O Foco Narrativo

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personagens que vemos agirem e executarem elas próprias... Daí vem que alguns chamam a essas obras dramas, porque fazem aparecer e agir as próprias personagens. 6

No caso particular da Poética, como na sua filosofia de modo mais geral, Aristóteles afirma o inverso de Platão. Se neste a poesia era imitação da imitação, no sistema aristotélico a poesia continua a ser IMITAÇÃO, porém não entendida como cópia das aparências, mas, ao contrário, como reveladora das essências. Imitar, para Aristóteles, é uma forma de conhecer que inclusive diferencia o homem dos outros seres vivos e lhe dá prazer. Por isso, quanto a imitar ou narrar, ele também inverte o juízo platônico, preferindo para a épica a imitação direta à narração das ações:

O poeta deve falar o menos possível por conta própria, pois não é procedendo assim que ele é imitador. Os

9 outros poetas (...) ao longo do poema procedem como atores em cena, imitam pouco e raramente; ao passo que Homero, após curto preâmbulo, introduz imediatamente um homem, uma mulher ou outra personagem, e não somente nenhuma carece de caráter, senão que de cada uma são estudados os costumes. (ARISTÓTELES, op. cit., p. 314.)

Hegel e a objetividade épica Platão e Aristóteles foram sucessivamente retomados, traduzidos (e traídos), imitados, diluídos, interpretados, pela retórica e poética da Roma antiga e da Idade Média; pela. poética clássica do Renascimento europeu; pelos ilustrados do século XVIII; pelos românticos, no século XIX; e seguem sendo revistos, citados, reinterpretados até os nossos dias, pela moderna teoria da literatura. Mas, hoje, irremediavelmente, os lemos pelo filtro de uma obra que 6

ARISTÓTELES. Arte poética. In: —. Arte retórica. Arte poética. São Paulo, Difusão Européia do Livro, 1964. p. 264.


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