Arte: Um instrumento transformador

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Arte: Um instrumento transformador HUMA: Proposta para um modelo de reinserção social incluso

levar os meus pais, sempre senti que eles não me davam a importância necessária… o dinheiro é controlado pela minha irmã B, que de longe a longe aparece em casa…no fundo tenho o material mas não tenho afectos… Sempre senti que o facto de ter um problema congénito, hormonal e cromossomático, que me dava alterações de humor, assim como alterações da personalidade, me fez afastar das pessoas que mais queria que me dessem afecto…o meu problema é transmitir, receber e dar afectos; ligo mais depressa para a Saúde 24, do que para um irmão meu. Era amiga da minha irmã, foi a única que soube que eu tinha caído no rio, ela ia a casa do namorado e eu encobria-a. O meu pai sempre foi muito severo e tentava bater-lhe, aí eu metia-me à frente e falava da doença e eles tinham medo que me desse a crise e acabavam por parar. Só gostava de sair com a minha mãe… a minha fuga era o meu quarto…Agora sinto-me mais autónoma…não me dava a viver com mais ninguém de qualquer sexo…não gosto de dormir na casa dos outros, uma vez fui dormir a casa do meu irmão, quis ir e não consegui dormir, pois não me sentia à vontade. Quando entro na minha casa, agora sinto que entro no céu e isto aprendi com o Espaço t, pois sei que os meus amigos estão lá e se quiser falar com eles utilizo o facebook…”. “Fiz amigos cá dentro que agora são de lá de fora, já foram a minha casa e partilhamos afectos, vemos fotos, lemos poemas, falamos muito pelo telefone, pois aqui não há privacidade suficiente, pois estamos todos juntos. Criei o hábito de escrever textos e de trocar com os meus colegas. O ateliê que mais me marcou foi o de Escrita e Afectos. A Pintura também me marcou. Quando o B tocava viola era bom, mas já faleceu. Os estagiários também são uma lufada de alegria. O P é o meu estagiário favorito. Era espanhol, é pena não virem mais pessoas estrangeiras. Aprendi coisas novas de outras culturas, até retomei o inglês. Desde que estou cá reduzi muito os meus internamentos, só estive internada quatro vezes. O primeiro foi quando o Espaço t fechou para férias, pensei que o mundo ia fugir…depois até acabou por ser bom pois foi a primeira vez que fui sozinha para a aldeia e adorei. Um outro foi pela morte do meu irmão e os restantes por cansaço. Mas foram muito diferentes, pois foi para me recuperar e não para chamar à atenção. Nos anos anteriores, ia em média todas as semanas para o hospital. O meu irmão diz que desde que vim para o Espaço t melhorei mais de 80%, estava escondido dentro de mim aquilo que sou hoje. Agora, apenas, tomo 6 comprimidos por dia…”.

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