Revista Piapuru

Page 25

Percebemos que algumas crianças e jovens demonstram certa preocupação com o certo e o errado. Como provavelmente estão expostas a este modo de educação em sua vida cotidiana, no início, têm resistência em se envolver na pesquisa estética com liberdade. Outra possibilidade é de que a criança ou o jovem tenham receio de ser observados expressando-se de modo incompatível com a imposição estética da cultura de mídia, além de sentirem receio em não serem aceitos e admirados pelo grupo. Para continuarmos a refletir sobre o contexto no qual os corpos de nossos jovens e crianças estão inseridos, podemos pensar o que significa ser criança e um adolescente no Século XXI. Um ponto importante a ser mensurado é o fato de vivermos em uma sociedade de consumo compulsivo, que age como eixo organizador do modo de viver nas sociedades de hoje, um eixo modelador de corpos. A ditadura disciplinar vivida hoje impede a criança de aprender a ler e dialogar com as linguagens presentes nos gestos, no indizível, no invisível. Peter Pál Pelbart, em seu texto “Biopolítica” publicado na Revista Sala Preta, nos fala sobre “o corpo que não aguenta mais o adestramento civilizatório” e pontua que:

Para que os corpos desses jovens e crianças sejam despertados, é preciso construir para e com eles, um ambiente seguro, em que suas inquietações, limitações e virtudes sejam observadas e respeitadas; criar um espaço-tempo em que a troca de gostos e desejos seja compartilhada, sem a hierarquização de saberes. A escuta e o acolhimento deste universo pode nos dar pistas para as inquietações de nossas almas e potencializar novas expressões dos corpos contemporâneos. Percorrer os níveis alto, baixo e médio, levantar, abaixar, sentar, deitar, pular, rastejar, sussurrar, cantar, gritar, representar, desenhar no ar com linhas, pintar, ler, escrever, cortar, rasgar, compor, desfazer... sem ser possível deletar o indesejável, o estranho e o imperfeito é um desafio para as crianças e principalmente, para os jovens contemporâneos. Há muito receio de se expor e por isso, alguns fogem, não retornam aos encontros. Contudo, muitos outros aprendem a se posicionar, arriscar, esticar, alongar, rolar, falar de outras formas, caminhar, questionar, propor, criar, expressar-se de modos não usuais e inusitados. Aprendem com a surpresa e se divertem, brincam, confiam e se entregam. Vivem o presente e o tempo voa nesta partilha do sensível.

Para Pelbart, nossos corpos deixaram de se deixar afetar, de se

“(...) seria precisde o retom ar contaminar o corpo naqui lo que lhe é que mais deixar comover, se deixar pelo espaço-tempo própri o, na suaPorém, dor, no os envolvem. alémencon de estimularmos recuperação deste tro com aaexterio ridade , na sensível, é preciso aceitar o que suacorpo condiç ão de corpoescutá-lo, afetadocompreendê-lo, pelas forças do mundo nos propõe. tanto,o desenvolver percepções e romper com e capaz de serPara afetad por elas. Seria preciso retom convenções e certezas é fundamental como parte do processo.ar o corpo na sua afectibilidade, no seu poder de ser afetado e de afetar”. (Pelbart, 2007, p. 62)

Referências Bibli ográficas BOURRIAUD, Nico las. Estética Relacion al. São Paulo: Martins Fo ntes, 2009. GREINER, Christine. O corpo: pista para estudos indiscipl inares. São Paulo: Annablume, 2008. MACHADO, M. “Faz er surgir antiestruturas : abordagem em espiral para pensar um currículo em arte”. Re vista e- curriculum. V.8, n.1. São Paulo: Po ntifícia Universidade Católica, 2012. PELBART, P. “Biopolí tica”. Revista Sala Preta. São Paulo, 2007 . RANCIÈRE, J. A pa rtilha do sensível: Es tética e política. São Paulo : Editora 34, 2009.

Biblioteca Marcos Rey Ana André Ana Cristina Anjos Priscilla Vilas Boas

Rose de Oliveira Fotos: Equipe Bilbioteca Marcos Rey

25


Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.