventivo e Blatter o teria tratado com um carinho incomum. “Não conhecia ele e, na primeira vez que nos falamos, me tratou com muita atenção. Depois é que descobri o motivo: ele e meu tio haviam estudado juntos na universidade por dois anos e fizeram – se divertiu tentando descrever aos gestos por não encontrar a palavra em português – esgrima no mesmo clube”, contou, ficando cada vez mais à vontade, em seu escritório cercado por fotos, diplomas e artigos com a logomarca da FIFA ou relacionados ao futebol. Conselheiro cultural, Alain deixa claro não gostar do título e prefere se nomear amigo da entidade. “Estou bem na Fifa como amigo, não me vejo como integrante. Somos amigos, isso é que vale!”, afirma Gegauf que aguarda ansiosamente a chegada da bola oficial da Copa, que deve ser enviada para ele ainda esta semana. Além de Conselheiro, ou melhor, amigo, Alain Gegauf é coleciona-

SE A FIFA FOSSE NO BRASIL E A COPA NA SUÍÇA, CERTAMENTE IRIAM PROCURAR AMIGOS BRASILEIROS PARA CONVERSAR, NÃO ENTENDO POR QUE ISSO NÃO OCORRE NO SENTIDO CONTRÁRIO” Alain Gegauf Conselheiro cultural da Fifa

EM NATAL ▶ Bola ofical da Copa de 2002: brinde

▶ Gegauf e alguns dos objetos que fazem parte de seu pequeno museu particular

dor de diversos objetos da Federação Internacional de Futebol. É quase um museu, cujo acervo poderá, no futuro, ir à leilão. Em relação ao amigo Blatter, Alain faz questão de destacar o quão acessível o presidente da Fifa pode ser. “Pensam que ele é intocável, mas na verdade não é! Consegui levar o Leonardo Arruda [secretário de Justiça do RN] para conhecê-lo e entregar uma camisa do ABC. Também enviamos bolas produzidas em Alcaçuz”, observa.

LINHA DIRETA COM A FIFA

NATAL FIRME... ATÉ 2011 O conselheiro afirma que, em momento algum, a Fifa pensou em retirar a capital potiguar da lista das cidades-sedes para 2014. Natal hoje estaria firme e garantida na Copa devido à segurança e à forte infraestrutura hoteleira, mas que terá que trabalhar bastante para cumprir os prazos para não ter problemas. “Mandei um email recentemente para um amigo na Fifa e ele me confirmou que nunca se pensou em tirar Natal. Se Natal ficar fora, será problema da própria cidade, mas a Fifa não tem intenção de retirá-la”, afirma Gegauf que garante ainda que a entidade tem conhecimento das dificuldades para organizar o Mundial neste ano de eleições no país. “A Fifa sabe que tem atrasos e o ano é difícil por causa das eleições e como em 2011 tudo acalma, não só Natal, mas o Brasil vai ter que mostrar serviço. Se Natal estiver dentro do [cronograma] previsto, jamais será excluída”, reforça.

Com a iminência da realização dos jogos da Copa da África do Sul, ele garante que a preocupação da entidade está voltada para o torneio do outro lado do Atlântico, mas que com a perspectiva de uma Copa pouco rentável, as apostas da Fifa estão no Brasil. “Toda esperança está depositada no Brasil. Hoje é um país economicamente forte e que poderá fazer uma grande festa.”

2010

Gegauf não nega a nova pátria e garante não ter planos para deixar o Brasil. O clima quente, as belas paisagens e o futebol conquistaram para valer o coração do suíço que não perdeu a oportunidade de, como bom brasileiro, de ‘cornetar’ o técnico da Seleção Canarinha. “Dunga deve ter sua seleção na cabeça e mais quatro jogadores no banco que podem entrar a qualquer momento para jogar. Se pode escolher bons jogadores para

O “cultural adviser”, posto gravado em sua credencial da Fifa, se mostra aberto a conversar com os gestores da Copa em Natal. “Se a Fifa fosse no Brasil e a Copa na Suíça, certamente [os gestores] iriam procurar amigos brasileiros para conversar, não entendo por que isso não ocorre no sentido contrário?”, questiona Gegauf que lembra não ter interesse em se envol-

o banco, porque não chamar Ganso, Neymar e Hernanes?”, questiona o ex-lateral que ainda aponta, em relação ao resto do mundo, o conservadorismo da seleção brasileira. “Outros países tem menos medo de colocar três ou quatro novidades no time. Arriscaram com Pelé e deu certo, porque não fazer de novo?”

SE NATAL FICAR FORA, SERÁ PROBLEMA DA PRÓPRIA CIDADE, MAS A FIFA NÃO TEM INTENÇÃO DE RETIRÁ-LA” Alain Gegauf Conselheiro cultural da Fifa

ver na questão política. “Não caberia em um cenário político. Em um cenário só esportivo e para construção, sim!” E, apesar das palavras de otimismo em relação ao mundial na capital potiguar, uma pergunta inquieta a mente de Alain. Por que o projeto do estádio Estrelão, a ser desenvolvido em Parnamirim, não foi levado à frente. “Assisti, em

/ GEGAUF / AMIGO DO PRESIDENTE DA FIFA, JOSEPH BLATTER, SUÍÇO MORA EM NATAL E QUER AJUDAR NO PROJETO DA COPA 2014

2007, a apresentação do projeto do Estrelão – do arquiteto Glay Karlys que também projetou o estádio Frasqueirão – aos representantes da Fifa no Rio de Janeiro. Eles aplaudiram ao final pela a beleza do projeto que homenageava o Forte [dos Reis Magos]. Até hoje, não me disseram o porquê daquele belíssimo projeto ter sido mudado”, lamenta. Mas ele lembra que, hoje, não existe mais espaços para retroceder. Uma nova mudança de projeto poderia prejudicar a situação de Natal. Por coerência o suíço virou um defensor do projeto da capital potiguar para a Copa de 2014, que, por sinal, também acha bonito. Ele tem pronta, na ponta da língua, uma explicação prática para defender a construção de um novo ‘gigante da Lagoa Nova’. “Acredito ser um argumento falso dos que não querem a Copa em Natal lamentar que o estádio Machadão seja derrubado”, aponta o suíço que lembra o templo inglês do futebol, Wembley, construído em abril de 1923 e que foi palco de final de Copa do Mundo e recebeu provas dos Jogos Olímpicos. O es-

tádio foi ao chão em 2003 para dar lugar a uma nova estrutura. Mas, segundo Gegauf, outra pergunta – esta da população – pode ser um dos motivos da insegurança sobre a derrubada do estádio Machadão: “O povo continua se perguntando de onde virá o dinheiro para pagar essas obras. Não houve resposta e acredito que se o Governo e a Prefeitura mostrarem essas garantias, esse movimento pode ter fim”, avalia o conselheiro, que sugere uma solução para que o estádio das Dunas não se transforme num ‘elefante branco’: “O estádio pode ser transformado em um hotel, num campo de golfe ou até os dois adaptando o espaço para manter o campo de futebol. É simples e proporciona um bom uso.” Questionado sobre uma possível diferença entre a realização de uma Copa em Natal ou na Suíça, Alain aponta o planejamento como diferença principal. “Antes de fazer algo, se pensa. Uma vez que todas as partes estão cientes e sabem o que querem, não tem papo, não teria problema. É apenas sim ou não”, explica.


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