Nossos Filhos Sao Espiritos

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fraterno. Não para que deles nos livremos para sempre, mas a fim de que, juntos, sigamos rumo à felicidade. Como costumo dizer aos espíritos com os quais dialogamos, não podemos afirmar que isso é fácil, o que asseguramos, convictamente, é que é possível. É necessário, indispensável. Não importa muito por onde passa o caminho, o que importa é que ele nos leve à soleira da sonhada paz, nossa por direito inalienável de herança. *** Nota suplementar Os capítulos de livro (pelo menos deste), como certas cartas, tem, às vezes, o direito e necessidade de PS. (post scriptum, como diziam os latinos). Este capítulo é um deles. É que as histórias, como a vida, são intermináveis, porque se renovam a cada momento, na deslumbrante riqueza de variações em torno de si mesma. Decorrido algum tempo após a morte do menino, nossos amigos espirituais me perguntaram se seria do meu interesse conversar com ele. Como iria eu recusar tal oportunidade? Certa noite, após concluídos os trabalhos regulares, o espírito que eu conhecera encarnado no bebê deficiente assumiu discretamente os mecanismos de comunicação da médium. Sua primeira palavra foi de reconhecimento e gratidão por tudo quanto tentáramos — sem muito êxito, admito — junto dos seus. E muito difícil convencer a pessoas espiritualmente despreparadas para tais situações de que está tudo certo nas imutáveis leis da vida e que a palavra de ordem aqui é aceitação. Quanto a ele, estava em paz, tão lúcido quanto possível àquele que ainda não se desembaraçara de todo o envolvimento com as substâncias mais densas que constituem nosso instrumento de viver e, naturalmente, com os problemas da vida que mal terminara. Sua visão retrospectiva podia, agora, penetrar mais fundo e buscar mais distante, no tempo, as motivações que compunham seu quadro de experiências. Lamentava o suicídio desastroso, que compreendia como gesto de rebeldia, de tão trágicas conseqüências. Acrescentava que teria tido certos atenuantes (demorou-se um tanto na escolha da palavra, que reconhecia inadequada) se, pelo menos, não tivesse sido vitimado por uma pesada dosagem de ódio, especialmente pela jovem que, a seu ver, o traíra, preterindo-o ao outro. Além do mais, podia ver, agora, a lamentável inutilidade de seu gesto desesperado, ao saber que outra mulher lhe estava destinada. E que a esta ele amava de fato, não com os impulsos da paixão, como à outra, mas com as ternuras do amor. A rejeição teria sido apenas desagradável incidente, pelo qual ele teria mesmo de passar, por causa de compromissos anteriores. Nunca, porém, a lei programa suicídios e tragédias. Seja como for, ficaram as lições de todos esses episódios dramáticos. Estava ele informado de que, na próxima existência, não estará mais sujeito à deficiência física que, desta vez, deixou-o literalmente prisioneiro de um corpo, através do qual não lhe fora possível expressar-se. Resgatara, pois, o grave compromisso do suicídio, sempre encarado pela lei maior como um gesto de rebeldia e inconformismo, O mais importante para ele, contudo, era o fato de haver se libertado do rancor que nutria por aqueles que, de certa forma, contribuíram para seu aflitivo gesto, embora reconhecendo que a


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