Edição n. 6.210 de 25 de Junho de 2010

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memória

CORREIO DO RIBATEJO Edição n.º 6.210 | 25 de Junho de 2010

Santarém Republicana...

Manuel António das Neves Manuel António das Neves nasceu a 1 de Dezembrode18571, em AlburiTeresa Lopes tel, Vila Moreira Nova de Ourém sendo filho de António das Neves e de Jacinta Maria.2 Muito novo fixou-se em Santarém onde começou a trabalhar como empregado comercial. Casou com Maria José Lopes Neves (Amiais de Cima, 1864 – Santarém, 9/1/1950)3 e passou a residir na freguesia de Marvila. Em 1885, aparecia referenciado como comerciante no ramo dos fanqueiros e modas4. Em 1907, estabeleceu-se como comerciante e proprietário do Armazém Novo situado na Praça Visconde da Serra do Pilar, antigo estabelecimento de Neves & Fonseca.5 Esta casa de atacado e retalho aparecia publicitada como “um dos primeiros estabelecimentos da província, pela quantidade de variedade de seus artigos de vestuário ou de luxo, todos os artigos para roupa branca, de uso pessoal, de quarto, de casa de jantar, de cozinha. Tem de todas as fazendas das classes de fanqueiro, modas, retroseiro, mercador, chapelaria, camisaria, gravatas, malas, baús, leitos e lavatórios. Grande quantidade de guarda-sóis e sombrinhas, em todas as qualidades. Como a maior parte das suas compras são feitas directamente, pode vender nas melhores condições…” 6 . O Armazém Novo que fazia preços especiais para as modistas e enviava amostras para todos os locais, em 1908 era a casa “… depositária em Santarém, de Anjos & C.ª, para a venda de tripa, vendendo-a nas mesmas condições em que é vendida na origem.”.7 Em 1917, o Armazém Novo já pertencia ao sucessor de Manuel António das Neves, Francisco Correia.8 Em Abril de 1905, juntamente com Fernão Pires e Manuel Maria Oliveira adquiriu o Hotel Duarte por trespasse de cinco contos dando-lhe o nome de Hotel Central.9 Manuel António das Neves abraçou o ideário republicano. A 17 de Julho de 1904, participou na recepção em Santarém a Bernardino Machado, organizada pela Associação dos Empregados do Comércio de

Manuel António das Neves abraçou o ideário republicano

Santarém.10 Para além de membro do Partido Republicano, fundou e dirigiu juntamente com o advogado José Montez o jornal republicano O Debate entre 5 de Dezembro de 1907 e 11 de Fevereiro de 1909, quando o tipógrafo José Avelino de Sousa o substituiu como proprietário do jornal. Posteriormente, tornou-se membro do Centro Eleitoral Republicano de Santarém que funcionou na sede de O Debate e que a partir de 1908 desempenhou intensa campanha contra o poder monárquico. Com base na sua biblioteca pessoal e nas suas relações de amizade com homens como Sebastião Magalhães Lima, pode concluir-se que Manuel António das Neves era maçon tendo sido membro da Loja Liberdade n.º 247, de Santarém, que praticava o rito francês transitando em 1908 para o rito escocês antigo e aceite. A Loja foi extinta em 1913.11 A 6 de Outubro de 1910, um dia após a Revolução Republicana, Manuel António das Neves tomou posse como membro da Comissão Municipal Republicana juntamente com José Madeira Montez, Abílio Caldas Nobre da Veiga, José

Durante anos, Manuel António das Neves colaborou com a imprensa nomeadamente com o Correio da Extremadura de João Arruda. As relações entre estes dois republicanos deterioraram-se “… por um deplorável equívoco, quando, como presidente duma comissão municipal, se julgou visado por este jornal, a propósito de uma doação feita à junta de freguesia de Casével duns baldios que eram do município, como depois se demonstrou pela sua venda, regulada pelas leis de desamortização. Isto deu motivo a um processo de imprensa em que este jornal saiu triunfante, porque lutava pela verdade e pela justiça.”11.

António Pereira, Artur Dionísio Figueiredo, António Madeira Cabral e Manuel Maria de Oliveira, na presença do presidente da Comissão Distrital Republicana, Anselmo Augusto da Costa Xavier.12 As calçadas na cidade, as freguesias de Alcanhões, S. Vicente do Paúl, Pombalinho, Vale de Figueira, Achete e Póvoa de Santarém constituíram os

seus pelouros. Em 1918, Manuel António das Neves exerceu durante um ano o cargo de presidente da Câmara Municipal de Santarém, enquanto membro do Partido Nacionalista. Durante anos, Manuel António das Neves colaborou com a imprensa nomeadamente com o Correio da Extremadura de João Arruda. As relações entre estes

dois republicanos deterioraram-se “… por um deplorável equívoco, quando, como presidente duma comissão municipal, se julgou visado por este jornal, a propósito de uma doação feita à junta de freguesia de Casével duns baldios que eram do município, como depois se demonstrou pela sua venda, regulada pelas leis de desamortização. Isto deu motivo a um processo de imprensa em que este jornal saiu triunfante, porque lutava pela verdade e pela justiça.”13. Manuel António das Neves foi sócio e dirigente de diversas colectividades da cidade de Santarém como a Associação Comercial, a Associação dos Empregados do Comércio, o Grémio Literário Guilherme de Azevedo e os Bombeiros Voluntários. Também foi membro dos Montepios Artístico de Santarém sob a invocação de Nossa Senhora da Conceição, Geral de Nossa Senhora do Carmo de Santarém e Geral de Santarém. A 16 de Junho de 1912 tornou-se irmão da Santa Casa da Misericórdia de Santarém.14 Em Novembro de 1923, foi nomeado agente do Banco de Portugal em Faro15, funções que desempenhou posteriormente em Setúbal. Nos últimos anos de vida encontrava-se retirado da política “… pelo desânimo com que via caminhar as coisas públicas.” 16. Para este estado de espírito terá contribuído a extinção de O Debate com o seu último número publicado a 28 de Outubro de 1926. Manuel António das Neves faleceu em Marvila, Santarém, a 7 de Outubro de 1927, à uma hora da manhã em consequência da doença que o afligia desde Maio desse ano.17 O seu funeral realizou-se no dia seguinte, pelas 11 horas, para o Cemitério Público de Santarém com a presença de muitos amigos, correligionários e representantes do Partido Nacionalista, da Associação Comercial de Santarém e do Montepio Geral de Santarém. Junto ao jazigo de Silva Pereira, onde o corpo de Manuel António das Neves ficou provisoriamente depositado, foram ouvidos os discursos de Acácio Borges da Silva, Vaz de Sousa e Hermínio de Almeida.18 Nos seus Assuntos de Santarém, Laurentino Veríssimo es-

creveu “… eu com ele [Manuel António das Neves] muito convivi respeitando-o sempre e tendo-o na conta de homem sério, amigo e honrado. Paz à sua alma.”19. O vereador capitão Lino Valente, na reunião da Câmara Municipal de Santarém de 5 de Janeiro de 1928, propôs “… que em homenagem às virtudes cívicas e morais do prestante cidadão e indefectível republicano que em vida se chamou Manuel António das Neves, seja dado o seu nome ao actual Largo dos Pasteleiros”20. A proposta foi aprovada por unanimidade e aclamada por outros cidadãos como Hermínio de Almeida. Este, em carta a João Arruda, datada de 18 de Janeiro desse ano aclamava a justiça da homenagem.21 Os testamenteiros de Manuel António das Neves, Júlio Ferreira Alves, Ary Belchior Nunes Júnior e António Madeira Cabral, entregaram à Câmara Municipal de Santarém os bens legados: setenta e cinco acções da extinta Companhia das Águas de Santarém e os livros se encontravam na casa do falecido, no Largo dos Pasteleiros n.º 5. Estes integraram o espólio da Biblioteca Camões. —————

NOTAS: Cf. Correio da Extremadura, n.º 763, 25/11/1905, p. 2. 2 Cf. Registo dos Cadáveres Depositados no Cemitério Público do Concelho de Santarém, AHCMSTR, Liv. 1219. 3 Cf. Correio do Ribatejo, n.º 3065, 14/1/1950, p. 8. 4 Cf. Campos, Carlos Augusto da Silva, Almanach Commercial de Lisboa para 1886, Ano VI, Lisboa, Lallemant Frères Imprensa, 1885, p.233. 5 Cf. Correio da Extremadura, n.º 630, 9/5/1903, p. 2. 6 O Debate, n.º 1, 5/12/1907, p. 1. 7 Idem. 8 Cf. O Reclamo, n.º 1, 14/10/1917, p. 4. 9 Cf. Correio da Extremadura, n.º 731, 15/4/1905, p. 2. 10 Cf. Idem, n.º 693, 23 /7/1904, pp. 1-3. 11 Cf. A Maçonaria e a Implantação da República, Lisboa, Fundação Mário Soares e Grande Oriente Lusitano, 2009, p. 27. 12 Acta da Comissão Municipal Republicana de Santarém, 6/10/1910, pp. 129v-130. 13 Correio da Extremadura, n.º 1901, 8/10/1927, p. 2. 14 Cf. Novo Compromisso da Santa Casa da Misericórdia e Hospital de Nosso Senhor Jesus Christo de Santarém, Lisboa, Lallemant Frères Typographos, 1870. 15 Cf. O Debate, n.º 732, 29/11/ 1923, p. 2. 16 Cf. Correio da Extremadura, n.º 1901, 8/10/1927, p. 2. 17 Cf. Idem, n.º 1882, 28/5/1927, p. 3. 18 Cf. Idem, n.º 1902, 15/10/1927, p. 2. 19 Laurentino Veríssimo, Assuntos de Santarém, ms., vol. X, pp. 191191v. 20 Acta da Comissão Administrativa da Câmara Municipal de Santarém, 5/1/1928, p. 65v. 21 Cf. Correio da Extremadura, n.º 1918, 4/2/1928, p. 3. 1


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