A Aventura do Pangolim

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Eu sou um filhote de pangolim. Gosto de ficar juntinho da minha mãe. Mamo leite do peito dela e durmo abraçado com ela.


Quando ela sai, eu me agarro nela. Adoro conhecer o mundo passeando nas costas da minha mãe! Me sinto seguro com ela.


Com o passar do tempo, eu cresci e fui parando de mamar. Aí mamãe começou a me ensinar a comer cupins e formigas, que são os alimentos dos pangolins adultos.

Ela procurava um formigueiro, cutucava-o com as patas da frente e esperava os insetos saírem. Daí ela me ensinou a esticar a língua para pegar as formigas e comê-las. Hum, que gostosas!


Conforme fui crescendo, já não andava mais nas costas da minha mãe. Eu me aventurava a caminhar sozinho e a subir em árvores, enquanto ela me acompanhava de perto.

Mamãe disse que na mata existem animais grandes, que tentam nos comer, mas eu não acreditei.


Até que um dia, um cachorro do mato avançou para cima de mim. Eu fiquei assustado, mas fiz o que minha mãe tinha ensinado. Me enrolei todo e fiquei paradinho no chão, como uma bola.


O cão selvagem começou a me morder. Mas ele não conseguiu me machucar, pois minhas escamas são muito duras.


Até que ele desistiu e se mandou. Mamãe ficou orgulhosa de mim, pois eu já sabia me defender de predadores.


Certo dia, eu estava subindo em uma árvore alta, e minha mãe me olhava lá do chão.

De repente, um ser humano apareceu. Mamãe percebeu o perigo e se encolheu toda.

O homem a pegou, colocou-a num saco e foi embora.


Pra onde será que ele a levou? Minha mãe sempre dizia que, se eu me perdesse, devia ficar parado no mesmo lugar, esperando que ela me achasse.

Eu fiquei um tempão ali, esperando ela voltar. Mas ela não voltou.


Até que me deu fome e saí para procurar insetos. Era a primeira vez que tentava caçar sozinho. Será que eu ia conseguir achar comida sem a ajuda da minha mãe?


Eu percebi que tenho um olfato muito apurado. Consegui sentir de longe o cheiro de cupins. Achei um cupinzeiro e cutuquei-o com as minhas patas dianteiras.

Os cupins começaram a sair, e eu os comi. Percebi que minha língua fina e pegajosa consegue penetrar dentro do cupinzeiro, e os cupins ficam grudados nela. Daí eu puxo a língua de volta e engulo os cupins apetitosos. Hummm!

Gostei também dos ovos desses insetos. São uma delícia!

Fiquei muito feliz, pois consegui achar comida sozinho!


Os dias passaram, e minha mãe não voltou. Senti muita falta dela, mas não tinha o que fazer, a não ser aguentar a tristeza e enfrentar a vida.


Virei um especialista em achar e comer formigas e cupins. Enchia a minha pança com eles e ficava satisfeito. Apesar de ainda ser jovem, eu consegui me virar sozinho, como um pangolim adulto.

Ainda sentia saudades da minha mãe, mas, aos poucos, fui me acostumando a viver sem ela.


Uma vez, eu estava farejando insetos, quando, de repente, um leopardo grandão me atacou!


Eu tomei um susto e me encolhi todo. A boca dele era enorme! Ele me mordeu várias vezes, mas seus afiados dentes não foram páreo para minhas escamas duríssimas.

Ele ficou muito tempo tentando me comer, mas não conseguiu.


Eu fiquei aliviado e depois senti uma alegria que não cabia dentro de mim! Me senti invencível.

Estava vivendo feliz, até que um dia tudo mudou...


Apareceu um ser humano. Eu deveria ter fugido, mas me assustei e, por instinto, me encolhi todo. Isso só facilitou a vida do homem.


Ele me pegou, me colocou em um saco e me levou embora. Não acredito, aconteceu comigo a mesma coisa que aconteceu com minha mãe!

Será que ele ia me levar para o lugar onde ela estava? Eu não conseguia ver nada dentro do saco, nem respirar direito.


Quando ele me tirou do saco, vi que estava em um local fechado que se mexia. Era um automóvel. Eu estava com medo e tentei procurar uma saída. Os homens ficaram dando risada de mim, não sei por quê.

Achei uma janela e saí.


Subi no teto do veículo. Um dos homens ficou gritando e tentando me pegar, mas eu fugi dele.


Daí, o furgão freou, e eu fui projetado para frente. Me encolhi e fiquei rolando pelo chão.


Quando eu parei, estava no meio de um cruzamento, com caminhões e carros passando em alta velocidade. Oh, não, vou ser atropelado!


Então, um dos homens parou o trânsito e me pegou. Que alívio eu senti!

Mas durou pouco. Ele me colocou de volta no saco e me levou pro furgão. Pelo menos fizeram uns furos no saco pra eu respirar melhor.


Me colocaram em um depósito. Passei dias lá, sem água nem comida, e fui ficando cada vez mais desesperado. Fiquei me mexendo no saco, cutucando os furos com minhas unhas.


Até que consegui abrir um buraco e escapar. Finalmente estava livre!


Saí pela janela do depósito, mas um dos homens me viu. Então, eu subi numa árvore.

O homem pegou uma escada e tentou me recapturar. Mas eu não deixei. Fui subindo cada vez mais alto, e ele não conseguiu me alcançar.


O homem ficou bravo e chamou o amigo, que trouxe uma serra elétrica e começou a cortar a árvore. Ela ficou tremendo...


Então começou a cair...

Aaaahhh!


A árvore tombou forte no chão, e eu saí rolando!


Quando abri os olhos, os homens estavam me olhando, bravos.


Eles me levaram de volta para o depósito e me colocaram em uma gaiola de ferro. Do meu lado havia mais gaiolas com outros pangolins assustados como eu. Procurei pela minha mãe, mas ela não estava lá. Ficamos naquele lugar por mais alguns dias, até que um dos homens falou: — O navio para a Ásia parte hoje. Vamos levá-los para o porto.


Eles jogaram as nossas gaiolas dentro do furgão, sem cuidado algum.

Para onde será que vão nos levar? O que será que vai acontecer com a gente?


No caminho, de repente, ouviu-se uma sirene da polícia. Os homens ficaram agitados, e o motorista acelerou. Estávamos chacoalhando muito!

Subitamente, o veículo deu uma freada brusca. Minha gaiola caiu no chão e se abriu.


Eu saí rapidinho e comecei a procurar um meio de fugir dali. Até que achei um cantinho que me pareceu seguro.


O motorista pisou em mim e se assustou.


Eu também me assustei e saí de lá. Fui para um lugar mais alto.


O outro homem ficou bravo, pegou um revólver e atirou. O tiro passou zunindo no meu ouvido, mas não me acertou.

blam


O motorista me jogou pra frente do carro. Daí o homem do revólver atirou de novo. O tiro me atingiu de raspão. Foi um impacto fortíssimo que me deixou sem ar.

A munição bateu nas minhas escamas duras e se desviou, acertando o vidro da frente do carro, que se estilhaçou.


Eu caí no chão e fui para baixo do banco. O motorista continuou tentando dirigir, com o vento e a poeira batendo na cara dele.


Então, um pequeno caco de vidro escapou do para-brisa e voou para o olho do motorista...


... que mexeu bruscamente no volante, e o veículo capotou!


A polícia cercou o furgão, abriu as portas e prendeu os homens maus. Um deles reclamou: — Se não fosse esse pangolim desgraçado, a gente teria conseguido escapar!

Além dos outros pangolins, os policiais acharam também presas de elefante e chifres de rinoceronte, que seriam contrabandeados para a Ásia.


Eu tentei ir embora, mas um policial me pegou pela cauda e me acariciou. Depois me agradeceu: — Parabéns, pangolim! Você ajudou a desbaratar uma quadrilha de traficantes de animais. Você é um herói!

Depois ele me colocou de volta na gaiola. Eu e os outros pangolins estávamos com fome, sede, fracos e sujos. O que será que ia acontecer com a gente?


O policial nos levou para um centro de conservação de animais. A moça que nos recebeu disse: — Coitadinhos, vocês foram tão maltratados! Agora isso vai mudar.


Lá eles nos limparam, nos deram água, comida e carinho. Como era gostoso ser tratado com amor!


Depois de algum tempo, a gente recuperou as forças e a saúde. Então um homem nos disse: — Já está na hora de levá-los de volta pra natureza.


Eles prenderam um localizador na minha cauda e me soltaram de novo no meu habitat natural. Que alegria estar de volta na natureza! Voltei à minha vida normal, procurando e comendo deliciosos cupins e formigas. Estava livre!


Às vezes alguns humanos bondosos aparecem para ver como eu estou. Felizmente estou bem.

Sou muito grato pelo trabalho deles. Sem eles, não sei se ainda estaria vivo.


Até então, não sabia se eu era um pangolim macho ou fêmea. Só descobri quando fui atraída pelo cheiro de um pangolim macho e me acasalei com ele. Eu sou uma fêmea!


Meses depois, eu tive um lindo filhote. Vou cuidar dele tão bem quanto minha mãe cuidou de mim.

Fim


O nome pangolim tem origem na Malásia e significa “alguém que rola”. O pangolim é o único mamífero que tem escamas. Um único animal pode chegar a ter mais de mil escamas. Eles têm uma língua longa, fina e pegajosa, com diâmetro de apenas 0,5 cm e comprimento de até 40 cm. Não têm boa visão, mas, em compensação, têm olfato e audição excelentes. Suas pernas e unhas são robustas e muito fortes. Eles usam as poderosas garras para quebrar cupinzeiros, escalar árvores, cavar o chão para procurar comida e construir tocas. São bichos solitários, que se encontram somente na época de reprodução. Os machos demarcam seus territórios com urina. Em vez de eles procurarem as fêmeas, são elas que farejam esses sinais à procura de um macho. Existem oito espécies de pangolins, quatro na África e quatro na Ásia. A espécie retratada neste livro é o pangolim de barriga branca, também conhecido como pangolim de árvores, que vive nas florestas da África equatorial, em mais de 15 países diferentes, como Angola, Congo, Camarões, Nigéria, Gana, Libéria, etc. Todas as espécies de pangolim estão ameaçadas de extinção. São os mamíferos mais caçados e traficados do mundo. Milhares de pangolins são contrabandeados anualmente para a China e o Vietnã. Lá a carne de pangolim é considerada uma iguaria e existe uma grande demanda por suas escamas. Elas podem ser encontradas nos mercados de medicamentos em várias cidades. Normalmente secas, moídas em pó e colocadas em comprimidos, as escamas de pangolim são usadas em uma grande variedade de remédios tradicionais asiáticos. As escamas são compostas principalmente por queratina, a mesma substância dos cabelos e as unhas humanos, e não existem evidências científicas que sustentem sua eficácia como remédio.


Por que devemos nos preocupar com um animal de que a maioria das pessoas nunca ouviu falar? A extinção dos pangolins pode causar um desastre ecológico e econômico em certos ecossistemas e comunidades. Eles comem formigas e cupins, que podem dizimar plantações ou edificações, se não forem controlados. Os pangolins são parte integrante do equilíbrio da natureza. Já os caçadores de pangolins fazem parte de uma rede criminosa mundial que trafica também marfim de elefantes e chifres de rinocerontes, podendo levá-los à extinção. Algumas pesquisas sugeriram que o pangolim pode ter sido o transmissor do novo coronavírus para os seres humanos. Isso significa que a pandemia de COVID-19, que abalou o mundo inteiro, pode ter começado porque humanos traficam e consomem esse inocente animal. Isso é um alerta para que a venda e o consumo de animais silvestres sejam rigorosamente proibidos para evitar futuras pandemias. Muito trabalho precisa ser feito para assegurar a sobrevivência dos pangolins. É importante lutar para que a caça, tráfico e consumo desses animais como comida ou remédios sejam terminantemente proibidos no mundo inteiro, senão esses gentis animais poderão desaparecer antes que a maioria das pessoas saiba que eles existem.


No ano de 2020, o pangolim foi retirado da lista de medicamentos aprovados da medicina tradicional chinesa. Essa mudança veio dias após a China atualizar a situação dos pangolins segundo a lei de proteção de animais silvestres do país. O pangolim agora é considerado Classe 1 (mesmo status conferido ao panda, tão amado pela nação), que proíbe nacionalmente quase todo o comércio e uso do animal. Essas duas mudanças, se realmente implementadas com seriedade naquele país, podem salvar o pangolim da extinção. Como podemos ajudar? Conheça os vários projetos que existem para salvar os pangolins, cujos sites estão listados abaixo. Siga as páginas deles nas redes sociais. Se possível, faça uma doação financeira para apoiar o importante trabalho dessas organizações. www.savepangolins.org

www.africanpangolin.org

www.pangolincrisisfund.org

www.pangolinsg.org

www.pangolinconservation.org

www.svw.vn


SE VOCÊ GOSTOU DO LIVRO...

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Eu adoro criar e escrever histórias! As ideias surgem das maneiras mais inusitadas. Ao ler uma pequena notícia sobre o pangolim, no jornal americano The Christian Science Monitor, fiquei surpreso, pois nunca tinha ouvido falar desse bicho. Resolvi pesquisar sobre ele e fiquei triste de saber que é o mamífero mais caçado e traficado do planeta. Foi então que resolvi escrever um livro sobre ele, para ajudar as pessoas a conhecerem esse lindo animal e a lutarem pela sua preservação. Além desse, já escrevi vários outros livros para crianças. Se você quiser conhecê-los, visite o meu site: www.flavito.com.br

Sou quadrinista, ilustrador e professor de histórias em quadrinhos. Desenhei vários títulos publicados por editoras internacionais, dos quais se destacam Halo Escalation, Savage Sword e Halo Adult Coloring Book, pela Dark Horse Comics; X-MEN Blue, pela Marvel Comics; Person of Interest, pela DC Comics. No mercado nacional, produzo ilustrações para várias editoras. Em 2018, lancei meu primeiro quadrinho intitulado, Sem palavras. Para ver meus trabalhos, visite o site: www.dgfranchin.com


©2021 - Todos os direitos reservados. Autor: Flávio Colombini Ilustrações e projeto gráfico: Douglas Franchin Revisão de texto: Marcio Coelho Agradecimentos: Raquel Laranjeira, Alcidema Torres, Alessandra Colombini e Daniela Hessel. Agradecimento especial: Sangha Pangolin Project, na República Centro-Africana, que cedeu duas fotos para o livro. ISBN: 978-65-995345-7-7