Revista VOCARE - 2º Edição/2012

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estrutura rígida e fechada. Escolho uma base de conceitos do contemporâneo, mais especificamente nos elementos da escritura cênica evidenciados no Teatro pós dramático de Lehmann2 como justificativa para elucidar a composição desse espaço heterogêneo. Assim arrisco a criar um espaço relacional, como uma ação acontecimento, uma experiência, um jogo. Aqui artistas orientadores como espectadores/participantes são também autores produtores dessa experiência. Imbuída dos signos do pós-dramático é que escolho trabalhar com diversos suportes estéticos que se relacionam entre si, ou não; que corroborem para a criação coletiva e heterogenia desse encontro de pesquisa, no qual, vários suportes estéticos ofertam novas percepções. Assim provoco uma experiência de troca onde o espectador, artista orientador no caso, escolhe seu caminho de apreciação, intervenção estética, e experimentação poética. Foi estabelecendo paralelos com os signos do pós-dramático que elaboramos em equipe, no contexto da reunião pedagógica, a ação acontecimento denominada “vídeo documento” com o intuito de ampliar o suporte de nossas materialidades para além dos ensaios3 escritos. Assim o enunciado de produzir dois minutos de imagens e roteiros nos “vídeos documentos” que buscassem resignificar e atravessar a relação estabelecida entre o ensaio produzido, os encontros com os vocacionados e as discussões e aprofundamentos dos encontros de pesquisa pedagógica, assim como a sua posterior apreciação, que revela a potência do “vídeo documento”. Reside nisto a provocação para que o artista e o participante da experiência faça a parte realista do jogo um questionamento sobre a estabilidade com que ele mesmo vive seu próprio momento; e ainda, expõe uma abundância de signos que parece refletir o caos da experiência real cotidiana, onde a polifonia de referências estéticas podem se encontrar e conversar. Esse campo referencial pode aflorar da experimentação de outros suportes estéticos junto aos vocacionados (vídeo, objetos simbólicos, espacialidade) e ainda, promove uma apreciação que alimenta e verticaliza o referencial do outro, sobre cada processo criativo revelado em diferentes amparos estéticos. Essas foram estratégias para potencializar um recorte e reflexão das pesquisas de forma que cada participante e artista orientador pudessem estabelecer um campo relacional particular que estabelecesse semelhanças, constelações e correspondências. O espaço afetivo que pudesse acolher a exposição verdadeira desses artistas se deu no questionamento direto sobre os desdobramentos da própria percepção diante do acontecimento na diversidade de suportes estéticos. Numa outra ação acontecimento que chamamos de Roda Viva, o jogo é pré-enunciado. Todos ficaram de trazer citações no intuito de colocar suas referências para conversar. Os comentários críticos do vídeo documento é o material

de recorte e ainda a própria pergunta de pesquisa do artista. A ação Roda Viva começa com as cartas sendo colocadas na mesa. Cada um tem 20 minutos para falar da sua pesquisa, usar suas citações e nos minutos finais, os participantes da roda, fazem perguntas, provocações, e dessa forma enriquecem m a pesquisa do parceiro. Ao colocar em jogo as intervenções afetivas, poéticas e provocativas dos participantes, evidencio o teatro que é afirmado pelo processo e não só pelo resultado acabado. A produção em curso é colocada em foco, mais que o produto, sem uma estruturação de início, meio e fim já que o início se dá pelo primeiro encontro e terminada quando o último instante desse encontro termina. , Embora exista um roteiro aberto, mas, sem ser enunciado, existe assim, um espaço onde os assuntos e objetos de pesquisa convergem, constelando sem uma ordem pré-estabelecida. É com uma lógica própria daquele instante-encontro, que toca o agora desses artistas, atravessados por esse encontro. Elucida, portanto, um território onde não existe uma hierarquia explícita de imagens, texto, palavras e o discurso construído, que acolhe até as abstrações que se aproximam de uma estrutura do sonho.

Conversas com o espectador emancipado A materialização de nossas investigações é apostar na experiência estética como suporte para poética da cena. Seria isso então a configuração de uma nova forma de convívio da comunidade estabelecida nos encontros, com os vocacionados ou na reunião de pesquisa-ação. A intenção será apontar se essa experiência estética pode ofertar uma possibilidade, não da emancipação individual, mas de uma emancipação da comunidade do encontro. Espera-se também que o artista orientador como um mediador de subjetividades, possa estabelecer no território de encontro com os vocacionados uma experiência única do teatro do agora: construído a cada encontro, no mesmo sentido que a experiência da reunião de pesquisa. Se no teatro da contemporaneidade se constrói uma dramaturgia onde o espectador está ativo e não mais passivo, entre coautor e colaborador para esse encontro estético, então seria possível pensarmos no encontro do artista orientador com os vocacionados como um encontro de experiência coautoral e colaborativa. O espectador estaria compondo e agindo consequentemente nas escolhas, na participação, na intervenção ativa da dramaturgia desse aqui agora instaurado a partir dessa experiência estética, desse encontro. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. BOURRIAUD, Nicolas. Estética Relacional. São Paulo: Martins, 2009. 2. LEHMANN, Hans-Thies. Teatro Pós Dramático. São Paulo: Cosac Naify, 2007 3. A cada dois meses os artistas envolvidos escrevem sobre as pesquisas desenvolvidas no programa. Este vem substituir um relatório e dá margem para uma escrita poética e reflexiva.

VOCARE 2012 Revista do Programa Vocacional

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