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confluências Revista da Associação Portuguesa de Gagos

Fevereiro de 2018 Notícias Informação Divulgação Opinião

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FICHA TÉCNICA PROPRIEDADE

Associação Portuguesa de Gagos DIRECTOR

José Carlos Domingues CONSELHO EDITORIAL

Daniel Neves da Costa Ana Isabel Ferreira André Caiado Rosa Paula Neves COLABORARAM NESTA EDIÇÃO

José Carlos Domingues (notícias e edição); Jorge Santos Silva, Daniel Pinho, Ana Rita Valente (artigos). A revista segue a variante do português europeu anterior ao acordo ortográfico de 1990. Os artigos são escritos segundo o acordo ortográfico da preferência dos autores. Os artigos são da exclusiva responsabilidade dos seus autores, não traduzindo necessariamente a posição da Associação. CONTACTOS

Associação Portuguesa de Gagos Rua Principal, n.º 78, Negrote 3090-834 Figueira da Foz Tel.: 925 517 093 gaguez@sapo.pt www.gaguez-apg.com A Associação Portuguesa de Gagos foi fundada em Agosto de 2005. É uma associação de âmbito nacional, com sede na freguesia de Alqueidão, no concelho da Figueira da Foz. É desde 2012 membro da European League of Stuttering Associations.

ÍNDICE 3 Editorial 4 Notícias 13 Gaguez e família 16 Gaguez: falando comigo mesmo 23 Atitudes e conhecimentos da população portuguesa acerca da gaguez

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Editorial Com algum atraso relativamente à data expectável de lançamento — a 2.ª edição desta revista. Elogios, críticas, sugestões; esperávamos as segundas, contávamos com as terceiras, agradecemos os primeiros. É um projecto que está a dar os primeiros passos, e está sujeito a constantes melhoramentos. Neste número contamos com duas reflexões da autoria de quem conhece a gaguez de viva voz. A importância da família na promoção de respostas positivas face à gaguez tem sido um tema várias vezes abordado nas Jornadas sobre Gaguez, entre outras, na mais recente edição, em Outubro do ano passado. O artigo “Gaguez e família” vem nessa sequência, um exemplo claro das dinâmicas de reflexão (fixando, sintetizando ou elaborando) que se pretende potenciar com esta iniciativa. O artigo “Gaguez: falando comigo mesmo” apresenta também, num outro registo, uma partilha da experiência pessoal da gaguez. Dois olhares, duas abordagens, mas a mesma partilha unida num propósito comum: testemunhando, inspirar e consciencializar. Saliento também o artigo escrito pela terapeuta da fala Ana Rita Valente, investigadora da Escola Superior de Saúde da Universidade de Aveiro, que nos apresenta as conclusões de um estudo que efectuou com vista à avaliação das atitudes da população portuguesa relativas à gaguez. Neste trabalho, e fazendo uso de uma ferramenta especificamente desenvolvida para este propósito (o questionário POSHA–S), pretendeu-se identificar as variáveis demográficas que permitam prever as atitudes da população portuguesa relativas à gaguez. Um estudo com valiosos contributos, tanto a nível das linhas para as quais será mais proveitoso dirigir acções de sensibilização, como também ao nível terapêutico. Dentre os acontecimentos que pautaram a vida da Associação Portuguesa de Gagos nos últimos tempos, saliento aqui dois: um, e uma vez mais, a co-organização do Encontro Europeu de Jovens que Gaguejam, em conjunto com associações congéneres da Itália, Holanda, Bélgica, Suécia e Finlândia, em que tive o privilégio de representar a APG e aprofundar contactos com outros activistas em gaguez; e dois, a distinção da tese de doutoramento do nosso Presidente, Daniel Neves da Costa, com o Prémio Maria Cândida da Cunha, promovido pelo Instituto Nacional para a Reabilitação, I.P. Mostram, um que a actividade da APG é reconhecida no contexto do activismo europeu, e outro, que a gaguez assume cada vez mais presença no espaço público. Esperamos que este número seja do vosso agrado. O próximo sairá, espero, num prazo inferior aos seis meses de periodicidade que desejamos imprimir a esta iniciativa, e que este número teimou em não cumprir. José Carlos Domingues Director

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III Jornadas de Perturbações da Fluência

As III Jornadas de Perturbações da Fluência — Gaguez e Taquifémia decorreram no dia 24 de Junho de 2017, nas instalações da Escola Superior de

Saúde da Universidade de Aveiro. Uma organização do Instituto epap, com o apoio da Associação Portuguesa de Gagos.

A APG no Conselho Local de Acção Social da Figueira da Foz

A Associação Portuguesa de Gagos é actualmente a entidade que representa, no Conselho Local de Acção Social (CLAS) da Figueira da Foz, as associações culturais e recreativas da Zona Sul do Município. Uma decisão tomada na sequência da reunião do CLAS no dia 23 de Novembro. 4


Encontro Europeu de Jovens que Gaguejam 2017

Na sequência da actividade semelhante desenvolvida em 2016, a Associação Portuguesa de Gagos, juntamente com Associações congéneres de Itália, Holanda, Bélgica, Suécia e Finlândia, co-organizou o Encontro Europeu de Jovens que Gaguejam 2017, uma iniciativa promovida em articulação com a Fundação Anatta (NL), através do projecto Salvaj, e com o apoio financeiro do programa Erasmus+.

De 1 a 9 de Julho, a floresta do Arboretum Prandi, em Sale San Giovanni, pequena aldeia do Norte de Itália, foi o local escolhido para este retiro de desenvolvimento pessoal e conexão com a natureza, sob o título "Criatividade Natural”. Workshops de descoberta e reflexão pessoal centrados em valores, tirando partido de uma relação próxima com a Natureza, exercícios de Visualização, Mindfulness ou Meditação, e sessões de círculos de conversa foram algumas das actividades desenvolvidas, que permitiram não só constituir duradouras amizades mas também potenciar compreensões mais realistas e positivas dos desafios que a gaguez coloca na vida de quem com ela se vê confrontado. 5


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A produção de um filme, partindo da criatividade de quem gagueja, permitiu desconstruir a experiência negativa da gaguez e reconfigurá-la de modo mais descomplexado, constituindo-se como uma forte ferramenta terapêutica. Ao fim da tarde, actividades diversas de apresentação da cultura dos respectivos países permitiram não só potenciar a partilha intercultural mas também criar momentos de alegre confraternização. Também os passeios pela natureza, apreciando não só a floresta do Arboretum mas também as espécies campestres e as actividades da região, contribuíram para o ambiente de contemplação, reflexão e crescimento pessoal que permeou toda a semana. A delegação portuguesa foi composta por José Carlos Domingues, Secretário

da Direcção, e Pedro Merino, associado da APG e membro do Grupo do Porto.

A Associação Portuguesa de Gagos está inserida numa rede de associações nacionais e internacionais de activismo em gaguez, e é nosso objectivo continuar a estreitar diálogos com organizações estrangeiras congéneres, nomeadamente através da partilha de informação e da articulação de actividades conjuntas.

Comunicação social

À conversa sem tabus sobre gaguez No dia 17 de Agosto, a APG participou no Programa da SIC “Juntos à Tarde”, na rubrica intitulada à “À Conversa sem Tabus", que desta vez se debruçou sobre a gaguez. Jorge Santos Silva, Ana Isabel Ferreira, José Carlos Domingues, André Caiado e Catarina Vieira partilharam um pouco do que significa viver com gaguez. Em estúdio, Daniel Neves da Costa, Presidente da Direcção, para além de partilhar igualmente um pouco da sua experiência da gaguez, reflectiu sobre o tempo de comunicação particular de que quem gagueja precisa para estabelecer um estar em diálogo, bem como apresentou a Associação Portuguesa de Gagos e a sua missão. 6


Convívio Anual da APG Celebração do 12º aniversário da APG e Assembleia-Geral

Secretário, José Carlos Pedrosa, e pela Vogal Rosa Paula Neves, chamada a ocupar o lugar vago pela ausência do Segundo-Secretário, António Martins. A Direcção apresentou e submeteu a discussão e votação os Relatórios de Actividades e de Contas referentes ao ano de 2016, que foram aprovados por unanimidade. Deu depois nota das várias actividades já desenvolvidas durante o ano de 2017. De seguida apresentou o Plano de Actividades e o Orçamento para o ano de 2018, solicitando ainda propostas de actividades dos associados. Após recolhidas diversas sugestões, foram os documentos igualmente aprovados por unanimidade. O Sr. Presidente da Mesa propôs de seguida a aprovação de um voto de

A Associação Portuguesa de Gagos levou a cabo, no dia 17 de Setembro de 2017 e nas suas instalações em Calvete, Alqueidão, o seu Convívio Anual, iniciativa que coincidiu, como já em anos anteriores, com a celebração do seu aniversário. Na mesma ocasião, reuniram os seus associados em Assembleia-Geral, pelas onze horas e trinta minutos, de acordo com a ordem de trabalhos previamente indicada. Como à hora indicada na convocatória não estava reunido o quórum suficiente para o início dos trabalhos, a sessão teve início trinta minutos mais tarde. Os trabalhos foram dirigidos pela Mesa da AssembleiaGeral, nesta ocasião composta pelo seu Presidente, Luís Rocha, pelo Primeiro7


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louvor à Direcção, pelo trabalho que tem vindo a desempenhar, proposta essa que foi igualmente aprovada por unanimidade.

de Jovens com Gaguez. A partir de sexta-feira à noite, um conjunto de associados reuniu nas instalações da APG, levando a cabo diversas iniciativas de confraternização e reflexão sobre a missão e objectivos da APG. No sábado, depois de um alegre pequeno-almoço marcado por momentos musicais e de um workshop de contacto visual, participaram na tradição da vindima, para muitos a primeira vez que o faziam.

Terminados os trabalhos, o programa seguiu com o habitual almoço de confraternização, que juntou gagos e familiares, de diversas partes do país, associados e não-associados, terapeutas da fala e outros companheiros activistas, fortalecendo laços e celebrando este ideal que a todos une. Melhoramentos singelos nas instalações, de que já foi possível desfrutar, deixam antever a realização de cada vez mais actividades. As cerimónias institucionais terminaram com o descerrar de uma placa identificativa das instalações.

Pela tarde realizou-se uma visita às salinas da Figueira da Foz, no estuário do rio Mondego, em que foi possível ficar a conhecer melhor a actividade de produção de sal marinho. Depois do jantar teve lugar uma sessão sobre a dinamização de Grupos de Pares, com o objectivo de sistematizar experiências e identificar formas de melhorar esta iniciativa.

O fim-de-semana ficou ainda marcado pela realização do 1º Encontro Nacional

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XI Jornadas sobre Gaguez

Entender a gaguez

understands stuttering” (Um mundo que entende a gaguez)”. Os trabalhos tiveram início pelas 9:30, e começaram com uma conversa em que se fez um cruzamento de diversas vozes, entre a gaguez vivida e as propostas de definição e compreensão avançadas pelo mundo da ciência, tentando responder à pergunta, de resposta aparentemente tão óbvia mas na verdade sempre elusiva: "afinal, o que é a gaguez?"

Realizadas 10 edições deste evento, e no ano em que se celebrou o 20º aniversário do Dia Internacional de Consciencialização para a Gaguez, a Associação Portuguesa de Gagos levou a cabo, no dia 21 de Outubro, mais uma edição das Jornadas sobre Gaguez. Depois de 4 anos em que se realizou em colaboração com algumas das Escolas Superiores de Saúde que oferecem o curso de Terapia da Fala, as XI Jornadas sobre Gaguez tiveram lugar em Coimbra, cidade em que entre 2007 e 2012 se realizaram 6 edições deste evento. O Instituto Universitário Justiça e Paz, na Alta Universitária, que habitualmente recebe os encontros do Grupo de Coimbra, foi o palco para esta edição. O tema desta edição, “Entender a Gaguez”, foi baseado no mote do Dia Internacional de Consciencialização para a Gaguez 2017, “A world that

O segundo momento do dia consistiu num workshop em que se abordou a etiologia da gaguez na criança, tendo por base a aplicação e integração do Modelo Multifactorial na prática clínica. 9


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Após o almoço, os trabalhos continuaram com uma comunicação dos resultados de uma investigação feita com pais portugueses sobre as suas preocupações quotidianas e antecipação de preocupações futuras, quando têm uma criança com gaguez, e sua análise do ponto de vista das implicações para a eficácia do processo terapêutico.

Na última mesa do dia levou-se a cabo uma partilha sobre a experiência de viver com a gaguez na infância, idade escolar e em adulto, contribuindo, com histórias pessoais únicas, para uma narrativa comum que forma as bases do legítimo activismo em causa própria.

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Conhecimento científico Tese de doutoramento distinguida pelo Instituto Nacional para a Reabilitação, I.P. se pode potenciar uma cultura de inclusão e emancipação na deficiência, a criação de conhecimento que desconstrua situações de estigma e descriminação e o desenvolvimento de activismo científico e terapêutico através da criação de dispositivos de indagação e reflexão colectiva entre pessoas com gaguez, familiares, cuidadores, terapeutas da fala, professores, estudantes e outros profissionais. Este diálogo entre conhecimentos e práticas de conhecimento (tanto científico, profissional como experiencial), que emerge das dinâmicas de indagação fomentadas, permite a desconstrução da posição de subalternidade em que as pessoas com deficiência usualmente se encontram e iniciar um processo de empoderamento cívico, epistémico e político, tanto individual como colectivo e de produção de conhecimento e práticas de cuidado de saúde, que pode ser replicado em outros grupos e comunidades.

A tese de doutoramento «O Touro que nos Puseram na Arena. Ou: O Desdobrar das Fronteiras nos Interstícios da Palavra – Gaguez, Ciência e Comunidades de Responsabilidades», de Daniel Neves da Costa, Presidente da Associação Portuguesa de Gagos, foi distinguida com o Prémio Maria Cândida da Cunha, promovido pelo Instituto Nacional para a Reabilitação, I. P. Dirigida às Ciências Sociais e Humanas, esta distinção visa mobilizar os estudantes do Ensino Superior para a produção de conhecimento sobre os fenómenos da deficiência, discriminação e reabilitação, através da realização de trabalhos académicos.

Licenciado e Mestre em Sociologia, e agora Doutorado em “Governação, Conhecimento e Inovação”, pela Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra, Daniel Neves da Costa é investigador júnior do Centro de Estudos Sociais (CES) da Universidade de Coimbra, desenvolvendo a sua actividade no Núcleo de Estudos sobre Economia, Ciência e Sociedade.

Usando a gaguez como estudo de caso, este trabalho demonstra como 11


25 de Outubro de 2014 VIII Jornadas sobre Gaguez "Gaguez e diversidade terapêutica - Expectativas, ferramentas e interrogações" Escola Superior de Tecnologia da Saúde do Porto


Gaguez e família Jorge Silva 54 Anos, natural e residente no Porto. Nível de escolaridade no nível do 12º Ano com acesso ao ensino superior, não efectuado. Actualmente vendedor-distribuidor como actividade profissional. Casado, com uma filha, autodidacta e tendo como hobbies principais a literatura, a escrita e o canto. A bricolage é quase actividade profissional. PQG desde os cinco anos de idade, e militante da causa da Consciencialização para o Problema da Gaguez como sócio da APG e membro do Grupo de Auto-Ajuda do Porto

Baseando a minha opinião numa experiência de vida muito pessoal, onde, tal como todas as pessoas com a disfunção da gaguez, vivi, senti e padeci das muitas e variadas incongruências ligadas à mesma, considero a família, e o inerente ambiente familiar, uma das primeiras e bastante positiva forma de alguma coisa fazer pela gaguez no sentido de a minorar ou ajudar a enfrentar o problema de uma forma positiva. Na minha família, a gaguez, partilhada com um irmão mais velho, nunca foi considerada um assunto tabu mas sempre foi vista, sim, como um problema real a ser considerado e tido em conta, mas no contexto de sempre se procurarem soluções e ajudas possíveis. Apesar de pessoas simples, com a instrução básica e de poucos recursos, os meus pais sempre tiveram a capacidade e o discernimento bastante para lidar com o problema que lhes afectava dois filhos e sempre tentaram e procuraram, senão a solução, todas as formas possíveis de minimizar o problema. Nunca se envergonharam do facto escondendo os filhos do mundo ou se desinteressaram fazendo de conta que nada havia, assim como nunca entraram por aquela superprotecção que muito facilmente poderia acabar por criar uma zona de conforto com resultados previsivelmente negativos. Nunca deixaram ou admitiram que rotulassem os filhos de “coitadinhos” ou que muito simplesmente os considerassem como uns simples “bichos raros”. A “zona de conforto” tinha os seus limites, mas a “zona do abismo” também tinha as suas barreiras. Tínhamos que ser como todas as outras crianças, de ganhar e conquistar o nosso “espaço” nas vivências e nas brincadeiras, o que na minha opinião foi uma forma inteligente de lidar com o problema, mas nunca descurando o problema. A atenção a qualquer contratempo relacionado com a gaguez era sempre presente porque era impossível ficar arredada da mesma e dos muitos e variados estados emocionais ou psíquicos que originava, e que nunca seriam logicamente do agrado de qualquer pai ou mãe, para mais já de si sempre ressentidos do problema. A exigência de cuidados e ajuda tornava-se assim mais intensa e necessária. Na década de sessenta e mesmo nas décadas seguintes do século passado não havia muito a dizer ou a fazer relativamente à gaguez a não ser considerá-la simplesmente um problema que existia e com a qual se tinha de viver bem ou mal, e muito pouco ou mesmo quase nada havia no aspecto técnico ou mesmo médico em relação ao tema, isto não só dentro do âmbito das hipóteses daquilo que os meus pais podiam procuraram como quase de toda a certeza no aspecto geral. 13


Não existiam centros, organismos, terapias ou supostos estudos médicos para possíveis acompanhamentos e as pseudo-soluções ou curas eram na sua maior parte encontradas na tradição popular, nas medicinas alternativas, muitas vezes no misticismo e na sempre presente intervenção divina, e em tudo o que fosse plausível, por opinião de terceiros, de ser tentado e posto em prática. Os meus pais não fugiram à regra. Da rogação piedosa à Santa Clara perante o corpo mumificado na igreja do Bonfim no Porto aos chás milagrosos de uma ervanária que iriam combater uma hipotética gordura que apertava as minhas cordas vocais, passando pela célebre receita médica de “os nervos curam-se com um pau pelas costas abaixo” passada ao meu irmão por um Senhor Doutor perante a pergunta/opinião da minha mãe “se o menino seria nervoso”, de tudo havia como panaceia, assim como muitas outras pseudoterapias que entravam por vezes pelo ridículo e mesmo pela própria estupidez, e que pela sua exacta condição não eram nem poderiam ser tidas em conta. No conjunto das muitas propostas, conselhos e indicações algumas havia que podiam ser consideradas e postas em execução e que se não estragaram, pelo menos foram tentadas e por vezes acabaram por obter algum resultado positivo. Lembro-me perfeitamente de alguém ter aconselhado a minha mãe a “pôr o menino a ler em voz alta”, coisa simples e fácil de imediato posta em prática com alguns resultados promissores em contraponto com muitas outras que nada adiantaram, como o falar devagar separando as sílabas e em tom monocórdico, que nenhum resultado obtinha a nível da percepção e me deixava numa sensação de autêntico “atrasinho”, o que acabava por quase originar um efeito contrário. No período mais negro da minha gaguez, e aquele que considero uma das alturas da vida mais graves para o problema que é o início da adolescência, vi-me de repente a entrar num buraco e a bater no fundo, deixando de estudar e entrando num processo de revolta negativa que mais uma vez preocupou e necessitou da ajuda providencial da família, obrigando uns pais desesperados perante uma “travagem” repentina de um ciclo de vida do filho a procurarem uma ajuda quase inexistente e que em último e único recurso foi encontrada na psiquiatria e que acabou por se tornar numa providencial tábua de salvação, com uma eficaz terapia psicológica que anulou revoltas, diminuiu receios e indicou o caminho a trilhar para o futuro dentro de uma forma positiva que se baseava simplesmente no factor de nunca aceitar e deixar que a vida fosse condicionada pela gaguez. O acompanhamento familiar foi e será sempre fundamental e necessário em todo o processo e ciclos de vida dentro da problemática da gaguez, e esse mesmo acompanhamento acabou por ser mantido na etapa da constituição de uma nova família, com uma companheira para a vida dotada de uma atitude totalmente desprendida de qualquer preconceito ou temor em relação ao problema, mas não indiferente do mesmo, dado que acabou por se tornar num novo esteio de apoio, ajuda e incentivo para de uma forma pragmática e animadora poder continuar com a “luta”. Nas minhas horas más, a família esteve sempre presente no consolo, no incentivo e na ajuda e, sem exageros ou extremismos souberam dentro das diminutas pos-

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sibilidades ir auxiliando a formação de uma vida futura tendo sempre em conta e atenção o problema, num trabalho que se pode acabar por considerar positivamente bem conseguido, dado que, e apesar de tudo (da gaguez e outros constrangimentos familiares difíceis), a infância acabou por ser feliz, a adolescência que começou mal acabou por seguir os seus trâmites normais e a vida adulta acabou por ser pouco condicionada pelo problema, embora a consciência de que a sua existência era permanente e o estigma da sociedade era omnipresente. Foi essa inteligente actuação paternal e familiar que me leva a considerar ser eu um felizardo perante tantos outros casos de igual condição com acompanhamentos totalmente diferentes que sei terem existido e que pode muito bem vir aqui servir como motivo válido e consistente de análise, e quiçá de estudo e desenvolvimento para futuras ajudas ao problema da gaguez nos seus variados contextos. Sinto que foram actuações positivas, mesmo aquelas que por vezes me constrangiam mas que percebo estavam englobadas num conjunto de acções que me ajudaram a seguir em frente sem “paninhos quentes” ou castrações, ir para a “guerra”, arranjar armas, lutar, ganhar e perder batalhas, mas nunca desanimar, desistir ou mesmo tentar resolver o problema da forma incorrecta, e a prova desta não subserviência e deste enfrentamento do problema está que ao longo dos tempos foram-me colocadas muitas e variadas alcunhas mas nenhuma delas foi “gago”, coisa que nunca consenti e palavra que abomino e evito ao máximo utilizar.

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Gaguez : falando comigo mesmo

Daniel Ricardo de Pinho 28 anos. Músico profissional. Tem o curso básico de Órgão pelo Conservatório de Música do Porto. Licenciado em Teoria, Formação Musical e Direcção Coral pela Universidade de Aveiro, encontra-se a concluir a Licenciatura em Kirchenmusik pela Hochschule für Kirchenmusik und Musikpädagogik Regensburg (Alemanha).

Após ser convidado para escrever o presente artigo, iniciei uma reflexão sobre como poderia transmitir a mensagem de uma forma pragmática e eficaz. Para isso, começo com uma pergunta essencial: Quem sou eu? Parece fácil responder mas não é assim tão simples, na medida em que tal pergunta me transporta para reflexões existenciais profundas, podendo estas serem deveras complexas. Será que sou aquilo que sou ou o que os outros querem que eu seja? Será que vivo a vida de acordo com a minha essência/natureza ou estou a viver de acordo com aquilo que os outros esperam de mim? Chamo-me Daniel Pinho, sou músico clássico, e vivo actualmente na Alemanha. A música é, sem dúvida, a minha vocação, aquilo que me alimenta constantemente, o ar que me nutre e conecta com outras dimensões, outros planos, onde sou feliz por inteiro de forma tão intensa que qualquer tentativa de descrição verbal ficará sempre aquém. Se me tivesse de definir sucintamente num adjectivo, diria que sou um sonhador. Alguém que “tem dentro de si todos os sonhos do mundo”, citando Fernando Pessoa. Sonhador para mim não significa ser lunático, um ser alheado da realidade, mas sim alguém com um espírito e pensamento livres: liberdade para pensar, para voar, para ser quem sou e como sou. Devem perguntar por que escrevo isto?! Sim, também sou apaixonado por filosofia e psicologia. Essencialmente gosto de aprender, de me enriquecer, de buscar a sabedoria pois, só através dela, serei capaz de, tendo uma consciência e conhecimento profundo e alargado, tomar as decisões mais acertadas. Qual a conexão disto tudo com a gaguez? Vamos por partes. Quem sou eu? Esta pergunta remete-nos logo para uma dimensão profunda de reflexão ao âmago de nós mesmos. Não há nada mais difícil do que a descoberta de nós próprios, contudo penso que este é o ponto de partida para, através de uma consciência pessoal, avaliarmos quem somos de facto, de onde vimos, para onde vamos, o que procuramos/queremos, quais os nossos pontos fortes e fracos… qual a nossa missão de vida, etc.

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Será que sou/vivo de acordo com a minha essência, aquilo que verdadeiramente sou, ou, contrariamente, tento projectar-me naquilo que os outros esperam de mim? Viver de acordo com a essência é o natural, algo que procuro constantemente para encontrar/atingir o equilíbrio em todas as áreas da minha vida. Penso que só desta forma se pode viver em paz, em harmonia consigo mesmo, com os outros rumando à felicidade. Esta pergunta aplica-se também à gaguez. Independentemente do historial de vida de cada um, sabemos que a gaguez faz parte de nós, assim como a estrutura física, cor dos olhos e cabelos, e muitas outras características individuais. Aceitação de sua condição é a primeiro processo para se conseguir ser feliz. Muitos de vós, legitimamente, podeis perguntar: como posso aceitar algo que me faz sofrer, que me limita, que não me permite expressar o que pretendo? Respondendo: o termo aceitação é muito diferente de resignação. Aceitação vem do verbo “aceitar, receber, estar conforme com”. Contrariamente, resignação vem do verbo “resignar, desistir, desistir de alguma coisa, abandonar, conformar-se, sujeitar-se”. “Aceitação e reconhecimento é o ponto de partida para a mudança” Eu sou apologista, obviamente, da aceitação. Aceitação pois a gaguez não foi algo que escolhemos conscientemente. Não temos o poder pleno de abdicarmos de tal condição. Contudo, temos o dever/direito de lutar para atenuar os efeitos/consequências nefastas dessa realidade. Na minha opinião, para se conseguir ultrapassar qualquer problema é necessário reconhecê-lo, dissecá-lo, ter o discernimento de conhecer profundamente o que enfrentamos e eliminar tudo o que nos causa medo. Todo este processo provém de um ciclo de aceitação. Contrariamente, resignação pressupõe sujeitar-se passivamente aquilo com que somos confrontados, algo que, no que se refere à gaguez, não é o que queremos, decerto. Reflectindo sobre o que é um problema O que é um problema? Tudo depende da perspectiva de cada um, da sua visão. Para muitos, problema é sinal de fatalismo, castigo… etc. Para mim, problema, e citando o dicionário (questão matemática proposta para se lhe achar a solução), significa obstáculo/barreira que faz parte de um dado processo de desenvolvimento/crescimento, existe para ser ultrapassada. É nesta atitude e pensamento proactivo e positivo que conduzo a minha vida e problemas. Os problemas são desafios que me preparam para outros níveis de maior complexidade. “O segredo não está em querer acabar com os problemas, pois tal não é possível, mas sim saber lidar com as mais diversas adversidade da vida” – Lair Ribeiro.

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Penso que perante um problema temos sempre dois caminhos a seguir: seguir numa atitude de vitimização/não aceitação, lamentar-se, ou, pelo contrário, retirar, mesmo do sofrimento e provação, aquilo que tal realidade nos quer ensinar e seguir em frente levando na bagagem uma experiência para o futuro. Fazendo uma analepse: É lógico ir contra a natureza daquilo que se é, pessoa que gagueja, só porque é vulgarmente conotado como “anormal”, “estranho”, “retardado”, diferente”? Diferente foi sempre uma palavra que me acompanhou desde os primórdios da minha existência até ao presente. Primeiramente era diferente por ser uma criança mais madura que as do seu meio, por ter outros interesses, por não ser como os demais, por ser profundo, por ter outra postura na vida, por ter personalidade, por ter tido acne muito agressivo na adolescência, por gaguejar, questionar o porquê… enfim, às vezes apenas por ser quem sou, por existir. Não foi fácil chegar até aqui mas eu consegui! E é esta a mensagem que quero frisar e transmitir a todos vós. Na minha existência, já sofri muita discriminação e situações de injustiça, contudo nunca me entreguei. Sempre lutei com toda a força que me caracteriza. Sim, é uma luta! Quantas vezes estive na solidão de mim mesmo, contra tudo e todos. Poder-me-ia ter tornado um ser revoltado e amargurado mas não enveredei por esse caminho. Sempre procurei, em vez disso, cultivar-me, estudar, revestir-me de conhecimento e argumentos para lutar com a ignorância - fontes de muitos problemas. É lógico viver de acordo com aquilo que a cultura de massas/maioria nos impõe como sendo “normal”? Vivemos numa sociedade e mundo paradoxais onde: - a arrogância é vista como sinal de força; - tudo que é novo, diferente, estranho é visto como “anormal”; - o sensível sinal de fraqueza; - aquilo que está na moda é que é dito “cool” e moderno; - onde a cor da pele é visto como raça inferior; - onde a mulher é vista como inferior ao homem; - onde a gaguez é vista como sendo algo pertencente a pessoas talvez não muito inteligentes, “retardadas” e até deficientes… É lógico ser aquilo que as massas preconizam como sendo normal e aceite? Não, eu não concordo! Principalmente quando, tantas vezes, a maioria não é exemplo para ninguém. Além do que, muitas linhas de orientação podem ser bastante discutíveis e refutáveis. Sim, sou diferente com orgulho. Não quero ser mais um. Quero ser alguém que faça a diferença nos meios onde circula, com as pessoas com quem contacto, no mundo. Não se trata de gostar de ser do contra mas confesso que me entusiasmo em

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não seguir os rebanhos existentes, em despertar mentalidades, abrir novos horizontes. É o espírito livre que fala em mim. Então as perguntas que se impõem: tenho de ser como os demais? Obedecer aos mesmos padrões, quando muitos deles são discutíveis e configurado a uma dada realidade? Tudo é uma questão de perspectiva/paradigma. Por exemplo: quantas vezes a mesma mensagem é interpretada de forma completamente diversa segundo um dado interlocutor? Cada paradigma/meio/realidade obedece às suas regras. Se cada um criar as suas regras, o seu paradigma, assumir as rédeas da sua vida não se torna dependente da aprovação do outro. A opinião do outro deve ser escutada na medida em que esta, mesmo sendo crítica, me venha enriquecer e não discriminar ou deixar mossa psicológica. Desta forma sou feliz pois a minha vida não está nas mãos no outro mas sim na firmeza daquilo que sou e das decisões que tomo. Decisão/declaração são termos muito importantes! Há anos que declarei “ a felicidade deve provir primariamente do íntimo de nós mesmos e não da interferência de terceiros”. Quero ser livre para fazer as minhas escolhas, ser quem sou, ou estou refém da opinião dos outros? Eu escolho ser livre! Eu compreendo que vivemos dentro de uma sociedade e é difícil ser completamente imune às influências que nos chegam dos mais diversos quadrantes contudo cabe a cada pessoa dosear o nível de interferência que os outros podem assumir na nossa vida pessoal. O que importa o riso, a admiração, escárnio dos outros quando nos ouvem gaguejar? A melhor forma de reagir é dizer: gaguejo e quê? Esta atitude desarma completamente o outro. A forma como nos apresentamos e a imagem que transmitimos, não de vítimas, será fulcral para consciencializar e exigir o respeito do próximo pelo exemplo de gostarmos e nos aceitarmos como somos. Na vida, seremos sempre criticados por qualquer motivo; passemos a dar valor àquelas pessoas que realmente importam e fazem diferença nas nossas vidas! Eu sou um sedento de conhecimento e isso tem alargado os meus horizontes. Tal postura que assumo na vida não se estabeleceu de um dia para o outro. Porém, tal realidade sedimentou-se em mim fruto de um trabalho interior ao longo do tempo. Caminho de muitas quedas mas sempre me levantando. Eu decidi gostar de mim, ser amigo de mim próprio, amar-me, e isso restabeleceu-me de sofrimentos passados levando-me ao equilíbrio e discernimento que actualmente possuo. Tudo isto teve efeitos positivos na minha gaguez, uma vez que tudo foi relativizado, atenuado, reformulado. Minha experiência de gaguejar De uma situação problemática nos tempos de universitário em Portugal, decidi procurar ajuda e maior conhecimento sobre a gaguez. Encontrei o Dr. Brito Largo, com 19


quem falei pessoalmente, e desde logo fui elucidado para uma quantidades de ideias e situações para que, naquele tempo, não estava desperto. Ele aconselhou-me a visitar um grupo de auto-ajuda que se encontrava mensalmente em Miramar. Assim o fiz, e logo, desde o primeiro encontro, algo se revolucionou no meu pensamento. Através dos diversos testemunhos e contacto com os outros membros, tudo se relativizou pois constatei que a minha gaguez era insignificante perante aquilo que os meus companheiros e amigos tinham já ultrapassado. A partir do momento em que deixei de me concentrar no meu problema tudo se atenuou e influenciou, como um efeito dominó: relativização - menos ansiedade/nervosismo - comunicação mais fluente. Mais tarde, floresceu a aceitação, uma espécie de coroação num processo de apaziguamento. Existe uma lei universal, conhecida como lei do aumento, segundo a qual “tudo que se concentra, aumenta. Se nos concentrarmos nos problemas, eles aumentarão. Caso nos concentramos na solução, elas também aumentarão.” A partir do momento em que deixei de alimentar a gaguez, bem como todos os medos existentes, tive uma melhoria significativa até um estado quase de fluente total e constante. Segundo a minha visão, é de extrema importância falar sobre a gaguez, reflectir, debater, conhecer, compreender, trocar experiência, entreajudar-se mas não alimentar os medos e tudo o que ela nos traz de mau. Não alimentar a gaguez significa, entre muitas coisas, não se deixar absorver, desistindo da vida pelos seus efeitos e dificuldades constantes. Não deixar que esta assuma o controlo da vida. A gaguez não é a minha vida: faz parte dela, mas não tem a supremacia. Caso contrário, incito à reflexão, pois a partir do momento em que a vida de alguém está suspensa e totalmente concentrada só na gaguez e seus efeitos, é sinal que existem outros problemas que devem ser repensados, e não justificados apenas pela presença da gaguez. Agindo sempre com o mesmo modus operandi não iremos atingir resultado diferentes. É lógico. Se a minha concentração está apenas no gaguejar, no medo das reacções, na vergonha, no medo da exclusão, de não demonstrar fraqueza, como poderei resolver/atenuar a situação? Aqui auto-estima tem um papel fulcral. Não quero, de todo, dizer que falta de auto-estima provoca gaguez mas é lógico concluir que um dado indivíduo que não esteja em equilíbrio, não tendo confiança em si mesmo, que não goste de si, como poderá reagir face aos obstáculos que a gaguez pressupõe? Segundo estudos da área da Psicologia, chegou-se à conclusão que pensamento gera sentimento, sentimento gera acção, acção gera acontecimento/resultado. Podemos então concluir que tudo nasce no pensamento. Este será o ponto de partida, o foco que deverá ser trabalhado. Ainda mais quando sabemos que cada ser não utiliza o máximo das capacidades cerebrais que possui. Vale a pena pensar sobre isto. Minha forma de conviver/atenuar a gaguez Como sabemos, cada indivíduo é único e cada gaguez também assim o é. Logo, as características bem como técnicas/dicas podem não funcionar/ajudar para determinada pessoa. 20


No meu caso, socorrendo-me de ser músico, um aspecto que tenho em conta na acção de comunicar é de não manter sempre o mesmo tom de voz: primeiramente, porque é algo repetitivo, monótono, que origina fadiga e por consequência desatenção por parte de quem nos ouve; seguidamente, porque falar com uma certa cadência melódica ajuda a desviar de palavras mais propensas a gaguejar. Aprofundando: procuro falar mais expressivamente, ou seja, dar certas nuances ao processo discursivo através de mudanças no tom de voz, na acentuação bem como na velocidade, ora mais rápida ora mais lenta, utilizada na articulação das palavras. Fazer pausas é essencial. Primeiramente por uma questão fisiológica, respirar bem. Depois porque torna o discurso mais lógico e estruturado. Evitar dizer muita informação de forma atropelada e rápida pois muitas vezes o problema é querer despachar a informação com medo de gaguejar e isso não abona em favor de uma conexão equilibrada sobre o que se pensa e como esse pensamento vai ser transcrito em palavras. Quando me refiro a diferentes tons de voz não me refiro, obviamente, a cantar, apesar de o que li e estudei na arte de bem falar (retórica) me ajudarem a tornar o discurso mais expressivo, musical e, por consequência, fluente. Não posso deixar de frisar que naturalmente existem períodos em que, pelo facto de estar mais cansado ou sensível, poderei ter menos fluência. Contudo, a atitude de relativização, aliada a uma estrutura psicológica positiva e utilizando a técnica que explanei são pontos que, unidos entre si, atenuam a gaguez e principalmente me deixam apaziguado com esta problemática. A escrita deste artigo pessoal não pressupõe ser um artigo científico, mesmo citando fontes de conhecimento e alguns autores. O propósito é fazer uma reflexão com todos os leitores, de acordo com a minha experiência pessoal de gaguez e postura perante a vida, de forma a ajudar, elucidar, partilhar algo que seja útil e que faça a diferença, para melhor, espero eu, na vida de cada um de vós. Não poderia terminar sem antes compartilhar convosco um texto de uma canção italiana que considero oportuno e inspirador: Na Fantasia Na fantasia eu vejo um mundo justo Ali todos vivem em paz e em honestidade Eu sonho que as almas são sempre livres Como as nuvens que voam Cheias de humanidade no fundo da alma Na fantasia eu vejo um mundo claro Lá também a noite é menos escura Eu sonho que as almas são sempre livres Como nuvens que voam Cheias de humanidade 21


Na fantasia existe um vento quente Que sopra pela cidade como amigo Eu sonho que as almas sĂŁo sempre livres Como nuvens que voam Cheias de humanidade no fundo da alma Compositor: Ennio Morricone Letrista: Chiara FerraĂš

Sejam felizes!

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Atitudes e conhecimentos da população portuguesa acerca da gaguez Ana Rita dos Santos Valente Natural de Aveiro, concluiu a sua licenciatura na Escola Superior de Saúde da Universidade de Aveiro em 2007 e o Mestrado em Ciências da Fala e da Audição em 2009. Tem-se debruçado sobre o estudo da gaguez, pela autoria de diversas publicações científicas e desenvolvimento de produtos registados, bem como lecionado conteúdos relativos a esta temática na Escola Superior de Saúde da Universidade de Aveiro e em diversos workshops. Em 2014 concluiu a Especialização Europeia em Perturbações de Fluência na Universidade Thomas Moore, Bélgica. Concluiu recentemente o Programa Doutoral em Psicologia, sob o tema “Desenvolvimento de instrumentos de avaliação para adultos com perturbação de fluência”. Paralelamente, realiza atividade clínica como Terapeuta da Fala em diferentes espaços.

Introdução O presente estudo foi motivado por um número crescente de investigações que determinaram as atitudes da sociedade em relação à gaguez, as quais documentaram que o público em geral atribui traços negativos às pessoas que gaguejam [1]. Esses estudos têm sido realizados com pessoas de diferentes idades [2–6], diferente estatuto familiar [7–9], e diferentes grupos profissionais [10–15], incluindo Terapeutas da Fala [16–18]. Os resultados desses estudos indicam que a ansiedade, a timidez, o nervosismo e a introversão estão entre os traços negativos atribuídos frequentemente a pessoas que gaguejam, constituindo o "estereótipo de gaguez" [18, 19]. O estigma, que é definido por Goffman [20] como um “fenómeno através do qual um indivíduo com um determinado atributo é profundamente desacreditado e rejeitado pela sociedade (...)”, relacionase com o “estereótipo da gaguez” uma vez que a pessoa que gagueja é vista como “não normal” em todos os aspetos da sua vida, devido ao rótulo desviante que a sociedade associa a uma característica que a pessoa possui [21]. Devido à generalização do estigma e do estereótipo da gaguez, bem como às suas consequências, surgiu em 1999, na cidade de Morgantown, um projeto denominado International Project of Attitudes Toward Human Attributes (IPATHA). Este projeto teve como objetivo explorar as atitudes e conhecimentos da sociedade acerca de um conjunto de atributos humanos, nos quais se inclui a gaguez, desenvolvendo iniciativas para a melhoria dessas atitudes com vista à diminuição do impacto do estereótipo. O IPATHA formulou um conjunto de objetivos, de entre os quais se destaca o desenvolvimento e validação de um instrumento de avaliação que permita determinar as atitudes e conhecimentos da população relativamente à gaguez e a outras condições considera23


das estigmatizantes (e.g., ser doente mental), permitindo a sua comparação. O instrumento deveria ser, segundo as guidelines pré-determinadas pelo projeto: 1) curto, simples e rápido de completar; 2) fiável e válido; 3) simples de forma a permitir traduções para outras línguas/culturas e 4) de fácil cotação e interpretação [22]. Com base nas guidelines referidas, foi criada a versão experimental do Public Opinion Survey of Human Attributes - Stuttering (POSHA-S) e aplicado a diferentes populações. Com os diferentes estudos foram sendo introduzidas alterações/adaptações (e.g., alteração nas escalas de cotação, permitindo que o questionário se tornasse mais simples usar e fácil de cotar). A validade e a fiabilidade do questionário foram igualmente estudadas, tendo-se concluído que os itens do POSHA apresentam consistência interna, que os seus resultados se mantém estáveis ao longo do tempo e que os itens traduzem de forma correta o construto que o questionário pretende medir [22–27]. A análise detalhada dos itens do questionário permitiu a eliminação de itens considerados redundantes e itens que não pudessem ser traduzidos facilmente. O POSHA-S constituiu-se como um instrumento standard, o qual permite comparações entre investigadores em qualquer parte do mundo. O questionário é igualmente utilizado para determinar as estratégias que são mais efetivas/menos efetivas na diminuição do estigma associado à gaguez [22]. Após contacto com o autor do POSHA-S, Dr. Ken St. Louis, foi obtida a autorização para a tradução/adaptação cultural do questionário e sua aplicação à população portuguesa. Desde modo, o presente trabalho teve como objetivo a determinação das atitudes e conhecimentos da população portuguesa acerca da gaguez, a partir de uma amostra probabilística recolhida na totalidade do território. Pretendeu-se, ainda, comparar os resultados obtidos no presente estudo com a base de dados internacional do POSHA-S, a qual contém 141 amostras, representando 11383 pessoas provenientes de 42 países. Metodologia O estudo realizado com o POSHA-S em Portugal iniciou-se com o processo de tradução/adaptação cultural, de acordo com as recomendações realizadas pelo autor do instrumento [28] e de publicações específicas relativas ao processo de tradução [29–31]. Inicialmente foram produzidas duas traduções independentes, realizadas por duas pessoas fluentes nas duas línguas, em que uma delas tinha conhecimento acerca dos objetivos do questionário e a outra não possuía qualquer conhecimento. Seguidamente, os dois tradutores realizaram uma síntese das traduções, resultando um documento único. Esse documento foi utilizado para o processo de retroversão, tendo sido este realizado por duas pessoas que possuíam o inglês como língua materna. A constituição de um comité de revisão multidisciplinar teve como objetivo a comparação de todas as versões do questionário para avaliar a sua equivalência e produzir a versão final do questionário traduzido. A versão final foi, depois, alvo de um pré-teste, tendo sido aplicado a um grupo de 5 pessoas selecionadas por conveniência [32].

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O questionário POSHA-S, na sua versão em português europeu, manteve a composição original. O documento inicia-se com uma introdução, onde são explicados os objetivos do estudo, à qual se segue uma secção demográfica. A secção geral do POSHA-S pretende a comparação entre a gaguez e outros atributos (ser inteligente, ser esquerdino, ter alterações mentais ou ser obeso). Na secção específica acerca da gaguez constam um conjunto de itens com os quais se pretende obter informação acerca dos sentimentos, atitudes e conhecimentos que a sociedade apresenta. A cotação do questionário é realizada numa escala de -100 a +100, sendo que as atitudes/conhecimentos mais negativos (i.e., que não estão de acordo com a mais recente evidência científica) se encontram próximos do -100 e as atitudes mais positivas próximas do +100. Os itens do POSHA-S são agrupados de forma a obter diferentes Componentes (e.g., componente Causa da gaguez), sendo os componentes agrupados para a obtenção dos subscores “Crenças acerca das pessoas que gaguejam” e “Reações para com as pessoas que gaguejam”. A média dos subscores é denominado “Score geral da gaguez”. Para determinar a amostra para aplicação do questionário POSHA-S foi utilizada uma amostragem probabilística em três etapas por clusters [9]. Na primeira etapa foi criada uma lista de todos os distritos de Portugal Continental e Insular (total de 20 distritos) e de todos os concelhos existentes nos distritos (total de 308 concelhos). Aleatoriamente foram escolhidos 5 concelhos em cada distrito, totalizando 100 concelhos selecionados. Na segunda etapa, todas as freguesias existentes nos 5 concelhos selecionados aleatoriamente na etapa 1 foram listados (total de 1465 freguesias). Seguidamente foi escolhida aleatoriamente 1 freguesia, num total de 100 freguesias. Na terceira etapa, em cada freguesia selecionada na etapa 2, foram escolhidos aleatoriamente dois indivíduos (um do sexo masculino, outro do sexo feminino) das faixas etárias [18-24], [25-64] e [ 65 anos]. Perspetivava-se, portanto, um total de 600 questionários preenchidos. A autora do presente trabalho contactou as Juntas de Freguesia selecionadas na etapa 2, explicando o objetivo do estudo e a forma de seleção das pessoas. Os questionários (em papel) foram enviados para as moradas indicadas. A seleção aleatória foi realizada pelo administrativo ou pela presidência da Junta de Freguesia, tendo sido selecionadas as 6 primeiras pessoas que se deslocassem à Junta de Freguesia e que satisfizessem os critérios de inclusão (i.e., viver na freguesia, ter mais de 18 anos e ser capaz de ler/escrever). A percentagem de cada resposta foi calculada para determinação das atitudes mais relevantes na amostra representativa da população portuguesa. Os scores dos questionários preenchidos foram calculados para comparação com os dados provenientes de 141 amostras existentes na base de dados do POSHA-S. Resultados Foram obtidos 311 questionários preenchidos, que constituem 51.8 % da amostra calculada inicialmente. A maior percentagem da amostra (30.2 %) provém da zona Centro do país. A amostra encontra-se quase equilibrada em termos de sexo dos participantes (48.2 % do sexo masculino e 50.5 % do sexo feminino). A maior percentagem da amostra (28.6 %) apresenta com habilitações literárias o ensino secundário e encontra-se 25


empregado (45.0 %). Relativamente ao estado civil, a maior percentagem da amostra (59.5 %) encontra-se casado e tem filhos (53.1 %). O português europeu é a língua materna da maioria das pessoas que constituem a amostra do presente estudo (97.4 %). As respostas da secção geral do POSHA-S dizem respeito à impressão geral acerca de cinco atributos humanos, à intenção de ser uma pessoa com os atributos referidos, ao nível de conhecimento, ao contacto com pessoas com uma determinada característica e à auto-identificação. Quanto ao atributo gaguez, a impressão geral é maioritariamente neutra (63.3%) e a quantidade de conhecimento classificado como “alguma coisa” (40.0 %). A amostra do presente estudo referiu, na sua maioria (39.4 %), discordar fortemente da questão “Eu quero ser uma pessoa que gagueja”. 55.3% da amostra referiu ter um conhecido que gagueja e apenas 1.6 % se identificou como alguém que gagueja. A secção específica acerca da gaguez contém diferentes itens acerca das características que se consideram estar presentes nas pessoas que gaguejam, às atitudes para com uma pessoa que gagueja, à causa da gaguez, à ajuda necessária e à fonte de onde provém a informação que a pessoa que preenche o questionário detém sobre a gaguez. Maioritariamente, a amostra considera que as pessoas que gaguejam não devem tentar esconder a sua gaguez (90.7 %), devem ter empregos nos quais tenham de compreender corretamente e decidir coisas (62.1 %), são nervosas e emotivas (49.5 %), tímidas e medrosas (41.2 %), não são culpadas da sua gaguez (86.2 %), são capazes de fazer amigos (93.9 %), de levar uma vida normal (91.6 %) e de desempenhar qualquer trabalho que pretendam (79.7 %). Os resultados obtidos revelaram que maioria da amostra não ficaria preocupada se o seu médico (77.8 %), vizinho (82.0 %), irmão/irmã (59.2 %) ou o próprio (46.6 %) gaguejasse. Quanto às atitudes, a maioria da amostra considera que, perante uma pessoa que gagueja, tentava agir como se a pessoa estivesse a falar normalmente (89.7 %), não faria uma piada acerca da gaguez (90.4 %), não completaria as palavras da pessoa (53.7 %), não se sentiria impaciente (82.6 %), se iria sentir confortável e relaxado (62.1 %), não sentiria compaixão pela pessoa (49.2 %), e diria à pessoa para “abrandar” ou “relaxar” (46.0 %). Como causa, os participantes neste estudo consideram a herança genética (37.0 %) e um acontecimento assustador (44.4 %). Fantasmas, demónios ou espíritos, atos de Deus, aprendizagens/hábitos ou uma doença não são consideradas, pela maioria da amostra, como causas para a gaguez. Maioritariamente, a amostra considera que um terapeuta da fala (95.2 %) e um médico (72.0 %) devem ajudar pessoas que gaguejam. A experiência pessoal e a televisão/rádio/filmes são as fontes de informação maioritariamente referidas pelos participantes. Discussão e conclusão O presente estudo teve como objetivo a determinação das atitudes, crenças e conhecimento de uma amostra representativa da população portuguesa, bem como a comparação dos dados obtidos com a base de dados internacional. Verificou-se que mais de 80 % da amostra referiu conhecer alguém que gagueja, podendo estes dados contribuir para a impressão acerca da gaguez aproximadamente

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neutra [7]. Quanto à secção específica sobre a gaguez, os resultados obtidos permitem concluir que a maioria da amostra expressa atitudes positivas e corretas (ver quadro 1). Atitudes/conhecimentos corretos

Atitudes/conhecimentos incorretos

• A pessoa que gagueja não deve esconder • Dizer à pessoa que gagueja para falar a sua gaguez e deve ter um emprego com mais devagar responsabilidade • Existência de crenças acerca da etiologia: • Agir como se a pessoa estivesse a falar susto normalmente • Considerar as pessoas que gaguejam • Não fariam uma piada nem tentaria com- como nervosas/emotivas pletar as palavras da pessoa • Considerar as pessoas que gaguejam • Não se sentiriam impacientes como envergonhadas/medrosas • Sentir-se-iam confortáveis e relaxados ao falar com uma pessoa que gagueja • Não sentiriam pena • As pessoas que gaguejam não devem ser culpadas pela sua gaguez

Estereótipo da gaguez [21, 7, 33, 28]

• As pessoas que gaguejam podem fazer amigos • As pessoas que gaguejam podem ter vidas normais • As pessoas que gaguejam podem ter qualquer trabalho que pretendam • A predisposição genética também é considerada uma causa da gaguez • O terapeuta da fala é considerado como o profissional para ajudar as pessoas que gaguejam As atitudes corretas podem estar relacionadas com a classificação da quantidade de informação que a amostra diz ter acerca da gaguez. A informação pode influenciar as atitudes e torná-las mais realistas e positivas [11, 15, 26]. Por outro lado, as atitudes negativas reflectem o estereótipo da gaguez, igualmente presente em diferentes estudos [7, 9, 16, 19, 25, 28, 33, 34]. A comparação dos resultados do presente estudo com os dados obtidos nas diferentes amostras recolhidas através do POSHA-S revelou que a maioria das pontuações

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(73.3 %) se encontra na média; tal indica que as atitudes da população portuguesa tendem a ser maioritariamente semelhantes às encontradas em outras populações. Contextualização O presente trabalho foi realizado no âmbito do Programa Doutoral em Psicologia e orientado pelo Professor Doutor Luís Jesus e Dr. Margaret Leahy, com monitorização do autor do questionário POSHA-S, Dr. Ken St. Louis.

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13 Lass, N. J., Ruscello, D. M., Schmitt, J. F., Pannbacker, M. D., Orlando, M. B., Dean, K. A., Ruziska, J. C., Bradshaw, K. H. (1992). Teachers’ perceptions of stutterers. Language, Speech, and Hearing Services in Schools, 23, 78–81. 14 Ruscello, D. M., Lass, N. J., Schmitt, J. F., Pannbacker, M. D. (1994). Special educators’ perceptions of stutterers. Journal of Fluency Disorders, 19(2), 125–32. 15 Yeakle, M. K., Cooper, E. B. (1986). Teacher perceptions of stuttering. Journal of Fluency Disorders, 11(4), 345–59. 16 Cooper, E. B., Cooper, C. S. (1996). Clinician attitudes towards stuttering: Two decades of change. Journal of Fluency Disorders, 21(2), 119–35. 17 Lass, N. J., Ruscello, D. M., Pannbacker, M. D., Schmitt, J. F., Everly-Myers, D. S. (1989). Speech-language pathologists’ perceptions of child and adult female and male stutterers. Journal of Fluency Disorders, 14, 127–34. 18 Yairi, E., Williams, D. E. (1970). Speech clinicians’ stereotypes of elementaryschool boys who stutter. Journal of Communication Disorders, 3, 161–70. 19 MacKinnon, S. P., Hall, S., MacIntyre, P. D. (2007). Origins of the stuttering stereotype: Stereotype formation through anchoring-adjustment. Journal of Fluency Disorders, 32, 297–309. 20 Goffman, E. (1963). Stigma: Notes on management of a spoiled identity. PrenticeHall: Englewood Cliff (NJ). 21 Abdalla, F. A., St. Louis, K. O. (2012). Arab school teachers’ knowledge, beliefs and reactions regarding stuttering. Journal of Fluency Disorders, 37, 54–69. 22 St. Louis, K. O. (2012). Research and development on a public attitude instrument for stuttering. Journal of Communication Disorders, 46, 129–46. 23 St. Louis, K. O., Lubker, B. B., Yaruss, J. S., Aliveto, E. F. (2009). Development of a prototype questionnaire to survey public attitudes toward stuttering: Reliability of the second prototype. Contemporary Issues in Communication Science and Disorders, 36, 101–7. 24 Junuzović-Žunić, L., Weidner, M. E., Reichel, I. K., Cook, S., St. Louis, K. O., Ware, M. B. (2015). Effects of fluency disorders coursework on students’ stuttering attitudes in two countries. In St. Louis, K. O. (Ed.), Stuttering meets stereotype, stigma, and discrimination: An overview of attitude research (pp 226–42). West Virginia University Press: Morgantown (WV). 25 Flynn, T. W., St. Louis, K. O. (2011). Changing adolescent attitudes toward stuttering. Journal of Fluency Disorders, 36, 110–21. 26 St. Louis, K. O., Reichel, I. K., Yaruss, J. S., Lukber, B. B. (2009). Construct and concurrent validity of a prototype questionnaire to survey public attitudes toward stuttering. Journal of Fluency Disorders, 34, 11–28. 27 St. Louis, K. O., Williams, M. J., Ware, M. B., Guendouzi, J., Reichel, I. K. (2014). The Public Opinion Survey of Human Attributes-Stuttering (POSHA-S) and Bipolar Adjective Scale (BAS): Aspects of validity. Journal of Communication Disorders, 50, 36–50.

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28 St. Louis, K. O., Roberts, P. M. (2010). Measuring attitudes toward stuttering: English-to-French translations in Canada and Cameroon. Journal of Communication Disorders, 43, 361–77. 29 Beaton, D., Bombardier, C., Guillemin, F., Ferraz, M. B. (1998). Recommendations for the cross-cultural adaptation of health status measures. American Academy of Orthopaedic Surgeons and Institute for Work & Health. 30 Guillemin, F., Bombardier, C., Beaton, D. (1993). Cross-cultural adaptation of health-related quality of life measures: Literature review and proposed guidelines. Journal of Clinical Epidemiology, 46(12), 1417–32. 31 Wild, D., Grove, A., Martin, M., Eremenco, S., McElroy, S., Verjee-Lorenz, A., Erikson, P. (2005). Principles of good practice for the translation and cultural adaptation process for patient-reported outcomes (PRO) measures: Report of the ISPOR Task Force for Translation and Cultural Adaptation. Value in Health, 8(2), 94–104. 32 Valente, A. R. S., Jesus, L. M. T., Roberto, M. T., Leahy, M., St. Louis, K. O. (2015). Cross-cultural adaptation of the Public Opinion Survey of Human Attributes (POSHA-S): The European Portuguese (EP) translation and adaptation process as a model. In Santiago, D. (Ed.), Stuttering: Risk factors, public attitudes and impact on psychological well-being (pp 93–110). Nova Science Publishers: Hauppauge (NY). 33 Daly, C., Leahy, M. M. (2014). Public attitudes towards stuttering: An epidemiological study of an Irish population. European Symposium on Fluency Disorders: Antwerp, Belgium. 34 White, P. A., Collins, S. R. C. (1984). Stereotype formation by inference: A possible explanation for the “stutterer” stereotype. Journal of Speech and Hearing Research, 27, 567–70.

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Assinatura do novo sócio 31



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