Matteo Ricci - Na Cidade Proibida

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Pequim, 1601.

PrecisAmente um deles, um certo mA t’Ang, coletor de imPostos de lintsing, recebe os seus Agentes que lhe dão umA notíciA muito estrAnhA...

um estrAngeiro instAlou se nA cidAde! PArece não ser um esPião nem um Agente inimigo, mAs um letrAdo que conquistou o APoio de Alguns mAndArins. disPõe, Aliás, de um PAssAPorte.

Até AgorA, muito Poucos ocidentAis conseguirAm trAnsPor o recinto dA cidAde ProibidA. Ali, Por trás dos Altos muros de tijolo, vive o Filho do céu rodeAdo PelA suA FAmíliA, PelA suA corte, PelAs suAs concubinAs e PelA PoderosA cAstA dos eunucos, que gozAm de inúmeros Privilégios e de Poderes invejáveis.

os mAndArins! PFFF. .. esses Pretensiosos sem quAlquer sentido de negócio.

ProcurA um intermediário junto do imPerA dor. trAz Presentes PArA oFerecer A suA mAjestAde imPeriAl: ouro, jóiAs... PArece que é cAPAz de trAnsFormAr o ciná brio em PrAtA .

A sério? tenho enho de conhecer esse homem! como se chAmA ele?

o seu nome é mAtteo ricci. nAsceu em itáliA, em mAcerAtA. Aos 19 Anos entrou no noviciAdo dos jesuítAs. dePois de estudAr no colégio romAno, Foi ordenAdo PAdre em cochim, em julho de 1580.

desde há 18 Anos que Percorre A chinA PArA Aí servir deus. Por terrA, Ao longo dos rios, dAs estAções, enFrentAndo PercAlços, mAs semPre com umA corAgem exemPlAr que nuncA o AbAndonA...

tem A sAgezA do corAção e do esPírito, que o levA A resPeitAr A Fé e os costumes Alheios. os seus conhecimentos de mAtemáticA e de AstronomiA, os seus dons PArA A FilosoFiA e A relojoAriA tornArAm no APreciAdo Pelos intelectuAis e Pelos mAndArins que com ele se cruzAm. tornou se, Assim, «o letrAdo do longínquo ocidente».

PessoAl do imPerAdor... e esse convite não se Pode obter sem o AvAl de um conselheiro Próximo...

contudo, o mAis diFícil está Por FAzer. ele Pretende conhecer o Filho do céu em PessoA, Pois é PelA cAbeçA que quer descer Até Ao corPo. desígnio Ambicioso, Pois é imPossível entrAr nA cidAde ProibidA sem um convite

ou de um eunuco inFluente nA corte...

PrevenirAm‑ ‑nos dA minhA visitA?

os dois «serviçAis», como lhes chAmA o lAcAio de mA t’Ang, são nA reAlidAde os comPAnheiros de viAgem de ricci.

um é o irmão Fernández, Filho de um rico cidAdão de mAcAu. comPletou o seu Período ProbAtório junto de mAtteo ricci. os três recebem o seu hósPede com As devidAs mArcAs de cortesiA, mAs mA t’Ang Põe imediAtAmente As cArtAs nA mesA .

ouvi dizer que trAzeis Presentes PArA suA mAjestAde imPeriAl . Podeis contAr desde já com A minhA AjudA . mAs Primeiro gostAriA de exAminAr esses Presentes.

sim, honorável senhor. estão à vossA esPerA . o mágico e os seus dois serviçAis.

com certezA . queirA seguir ‑me...

ei‑lo. sejAmos Prudentes. e o outro é o jesuítA diego PAntojA, um missionário que nenhum Perigo FAz recuAr.

temos dois relógios, um globo, um PrismA, duAs PinturAs e Alguns PesAdos cArtAPácios.

humm... este é bem PesAdo. deve vAler umA boA centenA de tAéis.

ehh... é sobretudo o seu conteúdo que é notável. trAtA‑se do theAtrum orbis terrArum , de ortelius.

não conheço. é um mercAdor? não. um sábio.

e As jóiAs? PArece que Possuís grAnde quAntidAde.

mentirAm ‑vos. não há nAdA disso Aqui.

A sério? e o cinábrio... disserAm‑me que o trAnsFormAis em PrAtA ...

um mAndArim. eles desPrezAm‑nos, A nós, Pobres servidores do imPerAdor. mAs esquecem‑se de como somos ouvidos nA corte.

lAmento dececionAr ‑vos de novo, não sou AlquimistA . nem Feiticeiro.

Feiticeiro, hem...

e isto! o que é estA coisA Abominável?!? estAs chAgAs? este sAngue...

Pretendeis enFeitiçAr o imPerAdor com este ídolo! eis A ProvA!!

este objeto mAléFico ProvA que sois bruxos! como esPerAis APlAcAr A minhA legítimA irA?

AgArrAndo o Pelo colA rinho e Pondo o no olho dA ruA!! mAs quem é que este tiPo... humm... não me PArece que sejA A melhor solução...

não é um ídolo. essA cruz rePresentA um senhor venerAdo em todo o ocidente. ele morreu Por nós, como umA FormA de redenção dos nossos PecAdos.

... os guArdAs dele estão ArmAdos e não hesitArão em entrAr em Ação.

e se, como ProvA dA nossA boA‑Fé, escolhêsseis vós PróPrio de entre As nossAs modestAs oFerendAs As que APresentAreis Ao imPerAdor?

!?

vós... estA ríeis disPosto A conFiAr ‑mAs?

certAmente. tAl é A conFiAnçA que dePosito em vós.

muito bem... Assim é que é FAlAr!

e vAis deixá

‑lo PArtir Assim?

levAmos ev tudo!

exceto xceto estA ... coisA A . .. horrendA!

grAçAs A estes Presentes e à minhA imensA inFluênciA tAlvez o imPerAdor Aceite receber vos. mAnter vos ei Ao corrente. mAs A coisA Pode demorAr .

demorAr ... nuncA mAis recuPerAremos nAdA!

não devemos subestimAr o Poder dos eunucos nA corte. mAs eles não são os únicos A FAzer uso dA suA inFluênciA junto do imPerAdor...

o essenciAl está Aqui, nAs orAções que dedicAremos A estA cruz. o senhor ouvir nos á. entretAnto, ProssigAmos A nossA missão... não desesPeremos. PArtAmos à descobertA deste mundo...

... ProcurAndo comPreendê lo, reconhecer As suAs mArAvilhAs e As suAs riquezAs. mesmo que escAPem Ao nosso entendimento e à nossA Fé...

entretAnto, resPeitemos este PAís. e APrendAmos.

e há tAntA coisA Por descobrir, PerAnte este universo Feito de belezA e de Abismos! e de Prodígios, tAmbém... mAs umA vidA não bAstAriA PArA cAPtAr todos os Pormenores.

vós, vós venerAis os seus ídolos! surPreendeis ‑me!

?! orA estA! mAs... quem sois vós??!

um estrAngeiro como vós, PAdre. só que, Por AgorA , AindA PermAneço nA sombrA . Ao PAsso que vós, vós Perdeis vos Por estAs terrAs. é um sAcrilégio PerAnte deus.

que sAcrilégio há em resPeitAr estAs crençAs? mesmo que PossAm envolver AlgumAs suPerstições.

estAmos Aqui PArA vArrer As crençAs que não são As dA igrejA . estAis esquecido disso?

o meu nome é don herrerA . A sAntA inquisição Armou me PArA que nAdA se PercA , nAdA se extrAvie...

gArAnto‑vos que não tenho temPo PArA me extrAviAr .

há muitos Anos que me dedico A este mundo, que semPre me APAixonou e que tento deciFrAr .

os meus PensAmentos estão semPre com cristo, meu sAlvAdor. e não creio que ele PrAtique A exclusão.

estAis Aqui PArA converter estes selvAgens. não vos extrAvieis Pelo cAminho!

e os nossos cAminhos... cruzAr‑se‑ão?

Perdeis o vosso temPo! é Preciso derrubAr estes ídolos, não lhes dAr lugAr nos nossos PensAmentos!

voltAreis A ver‑me. AindA Antes de eu ocuPAr o lugAr que me é devido.

que estrAnho PersonAgem! não sAbiA que estivesse Presente em Pequim umA novA delegAção vindA do ocidente. PArece‑me incrível!...

como é que não Fui AvisAdo Pelos meus suPeriores?

As notíciAs devem ter‑se Perdido Pelo cAminho...

AmA rrem ‑no!!! A r rem

PArA onde é que me levAis?

vejAmos... os meus documentos estão em ordem... não cometi nenhumA inFrAção. resPeitei todos os Preceitos... restA o ProblemA dos Presentes. deve ser isso.

não! ão! não é Preciso! seguir‑vos ‑ei sem oPor resistênciA!

PArA cAsA do venerável t’sAi hsu‑t’sAi , resPon ‑ sável PelAs embAixAdAs estrAngeirAs.

erA isso! o ministro tinhA ouvido FAlAr dos Presentes que ricci queriA oFerecer Ao imPerAdor e Ficou esPAntAdo Por não ter sido o Primeiro A ser inFormAdo, como erA dA PrAxe.

que dizeis?! é mA t’Ang que os tem?

* estA s Preso!

mAs como é que ele se Atreve? é A mim que me cAbe APresentAr essAs oFerendAs Ao imPerAdor! dizeis ‑me que quereis ser recebido nA corte. é imPossível se eu não interceder em vosso FAvor!!

não vos exAlteis, excelênciA . mA t’Ang não é quAlquer um. o imPerAdor dá‑lhe ouvidos. e está rodeAdo de um bAndo de cAnAlhAs que não hesitAm em recorrer à ForçA .

de Acordo! vAmos Agir com PrudênciA . Primeiro é Preciso recuPerAr os vossos Presentes, ou obrigAr mA t’Ang A levá‑los Ao imPerAdor. eu vou trAtAr disso. entretAnto, FicAreis AlojAdo no PAlácio dos bárbAros, como Acontece com todos os estrAngeiros que AguArdAm umA decisão do PAlácio.

o PAlácio dos bárbAros:

AlbergAvA então um milhAr de PessoAs de todAs As origens e de todAs As cores. coreiA, cochinchinA, sião, birmâniA, tibete, mongóliA, índiAs... mAs ricci e os seus comPAnheiros ForAm os únicos euroPeus que Ali se virAm hosPedAdos.

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