Jornal Contramão Edição 25

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25 hitchcock & zé do caixão:

UNIVERSOS

MALDITOS

UNA - Ano 6 - BELO HORIZONTE -Abril - Maio 2013 Distribuição Gratuita JORNAL LABORATÓRIO DO CURSO DE JORNALISMO MULTIMÍDIA


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EDITORIAL

Abril/Maio de 2013

?????????????????????????????? Reinaldo Maximiano e Jorge Rocha

Fortes emoções aguardam os leitores desta edição do jornal CONTRAMÃO. Para começar, o mestre do terror José Mojica Marins, mais conhecido como Zé do Caixão assombra as páginas centrais, em matéria realizada por Alex Bessas. O repórter encontrou Mojica, que esteve em Belo Horizonte para comentar a sessão de “Os pássaros”, em um evento em homenagem ao mestre do suspense, Alfred Hitchcock. O resultado dessa conversa mostra um Mojica que poucos estão acostumados a ver: cuidadoso com as palavras, carregado de recordações e cristão. Nem mesmo Hitchcock poderia ter pensado nisso. A continuação de nossa matéria de capa apresenta as sensações do público que acompanhou o evento “Hitchcock é o cinema”, realizado em agosto pela Fundação Clóvis Salgado, no Palácio das Artes. Filmes emblemáticos foram exibidos para uma audiência afinada com as propostas cinematográficas do mestre do suspense. Na lista, além do já citado “Os Pássaros”, estava ainda “Jardim dos prazeres”, estréia do diretor no cinema, que foi exibido com acompanhamento musical da Orquestra Sinfônica de Minas Gerais. Esta edição conta ainda com um raio x da sede mineira da Casa Fora do Eixo, com o propósito de colocar os pingos nos is a respeito das denúncias, à nível nacional, de que este

movimento tem sido alvo. O foco da matéria é voltado para verificar como estas denúncias afetam a Casa Fora do Eixo em Belo Horizonte e a relação entre os membros do movimento e os músicos locais. Reclamações, divergências e acusações são rebatidas por Gian Martins, Isadora Machado e Victor Maciel que, convictos, garantem que o Fora do Eixo não é apenas uma “moda passageira” ou mesmo um movimento que visa controle em um cenário político de confrontos ideológicos exacerbados. Ainda na toada de temas pertinentes à sociedade, Hemerson de Morais Dias e João Vitor (falta o resto do nome dele, eu sei) assinam a matéria intitulada “Drugsquare: (colocar o resto do titulo)”, onde traçam um pequeno, mas importante mapa dos mais conhecidos pontos de tráfico de drogas nas ruas de Belo Horizonte. Além de situar geográfica e socialmente esses pontos, os dois repórteres saíram também em busca de informações sobre as formas de combate ao tráfico e auxílio para quem quer abandonar as drogas. O resultado é uma matéria de fôlego, que pode ser lida nas páginas xx e xx. Mas das ruas não vêm apenas notícias ruins. Uma prova é o já tradicional Duelo de MCs, cuja sexta edição – realizada esse ano – premiou pela segunda vez o MC Douglas Din

como campeão nacional de freestyle. A repórter Fernanda Fonseca acompanhou o final do evento, sempre realizado na parte de baixo do Viaduto Santa Tereza, e descreve a experiência vivida entre as improvisações de rimas, além de entrevistar o vencedor do Duelo de MCs, que se descreve como “aquele que vive a vida dura em carne viva”. A peça “Luís Antônio Gabriela”, que teve única apresentação no Sesc Palladium, agora em agosto, também é tema desta edição do CONTRAMÃO, em matéria assinada por João Alves. A peça, dirigida por Nelson Baskerville e com texto de Verônica Gentlin, apresenta a historia de um homossexual que assume a identidade de Gabriela e seus conflitos com a família e a sociedade. Apesar do tom soar trágico, a montagem equilibra momentos de tensão com leveza, principalmente a cargo do ator Marcos Felipe, que interpreta o personagem-título. Para fechar, a contracapa desta edição apresenta uma parceria entre o desenhista Diego Gurgel – responsável por todas ilustrações das três últimas edições do CONTRAMÃO – e Jorge Rocha. Trata-se de parte da quadrinização de “The goodbye song”, um dos contos de “Tem uma nuvem que nunca sai do lugar”, livro lançado recentemente por Rocha.

contramao.una.br

EXPEDIENTE

Foto da capa Núcleo de Convergência de Mídias (NuC) do curso de Jornalismo Multimídia do Instituto de Comunicação e Artes (ICA) - Centro Universitário UNA. 25 Reitor: Átila Simões. Diretor do ICA: Lélio Fabiano dos Santos. Coordenadora do curso de Jornalismo Multimídia: Piedra Magnani da Cunha. hitchcock & zé do caixão: NuC/Coordenação: Reinaldo Maximiano Pereira (MTb 06489) e Jorge Rocha. UNIVERSOS Diagramação: Tiago Magno. MALDITOS Supervisão: Reinaldo Maximiano Pereira e Jorge Rocha. Revisores: Roberto Alves Reis e Piedra Magnani da Cunha. Estagiários: Alex Bessas, Aline Viana, Diego Gurgel, Fernanda Fonseca, Gabriel Amorim, Heberth Zschaber, João Alves, Juliana Costa, Luna Pontone e Tiago Magno. Tiragem: 2.000 exemplares. Ilustração: Diego Gurgell Impressão: Sempre Editora UNA - Ano 6 - BELO HORIZONTE -Abril - Maio 2013 Distribuição Gratuita JORNAL LABORATÓRIO DO CURSO DE JORNALISMO MULTIMÍDIA

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UNA - Ano 6 - BELO HORIZONTE - Junho - Julho 2013 Distribuição Gratuita JORNAL LABORATÓRIO DO CURSO DE JORNALISMO MULTIMÍDIA

Foto: Alex Bessas


CRÔNICA

Luis Antonio Gabriela Uma experiência visual e sonora

A Cia.Mungunzá de Teatro trouxe a Belo Horizonte a premiada peça “Luís Antônio Gabriela” que teve única apresentação no Sesc Palladium, 23 de agosto de 2013. Dirigida por Nelson Baskerville e com texto de Verônica Gentlin, a peça narra a história real de Luís Antônio, homossexual assumido, que posteriormente assumiu a identidade de Gabriela, e os conflitos da família. Não pense em uma peça tradicional, onde existe uma linearidade na história a ser contada. O grupo utiliza muita criatividade para mostrar detalhes e compor cenas através de câmeras de vídeo, telão, lanternas, composições próprias, letreiros eletrônicos e painéis artísticos. O resultado é uma peça intimista que utiliza várias linguagens para comunicar com o seu publico. A delicadeza e a coragem de Nelson, irmão de Luis, é tão grande que sua direção sabe muito bem utilizar arcos cômicos para aliviar os momentos de tensão, sem comprometer o ritmo da peça. Após o espetáculo, a emoção do público ficou mais evidente quando todos no teatro ficaram de pé e os aplausos foram ouvidos por longos minutos. Na fanpage oficial da peça, o grupo fez a seguinte declaração: “E quando a gente acha que já vivenciou tudo com “Luis Antonio - Gabriela”, eis que... Mil pessoas aplaudindo ininterruptamente o espetáculo em Belo Horizonte!! Noite pra ficar marcada na memória!! Ao povo mineiro só nos cabe agradecer a generosidade da acolhida!!! (...)”. Quando questionado sobre qual foi a maior dificuldade em interpretar Gabriela, o ator Marcos Felipe foi enfático. “Trabalhar o sorriso de Luís Antônio Gabriela. Apesar de ela passar por altos e baixos e ter uma vida muito sofrida, ela sorria o tempo todo”, disse o ator. Para ele, os documentos e os relatos dos familiares foram fundamentais para a construção do texto e da peça, e ajudaram muito no processo de construção das atuações e personagens. Marcos Felipe ainda comentou que o preconceito contra as travestis é algo evidente no Brasil e que essa realidade só irá mudar no dia que tivermos uma política de respeito. Após o espetáculo, o elenco se reuniu e abriu um bate-papo para que os espectadores perguntassem e dissessem o que acharam da peça. Os cuidados com todos os aspectos da peça foram ressaltadas em todas as opiniões e elogios não foram poupados.

Fotos: João Alves

Por Gabriel Amorim (3º período) - Jornalismo Multimídia João Alves (4º período) - Publicidade e Propaganda

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A vida para uma travesti não é simples ou fácil, muitas vezes incompreendidas por seus familiares, discriminadas pela sociedade as travestis são jogadas a marginalidade, e a sua própria sorte, para muitas a prostituição é o único caminho que sobrou para sobrevivência, pelo fato de estarem sempre expostas e chamam muita atenção as travestis são alvos fáceis para crimes de ódio. Há três anos à frente do Centro de Luta pela Livre Orientação Sexual (CELLOS) Anyky Lima conta que a partir de uma necessidade em proteger a auxiliar as travestis e transexuais foi criado um espaço o CELLOS Trans “acompanhamos em tudo, saúde, educação e defensoria”, explica Conforme o relatório do Grupo Gay da Bahia o Brasil é responsável no anos de 2012 por 44% dos assassinatos por homofobia no mundo, em Belo Horizonte houveram dois assassinatos a travestis no mês de agosto (2013), sendo uma das vítimas morta a pedradas. Anyky Lima, vê um descaso na investigação de crimes contra as travestis e não há contribuição da mídia “a mídia marginaliza as travestis, como se elas fossem culpadas da própria morte, sempre a prostituta e drogada”. Para o estudante Jefferson Santos Machado,23, a falta de contato com as travestis faz com que elas se tornem marginalizadas e a ação da mídia reflete essa realidade “as travestis são marginalizadas, primeiro, pela sociedade que não tem contato, e a mídia apenas reflete isso sem procurar uma forma de intervir nessa bola de neve que desde muito tempo vem rolando”, explica. A internet para Jefferson Machado é um pode abrir portas e trazer a realidade das travestis de forma real, sem preconceito, o site homofobia mata é um deles “existem vários canais no youtube e páginas, grupos e perfis no facebook que acabam abrindo espaço para que elas saiam dessa marginalização histórica.” Explica. O estudante vê que mesmo através do humor a travesti pode ter voz e conscientizar as pessoas que travestis são seres humanos como qualquer outro “Luísa Marilac que, depois de 15 minutos de fama na TV, hoje mantém um canal onde fala sobre as questões de onde vive (Guarulhos) e sobre a sociedade num geral, além de comentar casos de travestis que não são comentados em grandes redes de jornais, tv’s e afins.”. Explica.

MOBILIZAÇÃO


MOBILIZAÇÃO

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DRUGSQUARE

Um panorama sobre o consumo de drogas em Belo Horizonte

Foto: Hemerson Morais

Por Hemerson Morais e João Vitor Fernandes (5º período) - Jornalismo Multimídia

No bairro Lagoinha, próximo ao Conjunto IAPI, quase todos os dias é possível encontrar um intenso movimento de tráfico e consumo de drogas Praça Sete, complexo da Lagoinha, Praça da Liberdade, Viaduto Santa Tereza e Savassi. Além de pontos turísticos da cidade de Belo Horizonte, estes locais tem outro ponto em comum. Neles, é possível observar pessoas consumindo drogas à céu aberto e à luz do dia. Eduardo Soares, coordenador da Pastoral da Sobriedade, e ex-usuário de drogas, afirma que, hoje, as drogas são facilmente encontradas em qualquer região da capital. “Há alguns anos, as drogas eram reconhecidas como drogas de periferia, hoje, vemos concentração de dependentes na Savassi e no Lourdes”, aponta. Além de locais públicos, bares e boates, faculdades e escolas estão também se tornando alvo dos traficantes de Belo Horizonte. Eduardo Soares explica que não é possível ter controle sobre as drogas pois elas estão disseminadas em diferentes locais, no espaço urbano. “As drogas estão nas faculdades e escolas. Antigamente, a maconha era uma droga temida, hoje, ela é como se fosse um copo de cerveja” completa. Neste sentido o assessor do Conselho Municipal sobre Drogas Nilton Bittencourt aponta que um dos principais programas de combate as drogas da prefeitura de Belo Horizonte é o Consultório de Rua, “que age diretamente na cena de uso”. Porém, este serviço só funciona na região central da capital. O consumo de drogas, principalmente nos grandes centros urbanos, é um dos assuntos em pauta, para as entidades de serviços sociais, dos estados e municípios. Segundo

dados do II Levantamento Nacional de Álcool e Drogas (LENAD), os brasileiros estão bebendo mais. Segundo a pesquisa aproximadamente 11,7 milhões de pessoas são dependentes do álcool no país. Os números de usuários das drogas consideradas ilícitas também são alarmantes. O números apresentados pelo Relatório Mundial sobre Drogas 2013, do Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC), mostram que 1,73% da população brasileira é usuária de cocaína e 0,9% são dependentes de crack. Em janeiro de 2013, o governo de São Paulo deu início a uma nova política relacionada aos dependentes de álcool e drogas, sobretudo o crack. O Centro de Referência em Álcool, Tabaco e outras Drogas (Cratod) auxilia nos processos de internação voluntária e compulsória dos usuários numa iniciativa polêmica e que foi seguida de outra semelhante no Rio de janeiro. As práticas de internação compulsória para dependentes químicos é feita desde que seja comprovado que o usuário não consegue garantir sua integridade física e mental. No entanto, para o presidente do Conselho Regional de Psicologia de Minas Gerais Humberto Verona esta prática joga por terra tudo que já foi conquistado em termos da luta antimanicomial. “As pessoas estão com um pensamento antigo e conversador, um discurso de internação, um discurso inteiramente manicomial; e tudo que a gente já conseguiu, até hoje, está em risco em função de uma política equivocada”, analisa.

Em Belo Horizonte, esta política é tratada como última opção. Para o assessor do Conselho Municipal Sobre. como Drogas Nilton Ferreira Bittencourt Júnior, é preciso criar ações preventivas para que as pessoas não venham a usar drogas. “Quanto aqueles que já são usuários um acompanhamento para que saiam, o quanto antes, do vício”, esclarece. O coordenador da Pastoral da Sobriedade, e ex-usuário de drogas, Eduardo Soares acredita que é preciso união de todos. “O Problema é de todo mundo, temos quer criar uma estratégia e combater o consumo, não adianta combater o tráfico tem que combater o consumo”, afirma. A coordenadora da Associação Mineira de Pais e Amigos para a prevenção do uso de drogas(AMPARE), a psicóloga Cristina Abreu Souza entende que em alguns casos a internação compulsória é necessária. “Quando a pessoa não tem mais condições de responder pelos seus atos, a única opção é fazer uma desintoxicação involuntária para que ela possa voltar a pensar e poder escolher o que ela vai querer”, defende. Já para o Conselho Municipal de Política Sobre Drogas a internação compulsória é a última opção. “A prefeitura adota o trabalho de conscientização. Se o usuário quiser sair [da dependência] existem várias possibilidades. Porém, se a pessoa não quiser não adianta nenhum tratamento. Mas é bom deixar claro que a internação compulsória é legal e existe todo o tramite judicial que envolve este tipo de procedimento”, esclarece Nilton Ferreira Bittencourt Júnior.


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Banho de sangue

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Os cineastas Rodrigo Aragão (topo) e Peter Baierstof (abaixo)

Cineastas Rodrigo Aragão e Peter Baierstof tiveram seus filmes lançados na Mostra Indie Por Alex Bessas (2º período) e Juliana Costa (4º período) - Jornalismo Multimídia A 13ª edição da Indie Festival reuniu, em Belo Horizonte, no mês de setembro, as produções cinematográficas do “circuito alternativo”, de diferentes nacionalidades. O festival foi dividido em duas mostras paralelas, a Mundial que destacou as retrospectivas da obras de Jean-Claude Brisseau (França) e Wang Bing (China); e a Indie Brasil cujos destaques foram duas produções brasileiras do gênero gore, Mar negro, de Rodrigo Aragão, e Zombio 2: Chimarrão zombies, de Petter Baiestorf. O CONTRAMÃO entrevistou os dois cineastas que pontuaram as dificuldades da produção cinematográfica independente, fora das leis de incentivo. CONTRAMÃO: Como está o cenário de filmes gore e trash no Brasil? PETTER BAIESTORF: Cada vez mais forte, melhor, um exemplo é a Rede Globo e suas produções! Agora, o cenário de produções independentes, produzidos sem a esmola dos editais está cada vez mais forte e tentando criar um mercado autossustentável. Para produzir o Zombio 2 contei com o dinheiro de quatro produtoras, além da minha, a Canibal Filmes. Filmamos em 23 dias ao preço de 20 mil reais. O caminho natural é a cooperativa de produtoras independentes. RODRIGO ARAGÃO: O cenário geral está melhorando, até pela evolução tecnológica. Mas a gente não faz cinema por causa do mercado, não faz cinema por que é conveniente ou qualquer coisa assim. A gente faz porque é o que gostamos de fazer. A gente ama e eu não penso no filme como trash. A gente faz o filme como dá pra fazer. Eu sempre fui frustrado com o Brasil por não ter mais cinema fantástico. A cultura brasileira é cheia de folclore, de magia, de pessoas cheias de manias esotéricas, de crenças, de seres e o cinema não passa isso. Eu quis fazer algum filme que explorasse um pouco esse lado. CONTRAMÃO: Baiestorf, você mencionou o esquema de cooperativas de produção, mas e a exibição? Como sobreviver? PB: Zombio 2 tem uma acolhida interessante em Festivais de Cinema Fantástico. Sua estreia foi no FantasPoa (maior festival latino de cinema fantástico, em Porto Alegre -RS). O filme foi selecionado para o Festival Fantástico de Sitges (Catalunha - Espanha). Mas eu libero o filme para exibições em shows de bandas, lançamentos de livros, cineclubes, botecos, etc. Quanto à sobrevivência, no Brasil, infelizmente, ainda não há como. A mentalidade do cineasta e distribuidor brasileiro está em como conseguir fazer o projeto ser aprovado num edital, que em criar uma indústria forte.

Lanço meus filmes de forma independente. Às vezes, recupero o dinheiro investido, o mais habitual é perder o dinheiro em cada produção, porque aqui todos acham que cinema deve ser exibido de graça. Quem quer ganhar dinheiro tenta edital ou vira médico, advogado ou qualquer uma dessas profissões xaropes. RA: Com o Indie Brasil acontece uma coisa legal que é ter uma janela fora dos festivais de cinema fantástico, com um público diferente. É um sinal que a gente está transbordando. Este é meu terceiro longa-metragem, exibi-lo em Belo Horizonte é especial porque sou de Guarapari que é litoral de Belo Horizonte, né? O produtor do filme é daqui e eu já morei em BH, é uma cidade que eu tenho carinho. CONTRAMÃO: Por que investir no gênero fantástico, em meio às dificuldades de produção? PB: Passei quase 20 anos fazendo filmes que iam do gore, passando pelo cinema erótico até coisas dadaístas. Estou de saco cheio desse cinema intelectualóide que é regrinha no cinema brasileiro. O meu caminho, pela próxima década, será investir em cinema de gênero. O Brasil está cheio de cineastas produzindo muito, só que a maioria é mantida completamente à margem. Quero trabalhar na produção e distribuição de filmes para criar um mercado de distribuição independente no Brasil. Vai ser difícil, mas acredito num sistema de cooperativas entre produtores nanicos. RA: São filmes feitos de fãs para fãs. Com Mar Negro eu tive a felicidade de convidar as pessoas que queriam participar. Não tínhamos orçamento suficiente e as pessoas começaram a ir por conta própria. Elas pagaram a própria passagem e foram trabalhar de graça. Foi uma honra reunir 70 pessoas na equipe. Eram pessoas que estavam felizes por estar dividindo aquele espaço e que trabalhavam muito. CONTRAMÃO: Quais são os próximos projetos? PB: Lançar meu livro Arrepios Divertidos, sobre cinema independente. Lançar o Zombio 2, em DVD, para venda direta ao consumidor. RA: Eu estou trabalhando em um curta chamado Confissões de um Cineasta Canibal, que é a história de um cara que tenta fazer filme de terror e não consegue. Então, ele mata as atrizes de verdade, filma, corta os pedaços e vende de churrasquinho para financiar a compra de equipamentos. Estou trabalhando, ainda, na continuação do Mar Negro, O livro negro que trata de um livro que está presente no Noite do Chupacabra (2011) e no Mangue Negro (2008).


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Um suspense no ar

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“Hitchcock é o cinema” reúne aficcionados pela obra do mestre do suspense durante mostra realizada no Palácio das Artes

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Por Alex Bessas (2º período) e Aline Viana (4º período) - Jornalismo Multimídia

A exibição de filmes do primeiro filme de Hitchcock, O Jardim dos Prazeres, foi acompanhada pela Orquestra Sinfônica de Minas Gerais

De 31 de julho até cinco de setembro o Cine Humberto Mauro exibiu a obra completa de Alfred Hitchcock, aclamado como o mestre do suspense. A mostra foi aberta por O Jardim dos Prazeres (1925), primeira obra do cineasta. A sessão de regressão promovida pela Fundação Clovis Salgado - que contou com a orquestra mineira interpretando a trilha sonora in loco - fez lotar o grande salão do Palácio das Artes, em Belo Horizonte. Nas exibições subsequentes fãs e curiosos se aglomeravam para ver ou rever seus filmes. Jovens deixavam entrever a alegria de assistir, no cinema, aos filmes do diretor. Todavia nenhum deles parecia tão entusiasmado quanto uma senhora que, amparada por uma muleta, procurava por ingresso para O Jardim dos Prazeres. “Fiquei sabendo que Hitchcock aparece pelado nesse filme, é minha última chance de ver ele assim”, argumentava quando tentava comprar a entrada. Ainda é um suspense se, de fato, ela acreditava na estória ou se era apenas um artifício para desanimar o espectador. Aliás, a busca por ingressos para a estréia surpreendeu: tamanha foi a

demanda que com dez dias de antecedência já haviam se esgotado. A atriz de teatro do Grupo Galpão, Inês Peixoto, leu nos jornais sobre a exibição e apresentação da Orquestra Sinfônica de Minas Gerais, e, estando em viagem, fez o que pôde para conseguir ingresso e só descansou depois de consegui-lo. Mestre em Cinema pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Ataídes Braga acredita que o suspense é o fator que faz Hitchcock ser admirado tanto por entendedores como por leigos. “A ideia era que sempre havia uma bomba a explodir e um cadáver sob a cama, mas ele mesmo ria disso e se preocupava mais na articulação da montagem para iludir, ludibriar e conquistar o espectador do que em truques”, sustenta. O crítico de cinema Marcelo Miranda acredita que o nome da mostra - Hitchcock é o cinema - não podia ser melhor. A brincadeira com a frase de Godard faz todo sentido, já que, segundo Miranda, tudo o que se pode fazer no cinema está nos 54 filmes de Hitchcock. Ataídes Braga fundamenta, ao dizer que “todos os grandes diretores são importantes para

a história do cinema quando apresentam uma leitura diferente de uma época, ou criando algo original, ou desenvolvendo um estilo”. Rafael Ciccarini, professor de História do Cinema Brasileiro na pós graduação da PUC Minas, professor de Distribuição e Exibição Cinematográfica na UNA, crítico de cinema e organizador da mostra, revelou que a preparação levou mais de um ano para ser levada a cabo. A exibição visava a importância do cineasta para a história do cinema. “A obra do Hitchcock percorre quase a história do cinema inteira, começando nos anos 1920, passando do silencioso para o sonoro, do preto e branco para o colorido, o 3D nos anos 1950 ele é um dos pioneiros”, salienta Ciccarini. Para o coordenador do curso de Cinema da UNA, Júlio Pessoa, as exibições podem contribuir para o desenvolvimento do cinema em Belo Horizonte, a partir do momento que trazem a obra integral do artista - como já foi feito com Charles Chaplin e Howard Hawks - o que permite uma visão holística da história do cinema para futuros produtores.


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EXCLUSIVA

Todas as encarnações dos “demônios” de

Zé do Caixão Ilustração: Diego Gurgell

Por Alex Bessas (2º período) e Aline Viana (4º período) - Jornalismo Multimídia

José Mojica Marins mantém-se como referência do terror


EXCLUSIVA O cineasta José Mojica Marins concebeu, há 50 anos, um personagem folclórico para a cultura pop brasileira: Josefel Zanatas, mais conhecido pela alcunha de Zé do Caixão. Difícil encontrar no Brasil quem não tenha ouvido falar no agente funerário de uma cidade do interior que, em suas andanças, busca a “mulher perfeita” que possa gerar o filho e prolongar a sua linhagem, dita superior. Zé do Caixão é temido e odiado por seus atos e palavras de blasfêmia e heresia. Em uma das cenas de À meia noite encarneirei no teu cadáver, o nefasto personagem entra em um comercio local comendo um pernil de cordeiro em plena Sexta-feira da Paixão. A associação à imagem de Jesus Cristo, também chamado pelos cristãos de “cordeiro de Deus” é óbvia. E esse é apenas um dos muitos atos de horror perpetrados por Zé do Caixão nos vários filmes com este personagem das trevas. As referências de composição do personagem Zé do Caixão são clichês de filmes de terror do anos 1930, da Universal, dentre eles Drácula, interpretado por Bela Lugosi. O ator húngaro jamais se livrou do estigma da personagem que fez no teatro e no cinema e, inclusive, chegou a ser sepultado com a capa do vampiro. Outra referência possível é é o vampiro Nosferatu, do filme de F.R. Murnau, de 1922, um clássico do cinema expressionista alemão. Do expressionismo há outra associação que são os cenários dos filmes, principalmente, os cemitérios e outras edificações com silhuetas angulosas, como torres, cruzes, escadas. Hitchcock também figura entre as influências do diretor, sendo um dos cineastas preferidos do mestre do terror. Sua obra mais sádica, Os Pássaros, é considerada uma “fita” incomparável, nas palavras de Mojica,que esteve em Belo Horizonte em agosto, justamente como comentarista deste filme.

Mojica já foi chamado de mestre outras vezes, quando produzia pornô por exemplo, mas desclassifica o título - embora não esconda certo orgulho por ter um filme com 24 horas de sexo explícito. Durante décadas, Zé do Caixão e José Mojica praticamente co-habitaram o mesmo corpo. A coexistência entre o artista e seu personagem num mesmo corpo força a necessidade de diferenciar suas identidades, pois a criatura, por décadas, está encarnada o corpo do criador, como se um fosse a extensão do outro. Embora Mojica continue produzindo, Zé do Caixão, por sua vez, entrou em cena pela última vez em 2008, no filme A encarnação do demônio. Mojica insiste em querer separar e diferenciar o criador da criatura, o que torna ainda mais curioso tomar nota dos pontos de interseção entre eles. Na trilogia À meia-noite levarei sua alma, Nesta noite encarnarei o teu cadáver e A encarnação do demônio, José Mojica Marins interpreta o Zé do Caixão, em seu aspecto conhecido, com unhas grandes, cartola e sobretudo pretos. O proprietário de uma funerária de uma pequena cidade do interior é temido por sua crueldade e pelos desafios que impõe ao sobrenatural. Mojica, o diretor, também conta ter diversas vezes desafiado crendices: chegou a passar 12 horas em um necrotério na companhia de 8 cadáveres - “eram todas mulheres”, frisa. Mas o que, de fato, une criador e criatura é a angústia comum a ambos: a sina de Zé do Caixão é não conseguir ter filhos, sua continuação na terra, a eternidade pelo sangue. Mojica sofre por não ter nenhum sucessor, ninguém que siga o terror que o eternizou no cinema e no imaginário popular: “Como um bom brasileiro, eu vim da terra e acho que tinha que ter alguém que seguisse isso, que fizesse alguma coisa. Eu fico triste de não ter um sucessor, de não ter ninguém que siga esse caminho. É a

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minha grande revolta”, queixa-se. Para José Mojica Marins - que já gravou filmes com até 300 aranhas caranguejeiras -, há pelo menos um filme capaz de lhe causar medo. Trata-se de “A Sentença de Deus”, obra inacabada que tentou filmar por três vezes até sucumbir as seguidas tragédias: duas atrizes que fariam o papel da protagonista morreram afogadas, a terceira sofreu um acidente e teve a perna amputada. Mojica lamenta por sua mais recente produção, A Praga, ser exibido apenas em festivais e critica o cenário do cinema independente no país. Para ele, é um cinema feito por “patricinhos”. O cineasta se acalma quando fala de Belo Horizonte, onde já ministrou curso para mais de três mil mineiros. Três é também o número de ex-esposas mineiras. No meio de uma roda de jovens atraidos pelo cineasta, José Mojica Marins se mostrava incomodado com alargadores, camisas com estampas de bandas e especialmente com duas garotas que namoravam no banco ao lado. Por diversas respondia rapidamente as perguntas e em seguida partia para o ataque: “o brasileiro gosta de coisa importada, gosta de ter os gringo aqui [gesticula indicando o espaço de uma estampa]. Do jeito que vai, eu acho que esses jovens vão se tornar tudo boiola” e indicava “o mundo realmente não pode ser das mulheres. [...] a mulher está crescendo cada vez mais, principalmente as lésbicas” . O espantoso no encontro com José Mojica Marins não são suas histórias mórbidas ou o treinamento pelo qual passavam seus atores que inclui contracenar com cobras, escorpiões e até mesmo segurar fios elétricos. O espantoso é vê-lo rogar a tenebrosa “praga do mês’ e se despedir com a saudação de fé “Vá com Deus!”, como um bom católico que afirma ser.


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CIDADES

A capital dos

NERDS Por Juliana Costa (4º período) - Jornalismo Multimídia

Em filmes, a história é sempre a mesma: o nerd é aquele cara inteligente, meio desajeitado, excluído e que, geralmente, é o alvo de brincadeiras sem graça do grupo de alunos populares da escola. Pelo menos essa é a tônica da comédia A vingança dos nerds (Revenge of nerds, 1984), dirigido por Jeff Kanew, e similares que apostas em risadas provocadas a partir de situação de bullying que colocam o nerd na posição de um sujeito que não será bem sucedido. Na realidade, várias personalidades que seriam excessivamente intelectualizadas, fascinadas por games e obsessivas por estudo e conhecimento, se destacaram economicamente, como por exemplo Bill Gates. Na área dos jogos eletrônicos, setor importante da economia mundial, o Brasil, especificamente, faturou em 2012, o Brasil faturou cerca de 600 milhões de reais segundo uma matéria da PUC-Rio. Outro setor importante é dos HQs que faz parte do universo o site Omelete fez uma pesquisa em março des de ano e constatou que o mercado de quadrinhos cresceu 22,59% m comparação a março de 2012. Histórias em quadrinhos, cinema, literatura e seriados de TV fascinam o quadrinista Rodney Buchemi, segundo ele “um nerd assumido”, que sempre está em busca de informações as mais detalhadas possíveis sobre essas áreas. “O nerd, na maioria dos casos, é visto como uma pessoa bacana, tranquila, disciplinada e mente aberta, mas existem aqueles que preferem uma vida mais reclusa avessa ao

Ilustração: Diego Gurgell


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Foto: Juliana Costa

CIDADES

mundo externo”. Segundo Buchemi, um ícone atual da chamada “cultura nerd” é a série americana The Big Bang Theory cuja história gira em torno de personagens viciados em quadrinhos, jogos de narração, filmes e atores das produções de ficção cientifica, com um notório saber desse universo. Ou seja, ser nerd é legal. Para o ilustrador e quadrinista Ricardo Tokumoto ser nerd significa: “enxergar as coisas além do superficial, uma pessoa que leva suas paixões a fundo”. Belo Horizonte hospeda vários encontros voltados para o público gamer, otaku, nerd. Em 2011 o Festival Internacional de Quadrinhos, mais conhecido como FIQ, passou a ser considerado o maior evento de fãs e criadores de quadrinhos da América, superando a quantidade de visitantes da Comic Con, de 2011. “O FIQ nasceu de um outro projeto, a Bienal Internacional de Quadrinhos, que aconteceu no Rio em 1991 e 1993, e em 1997 em BH. A Bienal deu muito certo aqui. Mas o grupo que a realizava se desfez. Parte dele, junto com a Prefeitura de BH, resolveu, então, criar o FIQ”, esclarece Afonso Andrade, um dos organizadores do evento. A cada edição, o FIQ homenageia alguém da área, em 2013, o homenageado será o cartunista Laerte. Neste ano, o FIQ será realizado entre os dias 13 e 17 de novembro, na Serraria Souza Pinto. O FIQ inspirou novos eventos nerds na cidade, com o sucesso da primeira edição no ano passado, os organizadores decidiram con-

tinuar a realizar o The Nerd Street. Este ano o evento ocorreu nos dias 14 e 15 de setembro, no Instituto Padre Machado. O final de abril de 2013 foi movimentado para os amantes de jogos e quadrinhos; nos dias 20 e 21 de abril ocorreu à primeira edição do Heroes Festival, evento criado por Naíra Costa, que também é diretora do Anime Festival, evento voltado para animação e quadrinhos japoneses. A produção do festival resolveu atender a demanda por eventos voltados aos quadrinhos. “Tivemos palestras, workshops, apresentações, ilustrações ao vivo, foi uma iniciativa meio suicida do ponto de vista financeiro, mas não me arrependo porque o pessoal gostou demais”, conta Naira. Além disso nos dias 27 e 28 de abril Belo Horizonte hospedou o Laboratório de Jogos, um evento para criadores de jogos trocarem experiências, ideias e desenvolverem novos jogos. Além dos eventos, existem lugares fixos feitos especialmente para receber os amantes dos gostos nerds. Dois exemplos são a Otaku Animes, aberta em 2009 e a Kobold’s Den, que antes trabalhava só com a loja online, abriu uma filial na região da Savassi em maio deste ano. Essas lojas são os principais points pontos de encontro da galera que curte jogar board games, que são os jogos de tabuleiros, RPG narrativos e card games como Magic, Pokémon e Yu-Gi-Oh!. Todos os dias as lojas lotam de jogadores em busca dos produtos e espaços que elas oferecem. A Otaku Animes organiza campeonatos de Magic em todas as sextas fei-

ras, chamado de Friday Night e, de tempos em tempos, realiza outros campeonatos de card games. (reforço a necessidade de sinalizar que graficamente se prevê um glossário de termos. Lembre-se, seu leitor pode não dominar o tema.) E como se as lojas não bastassem para os fãs dessa cultura pop, ocorrem encontros pela cidade. O grupo dos Whovians MG, fãs da série britânica Doctor Who se reúne de duas a três vezes ao ano para conhecer novos membros, dividir informações e mostrar os produtos adquiridos da sé rie. Recentemente as moderadoras do grupo Mayra Magalhães e Júlia Albuquerque formaram uma parceria com o grupo Time Lords BR, fazendo com que possivelmente realizem um evento chamado GallifreyCon em Belo Horizonte. Outro grupo que realiza encontros regulares são os fãs dos Best Sellers dos últimos 12 anos, Ocorre várias vezes ao ano o Encontro das Sagas, normalmente na Praça da Liberdade. “Finalmente, BH se tornou a capital da cultura pop, por causa principalmente do FIQ que foi o genitor de todos esses eventos de quadrinhos e outros. O mercado e o mundo nerd olham para BH com outros olhos”, Buchemi afirma e confirma o que todos já percebemos: o mercado mineiro só tende a hospedar mais eventos e estabelecimentos voltados para esse público.Para você que descobriu agora que é um nerd, seja bem vindo a esse mundo de infinitas informações e expressões artísticas.


Abril/Maio de 2013

ESPORTE

Por Fernanda Fonseca (2º período) - Jornalismo Multimídia

Na ponta da língua

Adicionar créditos

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O Coletivo Família de Rua, principal articulador da cena hip hop em Belo Horizonte, comemorou os seis anos de existência do Duelo de MCs com uma festa que reuniu a nata da rima improvisada brasileira no Viaduto Santa Tereza. Foi um dia histórico, que consagrou o MC Douglas Din bicampeão nacional dos duelos de rimas, o free style. MC Din, em entrevista ao CONTRAMÃO (página ao lado), conta que esteve confiante na vitória e que foi importante ter contato com rappers de vários pontos do Brasil. Até a grande final do Duelo de MCs Nacional foram seis meses de atividades intensas, oito estados visitados e mais de 100 MCs envolvidos. Destes, oito guerreiros resistiram bravamente e disputaram no domingo do dia 25 de agosto o título de melhor improvisador da cultura hip hop brasileira em 2013. Todos foram unânims ao considerar que a baalha valeu cada momento de participação. A programação começou com os DJs LB e Nyack no comando das pick-ups e contou com os shows de Matéria Prima, Marechal e Rappin Hood, mantendo o pique do público nas alturas. O grafitti também esteve presente no palco do Duelo de MCs Nacional. Os artistas André Dalata e Raquel Schembri representaram as artes visuais da cultura hip hop. Quando as batalhas da semifinal se iniciaram já era noite. Com direito à terceiro round na grande final, disputada pelos MC Din (MG) e Koell (SP), o mineiro manteve o título em casa.


ESPORTE

Abril/Maio de 2013

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Vida dura e carne viva de um rimador

Foto: Fernanda Fonseca

Na apresentação de free style do campeão, Douglas Nascimento da Silva, o MC Din, 22, se descreveu como “aquele que vive a vida dura em carne viva”. Morador da Vila Santana do Cafezal, no Aglomerado da Serra, o bicampeão da edição 2013 do Duelo de MCs Nacional revelou ao CONTRAMÃO os processos criativos que o levaram a receber o título de melhor improvisador do país. Din avalia ainda a participação das mulheres MCs, a cena hip hop em BH e a contribuição do Duelo de MCs para a construção de novas realidades possíveis. CONTRAMÃO: Quando você começou a fazer rap e a frequentar o Duelo de MCs? Esses momentos se confundem? MC Din: Eu já gostava de rap antes do Duelo, já me identificava desde os 12 anos, ouvindo a Rádio Favela. Mas eu comecei a fazer rima quando passei a frequentar e a participar do Duelo de MCs, em 2007. CONTRAMÃO: Você foi o campeão da edição 2012, em que você pensou quando subiu no palco mais uma vez? MC Din: Rolou um pouco de pressão. A galera falava que tinha apostado em mim, que eu tinha que ganhar para não deixar o título “sair de casa”. Mas nada disso me abalou porque eu estava confiante na vitória. CONTRAMÃO: Qual a sua avaliação do processo de eliminatórias e dos finalistas da edição 2013? MC Din: Na eliminatória estadual tinha muita gente com vontade. O MC Inti que disputou a final de Belo Horizonte comigo, começou muito novo e queria muito estar na final.

Quando eu conheci pessoalmente os finalistas nacionais eu fiquei feliz e um pouco receoso, porque cada um traz da sua terra um tipo de comportamento. O MC Tai, que veio de Pernambuco, era mais fechado, não conversava muito. O MC Rog, do Pará, é uma figura muito simples, muito pura, foi muito legal ter esse contato. CONTRAMÃO: Como é para você fazer free style e quais as suas influências? MC Din: Free style é uma doideira. Quando eu comecei a rimar com meus amigos eu não sabia direito o que era e achava muito desafiador. Exige muita concentração e é um exercício mental muito bom até para o dia-a-dia. Quando eu comecei, o top era o rapper Emicida, minha referência. Tem um cara que eu considero muito bom em free style, o MC Gil, do Rio de Janeiro. CONTRAMÃO: Você entende o rap como um movimento de resistência? MC Din: É muito isso. Mas o rap tem sim uma face de resistência. Quando o rap adquiriu essa face, passou a usar o drama para contar uma história. Quem faz o rap como forma de protesto, o rap político, crítico, faz por identificação. Mas muita gente não aplica por achar que a galera está cansada de ouvir CONTRAMÃO: O Duelo de MCs exerce um papel no empoderamento dos jovens? MC Din: A essência do duelo são as pessoas. A galera que está lá na troca de ideias, num espaço de convivência, pode interagir com várias pessoas, enxergar uma outra realidade, ter mais respeito por algo que não tinha, entender o roqueiro, o pagodeiro, o mano do

funk. CONTRAMÃO: O rap é um movimento originário da periferia e, com o Duelo de MCs, veio para o centro. Essa transição alterou o estilo? MC Din: O centro é terra de ninguém. Talvez um dia tenha sido só de uma classe, mas, hoje, é tudo muito equilibrado. O Duelo de MCs veio para o centro porque é um lugar de fácil acesso. Eu não vejo problema nenhum, hip hop lá ou cá, tanto faz. A vantagem do centro é reunir pessoas de vários lugares, várias tribos. CONTRAMÃO: Na final do ano passado, você duelou com uma mulher. Como você avalia a participação feminina no movimento? MC Din: É lindo! Mas é uma situação onde há pouco equilíbrio. Se você coloca uma mulher em um palco onde só tem homem, a representatividade pelo espanto é muito maior. Elas têm capacidade tanto quanto os homens. Uma mulher campeã nacional seria de uma importância muito grande para o hip hop. CONTRAMÃO: Com a interrupção do Duelo de MCs às sextas-feiras o que a cidade perde? MC Din: Para solucionar os problemas que o Duelo de MCs vinha enfrentando, como o consumo excessivo de drogas, as pessoas estavam propondo fazer as disputas em casas de shows e locais fechados. Eu questionava se as pessoas tinham o direito de cercar os espaços públicos. Isso aqui é hip hop, é para todo mundo! Se é possível fazer sem pagar, vamos fazer. É isso que torna o bagulho mais forte.

Douglas Nascimento da Silva.o MC Din, foi eleito o melhor improvisador do país pela segunda vez consecutiva no Duelo de MCs em BH


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Abril/Maio de 2013

CULTURA

Desconstruindo a Casa Fora do Eixo Minas

Por Alex Bessas e Aline Viana (2º período) - Jornalismo Multimídia

Ilustração: Diego Gurgell

Foram quase duas horas dentro da Casa Fora do Eixo Minas (FdE), em Belo Horizonte. Delas, uma hora de quase ininterrupta conversa sobre o funcionamento da rede e todas as polêmicas que iniciaram uma guerra memética nas redes sociais. Todo esse entrevero se estendeu na imprensa, com reportagens de revistas antagônicas como Veja e Carta Capital, jornais como a Folha de São Paulo e O Globo, além de replicar em blogs à esquerda - como o Passa Palavra - e à direita - como o blog de Reinaldo Azevedo. Os militantes da sede belo-horizontina do FdE, que operam com as mesmas orientações ideológicas da rede, acompanharam vivamente todas essas discussões e são categóricos ao afirmar: trata-se de uma espécie de perseguição ao modo de vida e de produção cultural diferente do modelo político-econômico vigente. Na capital mineira, as atividades do FdE começaram com a criação do Coletivo Pegada. Fundado em 2008, o Pegada já nasceu vinculado à rede e trouxe para a capital mineira, por exemplo, o festival Transborda. Depois de 4 anos de maturação, o coletivo se dissociou. No entanto, pelo menos um membro, Flávio Charchar, passou a integrar a Casa FdE Minas, que surgiu em abril de 2012 como um ponto de referência do coletivo em Minas Gerais, permanecendo nela por 7 meses. Antes mesmo da experiência de uma vida coletiva sob o mesmo teto, o Fora do Eixo já se envolvia na sua primeira polêmica em solo mineiro. A compositora, intérprete e produtora cultural Malu Aires acusou o FdE de realizar o Transborda para concorrer - de maneira desleal - com o BH Indie Music, evento organizado por ela em Belo Horizonte. Segundo Aires, o Transborda só passou a ser realizado depois que ela se desligou da rede de festivais do circuito FdE. Para ela, esse fato explicita uma postura de negação contra quem não é parceiro da rede. A crítica da produtora ganha tons mais radicais com as recentes declarações de Bruno Kayapy, integrante da banda Macaco Bong, ao blog Rock

em Geral, de Marcos Bragatto, que não revelam a relação da Casa de BH, mas indicam uma situação de abandono e negação: depois de vincular a banda ao circuito, se tornando um dos expoentes do FdE, Kayapy decidiu se desligar do coletivo para se dedicar à banda, sendo surpreendido com os parceiros que abandonaram o projeto musical para se entregar a lógica do FdE. Mais tarde o músico ficaria internado com o diagnóstico de um tumor. Na entrevista ele conta não ter recebido nenhuma visita. Ao largo dessa controvérsia, Victor Maciel, um dos gestores da Casa FdE em Belo Horizonte, rechaça a acusação de Malu Aires com veemência. Ele alega que a casa sequer existia quando o festival aconteceu pela primeira vez na capital mineira, mas em seguida confirma que o evento é promovido pela rede. Argumenta que a ideia de concorrência já foi ultrapassada e que trabalham com a perspectiva de diálogo, garantindo ainda que, em uma cidade com mais de 2,5 milhões de habitantes, há possibilidade dos festivais coexistirem e termina convidando Aires a visitar a Casa. Para o gestor, a ideia da produtora - corroborada por Kayapy - de que quem não está com o FdE está contra ele, não se sustenta. Um dos pontos mais controversos dos “ataques” aos coletivos FdE diz respeito à prestação de contas de suas atividades, como a realização de shows chancelados pelo movimento Brasil afora. Quando questionados sobre os eventos promovidos pelo Fora do Eixo em BH desde abril de 2012 a resposta é efusiva, mas não dá conta de estabelecer números palpáveis. Victor Maciel garante que acontecem eventos semanais em todo estado de Minas Gerais apoiados pelo FdE, além dos festivais produzidos pelo Circuito Mineiro de Festivais Independentes, que neste ano incluem aproximadamente 25 shows. Na capital já aconteceram até cinco edições do Domingo na Casa e, por cerca de um ano, realizaram - em parceria com a casa de shows Granfinos - eventos gratuitos quinzenais.

Embora negue enfaticamente existir uma política de não-pagamento de cachês, conforme denunciado pela cineasta Beatriz Seigner, Maciel não soube precisar quantos artistas teriam recebido pagamento nos eventos por eles promovidos. O ninja Gian Martins explica que a rede oferece outras formas de pagamento, não necessariamente monetárias: trata-se da hospedagem de artistas gratuitamente nas casas, ou do pagamento em Cubo Cards - moeda desenvolvida e utilizada pela rede - que são posteriormente trocados por serviços. As prestações de conta constituem outra dor de cabeça para o FdE, tanto que, recentemente, lançaram o Portal Transparência, uma tentativa de tornar acessível as arrecadações financeiras públicas. Martins esclarece que o Banco de Projetos não é uma planilha de prestação de contas, mas uma plataforma para que soma todos os projetos da rede que foram feitos pelos membros da rede. Victor Maciel revela que, de cerca de 33 projetos inscritos em Minas Gerais, apenas 1 foi aprovado: o Circuito Mineiro de Festivais Independentes. Martins se debruça sobre a planilha para traçar uma crítica às políticas culturais, lembrando que a soma dos valores solicitados é de aproximadamente R$ 10 milhões, mas que o montante aprovado é de cerca de R$ 4 milhões e que o capital efetivo não passou de pouco mais de R$ 600 mil. Com base nestas leituras finaliza: “O que há de alarmante nessa planilha é que o capital não chega ao interior, é que as políticas de cultura devem ser repensadas”. Quanto à crítica de que o Fora do Eixo explora a mais-valia de seus colaboradores, Victor Maciel é enfático. “Não é um processo de exploração de mais-valia, porque não existe um processo de dominação econômica. O Fora do Eixo, na verdade, é um processo socializante, tudo que entra aqui dentro é de todo mundo”, aponta.


CULTURA

Abril/Maio de 2013

Lar, doce lar Em BH, suposições de desvio de verba e disputas de poder são rebatidas

Victor Maciel

Isadora Machado

Adicionar créditos

Quanto à crítica de que o Fora do Eixo explora a mais-valia de seus colaboradores, Victor Maciel é enfático. “Não é um processo de exploração de mais-valia, porque não existe um processo de dominação econômica. O Fora do Eixo, na verdade, é um processo socializante, tudo que entra aqui dentro é de todo mundo”, aponta. Em meio às críticas dos dois lados do espectro político-ideológico, ele debocha, indicando que “a esquerda tenta taxar de novo capitalismo, a direita tenta taxar de seita e a gente dá risada disso tudo”. A estrutura física da Casa é atraente, trazendo diversos elementos que dão àquele ambiente ares juvenis e artísticos. Há grafittis, pinturas, cartazes, mensagens espalhadas pelos departamentos. Fisicamente a Casa se divide de acordo com os chamados simulacros criados no Fora do Eixo com o objetivo de simular modelos externos à rede, com os quais estão insatisfeitos. No vocabulário dos membros, o objetivo é ressignificar. Há uma sala reservada à Mídia e Poéticas Visuais, outra destinada à Universidade Livre, mais uma onde funciona o PCult (Partido da Cultura) e outra para o Banco. A carioca Isadora Machado, que também vive na Casa em BH, assegura que - embora as equipes se dividam nestes espaços de acordo com o papel desempenhado no coletivo - as tarefas básicas para manutenção da Casa são divididas entre todos os moradores por seu gestor de residencia cultural, título assumido por Victor Maciel. Para compreender o funcionamento da Casa Fora do Eixo e de toda rede é necessário comprender o conceito do Caixa Coletivo, explicam os entrevistados. Segundo o ninja Gian Martins, trata-se de um “sistema econômico financeiro diferente do praticado em uma empresa, república ou casa coletiva comum”. O Caixa Coletivo seria a composição do dinheiro de todas as pessoas residentes na casa e é de lá que vem o capital para comprar mantimentos e suprir todas as necessidades dos membros e visitantes. O uso do caixa, considerado uma das principais ferramentas usadas para manutenção dos trabalhos, é debatido coletivamente. Martins afirma ainda que a adesão ao mecanismo é de livre escolha. Há também um armário de roupas compartilhadas. O Fora do Eixo se entende como uma organização suprapartidária, mantendo diálogo com diversas instancias de poder para a construção de políticas públicas de estado, argumenta Gian Martins. Segundo ele, não há vínculo com nenhum partido e o grupo não se posiciona ideologicamente. A proximidade com partidos de esquerda se justificaria porque, historicamente, estes mantêm diálogos com a sociedade civil organizada e tem mais afinidade com movimentos sociais. Os integrantes se entendem como parte de um movimento social, justificam o título pela criação e difusão de tecnologias sociais - citando o caixa coletivo como exemplo - e sustentando a luta pela construção de políticas públicas sociais, embora não apresentem exemplos. “Não precisamos de autorização, da chancela de ninguém para tomar as decisões da Casa”, frisa Gian. Em seguida, esclarece: “Nós somos uma rede, todo nosso trabalho é discutido em rede. Naturalmente, todas as decisões são colocadas para o coletivo”. Essa relação de autonomia é afirmada também em relação à Mídia NINJA. Machado sustenta que esta é uma rede por si só, que conecta diversos colaboradores pelo Brasil, mas, como vem da incubadora do FdE, a sua sustentabilidade passa pela rede, fazendo uso dos Cubo Cards, por exemplo. Gian explica que não há financiamento direto, o Ninja se sustentaria pelo trabalho de quem tem desenvolvido o projeto, não se restringindo a membros do Fora do Eixo. A forma de sustentar a plataforma ainda vem sendo debatida. Com sotaque sulista, Isadora Machado rechaça a acusação do trabalho desenvolvido na rede se configurar como uma escravidão pós-moderna: “O grupo é aberto. Qualquer um pode se posicionar, ir até onde quiserem e até sair da rede”. Para ela até o conceito de escravidão depõe contra os acusadores: “A questão é colocada por jovens brancos de classe média que tinham comida na mesa, livre acesso a diversos eventos culturais”. Frisa que ninguém se desligou da rede depois destes depoimentos e que algumas questões já vinham sendo discutidas, que outras já foram superadas, sem especificar quais seriam.

Gian Martins

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Abril/Maio de 2013

CULTURA

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