Ocupação Cildo Meireles

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“Alguma coisa está acontecendo aqui/Mas você não sabe o que é/Sabe, Mr. Jones”. Por volta de 1965, tínhamos a necessidade de expandir a arte para atingir outros sentidos. Certa vez, quando estávamos no MAM, montando uma exposição11 que depois foi fechada, o Tomoshige Kusuno me falou de uma gravura, não lembro de quem, feita a partir de uma grande bobina de papel estendida sobre o asfalto e depois “atropelada” por uma motoniveladora, o que gravava pedaços da pista em toda a sua extensão. Isso, seguramente, ficou na minha cabeça. Em rio oir essas escalas todas confluem para uma dimensão sonora, que supõe uma apreensão muito delicada do sentido. A espacialização, no caso, é imaginária. Quando se ouve o som já editado, a sensação é a de um concerto sinfônico, como se o ouvinte estivesse dentro de um teatro. Essa é, de certa forma, a contradição que há na minha obra: os trabalhos que são de início muito pequenos, muito discretos, lidam com escalas grandes. É o caso do Cruzeiro do Sul, por exemplo, ou de Inserções em Circuitos Ideológicos. Já aqueles que fisicamente têm uma escala maior são pensados sempre para uma única pessoa. rio oir faz parte do segundo grupo; só poderá ser fruído solitariamente, porque senão o som das águas não será ouvido, já que tem um grau de imperceptibilidade muito grande. Interessante que os norte-americanos trabalhem em geral com escalas mais amplas, enquanto nós aqui no Brasil cultivemos esse intimismo, não é? Isso tem a ver, por exemplo, com o conceito de uma exposição que o 12Gerardo Mosquera fez, em 2000, no museu Reina Sofía, chamada Pervertendo o Minimalismo: Não É Só o que Você Vê. Ela era toda formada

11 Essa exposição no MAM/RJ era uma espécie de pré-Bienal de Paris, pois dela sairia a representação do Brasil para o evento em Paris de 1969. Montada nesse mesmo ano, a exposição foi fechada três horas antes da inauguração, por um coronel do Dops. 12 Gerardo Mosquera Gerardo Mosquera (1945) é curador e crítico de arte freelancer, baseado em Havana, mas que trabalha para museus, galerias e editoras americanas e européias. Entrevista Cildo Meireles no livro sobre sua obra lançado na Inglaterra [Vários autores. Cildo Meireles. Londres, Phaidon Press, 1999], em seguida também publicado no Brasil (São Paulo, Cosac Naify, 2000).


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