Cinema da Cidade 2

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 os pés amassam as pedras, da rua, descrentes de sua dureza consonantal, de suas palavras agudas: epifania, policromático, dissonante. A língua, toda língua, já foi metálica, como gritos sujos de terra, das brincadeiras de antigamente. Guarda-se, em toda palavra, o som, um som, lança que vara o tempo, para ser apenas alma de lobo, flertando com uma lua inatingível. Uma mulher velha grita, grita eternamente, na tela CinemaScope de olhos evasivos: um filho morto, um corpo partido, um universo divergente, a dor, a dor, o parto, a parte que parte. Terra, haveria de comê-la para reter essas muitas partidas, os infinitos encontros, que ao se abraçarem, já acenam distantes. Culpo o mar, bebo o mar, desespero desse infinito ínfimo onde o amor distante, um mimo ausente, vai apagar-se para sempre, como realização delicada de uma boa morte.

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