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performance consistia em falsificar diplomas de graduação em Belas Artes, com carimbo e direito a fotos registrando a entrega do canudo aos alunos paramentados. Da mesma época é MoMAcumba, trabalho em que Aleta emula um Ebó com galinha congelada, pacote de cigarros light, maçãs, farofa, velas, cachaça e fotos da fachada do Museu de Arte Moderna de Nova York, com o desejo expresso de entrar no templo em que se transformou o museu. Um projeto de 2016 foi chamado de Venha Se Despir de Suas Vergonhas, dentro do projeto Permanências e Destruições, com curadoria de João Paulo Quintella. O local foi a Ilha do Sol, na Baía de Guanabara, que já foi um refúgio naturista até ser abandonado depois do assassinato brutal de sua fundadora, Dora Vivacqua, mais conhecida como Luz del Fuego, famosa por fazer performances nua com cobras. Ali Aleta criou um estúdio fotográfico e por dois dias realizou e estimulou performances registradas em Pollaroid, que eram distribuídas aos participantes. CONSTRUCTO MISÓGINO

Gênero e raça para ela são construções sociais. “Hoje, eu sei que minha mãe é negra e meu pai é branco, só que não foi assim que eu vi a vida inteira, apesar de meu pai ser mais claro e minha mãe ser dois tons de pele acima do meu e ter aquele cabelo mais crespo. Alisei cabelo a vida inteira – fazia touquinha –, que loucura. Parei dois anos atrás. Eu tenho como me disfarçar de branca, sei que estou nesse lugar”, diz ela. Quanto a gênero, “é um conjunto de normas sociais que vão garantir ao macho a subserviência da fêmea. Quando a gente nasce e furam a nossa orelha, isso se chama um marcador social, você já é marcada como pária, você vai ser tratada de forma diferente desde o seu nascimento. Meninas morrem muito mais sufocando, aspirando coisa, porque a cultura diz que você tem de enfeitar a menina. Tem fetocídio de fêmea. Tem um bando de mutilação digital. Aqui é o mercado da cirurgia plástica, que é mutilatório e cai sobre o corpo da mulher brutalmente. O Brasil é campeão de vaginoplastia, ninfoplastia, correção dos lábios. É uma demanda criada por pornografia mainstream, essa infantilização dos corpos da fêmea. A gente sofre essa influência dos corpos midiáticos. A gente se mede por esses outros corpos. Um constructo completamente misógino, masculinista. Gênero é isso”, diz ela. Nos últimos anos, Aleta foi chamada para participar de encontros sobre questões de gênero. Ao falar de sua carreira no cinema e na arte, foi hostilizada. “Tentei falar de maternidade como marginalidade e

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MAR/ABR/MAI 2018

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