Balaclavas e os profetas do caos

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co de sua história. Ele presenciou a morte dos pais, e a partir de então foi criado para ser líder do tráfico. “Foi Jesus, os cânticos e a arte que me salvaram”, contava com um leve temor na voz. Seus amigos dá época estão todos mortos, sobrou apenas um primo que vegeta internado nas drogas pesadas. Cerca de uma hora e meia depois chegamos à USP. Descemos do carro e Tânia mais que rapidamente preparou-se para guiar até sua casa e seus lençóis limpos. Foi então que se acendeu em minha mente: “Caralho! Esqueci a mochila no portamalas do Guto!”. Conferi os bolsos, me restava a carteira com 20 reais, os documentos e o celular. “Só conheço esse cara há alguma horas, espero que ele seja boa pessoa, senão tô no ovo, na merda, to enrolado!”. Nada de saco de dormir, nada de caderninhos de anotação, nada de gravador nem de câmera fotográfica, nada de meu remédio diário Adefovir pra segurar a violência de uma maldita inflamação em meu fígado. “Puta que pariu, Deus! Desbunde esse rabo misericordioso dessa poltrona divina e me livra dessa merda, PORRA!”. Coloquei o cartão telefônico na aparelho e comuniquei Guto do acontecido: “Pode ficar tranqüilo, não devolvi o carro hoje, a loja tava fechada. Já vou lá no porta-malas e pego ela. Amanhã levo aí pra você”, acalmou-me. Já um pouco mais sossegado tomei novamente a incumbência de vigiar a entrada junto com a comissão de segurança. Quatro de nós éramos fixos no portão de entrada, mas um sem número de pessoas revezavam-se por lá estendendo a conversa pelos mais variados temas, como tratados de história-sociológica de Proudhon a Alfred Weber, pratos vegans, frentes da esquerda radical e futebol. Como não tinha o material necessá-

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