em cena. Ousado também por ser o último a se apresentar naquele palco antes de o teatro fechar as portas em razão da pandemia do Covid-19, da qual sabíamos tão pouco nos idos de março daquele ano. Desta vez sem crianças, a sensação de hipnose coletiva permaneceu. Abajur Cor de Carne – Cartografia pela Dança fez magia e manteve o público atento, reflexivo, extasiado. Aplausos demorados, insistentes, sinceros. Isso se explica por um trecho muito significativo da obra, encontrado no capítulo II deste livro: “[...] percebemos que há uma força e uma resistência em nosso trabalho: a sua capacidade de atravessamento para qualquer público, seja o público conhecedor de arte, seja o público leigo, pois a nossa perspectiva poética busca uma arte feita por todas e para todas, do contrário, não faria sentido pensar e criar um espetáculo de dança contemporânea com uma linguagem e atravessamentos tão múltiplos e oferecê-lo a um único público, ou, ainda, mantêlo longe daquelas pessoas que mais precisam entrar em contato com essa dança, que são as mulheres que sofrem violência e todos aqueles e aquelas que perpetuam essa dinâmica de opressão contra as mulheres — sejam os agressores, seja a sociedade”. Está explicado, então, porque neste terceiro momento com a obra Abajur Cor de Carne – Cartografia pela Dança: possíveis epistemologias de uma arte negro-brasileira sinto as emoções tão sensivelmente tocadas. Meu corpo de mulher preta, periférica, lésbica, professora, umbandista e profissional da dança afrobrasileira é representado e respeitado plenamente. Seguramente, a leitora e o leitor da obra se perceberão na trama, seja qual for o pertencimento racial, a orientação sexual, o gênero, a idade, a procedência social. Se, na arte cênica, o coletivo impressiona, na arte literária essa intensidade se prolonga. A provocação da obra em proporcionar blocos de sensações,