Balaclavas e os Profetas do Caos

Page 20

“Antes de começar, é meu dever avisar que tudo que vocês disserem pode ser usado contra vocês... em algum lugar”, eu prometo escrever a verdade, somente a verdade, nada mais que a verdade; se a verdade não for um dogma monoteísta inflexível. “Tá certo, mas eu quero deixar bem claro uma coisa: eu não dou o cu!”, não sei por que, mas Timóteo parecia realmente acreditar que o levaríamos a sério, aquele indie canastrão saído de uma liquidação black-metal de fantasias trucker-hawaianas! “Eu também quero me pronunciar sobre isso: Ronnie Von é a coisa mais linda que eu já escutei em língua portuguesa!”, Rodolfo estava na onda de cantar “Continentes e Civilizações”, algo que soa como um mantra da salvação para alguém que, como eu e ele, está no último ano de universidade, ou seja, aspirante a desempregado, gente que já começa a pensar no marketing pessoal mais simples pra vender a consciência por qualquer sub-emprego minimamente aceitável. “Valdez, você tá se retraindo por conta do gravador?”, ele sempre foi um rapaz arguto, eu esperava mais dele e daquela longa barba amarrada com vários elásticos de aparelho dental. “Provavelmente, cara”, com certeza, cara. “Você tem medo de gravador?”. “Muito!”. “Por quê?”. “Porque ele vai roubar minha alma!”. “Tudo bem... você me convenceu”, mesmo. A segunda fase do ritual consiste em inventar, urgentemente, alguma coisa comível com os mantimentos trazidos. As velas fumegantes começavam a compor sinfonias em nossos estômagos, e ninguém planeja bem com fome, nem os famintos por planos. No ar rodopiavam ondas de “These Days” a “Decemberists”, de “Tiririca” a “Sui Generis” e “Duduca e Dalvan”.

20


Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.