Respeitável Público – Projeto de Reativação da Praça Franklin Roosevelt na Cidade de São Paulo

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de lá? R.G.V. – Eu acho que existe um mecanismo social meio inevitável... T.F.G. – Será que é inevitável? R.G.V. – Por exemplo, o que aconteceu em 2007 é que nós quisemos sair da Praça. Porque os imóveis, todos esses apartamentos... A Praça Roosevelt foi um dos locais em que mais valorizaram-se os imóveis na cidade de São Paulo nos últimos 10 anos. Nós compramos um apartamento no prédio do Satyros 1 (2) no final de 2001 começo de 2002, eu acho, por R$ 32.000,00 (trinta e dois mil reais): um apartamento de 65m2. Hoje esse partamento vale R$ 120.000,00 (cento e vinte mil reais). Se você fizer o cálculo, são [quase] 400% em 7 anos. Quantas regiões da cidade de São Paulo valorizaram tanto quanto a Praça Roosevelt? Então o que aconteceu: todos os travestis que moravam na Praça foram expulsos. Eles não tinham condições de manter os seus apartamentos. E começou a vir um novo tipo de morador. Então aqueles que freqüentavam a Praça, aqueles que moravam na Praça não podem mais nela morar. A Praça expulsou essas pessoas. O teatro expulsou essas pessoas. O que é que nós do Satyros pensamos em determinado momento: que agente devia ir embora, porque não era o lugar para nós. Porque a Praça se tornou um ponto cult, um ponto que a menina que estuda artes cênicas na (Escola Superior de Artes) Célia Helena, que mora na Vila Madalena e que o pai é diretor de uma grande empresa, ela pode freqüentar a Praça Roosevelt e ela acha legal freqüentar, e ela não quer enfrentar nenhum traficante, nenhum travesti, nada. Ela quer encontrar o mesmo povo da Vila Madalena, entende? Nós só não fomos embora porque o projeto da São Paulo Escola de Teatro estava andando, que é um projeto de inclusão social. Porque a idéia é que aproximadamente metade das vagas da escola sejam preenchidas por jovens carentes da periferia, que acabam o Ensino

Médio, não têm perspectiva nenhuma de trabalho, não têm dinheiro nem para pegar um metrô para procurar trabalho no centro... Aliás nem conhecem o centro de São Paulo direito, então não sabem nem onde procurar trabalho, não têm perspectiva de entrarem em uma Universidade, mas ele vai receber uma bolsa para estudar na nossa escola de forma gratuita. Não só o ensino vai ser gratuito, como ele vai ter dinheiro para poder ir até a escola. T.F.G. – Então o Satyros vai administrar a Escola? R.G.V. – O projeto foi proposto pelo Serra para nós Satyros, mas nós chamamos um grupo de artistas e grupos para dividir essa história com agente, porque seria impossível agente fazer isso, e nem seria justo. Então chamamos o [José Carlos] Serrone, que é arquiteto formado pela FAU[USP] e o maior cenógrafo do Brasil, segundo muita gente, que vai cuidar do Curso de Cenografia, Figurino e Técnicas de Palco; chamamos Marici Salmoão, que era de um grupo chamado Dramáticas em Cena e que é consultora de dramaturgia do SESI, do British Council no Brasil; chamamos os Parlapatões para o Curso de Humor; o Raul Barreto, e para o Curso de Direção o Hugo Possollo; chamamos o Raul Teixeira para Sonoplastia, que é do CPT [Centro de Pesquisa Teatral], do Antunes Filho; e chamamos o Guilherme Bonfante que é o iluminador do Teatro da Vertigem. Então são vários grupos que cada um assumiu uma área, e tudo isso agente está coordenando e pensando. Se você for pensar todo espaço é público. Essa parte embaixo desse concreto ele é público e é considerado território pelos sem-teto que moram ali embaixo. Quando as pessoas falam: “Ah, isso não é um espaço público”, tem muito um viés da classe social. É publico para você, porque para o sem-teto, para o cara que está lá embaixo adora: ele está protegido da chuva, ele está lá com os amigos dele, ou ele faz xixi lá no canto... É público aquele espaço. Ele não é público para mim e para você porque agente tem medo de entrar lá embaixo.


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