Revista lusitânia contact #5

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Especial Portugal

O Ultimatum inglês de 1890 Reto Monico Historiador retomonico@gmail.com

A aliança de Portugal com a Inglaterra, que data de 1373, foi abalada por uma grave crise nos finais do século XIX. Neste artigo, ilustrado com algumas caricaturas da época, pretende-se explicar o que foi o Ultimatum de 1890, acontecimento que está na origem, entre outras coisas, do hino nacional A Portuguesa. A repulsa contra os ingleses foi tão grande na altura que deu origem a este hino de guerra, tendo, no entanto, a sua letra sido parcialmente modificada — por exemplo, em vez de se dizer «contra os bretões [ingleses] marchar, marchar», passou a dizer-se «contra os canhões marchar, marchar» —, para que pudesse ser adotado como hino nacional sem levantar problemas diplomáticos.

A exploração das costas africanas pelos europeus começa no século XV, mas até cerca de 1880 (a data da Conferência de Berlim, que decorreu de 19 de novembro de 1884 a 26 de fevereiro de 1885 e teve como objetivo definir as regras da ocupação de África pelas potências coloniais), os países europeus não colonizam praticamente o interior do Continente, limitando-se a ocupar as zonas costeiras. Quando começa a corrida à África, Portugal reclama, então, os direitos históricos porque foi o primeiro país a explorar estas costas. Porém, na Conferência de Berlim estipula-se que as potências coloniais só podem considerar como seus os territórios que ocupam realmente. É por isso que Portugal quer conquistar um território que permita unir Angola e Moçambique. Organizam-se, então, várias expedições para pôr em prática este objetivo. Este projeto da África Meridional Portuguesa — conhecido por «mapa cor-de-rosa», porque no mapa, concebido pela Sociedade de Geografia, em 1881, estes territórios aparecem coloridos nessa cor — tornaria impossível o famoso lema de Cecil Rhodes: «Domínio inglês do Cairo ao Cabo», a ligação planeada pelos colonialistas ingleses entre e o Egito, e a África do Sul. Londres abre o conflito diplomático em 1887, mas é em novembro de 1889, com a expedição de Serpa Pinto ao 30

«O macaco travesso». O semanário Punch, de 14 de dezembro de 1889, conta a história do macaco Jacko, muito traquina, que quis brincar com o mapa da África. Agarrou numa pena, meteu-a no tinteiro e escreveu «Anexação». Mas Jacko, que é um trapalhão, sujou as mãos e encheu o mapa de manchas de tinta — Nisto entrou John Bull [o Zé Povinho inglês] com a bengala e o pobre macaco Jacko teve de fugir rapidamente. Moralidade da história, segundo o semanário britânico: «Um macaco não deve brincar com mapas, mesmo sendo um português simpático».

Chire (Niassalândia e atual Malawi), que a crise entre os dois países chega a um ponto de quase rutura. O governo inglês acusa Portugal de ter atacado, quer os Macalolos, quer os Machonas (atual Zimbabué), povos que estavam, segundo o governo do 1.º ministro Lord Salisbury, «sob a proteção de sua Majestade». Toda a imprensa inglesa ataca Portugal, nomeadamente a partir de meados de novembro. «O papel de Portugal em África é uma maldição para os pretos, uma vergonha e uma desgraça para a civilização branca», escreve, por exemplo, The Times, a 7 de janeiro de 1890.


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