Revista Lupa #2

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PASSEPARTOUT

Por que

não vamos ao teatro?

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Texto Luiza Borges

_ Há muito tempo o teatro deixou de ser uma das principais, senão “a” principal, opção de lazer. Espaço de ver e ser visto, o teatro era lugar de outras atuações que não só aquela exigida dos profissionais do palco. As longas horas de duração do espetáculo eram a oportunidade de deixar-se ver e admirar, de conhecer outras pessoas, de conversar trivialidades, além, é claro, de assistir a uma boa peça. Entre um ato e outro, tornava-se espaço de sociabilidade dos bem nascidos, que além de diversão, também buscavam o status e o prestígio que o teatro oferecia. _ O teatro perdeu esta função social e também lugar na preferência do público. Isto se deve, em parte, ao surgimento de alguns estigmas que são mais acentuados em alguns lugares do que em outros, e que afugentam um público em potencial, deixando o teatro como opção de lazer “reserva”. _ Costuma-se pensar que o teatro é um programa elitista, para intelectuais e pouco divertido. O aparecimento de outras opções de lazer, mais “modernas”, em que há mais possibilidades de relação entre as pessoas, deixou muito clara a natureza artesanal do teatro, fazendo-o parecer antiquado. A concorrência é dura: shows, boates, cinemas, programas supostamente mais divertidos, mais prazerosos, mais acessíveis que o teatro. _ A crença de que o ingresso para o teatro é caro é mais um estigma. É comum achar quem pense que não vale a pena gastar quinze reais no teatro quando se poderia usar este dinheiro para ver uma super-produção cinematográfica.

No teatro baiano, o vício _

da comédia ajuda a criar mais um estereótipo: o de que só vale a pena assistir a espetáculos deste gênero. Como um círculo vicioso,

uma parte do público só vai ao teatro assistir espetáculos cômicos, e só se faz comédia porque sabe-se que existe um público garantido. Isto dificulta o crescimento de outros gêneros na produção teatral baiana. _ Três pesquisas sobre hábitos culturais de alguns segmentos sociais, realizadas entre 2001 e 2002 por Sérgio Sobreira e seus alunos da Faculdade de Comunicação da UFBA, confirmaram os estigmas. As pesquisas foram realizadas com 277 entrevistados (148 mulheres e 129 homens), a maior parte, estudante, com idades entre 21 e 25 anos. O estudo foi feito em diversos bairros de Salvador, mas principalmente em bairros considerados de classe média, como Pituba, Rio Vermelho e Federação. Confirmou-se a preferência por cinema e música como atividades de lazer, ficando o teatro como terceira opção. Dentre os entrevistados, aqueles que não vão ao teatro alegam como motivo principal a falta de

interesse, seguido pelo valor dos ingressos, considerados caros. Entretanto, ao consultar preços de ingressos das peças em cartaz atualmente na cidade de Salvador, verifica-se que o valor da meia-entrada fica em média R$ 7,00, quantia igual ou menor à que é paga em shows, cinemas e boates. Outro dado apontado pelas pesquisas, foi o grau de escolaridade daqueles que freqüentam o teatro. Verificou-se que 78,29% eram universitários, o que justifica o estigma de arte elitista. Quanto ao gênero, foi constatada a preferência pela comédia. _ É difícil encontrar uma solução “salvadora”, que faça com que o público deixe os preconceitos de lado e passe a considerar o teatro opção de lazer como as outras. As políticas de formação de platéia, estratégias desenvolvidas no sentido de atrair pessoas para o teatro e fazer com que criem esse hábito, são uma boa saída. O maior desafio é levar as pessoas uma vez ao teatro e fazer com que conheçam, verdadeiramente, essa arte. Depois, ela se tornará uma necessidade. Como diz João Lima, diretor da premiada peça O sapato do meu tio, “a arte é fundamental na vida do ser humano, assim como se alimentar, morar e ter educação. Acho que a arte é o que nos torna mais humanos”.


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