Revista Vieirense Nº 12 (2021) - Colégio Antônio Vieira

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Expediente Editorial Há 40 anos, o então padre geral dos Jesuítas, Pedro Arrupe, SJ, em famosa alocução, dizia que “aprender é importante, mas importante, porém, é aprender a aprender e desejar prosseguir aprendendo”. É essa competência para aprender que está presente no Colégio Antônio Vieira ao longo dos seus 110 anos. Evoluindo sempre com as mudanças do mundo, não paramos de nos reinventar ao longo do tempo. O diálogo com a contemporaneidade nos interpela e nos faz refletir sobre a educação que propomos, sobre o papel social da escola. E, sobretudo neste ano em contexto pandêmico, esse papel adquire importância e relevância. A pandemia, como vetor de disrupção, impôs-se também como um currículo. Afetou a forma como o conhecimento é construído, a aprendizagem, as metodologias, as ambiências de aprendizagem, e continua potencializando inquietações, transformações. Ouvir, portanto, a voz dos alunos, das famílias e professores do diurno e do noturno durante esse tempo, considerando as realidades distintas, constituiu-se também pauta formativa, democrática, dialogante sobre esse currículo vivo do nosso Colégio, comprometido em criar estratégias de combate às desigualdades históricas. Como parte dessa perspectiva, o Papa Francisco convoca a todos para se comprometerem em um Pacto Educativo Global, que promova uma educação de qualidade, devolvendo à escola a sua função social em toda a sua potencialidade formativa. É nesse horizonte que atua o currículo da formação integral que propomos, transformador da pessoa e da sociedade. Nossa história e projeto pedagógico que reafirmam esse compromisso, mesmo em tempos tão de-

Conselho Diretivo

safiadores, são tema desta edição da Revista Vieirense. Que cada aluno do nosso Colégio possa construir o seu projeto de vida e seja a diferença que queremos ver no mundo: crítico, reflexivo, comprometido, engajado, preparado para a diversidade e as adversidades. E que, dessa maneira, possa alavancar a revolução da ternura e da fraternidade. Boa leitura!

Mariângela Risério diretora geral Sérgio Silveira diretor de Gestão de Pessoas Ana Paula Marques diretora acadêmica Julina Argollo diretora administrativa e financeira Pe. Emmanuel Araújo, SJ assistente espiritual e reitor do Santuário Nossa Senhora de Fátima. Coordenação editorial Aidil Brites (DTR/BA 2619) Jornalista responsável Joyce de Sousa (DRT/BA 1689) Jornalista assistente Rodrigo Marques (DRT/BA 3190) Diagramação Duda Bastos | Dauã Bomfim Fotos Paula Menezes, Daniel Duarte acervos pessoais e bancos de imagens Produção Daniela Fernandes Revisão Cristiane Sampaio (DRT/BA 1272) Capa Grazielle Oliveira, aluna da 2ª série EM

Mariângela Risério Diretora geral

Design contracapa Salomão Alves

Sumário

04 Vieira 110 anos 10 Conexão Família e Escola 11 Entrevista: Prof. Zelão Teixeira 15 Conectados ao conhecimento 19 Iniciando a Educação Fundamental no Vieira 22 Travessias para o Ensino Médio 24 Ensino Noturno: obra jesuíta que move sonhos 29 Feras em Redação 32 Hora do dever de casa 33 Projeto Ethos 36 Arte e Música no currículo 40 Educação física para além do movimento 43 “Terceirão” em prova de resiliência 46 A Fratelli Tutti e a formação integral do Vieira 49 Por um caminhar de aprendizagem e solidariedade Revista Vieirense - 2021

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Vieira 110 anos Cada vez mais preparado para os desafios do século XXI

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ano de 2021 é um marco para o Colégio Antônio Vieira. A instituição completa 110 anos, consolidando-se como um centro de aprendizagem que, há mais de um século, mantém-se como referência de qualidade educacional na Bahia, a partir de um projeto pedagógico que está sempre se ressignificando para o tempo presente. É o que faz o Vieira hoje estar cada vez mais preparado para ser o colégio das crianças e jovens do século XXI, permanecendo sempre atento às possibilidades de múltiplos acessos ao conhecimento da atualidade, mas sem, por outro lado, deixar de preservar sua missão, que, desde 1911, visa formar cidadãos competentes, conscientes, compassivos, criativos e comprometidos, a partir de uma visão humanista e integradora. Esse olhar constante para a inovação dá hoje ao Vieira um novo ânimo para não só celebrar o aniversário especial como também os avanços conquistados especialmente no ano passado, quando a pandemia da Covid-19 também impôs difíceis desafios para a Educação em todo o

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mundo. Para que isso ocorresse, o DNA jesuíta do Vieira fez a diferença. O Colégio é a instituição de educação básica de Salvador que traduz o padrão internacional de excelência difundido em mais de 130 países pela Companhia de Jesus – ordem religiosa fundada na Europa, em 1540, por Santo Inácio de Loyola. Foi justamente o visionário fundador da Companhia quem já dizia, no século XVI, que a Educação precisava estar preparada para se adaptar a tempos, pessoas e lugares. Chegar a 2021, enraizado em princípios e valores que o identificam e o diferenciam, motiva ainda mais o Vieira a celebrar, com toda a Companhia de Jesus no mundo inteiro, o Ano Inaciano. É um ano, portanto, que também nos traz como foco a conversão de Santo Inácio de Loyola, que após ter sido ferido por uma bala de canhão na Batalha de Pamplona, mudou o rumo da sua vida. Inspirado pelo exemplo de Sto. Inácio, a cada ano, nosso Colégio aprofunda e consolida os seus ideais educativos para junto com os alunos, famílias e colaboradores superar as “balas de canhão” de tempos tão desafiadores.


Um Colégio de grandes lições

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fato que o distanciamento social imposto pela pandemia da Covid-19 provocou, em todo o mundo, a necessidade de adaptação imediata a novas rotinas, inclusive nas relações entre professores e estudantes. Atento à contemporaneidade, o Vieira avaliava as transformações na sociedade e de que forma elas poderiam se alinhar aos seus ideais educativos.

O patrono, uma inspiração.

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Colégio Antônio Vieira foi fundado pela Companhia de Jesus em 15 de março de 1911, sendo batizado com o nome do emérito padre Antônio Vieira. O jesuíta viveu bem antes disso (1608-1697), tendo honrado, bravamente, a missão evangelizadora e educacional da ordem religiosa, fundada por Inácio de Loyola.

“Tempo pandêmico altamente significativo e relevante, na medida em que conseguimos, criativamente, tornar o currículo o espaço de formação humana através da inter e da transdisciplinaridade, articulando saberes, cognição, co-

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laboração e cooperação, tocando a fragilidade de cada ser e despertando a fraternidade latente”, diz a diretora geral do Vieira, professora Mariângela. Para ela, o currículo gerado pela pandemia tem um potencial altamente mobilizador “para refletirmos como escola sobre a educação que propomos, sobre o mundo, o planeta, a sustentabilidade, as relações de consumo, o modelo de sociedade e de vida que estamos escolhendo”, como frisa. A ressignificação do projeto pedagógico para o tempo presente

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não é novidade no Vieira. “É uma prática que está no DNA dos colégios jesuítas”, como ressalta a professora Mariângela. No Colégio, os diversos espaços têm uma intencionalidade educativa. A arquitetura vem, ao longo do tempo, desenhando e projetando a criação de novos ambientes de aprendizagem, como, por exemplo, o Espaço Pe. Klein e suas multiconfigurações, a biblioteca do Vieirinha com anfiteatro, as salas maker, o bosque e o Espaço Criançando, entre outros. Assim, após ter se mostrado mais

do que pronto para avançar também com o ensino híbrido, o Vieira consolida, definitivamente, o ambiente remoto como mais um de seus inovadores espaços de aprendizagem, com uso igualmente planejado, revelando também o quanto o Colégio chega aos 110 anos maduro, renovado e, acima de tudo, coerente com a sua missão educativa. Para que, virtual ou presencialmente, possamos estar cada vez mais aprendendo juntos e fazendo história!


Alunos na segunda sede, na Piedade

No coração do Garcia

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Lançamento da pedra fundamental da nova sede

prédio atual do Vieira é, na verdade, a terceira sede do Colégio. “Começou a funcionar, em 1911, na Rua do Sodré. Depois, na Piedade. Como era cada vez mais procurado pelas famílias para matricular jovens promissores, comprou-se um terreno mais amplo, na Fazenda Garcia, cujas obras para abrigar o Vieira foram iniciadas em 1930”, contou o saudoso padre Geraldo de Almeida Coelho, SJ, um dos ex-alunos ilustres e que sempre foi um estudioso da história da Companhia de Jesus. O lançamento da pedra fundamental, marcando o início da construção da sede atual, completou 90 anos Santo Inácio de Loyola no ano passado.

Alunos ilustres sempre

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educador Anísio Teixeira e o escritor Jorge Amado, ex-alunos ilustres, são alguns dos exemplos do potencial singular revelado nos ambientes da escola nas primeiras sedes, assim como também podem ser citados o ex-governador Roberto Santos e o escultor Mário Cravo, que estudaram no prédio atual, dentre tantos ex-alunos que em 110 anos trilham histórias de sucesso, como a do próprio Colégio.

Anísio Teixeira

Jorge Amado

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Muitas histórias a contar Edinilson Silva “Bigu”, coordenador do Serviço de Vida Comunitária (Sevic) “Lembro de uma vez em que um aluno concluiu os estudos no Colégio e saiu sem falar comigo. Dizia que eu pegava no pé dele. Era daquele tipo que, por conta das inquietações próprias da idade, era sempre chamado ao Servic para refletir sobre algumas posturas quanto ao respeito ao outro e à preservação dos espaços. Tempos depois, já na faculdade, ele foi visitar o Vieira e, quando me dei conta, veio aquele rapaz correndo em minha direção, surpreendendo-me com um forte abraço: ‘Hoje sei o quanto aprendi muito contigo!’, disse. Confesso que fiquei emocionado e, cada vez mais, busco trabalhar seguindo os princípios inacianos de ‘amar e servir’. Foi também um aluno que me apelidou como ‘Bigu’, numa referência a um ex-jogador de futebol do Vitória. Acabou pegando e, assim, tornei-me conhecido em todo o Colégio”.

Júlia Cardoso, aluna do 1º ano do Ensino Médio “Estudo no Vieira desde o 1º ano do Ensino Fundamental, e uma das coisas que mais gosto no Colégio são seus espaços, além da relação que temos como os colaboradores, sempre dispostos a ajudar. Um dos momentos marcantes foi quando, no 7º ano do Ensino Fundamental, as turmas produziram um curta-metragem sobre intolerância religiosa. Me dei conta de que, mesmo estudando em um colégio católico, ele nos ensinava a respeitar outras religiões, mas gostei também muito da prática em si, de todo aquele movimento para gerar uma produção em prol da nossa aprendizagem. Recentemente, agora no Vieirão, participei pela primeira vez de um projeto de simulação de uma conferência das Nações Unidas, a ONU Colegial. Por conta da pandemia, foi a primeira edição virtual, mas não menos estimulante e incrível, como todos os projetos que ajudam a construir a história do Vieira e a de todos nós, alunos, que temos a oportunidade de cruzar nossas histórias com a dele”.

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Professor Renato Barros, coordenador geral do Vieirinha, colaborador com mais tempo de Vieira: 40 anos “Havia sempre uma grande expectativa ao acompanhar as mudanças dos espaços físicos do Colégio. Na verdade, são sempre adequações, visando atender melhor às necessidades do projeto pedagógico. Sempre que vejo, por exemplo, o espaço onde hoje funcionam o estacionamento e o prédio do 1º ano EF, no Vieirinha, fico lembrando que, antes, era a garagem, a oficina e, também, local de saída e chegada dos alunos que utilizavam o ônibus da escola. Quando, hoje, alguém imagina que isso era possível no estacionamento em frente ao Vieirinha?! Lembranças interessantes e mudanças necessárias”.

Maria Aparecida Boaventura, “Pró Cida”, professora do Ensino Médio Noturno

“Digo, com alegria, que sou testemunha viva e atuante desse trabalho socioeducativo desenvolvido pelo Vieira. Minha história com o Colégio começa quando eu, ainda criança, alcancei uma das ações sociais lideradas, à época, pelo padre Ugo. Ao levar estudantes do CAV às comunidades carentes, como a que eu morava, ele juntava realidades sociais totalmente diversas, mas as cuidava, a partir do ideal de uma educação inaciana voltada para o desenvolvimento da pessoa em todas as suas dimensões. Décadas depois dessa experiência, já como profissional de Educação, retorno à Casa com o coração grato e com a responsabilidade de poder contribuir para transformar outras histórias de vida no turno noturno, que oferta ensino gratuito, atendendo jovens de baixa renda que também sonham em realizar seu projeto acadêmico”.

Lívia

Farani,

psicopedagoga, ex-aluna e atual coordenadora do Serviço de Orientação Educacional (SOE)

“O que considero como um dos aspectos muito fortes do Vieira são justamente as relações, fruto do quanto o Colégio trabalha esse lado humano e o quanto isso tem me ajudado a tentar me tornar uma pessoa melhor. Como ex-aluna, sei exatamente como a frase ‘Vieira sempre Vieira’ tem um peso emocional significativo, e quando encontro com amigos da minha época de estudante, sempre ressaltamos o cuidado do Colégio com todos nós e o quanto ele vem cumprindo sua missão ao longo das gerações. Hoje, minha relação com o Colégio, de fato, perpassa a questão do trabalho, envolve muitos sentimentos, laços de família, afetividade e gratidão”.

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Conexão Família e Escola

PARCERIA RENOVADA EM MEIO A UMA PANDEMIA Por Rogério Rossi, pai vieirense e ex-aluno

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omos pais de dois estudantes, hoje na 2ª série do Ensino Médio e no 7º ano do Ensino Fundamental. A história de nossos filhos com o Colégio Antônio Vieira foi iniciada com aquele momento comum a todos os pais: a definição da escola das crianças. Nossa escolha recaiu, para a nossa felicidade, sobre o Vieira, mas não poderíamos imaginar quanta emoção e surpresa essa decisão nos reservaria no caminho, reforçando uma identidade especial com a instituição que, em verdade, sempre tivemos. Levar nossos filhos ao primeiro dia de aula me fez, no meu caso particular de ex-aluno, realizar uma viagem no tempo. O vaivém de crianças correndo, brincando, alegres, funcionários atentos, salas de aula em movimento frenético com os professores recepcionando os alunos... Muita felicidade e gratidão. Felicidade pela oportunidade de ter estudado no Vieira e ter o Colégio como parte integrante de minha história. Gratidão, por tudo que o Vieira me proporcionou e ofereceu: conhecimento, disciplina, humanidade, ética, respeito e muitas amizades que perduram por toda a vida. No nosso caso, em especial, o CAV é também uma referência familiar. São três gerações que passaram pelas suas salas de aula. Meu pai e tios; eu, meu irmão e primos. Da mesma maneira, o pai de minha esposa, seus primos e, agora, nossos filhos. Trajetória que ganha sabor mais especial ainda quando lembramos de Pró Lenice, tia ama-

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Rogério e Larissa Rossi são pais dos alunos Lara e João Lucas

da de minha esposa, que trabalhou no Vieira por 33 anos, sendo referência de muitas gerações de alunos. Agora, também com um olhar de pai e mãe, percebemos que o Vieira se modernizou, mantendo a excelência no ensino, sem, contudo, perder sua principal característica, que, a nosso ver, é a formação humana, os valores.

Colégio Antônio Vieira, buscando

RESILIÊNCIA

esteve pronto para oferecer solu-

Enfim, de tempos em tempos, epidemias e catástrofes sacodem o homem e suas certezas. No ano de 2020, o mundo foi surpreendido com o novo coronavírus, e a frase de Charles Darwin, neste cenário, está mais atual do que nunca: “Não é o mais forte que sobrevive, nem o mais inteligente, mas o que melhor se adapta às mudanças”.

lhendo suas angústias.

Todos nós, pais, alunos, professores e escola, no início, ficamos apreensivos e inseguros com essa nova realidade que invadiu nossa vida e lares. Nesse momento, o

adequar-se rapidamente ao contexto, adaptou-se ao ensino a distância, adotando uma postura de inovação, valendo-se da tecnologia e gestão responsável, sem perder sua essência de acolhimento. E, mesmo diante de imprevistos e eventuais dificuldades, o Colégio ções e ajudar alunos e pais, aco-

Por tudo isso, acreditamos no Colégio Antônio Vieira, valendo lembrar o ensinamento deixado por Madre Teresa de Calcutá ao comparar os filhos com as águias: “Ensinarás a voar, mas não voarão o teu voo. Ensinarás a sonhar, mas não sonharão o teu sonho. Ensinarás a viver, mas não viverão a tua vida. Porém… em cada voo, em cada vida, em cada sonho, permanecerá sempre a marca do caminho ensinado”.


ENTREVISTA – Prof. Zelão Teixeira

“O QUE VOCÊS CARREGAM EM SUAS MOCHILAS EXISTENCIAIS?”

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outor em Educação, historiador e integrante do Grupo de Pesquisa em Currículo e Formação da Universidade Federal da Bahia (Formacce-Ufba), o professor José Teixeira Neto é um dos profissionais mais requisitados para formação docente no estado. Em um desses momentos, o mestre questionou ao grupo de professores: “O que vocês trazem de si para a sala de aula?”. E emendou com uma metáfora: “O que vocês car-

regam em suas mochilas existenciais?”. Prof. Zelão, como é mais conhecido, referia-se às vivências cotidianas de cada indivíduo, e como, no caso dos docentes, esse movimento pode contribuir para um trabalho de formação integral dos estudantes, sobretudo quanto ao desenvolvimento do senso crítico no mundo contemporâneo. Após pesquisas que resultaram em uma tese de doutorado, o Prof. Zelão, que é coordenador

pedagógico da 2ª série do Ensino Médio do Colégio Antônio Vieira e um dos articuladores pedagógicos da instituição, lançou, no ano passado, um livro sobre o tema. A obra “Mochilas Existenciais e Insurgências Curriculares: possibilidades de interações nas pedagogias culturais do tempo presente” norteia esta entrevista concedida, com exclusividade, para a Revista Vieirense.

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As insurgências curriculares são uma maneira de currículo, com possibilidades de formação significativas, por trazerem temas que desdobram, ou não, dos programas prescritos das disciplinas” A partir do que é abordado no livro, como os professores podem ampliar o processo de aprendizagem dos alunos ao recorrer às chamadas “mochilas existenciais”?

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rof. Zelão Teixeira - O livro enuncia o currículo vivo, como pautas formativas em devir, que possa provocar educadores e educadoras não como um manual, um tutorial ou um passo a passo sobre uma prática curricular. Mas inspirações sobre ações curriculares possíveis, praticadas por docentes em seus cotidianos, para ser refletida, problematizada, questionada, enfim, discutida no campo da formação. Alguns pensadores e pensadoras de educação ajudaram-me na criação desses conceitos. Jorge Larrosa afirma que experiência não é a quantidade de coisas que você fez ou faz; experiência é tudo aquilo que nos toca profundamen-

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te, nos transforma naquilo que estamos sendo durante a vida. Jacques Ardoino, por sua vez, aponta que somos seres que se constituem na multirreferencialidade, ou seja, estamos sendo o que somos por conta de todas as referências que temos em nossa vida: a família, a escola, a rua etc. Já Roberto Sidnei Macedo indica a etnoformatividade como um tipo de formação nos lastros de nossas vivências, nos sentidos dos grupos e lugares onde existimos. Quando passamos a ter consciência desse processo, ampliamos nosso repertório e recursos formativos. Não é a substituição dos conteúdos disciplinares por nossas histórias de vida. Mas, sim, utilizá-las para trabalhar os conteúdos de maneira mais significativa, fazendo a diferença aparecer e não uma igualdade forjada. O que são, na prática, as insurgências curriculares? Em que medida elas ampliam os currículos prescritos tradicionais das disciplinas dadas em sala de aula? Insurgência é um termo emprestado da história, da sociologia, para caracterizar algum movimento, acontecimento, fenômeno, alguma emergência que não estava prescrita, programada, planejada. Vivemos em contextos midiáticos que nos afetam, nos formam, provocam aprendências diversas que não ocorrem, necessariamente, com os professores e professoras em salas de aula. As insurgências curriculares são uma maneira de currículo, com possibilidades de formação significativas, por trazerem temas que desdobram, ou não, dos programas prescritos das disciplinas, podendo também serem provocadas por professores e professoras ou mesmo alunos e alunas, em função de sua emergência no contexto, algo que ocorreu ou vem ocorrendo naquele

Não é a substituição dos conteúdos disciplinares por nossas histórias de vida. Mas, sim, utilizá-las para trabalhar os conteúdos de maneira mais significativa” período e obtém notoriedade na mídia, nas redes sociais, ou ainda na comunidade em que o grupo está vivendo. A insurgência, portanto, emerge inundando as interações, convocando todos e todas de alguma maneira com suas opiniões e posicionamentos expressados por suas mochilas existenciais, movendo nossas oportunidades de aprendizagem. As famílias dos alunos, muitas vezes, revelam preocupação quanto à mídia e redes sociais que nem sempre trazem conteúdos considerados de qualidade para crianças e jovens. Como os professores podem atuar de forma significativa diante dessa questão e, em geral, de todas as pedagogias culturais do tempo presente, como o senhor aborda no livro? As pedagogias culturais do tempo presente tratadas no livro referem-se a uma perspectiva de formação elaborada por duas pesquisadoras


Durante eleição do Grêmio Estudantil, estimulando alunos a atuar como agentes de um currículo vivo

e educadoras brasileiras, Marisa Vorraber Costa e Viviane Camozzato, que nos ajudam a pensar e problematizar os sentidos de pedagogia no contemporâneo. É todo o lugar onde o poder está operando, seja nas academias, escolas, faculdades, universidades, seja nos artefatos e equipamentos culturais, revistas semanais, jornais impressos e televisivos, cinema, novelas, blogs, vlogs, sites, canais de youtubers, propaganda, entre tantos outros. Somos enredados por essas pedagogias no cotidiano, ou seja, somos capturados por elas culturalmente, independentemente dos programas e currículos escolares. As pedagogias culturais do tempo presente estão, portanto, sempre

nos interpelando, formando sujeitos para determinados discursos. Mas há também positividades nessas pedagogias que podem ser problematizadas na formação escolar, praticando currículos vivos, insurgentes, que provoquem enfretamentos dessas imposições consumistas, que sejam rotas de fuga desses enquadramentos sociais homogeneizadores.

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No Vieira, querido e afetuoso colégio onde atuo há 23 anos, vivencio essas possibilidades com colegas educadores e educadoras cotidianamente” O livro traz narrativas de professores, muitos que atuam no Vieira. Qual a avaliação que o senhor faz dos recursos adotados pela equipe pedagógica do Colégio para ir além do currículo prescrito?

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e fato, na pesquisa, contei com a contribuição fundante de educadores e educadoras tanto do Colégio Antônio Vieira como de outras instituições públicas e privadas de Salvador. No caso do Vieira e dos demais colégios da Rede Jesuíta de Educação (RJE) no Brasil, há um campo fértil para essas práticas. A Pedagogia Inaciana mobiliza educadores e educadoras a acessarem e serem acessados e acessadas em suas mochilas existenciais para provocarem ou serem provocados e provocadas para práticas de currículos vivos, considerando o contexto em que se inserem e as insurgências cotidianas que os desafiam, as desafiam. Especificamente no Vieira, querido e afetuoso colégio onde atuo há 23 anos, vivencio essas possibilidades com colegas educadores e educadoras cotidianamente, tanto nas salas de aula, nos projetos de série e reuniões pedagógicas formativas, quanto nos corredores, no cafezinho e com alunos, alunas e famílias. O senhor lançou o livro bem no

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ano em que a pandemia da Covid-19, por sua vez, lançou luz sobre o papel da escola e do professor no processo de aprendizagem. Em que medida este contexto também corrobora com suas proposições? A Covid-19 configurou-se como uma das grandes e perturbadoras insurgências que o currículo-vida nos proporciona, nos provoca, nos ameaça, nos desloca e faz emergir de nós o que temos de melhor e pior, o que temos como compreensão de minha individualidade no coletivo e de meu desdém pelo coletivo, centrando-me em minha individualidade. Aquelas famílias, sobretudo em outros países, que antes defendiam, por exemplo, o homeschooling (educação domiciliar) e que a escola não servia para nada agora perceberam, pelas vias mais tortas e sofridas, a importância da escola no processo de formação. Penso, assim, que essa questão pandêmica e seus desdobramentos devem ser tratados por todos e todas nós, formadores e formadoras, alunos e alunas, famílias, poder público e as inúmeras e diversas lideranças, também a partir de suas oportunidades de aprendências. Estamos, portanto, nos enredando nas pedagogias do corona! Não há e nem haverá “novo normal”! Normalidade para quem? O novo é novo e já está em curso. É esse movimento do tempo presente e suas pedagogias que podemos tomar como potência formativa, transversalizando as disciplinas.

Estamos, portanto, nos enredando nas pedagogias do corona! Não há e nem haverá “novo normal”! Normalidade para quem? O novo é novo e já está em curso” * O livro “Mochilas Existenciais e Insurgências Curriculares: possibilidades de interações nas pedagogias culturais do tempo presente” está à venda no site da editora CRV. Clique com a câmera do celular para o QR-Code e acesse agora mesmo. Pedidos também podem ser feitos pelo WhatsApp: 71- 98790-8658 https://editoracrv. com.br/produtos/ busca?assunto=mochilas


Prof. Ricardinho Bio montou estúdio em casa

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uso de redes sociais e aplicativos, dentre outras plataformas digitais empregadas em prol da aprendizagem, tornou-se ainda mais frequente, nos últimos anos, no Colégio Antônio Vieira, estimulando o engajamento dos estudantes, a partir de ferramentas tão presentes atualmente no cotidiano das crianças e jovens. No Vieira, entretanto, ainda que prevista pela Base Nacional Comum Curricular (BNCC), a imersão na cultura digital é promovida sempre de modo a fazer sentido para o Projeto Político-Pedagógico do Colégio – inclusive estimulando, paralelamente, a reflexão nos alunos sobre a adoção dos recursos no dia a dia, de forma ética e crítica.

O próprio tempo de exposição às telas foi um dos fatores considerados na programação das atividades remotas, assim como a segurança, a privacidade e os riscos de persuasão para fins mercadológicos ou ideológicos têm sido temas trabalhados nas aulas e leituras de livros e documentários indicados pela equipe pedagógica. “Em 2019, antes mesmo da intensificação das atividades on-line por conta da pandemia, fiz um debate em todas as minhas turmas sobre ‘Os impactos das redes sociais na vida dos jovens’. Naquela ocasião, percebi que o tempo que meus alunos dedicavam às redes sociais era enorme e, quase exclusivamente,

para compartilhar o seu dia a dia através de fotos e mensagens. Ou seja, os jovens subutilizavam as redes sociais”, conta a professora de História, Gigi Albuquerque. Com a pandemia, a professora não só passou a estimular mais o uso das redes e aplicativos na apresentação de trabalhos escolares como resolveu ampliar a utilização dos recursos para expor os conteúdos da disciplina. “A ideia era agregar conhecimento histórico na rotina dos estudantes”, revela. “Escolhi o Instagram por ser uma das redes mais acessadas pelos jovens no Brasil e por possibilitar publicações em formatos varia-

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dos: imagens, textos, vídeos nos Stories, SnapChat, Reels. Transformei, então, meu perfil, que era privado, em público e, em vez de publicações pessoais, passei a criar e publicar conteúdos relacionados à história”, narra a professora Gigi (gigi_albuquerque_). Coordenadora acadêmica, no Vieira, do projeto de simulação de Conferência das Nações Unidas (ONU Colegial), a professora Gigi ainda promoveu, por meio das redes sociais e aplicativos de conversa instantânea, a interação prévia entre organizadores e participantes do evento, que teve a primeira edição virtual em 2020, contando ainda com quatro perfis no Instagram.

ATUAÇÃO PLANEJADA O professor de Biologia Ricardo Faria, mais conhecido como Prof. Ricardinho Bio, sempre foi um dos mais conectados ao uso das redes e demais plataformas digitais, como forma de estimular o interesse dos alunos pela disciplina. Muito antes da interação virtual imposta pela pandemia, ele já se fazia presente na internet com vídeos sobre a disciplina em canal no YouTube. Nos últimos anos, o professor também profissionalizou o perfil no Instagram, que, além das postagens com dicas no Feed, permite o uso de recursos diversos, como IGTV, Direct, Stories e lives. Outras ferramentas, como Facebook, Telegram, Padlet e podcast no Spotify, também passaram a ser adotadas pelo professor Ricardinho em prol da aprendizagem dos alunos. Para o professor Ricardinho Bio (ricardinhobio), “feito de forma ética e sempre atento aos limites, o uso da tecnologia digital para fins pedagógicos alinha-se com o previsto pela própria Pedagogia Inaciana do Vieira, voltada para a ressignificação constante para o tempo presente”, como frisa. Ele alerta, entretanto, que para realmente

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motivar crianças e jovens, sempre tão conectados às novidades na internet, é preciso muito planejamento. “Não bastar publicar um vídeo de uma aula tal qual em uma sala presencial. É preciso trabalhar com finalidade, estratégia e criatividade para que não se torne algo monótono, que não cumpra o propósito da aprendizagem”, explica.

“NÃO TEM COMO ERRAR” No Vieirinha, os recursos também já são usados de forma moderada, conforme a faixa etária, desde as séries iniciais do Ensino Fundamental. O professor Gabriel Mattos, de Geografia, é um dos que já tinham canal no YouTube para fins pedagógicos, antes mesmo da pandemia. “Percebi logo o retorno positivo dos alunos pelo elevado número de visualizações”, conta. Ele divulga conteúdos associados às aulas e apostou, em suas publicações, no bordão que sempre usa na classe e que o faz ser mais facilmente encontrado nas redes: “Geografia, não tem como errar” (gabrielmattos_ geografianaotemcomoerrar). No Ensino Médio Noturno gratuito do Vieira, o professor Márcio Félix, também de Biologia, adotava aplicativos como Prezi e Padlet para apresentações, antes mesmo do contexto de aulas remotas. Ele já administrava um site, com conteúdo exclusivamente didático (100% Biologia). “As tecnologias são usadas como parte das metodologias ativas para estimular a aprendizagem e o protagonismo dos alunos”, diz ele, que também leciona no turno diurno. Ferramentas com simuladores de DNA ou para montagem de perguntas pelo aplicativo Quizizz e outras formas de gameficação, além da construção de mapas mentais e formulários eletrônicos, que geram, em tempo real, relatórios de aprendizagem, estão

entre os recursos preferidos do professor.

ALUNOS APROVAM O aluno Aliki Germano de Carvalho, da 2ª série do Ensino Médio Noturno, é um dos que frequentemente acessam o site 100% Biologia, do professor Márcio Félix. “O uso das redes e aplicativos pelos professores é um diferencial que os aproxima dos jovens, já que hoje nossa geração não se imagina sem a internet. Então, desperta ainda mais o nosso interesse pela matéria”, diz o estudante, que já apresentou trabalhos escolares em vídeos, usando aplicativos. No turno diurno, a aluna Verônica Moraes, também da 2ª série EM, já usava Padlet, Canvas, YouCut para fazer mapas mentais, vídeos e outros projetos escolares. “É muito legal um colégio que não se limita a ter somente provas tradicionais, permitindo que a gente possa também ter avaliações usando recursos tecnológicos que, por si só, já nos motivam para a aprendizagem. Por outro lado, é interessante também ver professores disponibilizando conteúdos nas redes sociais, permitindo uma interação e aprendizagem que vai além da sala de aula”, afirma.

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REDES SOCIAIS E APLICATIVOS NA APRENDIZAGEM

A IMPORTÂNCIA DA FORMAÇÃO DO PROFESSOR Por Profª Ana Paula Marques, diretora acadêmica do Colégio Antônio Vieira, mestre em Gestão Educacional e doutoranda em Educação pela Unisinos

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ara além do contexto de pandemia vivenciado no ano de 2020, que exigiu deslocamentos significativos dos professores em suas práticas e uso intensivo de recursos tecnológicos a serviço de uma aprendizagem personalizada e significativa, as tecnologias educacionais já faziam parte do currículo escolar. A própria BNCC traz a cultura digital como um pilar, prevendo a sua prática em todo o processo de ensino e aprendizagem e indicando que os estudantes devem utilizá-la de forma crítica, implicada e responsável, ao longo da Educação Básica. Ainda era, no entanto, um grande desafio a constituição de novos modelos mentais de ensino e de aprendizagem que utilizassem a tecnologia, não para reproduzir as metodologias de ensinos tradicionais, mas para garantir novos, múltiplos e personalizados processos pedagógicos, em que o aluno fosse protagonista de sua aprendizagem, implicando-se e dando sentido aos conteúdos. Assim, diante da própria realidade e da cultura digital exigida no contexto educacional do histórico ano de 2020, os educadores buscaram apropriar-se ainda mais das múltiplas tecnolo-

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gias educacionais, reconhecendo seu potencial na constituição do processo significativo de aprendizagens. Para ajudar os professores nessa prática, indo além da capacitação e buscando a compreensão dos processos cognitivos desenvolvidos a partir de novas metodologias, apoiadas nos espaços e aplicativos de aprendizagem, o Colégio Antônio Vieira ofereceu, ao longo da constituição de seu Projeto Pedagógico Remoto, formações para os professores e a equipe técnica. Mesmo antes da pandemia, ainda em janeiro, nosso encontro pedagógico já abordou o Ensino Híbrido, com a especialista Lílian Bacich, que trouxe o tema das metodologias ativas, com foco na construção de planos e atividades, alinhando a BNCC aos objetivos de aprendizagem. E, durante toda a constituição do Projeto Pedagógico Remoto, os professores puderam ter formações que qualificaram e potencializaram o uso dos recursos.

OPORTUNIDADE Nesse movimento cada vez mais robusto, a RJE ofereceu formações sobre empatia e metodologia em ambientes virtuais e sobre como sustentar as aprendizagens em momentos de pandemia. Para consolidar essa itinerância pedagógica de 2020, a RJE também ofertou uma capacitação em tecnologias educacionais, abordando recursos

para aulas virtuais no Moodle; conhecimento e aplicação de Recursos Educacionais Abertos (REA); maneiras de dinamizar as aulas virtuais e propostas de desenvolvimento da competência colaborativa, por meio das ferramentas do Office 365 e Google. Embora nossa comunidade aprendente já estivesse familiarizada com as metodologias ativas, o Ensino Híbrido e as Tecnologias Educacionais, o contexto vivido, tão desafiador para todos, proporcionou a possibilidade de aprofundarmos todos esses recursos, de forma que fossem verdadeiramente aliados de uma aprendizagem significativa, potente e personalizada. Na contramão dos discursos pessimistas que desacreditam no potencial das tecnologias no âmbito da educação, podemos vivenciar uma rica, poderosa e transformadora oportunidade de aprender, nos mais diversos âmbitos que compõem a formação integral.

SEGURANÇA NO AMBIENTE VIRTUAL O Colégio Antônio Vieira criou, no ano passado, quase quatro mil contas de e-mails dentro da ferramenta Office 365 – destinadas exclusivamente para alunos, professores e todo o corpo técnico da escola. “A medida faz parte das ações para promover segurança e estabilidade no ambiente virtual durante as aulas on-line”, explica o gestor de Tecnologias de Informação e Educação, Anderson Rafael Souza.


FUNDAMENTAL É

ESTAR NO VIEIRINHA Projeto pedagógico diferenciado e acolhimento especial marcam ingresso de alunos no 1º e 2º anos EF

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E

ntrar em uma nova escola e, ao mesmo tempo, ingressar em uma nova etapa de estudos, no Ensino Fundamental, representa uma importante mudança para a criança em todos os sentidos. É mais um momento cercado de intensos sentimentos, até porque a criança, agora na faixa etária entre 6 e 7 anos, já desenvolveu certa autonomia e preferências, devendo ser vista como protagonista da aprendizagem e, mais do que isso, acolhida de forma especial, para que se sinta à vontade nas novas relações com a equipe pedagógica e coleguinhas. É justamente a atenção singular dispensada às crianças nas séries iniciais do Ensino Fundamental, 1º e 2º anos EF, que vem se tornando uma referência no Colégio Antônio Vieira. O diferencial, segundo a professora Adriana Novis, está no projeto pedagógico voltado para a criança do século XXI e que já prevê um acolhimento de alta afetividade, mas que, de fato, considere os reais interesses e potencialidades do aluno.

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“A criança do século XXI apresenta um perfil investigativo, curioso e questionador. Ela precisa ser reconhecida como um sujeito único, de direitos e deveres, que apresenta personalidade própria e que deve ser valorizada, no ambiente familiar e no contexto escolar, inclusive, porque já também constrói conhecimentos a partir das interações e relações que estabelece consigo mesmo, com os outros e com o mundo que a cerca”, diz Adriana Novis, que é coordenadora pedagógica do 1º e 2º anos EF no Vieira. Engana-se, entretanto, quem pensa que estruturar um projeto pedagógico que desperte o interesse da criança no mundo contemporâneo implica, simplesmente, oferecer-lhe jogos eletrônicos e aplicativos, em que ela já está tão inserida no dia a dia fora da escola. Ainda que adotados para fins de aprendizagem, tais recursos digitais no Vieira são sempre sujeitos aos limites de exposição às telas, sendo vistos como uma das opções de experiências de conhecimento,

que também incluem as conexões necessárias com o mundo real. Foi pensando nisso que o Vieira investiu no Espaço Criançando, uma área verde com unidade de compostagem, túnel sonoro de bambu e espelho-d’água com peixinhos, usada para lazer e momentos de aula ao ar livre, permitindo uma maior interação do aluno com a natureza e com outras crianças. Nesse sentido, o planejamento pedagógico do Vieira foi ressignificado para o programa de aulas remotas, com atividades programadas para também incentivar as boas relações familiares, valorizando, paralelamente, os momentos de aprendizagem no mundo real, até mesmo estando a criança em casa.

LUDICIDADE A professora Catucha Cavalcante, que leciona para turma do 2º ano EF, no turno vespertino, lembra que também é nessa etapa que se intensificam os trabalhos de desenvolvimento da leitura e letramento, por exemplo. “A criança


está na fase de consolidação da base alfabética em um período em que ela começa a se dar conta da funcionalidade da leitura para comunicar, interagir e proporcionar conexões, o que vai se refletir na escrita e nas aprendizagens em todas as disciplinas”, diz. Ela ressalta a importância do papel da ludicidade, do acolhimento das emoções da criança e de um projeto pedagógico dinâmico, sobretudo, tratando-se do ensino remoto ou híbrido. É por isso que no Colégio até mesmo a brincadeira é considerada parte de um currículo vivo que integra as múltiplas potencialidades de aprendizagem na infância. “Aqui no Vieira, desde o 1º ano EF, buscamos desfazer aquela ideia de que brincar é coisa apenas da Educação Infantil e que ao chegar ao Ensino Fundamental a coisa passa a ser séria. Isso é um equívoco: a ludicidade, na verdade, faz parte da vida”, confirma a diretora geral, professora Mariângela Risério.

mãe de Pedro, a empresária Jéssica Oliveira. Mesmo no contexto de distanciamento social, o Colégio fez questão de manter o contato frequente com pais e responsáveis pelos estudantes, por meio de reuniões virtuais. “Esses encontros continuam e são sempre muito especiais e se configuram, de fato, como um espaço de diálogo fecundo”, acredita a professora Adriana Novis, destacando a importância do acolhimento especial não só para os pequenos novos alunos, mas para as famílias e suas grandes expectativas.

“Acho todas as aulas bem divertidas e gostei dos meus novos amiguinhos. Agora quero sempre continuar no Vieira”, afirma o aluno Pedro Henrique, do 2º ano EF. Ele ingressou na escola no ano passado, e a satisfação se dá, mesmo em meio às frustrações geradas por não ter podido desfrutar mais, logo no ano de estreia, dos estimulantes ambientes de aprendizagem do Colégio, a exemplo do Espaço Criançando.

ACOLHIMENTO ÀS FAMÍLIAS “O Vieira fez um excelente trabalho, mesmo diante dos desafios da pandemia, tendo me cativado, principalmente, durante as atividades remotas, quando dividiu as turmas em dias específicos para trabalhar leitura e escrita, demonstrando o cuidado em acompanhar o desenvolvimento de cada aluno mais de perto”, conta a

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AS TRAVESSIAS PARA O ENSINO MÉDIO: QUAIS CAMINHOS SE ALARGAM PARA OS CIDADÃOSSUJEITOS DE DIREITOS?

Por Vânia Virgens, pedagoga, doutoranda em Educação (Unisinos), coordenadora pedagógica do 9º ano EF do Colégio Antônio Vieira

Interessante perceber o quão mágico é debruçar-se sobre as nossas travessias nos territórios mais diversos habitados por nós (nosso eu-família-escola-cultura) no processo de formação humana e cidadã. Trata-se, como define Carlos Skliar (2014, p. 167), de um permanente movimento de encontro e desencontro com corpos e vozes de desconhecidos. Também nas travessias “a verdadeira novidade nasce sempre de uma volta às origens” (MORIN, 2005, p. 43), quando recorremos ao que vivemos, aprendemos, passamos e construímos no “pluriverso”, que é a escola. Parece que tudo foi ontem para os nossos filhos e filhas, para os nossos alunos e alunas! Primeiro dia de aula, adaptações, expectativas, aprendizagens, frustrações, desencontros e pre(tensões) marcam as etapas da escolarização na vida. É, pois, na travessia que se dá a Educação Escolar. A travessia a que nos referimos aqui – do Ensino

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Fundamental para o Ensino Médio – tem a mesma acepção poética cunhada por Carlos Skliar (2014, p. 26) - não pretende ser meta e nem finalidade, mas duração da continuidade. Estar no Ensino Médio, portanto, é esse tempo de extrema importância, uma vez que ele se encontra numa verdadeira encruzilhada [labirinto] do existir, quando decisões sobre a vida precisam ser tomadas para a inserção na vida profissional e ingresso na Educação Superior (SEVERINO; SEVERINO, 2012, p.10). Sendo duração na continuidade é que a Educação da Companhia de Jesus se firma com o propósito de “formar a pessoa para que dê sentido à sua vida e com ela contribua para o bem comum, em seu contexto, no de sua sociedade e do planeta” (COMPANHIA DE JESUS, 2019, p. 56). Por conseguinte, compreender o Ensino Médio como continuidade implica em voltar às origens, ir ao encontro do que foi construído também na escola como alicerce para o amadurecimento pessoal. Tão importante quanto o sentido e o desejo por parte de quem aprende, são as intencionalidades e construções do currículo vivo na/da escola: que bagagens os jovens carregam nas suas “mochilas existenciais” (TEIXEIRA NETO, 2020) para os novos caminhos que se alargam em direção ao Ensino Mé-

dio? O que os aguarda? E como o Projeto Político-Pedagógico se (re) constrói na perspectiva de não só conduzi-los, mas de abrir-se para também permitir ser conduzidos por eles? A sólida formação científica, cultural, cristã, ética e política, as atitudes e valores, os fortalecimentos dos vínculos de família e dos laços de solidariedade marcam o tempo enquanto profundidade no Ensino Fundamental. É nesse contexto que já se inserem no 9º ano os planos e projetos para potencializar as aprendizagens, tais como: o estudo orientado por professores especialistas em Química, Biologia e Física (Quibifi); o acompanhamento personalizado das produções textuais; a participação nos simulados modelo Enem e nas avaliações externas; a inserção dos estudantes nas olímpiadas do conhecimento; e o letramento maker, em que a curiosidade, a intenção criativa e a construção colaborativa são ideias-que-atravessam o nosso currículo. É assim que as especificidades de cada etapa do desenvolvimento humano privilegiam os aspectos que se desenvolvem de forma entrelaçada, na unidade do processo didático (BRASIL, 2010), alargando, no Ensino Médio, os caminhos para o estudo pessoal como processo de busca, investigação e pesquisa sobre


O que torna casual o poético é, justamente, o labirinto da travessia, a incapacidade de traçar linhas retas ou utilitárias, o modo como nos expomos ao que percebemos. A travessia é a diferença entre o tempo que passa e o que passa no tempo. Ou, talvez, a diferença que há no interior do tempo que passa: diferença enquanto intensidade, tempo enquanto profundidade” (Carlos Skliar) temas atuais e variados da cultura e da ciência, da literatura, da arte e da filosofia. As oficinas optativas para o Enem, no contraturno, reforçam, para além do exame, o caminho da autonomia técnica e intelectual, não menos repleto dos compromissos com a ética, a solidariedade e a Casa Comum. É nesse contexto que a qualidade pedagógica da escola inclui o compromisso com a aprendizagem do estudante e, portanto, com a política de formação dos educadores como ponto fulcral de compreensão da Educação como processo formativo e de coexistência com “seres fazedores de seu caminho que, ao fazêlo se expõem, se entregam ao caminho que estão fazendo e que assim os refaz também...” (FREIRE, 1992, p. 97-98). Nessa perspectiva, o jovem, a família e os educadores atravessam etapas constitutivas da formação, quando interagem, constroem, experimentam e transformam

saberes, conhecimentos e valores fundamentais para a cidadania. Na travessia, tudo acontece, tudo passa e... Tudo continua! São as pedagogias da “duração da continuidade” - que nos colocam no movimento sinuoso de ir e vir. Elas nos convocam ao começo, a retomar o que já foi pensado e sentido para avançar, como proclama Cecília Meireles, com as “novas formas, com as novas tintas, com os olhos em Sabedoria”. Tal prerrogativa destitui a ideia de que haverá passagens de uma posição menos importante a outra que se ergue; de um lugar mais fácil ao mais difícil; do incompleto ao completo. Os movimentos de travessia para o Ensino Médio são de projetos de vida que não cessam; de intervenção na continuidade temporal e nas aprendizagens construídas; e de novas perspectivas e sonhos “para além do espaço intervalar e fronteiriço” (OSOWSKI, 2002, p. 95). Em adição, os aparentes recuos, paradas e avanços são reelaborados na fluidez da travessia de um tempo que passa na intensidade e profundidade, mantendo acesa a chama que nos obriga a começar, sempre. Sigamos, entre travessuras e travessias.

Alunos participam de projetos pedagógicos integrados do Ensino Fundamental ao Médio

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ENSINO MÉDIO NOTURNO

OBRA JESUÍTA QUE MOVE SONHOS

Qualidade da proposta educacional da Companhia de Jesus estende-se à educação popular

Yêcilla Ágata Nogueira Ian do Rosário

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C

om apenas 17 anos, a jovem Yêcilla Ágata Nogueira tem um sonho: ser advogada e, mais do que isso, fazer diferença na sociedade. “Gosto de conversar com as pessoas e ajudá-las, e é também por isso que pretendo fazer Direito”, conta a adolescente. A qualidade do programa educacional do turno gratuito é uma das razões que dão à jovem a certeza de que tem condições de realizar seus sonhos. Quem também resgatou os sonhos ao cursar o turno noturno no Vieira foi o estudante Ian do Rosário. Após a morte da mãe, com a família também enfrentando muitas dificuldades financeiras, Ian sentiu-se desmotivado a realizar seus planos, pautados na arte, e até para fazer novos amigos. Realidade que mudou a partir do ingresso no Ensino Médio Noturno. “Percebi, na prática, que o passado não é um lugar de permanência e, sim, de referência para novos avanços a serem alcançados”, disse ele, parafraseando o compositor americano Roy Bennett. Também com 17 anos, ele planeja ser professor de Letras ou Geografia. “Matérias que sou completamente apaixonado”, frisa. Os sonhos e planos de Ian e Yêcilla são apenas exemplos do comprometimento dos alunos com o curso noturno do Vieira, a partir de um trabalho estruturado nos ideais de formação integral que também caracterizam as ações de Educação Popular da Companhia de Jesus. Os estudantes sabem que a qualidade do Ensino Médio Noturno do Vieira é um diferencial. Não é à toa que há uma grande procura, no perío-

do de seleção de candidatos para as vagas oferecidas pela obra social jesuíta, geralmente com inscrições abertas no final de cada ano letivo. Podem se candidatar jovens com renda familiar per capita de, no máximo, um salário mínimo e meio. A proposta centrada na formação do adolescente alinha-se com as Preferências Apostólicas da Companhia de Jesus, promulgadas em 2016 e que vão nortear a missão jesuíta durante os dez anos que se seguem. Uma das quatro diretrizes prevê “acompanhar os jovens na criação de um futuro cheio de esperança frente aos desafios da busca das juventudes por um sentido na vida”. É o sentido na vida que tanto buscam Ian e Yêcilla, assim como todos os seus colegas do Ensino Médio Noturno do Vieira.

favoráveis aos seus estudos, mas que aqui encontra a certeza de uma educação de qualidade, inclusiva”, diz a diretora geral do Vieira, professora Mariângela Risério. “Reconhecemos na Educação um direito universal, para o qual precisamos trabalhar para criar estratégias de combate às desigualdades históricas”, completa a educadora. A declaração da diretora revela o pleno alinhamento do Vieira com o compromisso firmado, em 2019, pela Conferência dos Provinciais da América Latina e do Caribe (CPAL) pela promoção do Direito Universal à Educação de Qualidade (Dueq), assim como com o previsto pelo

ATENÇÃO ESPECIAL A oportunidade inclui, além da possibilidade de acesso a uma educação com padrão de qualidade das escolas jesuítas, o fornecimento de material escolar, lanche e fardamento, além do uso dos espaços de aprendizagem diferenciados do Vieira, como laboratórios, espaços maker, salão com multiconfigurações (Espaço Klein, SJ), entre outros. Há também o acompanhamento dos serviços de Orientação Educacional (SOE) e de Orientação Religiosa e Pastoral (Sorpa), com o Colégio ainda contando com enfermaria e serviço de segurança, por exemplo. “Em nosso Colégio, com realidades sociais tão distintas, temos nosso grupo de alunos do Noturno, que, muitas vezes, não tem condições

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Aos sábados à tarde, alunos fazem atividades complementares como visitas a instituições

Pacto Educativo Global, lançado no ano passado pelo Papa Francisco, também aderido formalmente pelas instituições jesuítas de ensino.

TRANSFORMANDO VIDAS “O maior diferencial do Ensino Noturno do Vieira é que se trata de uma obra filantrópica em que há toda uma preocupação em, realmente, transformar vidas, oferecendo educação de qualidade, com professores que passam pela mesma formação docente da equipe do Vieira do turno diurno”, frisa a coordenadora pedagógica do Ensino Médio Noturno, professora Cintya Bittencourt. A professora Cintya conta que a regularidade das aulas e a própria preocupação da instituição em complementar a carga horária aos sábados (sempre das 14h às 17h40) estão também entre os referenciais de comprometimento com a formação que mais impressionam os estudantes. Geralmente aos sábados, além de aulas, eles participam de atividades comple-

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mentares, como visitas a museus, fábricas e outras instituições filantrópicas.

CRIANDO CONEXÕES As dificuldades iniciais de acesso à internet pelos alunos foram o grande desafio enfrentado pela equipe pedagógica do Ensino Médio Noturno do Vieira com a pandemia da Covid-19. “Ficamos muito preocupados em um primeiro momento e, inclusive, partimos para já estudar uma adaptação futura para compensar eventuais perdas de conteúdo, quando no retorno às aulas presenciais, mas a motivação dos alunos nos surpreendeu, e a maioria logo buscou alternativas diversas para poder acompanhar as aulas”, conta a orientadora educacional Aline Melo, que comemora o fato de, mesmo diante das adversidades, ter chegado ao final do ano de 2020 com 97% dos alunos acompanhando as atividades remotamente.


50 Anos

COMEMORANDO

A

oferta de um ensino gratuito e de qualidade é um marco do turno noturno do Colégio Antônio Vieira, desde quando foi instituído há mais de 50 anos. De acordo com os registros da Biblioteca do Vieira, as aulas à noite no Colégio tiveram início em 1969 com uma ação social de ex-alunos que atuavam como voluntários na alfabetização de pessoas carentes no bairro do Garcia, sob a liderança do padre Ugo Meregalli. Já em 1970, o curso foi oficializado como Suplecav (curso supletivo), tendo completado, assim, 50 anos no ano passado. “Um seminário comemorativo chegou a ser organizado em 2020 por ex-alunos e professores que atuaram no supletivo, mas, por conta da pandemia, as comemorações do cinquentenário foram adiadas e devem ser realizadas agora em 2021”, explica a Profa. Maria Ornélia, doutora em Educação e que também teve importante papel na consolidação das aulas no noturno.

ta na Itália”, como ressaltou. Outro marco, segundo ele, foi o dia em que o educador Paulo Freire, em visita à Bahia, fez questão de conhecer as aulas ministradas no então Suplecav.

EJACAV E ENSINO MÉDIO A partir de mudanças ocorridas na legislação brasileira, em 2002, extinguindo os cursos supletivos em todo o País, foi feita uma nova reformulação na proposta e instituindo-se o Programa de Educação de Jovens e Adultos (Ejacav), mantendo por 18 anos toda a proposta original de qualidade e alinhamento com os ideais inacianos. Em 2019, a partir da promulgação das Preferências Apostólicas da Companhia de Jesus, o Colégio passou a oferecer, no turno, o Ensino Médio gratuito, exclusivamente para jovens em situação de vulnerabilidade social, em mais uma demonstração da constante atenção da Ordem Jesuíta aos desafios do mundo contemporâneo.

O Pe. Domingos Minualli, que também foi atuante na valorização do turno, ressalta que, ao longo dos anos, a proposta pedagógica do noturno do Vieira “tornou-se referência na Bahia e até internacionalmente, dentro da Companhia de Jesus, tendo sido apresentada, inclusive, em um congresso jesuí-

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Direito de ser feliz Uma história de novos horizontes por caminhos que se cruzam no Vieira

N

atural de Gandu, no sul baiano, Joselina do Amparo lembra quando, aos 19 anos, interrompeu os estudos para atuar como empregada doméstica em Salvador, na residência de uma família no bairro da Graça. As três crianças da casa onde Joselina começou a trabalhar estudavam no Colégio Antônio Vieira. Foram, justamente, os já depois ex-alunos do Vieira que, juntamente com os pais, seus patrões, a incentivaram a retomar os estudos no turno noturno do Colégio. “Cheguei a pensar em me matricular em uma escola pública, mas todos da casa recomendaram o curso noturno no colégio deles, que também era de graça e, segundo eles, de excelente qualidade. Aceitei o desafio e hoje vejo que não deveria ter esperado tanto para tomar tão importante decisão”, conta. Na época, aos 37 anos, Joselina tornou-se aluna do Programa de Educação de Jovens e Adultos do Colégio Antônio Vieira (Ejacav), concluindo os estudos em cinco anos. “Eu era uma aluna aplicada, bem participativa, ativa mesmo, e havia me encantado com a escola, sobretudo pela formação que vai além do acadêmico, centrada no desenvolvimento do ser”, diz. “Gostava do espaço, do trabalho do SOE e do Sorpa (serviços de orientações educacional e religio-

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sa e pastoral) e de todo o projeto pedagógico que nos preparava em conteúdo e na elevação da autoestima”, lembra.

SÓCIA NO ESCRITÓRIO Não deu outra: aluna aplicada, Joselina logo passou no vestibular para Direito na Universidade Católica (Ucsal). “Tinha minhas economias e, com elas, paguei o primeiro semestre; o segundo, meus patrões me ajudaram; e depois eu consegui uma bolsa social da universidade, o que me permitiu concluir a graduação”. Joselina passou no exame da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e hoje, aos 49 anos, é sócia de um escritório de advocacia (Ribeiro & Amparo Advocacia e Consultoria), na Avenida Tancredo Neves, atual centro financeiro da capital baiana. Sabe de quem ela é sócia? Da filha dos “ex-patrões” . A menina estudou no diurno do Vieira e formou-se também em Direito. Dra. Joselina ainda mora com a mesma família: “Nossa relação de carinho e respeito continua, mas a de trabalho mudou para ainda melhor”, conta a ex-aluna do Ejacav, realizada e feliz.


disciplina também tem se mantido acima da alcançada pelas escolas da rede privada da capital baiana: 826,19 pontos, no ano referido.

NOTA 1000

Com desempenho acima da média nacional, alunos do Vieira ganham destaque na disciplina considerada “bicho-papão” pela maioria dos estudantes

D

obtida pelas escolas particulares de Salvador.

De acordo com os microdados mais recentes divulgados pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), órgão responsável pela realização do Enem, há pelo menos sete anos o Vieira tem registrado desempenho bem acima das médias brasileira, baiana e também no comparativo com a pontuação

Para se ter uma ideia, na edição de 2019 – segundo os microdados de análise mais atuais oficialmente revelados pelo Inep –, a nota média do Vieira foi de 831 pontos, para uma pontuação máxima de 1.000. No caso do Colégio, é importante sempre considerar o número elevado de alunos da instituição que prestam os exames anualmente (mais de 300 estudantes), o que, inevitavelmente, influencia no cálculo da média. Ainda assim, o resultado do Colégio em Redação, no ano referido, supera o obtido nacionalmente (734 pontos) e ainda mais no caso da média da Bahia e de Salvador, que se igualam em 732 pontos. A média do Vieira na

isciplina decisiva e, até por isso mesmo, também considerada pela maioria dos estudantes como “bicho-papão” do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) e vestibulares diversos, a Redação é, ao contrário, um traço forte no perfil dos alunos do Colégio Antônio Vieira. É o que tem revelado a média das últimas edições dos exames de ingresso ao Ensino Superior.

“Vale ressaltar que se trata de uma média mesmo, pois já se tornou comum que muitos alunos do Vieira obtenham notas acima de 900 e, destes, até nota 1000”, ressalta a professora Carla Fernanda Bomfim, uma das integrantes da equipe do Departamento de Língua Portuguesa e Redação do Vieira. Os dados do Inep também confirmam a questão. Ao considerar, por exemplo, os 30 melhores alunos da instituição, o Vieira desponta ainda mais entre os líderes no ranking de maior pontuação obtida no País, com pontuação média sempre acima de 900. O Colégio também tem histórico de nota máxima na plataforma on-line Redação Nota 1000, referência nacional em preparação para as provas do Enem e de vestibulares. Para a professora Carla Fernanda, que leciona nas turmas das 1ª e 2ª séries do Ensino Médio, o trabalho de preparação dos alunos do Vieira em Redação tornou-se um diferencial em Salvador, “por representar um projeto de escrita consolidado, fundamentado em uma proposta pedagógica desde as séries iniciais, que, quando chega ao Ensino Médio, ganha um formato ainda mais sólido para que os alunos consigam não apenas escrever em situações reais em seus projetos de vida, mas também para atender aos critérios dos concursos”, ela frisa. A professora destaca ainda a coesão das aulas de Redação com o trabalho de Língua Portuguesa, que também foca nas questões de interpretação, literatura e ensino dos aspectos gramaticais como forma de aprendizagem na construção de textos. “É importante promover as metodologias de forma integrada

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série do Ensino Médio, foca-se no treinamento estratégico das competências exigidas na correção da prova do Enem, sem deixar de ressaltar as diferenças em relação aos vestibulares das diversas universidades.

para que o aluno possa expressar no texto aquilo que ele quer dizer, considerando, por exemplo, o efeito da pontuação, o uso de mecanismos de coesão, dos verbos e outros modalizadores, o repertório literário e o aprendido em outras disciplinas, mostrando, assim, que toda a técnica trabalhada na Redação também se solidifica na interdisciplinaridade”, diz.

OFICINAS DE REDAÇÃO Outro importante diferencial do Vieira é o trabalho específico na preparação de alunos com as Oficinas de Redação, oferecidas, uma vez por semana, no turno vespertino, mas de forma integrante do currículo regular. “Não se trata de uma oficina opcional e não há um custo a mais por isso. É um trabalho integrante do projeto pedagógico do Colégio, oferecido já nas séries iniciais do Ensino Médio”, explica a professora Carla Fernanda. Ela é uma das profissionais que, além de dar aulas de Gramática no turno regular do Vieira, também atuam, à tarde, nas oficinas. Mesmo se tratando da mesma disciplina, os trabalhos realizados no turno regular e nas oficinas são diferentes: enquanto, no turno das aulas, a Redação trabalha gramática, repertório e estrutura do texto; nas oficinas, iniciadas já com a 1ª

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“Se o aluno aprende a escrever, ele pode fazer Enem, Bahiana, Fuvest, escrever um livro, entre outros projetos que tenha interesse nesta área”, assinala a professora. Assim, por meio da escrita, os estudantes se tornam capazes de “participar e intervir autonomamente na sociedade”, um diferencial da Pedagogia Inaciana, conforme preconiza o Projeto Educativo Comum (PEC), um dos documentos que norteiam o trabalho pedagógico desenvolvido pelos colégios jesuítas.

ATENÇÃO EXTRA NO TURNO REGULAR As aulas regulares de Redação no Vieira também contam com um tratamento especial, com a atuação de duas professoras, por turma, ou seja, na hora da aula de Redação, as turmas são divididas, o que já permite uma atenção mais particularizada. Uma das metodologias adotadas no Ensino Médio é a de trabalhar o texto por partes. “Em vez de aprender o texto na íntegra, ele inicia as práticas trabalhando apenas a introdução; depois das avaliações, o trabalho é lapidado e vai seguindo, da mesma forma, para as outras partes de desenvolvimento do texto, até chegarmos à conclusão”, explica a professora de Redação do turno regular, Bruna Guimarães, que dá aulas para as 1ª e 3ª séries EM, integrando a equipe “peso pesado” de profissionais do Vieira, referência na preparação para o Enem e vestibulares. A própria atuação da professora nas duas séries já comprova que, no Colégio, há uma preocupação em evitar uma sobrecarga para o estudante na última série

antes dos exames de ingresso ao Ensino Superior.

MODELO CAMPEÃO A professora Bruna também destaca a importância do trabalho complementar nas oficinas de Redação. “O Colégio foi realmente muito assertivo neste projeto, em um trabalho que só veio a agregar dentro de um modelo integrado que é considerado campeão, incluindo oficinas, realmente, diferenciadas que vão bem além de um mero trabalho de reforço”. No caso do tema da redação, que sempre preocupa os candidatos em geral, a professora explica que o Vieira atua a partir de eixos prováveis com aulas de repertório que se alinham a todos os conhecimentos também tratados em outras disciplinas, como Geografia, História, Atualidades, por exemplo. “Trabalhamos, paralelamente, grandes eixos em diversas áreas, como Educação e Segurança Pública, entre outros. Então, por exemplo, se o tema for ligado a analfabetismo funcional, importância da leitura, evasão escolar, educação a distância ou domiciliar etc., foi trabalhado pela escola no eixo Educação. Já o eixo da Segurança Pública envolve criminalidade, fome, violência, tráfico de drogas, entre outros”, explica.


Outro diferencial do Vieira que, segundo a professora Bruna Guimarães, também acaba influenciando os excelentes resultados em Redação são as ações de protagonismo estudantil existentes no Colégio. Os alunos podem participar, além do grêmio, de núcleos sobre minorias sociais (Neims), incentivo ao conhecimento (Naic), preservação ambiental (NAV) e também de ações de voluntariado e da Academia Vieirense de Letras e Artes (AVLA), além de grandes eventos de formação, a exemplo das simulações de conferências das Nações Unidas (ONU Colegial) e intercâmbio em projetos nacionais e internacionais promovidos por instituições jesuítas. “São iniciativas que, por si só, já dotam os estudantes de um repertório especial e que lhes dão um poder de criticidade e de reflexão incomparável, que eles levam também na sua escrita”, diz a professora.

As cinco competências exigidas pelo Inep na redação do Enem 1. Revelar domínio da escrita formal. 200 pontos 2. Desenvolver tema em estilo dissertativo-argumentativo. 200 pontos 3. Relacionar, organizar e interpretar informações e argumentos em defesa de uma opinião. 200 pontos 4. Demonstrar conhecimento de mecanismos linguísticos para construir a argumentação. 200 pontos 5. Respeito aos direitos humanos. 200 pontos Fonte: Inep/MEC

FALA, GALERA! Beatriz Costa, aluna da 3ª série EM “O modelo especializado do Vieira, incluindo as Oficinas de Redação, é um trabalho que qualifica, de fato, a construção textual dos alunos, de forma que apresente autenticidade, marcas de autoria. No meu caso, percebo uma evolução muito significativa, justamente porque contamos com projetos de texto que são sempre bastante comentados pelas professoras que buscam o tempo todo aguçar o nosso olhar para as nuances essenciais que uma boa redação deve ter. São avanços que foram notados, inclusive, durante as atividades realizadas no modelo remoto, também cumprindo os objetivos propostos”.

Pedro Vieira, aluno da 2ª série EM “Desde o Vieirinha, tenho tido bons resultados em Redação. No Vieirão, entretanto, pude notar ainda mais a importância da base adquirida no Ensino Fundamental para o crescimento da minha escrita de forma significativa, a partir do Ensino Médio. Na plataforma Redação Nota 1000, por exemplo, tenho registrado parágrafos conclusivos considerados perfeitos. Embora prefira estar presencialmente nas oficinas, notei meu crescimento na construção dos textos mesmo durante as aulas on-line, o que me faz acreditar em uma evolução cada vez maior a partir de agora”.

Luís Filipe Ribeiro, aluno da 3ª série EM “Estudo no Vieira desde o 6º ano do Ensino Fundamental e, até então, sentia muita dificuldade na parte argumentativa e de coesão das ideias na construção das minhas redações. Foi o Colégio que me proporcionou identificar essas minhas deficiências e também aprimorar minhas estratégias coesivas, ampliar meu repertório sobre temas, além de toda a parte de técnicas relativas às competências do Enem. Na plataforma Redação Nota 1000, notei que já consigo desempenho bem significativo para vestibulares como o da Fuvest (Fundação Universitária para o Vestibular), em São Paulo”.

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DEVER DE CASA

POR UM ESTUDO AINDA MAIS PRODUTIVO

Materiais produzidos pelo SOE auxiliam alunos nas tarefas extraclasse e estimulam protagonismo

QR-CODE: Aponte a câmera do seu celular para o QR-Code e acesse agora mesmo a íntegra dos materiais produzidos pela equipe do SOE do Vieira.

Na hora de fazer a atividade escolar em casa, complementando a aprendizagem dos conteúdos ministrados pelo professor em sala de aula, é preciso, antes de tudo, ter foco. Ou seja: não basta seguir as orientações da equipe pedagógica de forma mecânica, “robotizada” – tentando apenas “cumprir tabela”, como se diz na linguagem coloquial. É fundamental que o estudante entenda o momento, de fato, como mais uma oportunidade de construção de conhecimento. Despertar essa reflexão entre crianças e jovens é, na maioria das vezes, um grande desafio para os pais e demais responsáveis. No Colégio Antônio Vieira, entretanto, os alunos e suas famílias contam com a assistência especializada da equipe do Serviço de Orientação Educacional (SOE). Integrado por psicopedagogos, o SOE do Vieira criou até guias de estudo, com dicas de fácil acesso, para tornar a aprendizagem em casa ainda mais produtiva, considerando as características de cada faixa etária. Um dos diferenciais do Colégio é, justamente, contar com um orientador educacional para cada série.

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FOCO NO PRESENTE Os guias “Procedimentos de Estudo e Estratégias de Aprendizagem” e “Gestão de Tempo e Planejamento” foram lançados no ano passado: “Fizemos, antes, uma escuta com os alunos, focando na realidade daquele momento da pandemia”, conta a orientadora educacional do 9º ano EF, a psicopedagoga Jerusa Carvalho. “Acabamos formando um vínculo com todas as famílias, como parte de um cuidado que é sempre presente no Colégio e que, em tempos de pandemia, não poderia ter sido diferente”, completa a orientadora educacional da 1ª série do Ensino Médio, a psicopedagoga Camila Portugal. Resultado: os estudantes “curtiram”, na prática, as dicas do SOE do Vieira e muitas famílias até contribuíram com a divulgação nos aplicativos de grupos virtuais. A dentista Ana Cristina Andrade, mãe de dois alunos, foi uma delas: “Excelente a iniciativa que se alia a todo o suporte dado pelo atendimento do SOE, contribuindo para a aprendizagem dos estudantes, inclusive durante as aulas remotas”, diz.

Guias de Estudo Confira alguns dos conteúdos Uso do marcador de texto Orientações para fazer um mapa mental Revisão de cálculos Elaboração de aulas para si mesmo Links para questões de provas Relação de canais e sites recomendados Dicas exclusivas para o Enem Gestão de tempo


ETHOS CIDADANIA GLOBAL

A construção do amanhã, hoje!

Projeto da 2ª série EM completa 15 anos, estimulando o protagonismo do jovem na aprendizagem e como agente de transformação de si e do mundo

Convidados a ser protagonistas de seu processo de aprendizagem, os alunos do Colégio Antônio Vieira têm a oportunidade de participar de projetos pedagógicos, diferenciados por série, que promovem a construção do conhecimento e também o desenvolvimento de competências essenciais para os desafios do mundo contemporâneo. Na 2ª série do Ensino Médio, por exemplo, os estudantes avançam, de forma significativa, no amadurecimento da autonomia intelectual e emocional, a partir do Projeto Ethos. O nome tem origem grega e refere-se a caráter, conjunto de hábitos ou crenças de uma pessoa construído a partir da coletividade. Um dos marcos da iniciativa é a es-

colha de temas que estão sempre na vanguarda das discussões acadêmicas e midiáticas nacionais e internacionais, fazendo com que o projeto, que completa 15 anos agora em 2021, mantenha-se sempre muito atual. De acordo com o coordenador pedagógico da 2ª série EM, professor José Teixeira, o Prof. Zelão, as ações do projeto possibilitam desenvolvimento de competências pessoais e coletivas na interação com os desafios emergentes do contexto. “Problematizações, reflexões, diálogos, tensionamentos, consensos são praticados com criticidade, trabalhando referenciais e valores humanísticos que acreditamos ser fundamentais para a vida em sociedade. É, portanto, um chamamen-

to para que alunos e alunas da 2ª série EM do Colégio Antônio Vieira se impliquem com questões mobilizadoras contemporâneas e do tempo presente”, diz. O projeto já nasceu, em 2006, com uma perspectiva vanguardista e interdisciplinar, a partir de um tema gerador mantido até hoje (Ethos: produtivo ou civilizacional), “que vai se firmando, a cada edição, com temas anuais ou subtemas que se traduzem sempre em um convite para que o jovem discuta o mundo, a sociedade em que ele vive, sempre de forma ética, crítica e cidadã”, como explica a professora de História Marli Sales, uma das fundadoras da proposta pedagógica.

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INTERAÇÃO E RESPONSABILIDADE

O Ethos se dá em três etapas: a primeira, em que há a discussão e apropriação do tema gerador; depois segue-se o aprofundamento dos conhecimentos do tema anual, com leituras de livros, documentários, pesquisas e apresentação de trabalhos individuais ou coletivos. “Na última etapa, batizada de Ethos Criativo, os alunos agrupam-se para as apresentações, de acordo com a afinidade, adotando ou não recursos da tecnologia digital, gerando o que eu considero uma grande festa do conhecimento”, diz a professora Marli. Ela lamenta que, durante a pandemia, o projeto tenha ficado mais restrito, “embora os estudantes também tenham surpreendido em criatividade, adaptando-se à realidade desafiadora”, frisou. O professor de Língua Portuguesa e Literatura Paulo Reis é também um dos entusiastas do Ethos. “É um projeto que se propõe a pensar a nossa existência na Terra, a partir de um referencial teórico que abarca o ethos como uma grande mo-

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rada. Ou seja: o que a gente pode fazer para que a nossa morada em nosso planeta possa ser mais bem cuidada e para que as relações humanas sejam ressignificadas nesse processo, provocando no aluno, portanto, uma reflexão sobre o mundo em que vive e atua e que, muitas vezes, ele se vê como coadjuvante, encarando as questões atuais como se os adultos tivessem deixado para eles”, diz o professor, completando: “O Ethos mostra que os jovens já são participantes dessa morada e precisam, de fato, pensar nela”.

TEMA DE 2021 Energia nuclear, sociabilidade humana, antropoceno: a ação do homem, sociedade escópica e espetacularização do ser nas redes sociais estão entre os temas já tratados ao longo dos 15 anos de Ethos. Para 2021, as ações do projeto serão norteadas pela obra “21 Lições para o Século 21”, do professor e historiador israelense Yuval Harari, considerado um dos maiores intelectuais da atualidade. Ao abordar questões como big data,

inteligência artificial, migrações pelo mundo, intolerância religiosa, machismo, democracias e regimes totalitários, pós-verdade e fake news, manipulação pelas redes sociais, entre outras, o livro, lançado em 2018, mantém-se ainda muito atual. “O livro ‘21 lições’ estabelece um diálogo muito coeso com a proposta do projeto, tocando em temas contemporâneos, em uma leitura que nos provoca, nos tira do lugar de mero espectador”, diz a professora de Redação Ana Célia Di Tommaso. Ela destaca ainda que o projeto dialoga tanto com a Pedagogia Inaciana, quando ele propõe uma formação humana em seus diferentes âmbitos, quanto com as dez competências gerais da Base Nacional Comum Curricular (BNCC), “na medida em que, por exemplo, estimula o pensamento crítico e criativo; amplia o repertório sociocultural e gera empatia, cooperação, responsabilidade e cidadania, só para citar algumas das competências alcançadas pelo Ethos”, como conclui a professora.


DIZ AÍ, MOÇADA! “O projeto é, realmente, muito produtivo, ampliando significativamente nosso repertório, com avanços notados, ainda que no contexto de atividades remotas. Um documentário recém-lançado, à época, por um canal de TV fechado foi logo também trazido para nossa análise a partir do projeto, mostrando o quanto a proposta é contemporânea e envolve grandes pensadores atuais, sendo que nós, alunos, também já nos sentíamos apropriados daquelas discussões”. Átina Castro, aluna da 3ª série EM.

“Antes mesmo da 2ª série EM, eu já mantinha contatos com colegas da escola que haviam passado pelo Projeto Ethos e, pelas nossas conversas e mobilização que via do pessoal, eu sabia que era um projeto daqueles bem motivadores da nossa geração. Criei grande expectativa no ano passado, mas mesmo realizando o projeto remotamente, por conta da pandemia, ele se revelou muito interessante e aprendi muito”. Thiago Motta, aluno da 3ª série EM.

CONFIRA AS DEZ COMPETÊNCIAS GERAIS DA BNCC PRESENTES NAS AÇÕES DO PROJETO ETHOS

1. Conhecimento 2. Pensamento científico, crítico e criativo 3. Repertório cultural 4. Comunicação 5. Cultura digital 6. Trabalho e projeto de vida 7. Argumentação 8. Autoconhecimento e autocuidado 9. Empatia e cooperação 10. Responsabilidade e cidadania Revista Vieirense - 2021

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O PAPEL DA ARTE E DA MÚSICA PARA UMA FORMAÇÃO INTEGRAL Por Anna Oliveira, bacharela em Artes (Ufba), licencianda em Artes Visuais (Unifacs) e professora de Artes no Colégio Antônio Vieira; e Letícia Lopes, licenciada e mestra em Educação Musical (Ufba), coordenadora do Departamento de Artes e Música do Vieira

Falar sobre Artes Visuais e Educação Musical no contexto escolar é algo encantador e muito potente. Atualmente, no Colégio Antônio Vieira, temos as arte-educadoras Anna Oliveira, Camila Govas, Camila Paes, Joelma Serra e Joseneide Miguez, que atendem os alunos do Fundamental 1 aos 6º e 7º anos da nossa comunidade educativa. Na equipe de Música, temos os professores Carmelito Lopes, Letícia Lopes, Poliana Coelho e Ronaldo Oliveira, que também atendem às mesmas séries citadas acima. Embora cada disciplina tenha suas especificidades, no Vieirinha, elas sempre caminham de mãos dadas, buscando uma Educação Artística e Musical integrada e alinhada com os princípios da Pedagogia Inaciana para uma formação integral. Dialogar com o mundo a nossa

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volta, e a sua capacidade de se metamorfosear a cada instante, é mais do que entender a sociedade em que vivemos: é compreender a pluralidade do ser humano. E a arte, sendo reflexo da história, da cultura e do tempo em que foi criada, destaca-se como uma área do conhecimento com incríveis potências poéticas de aprendizagem. O ensino da Arte, na comunidade vieirense, tem como princípio não só exercitar as habilidades motoras, mas proporcionar uma força para entrelaçar o racional e o imaginativo, estimulando a comunicação e a expressão de sentimentos de cada criança. As aulas de Arte são feitas de momentos de apreciação, diálogo, pesquisas, brincadeiras e processos artísticos. O fazer artístico passeia entre o desenho, a pintura, a colagem, a dobradura, dentre ou-

tras técnicas, resultando em exposições que encantam as paredes e quadras do Colégio Antônio Vieira. Aqui se ensina mais do que saber distinguir uma cor, um pincel ou uma técnica: as nossas crianças experimentam diferentes formas de expressão artística, fazendo uso sustentável de materiais, cultivando o imaginário e levando o olhar sensível da infância para a vida. Acreditando na potência da Educação Musical no currículo escolar e amparados pela Lei 11.769, promulgada em 2008, que tornou obrigatório o ensino de Música nas escolas, os professores entendem que, em nossa sociedade contemporânea, a música tem exercido uma função que vai além dos aspectos musicais. Sendo assim, a prática musical também pode ser um momento de quebrar barreiras criadas pela cultura do individualismo, nas quais as pessoas pouco se olham e nunca têm tempo para o outro. Souza (Souza. J. Educação Musical e práticas sociais, Revista da Abem, 2014), grande referência nesta área do conhecimento, acredita que é importante não desassociar o ser social das aulas de Música ou de qualquer processo de ensino e aprendizagem. Ela ressalta a importância de trazermos a vida cotidiana dos estudantes para as aulas, validando a singularidade dos envolvidos e as experiências vividas dentro e fora do ambiente educacional. Entendendo que a Música não se faz sem as pessoas que através dela se mostram, as aulas são planejadas de forma que docentes e discentes criam, cantam, tocam e constroem saberes musicais coletivos que extrapolam as salas de aula e invadem palcos, pátios e até mesmo as quadras do Colégio Antônio Vieira.


ALIMENTO DA ALMA Segundo a frase atribuída a Friedrich Nietzsche, “a arte existe para que a realidade não nos destrua”, e nós nunca tivemos tanta certeza disso desde o início da pandemia. As consequências físicas e psíquicas do isolamento social são muitas. Diante deste contexto, certamente, a arte se destacou com um papel fundamental não só para nos entreter, mas também para alimentar a alma frente a tantas incertezas que vivenciamos. Nossa comunidade escolar como um todo passou por muitos desafios. A princípio, para os professores de Artes e Música, era impensável construir saberes artísticos sem o contato presencial. Vivemos o inédito por muitos meses e, como em todas as outras áreas do saber, tivemos que nos reinventar e nos deparamos com vários “eus” que existem dentro de nós – alguns, inclusive, que nem conhecíamos. Foram muitas horas pensando em como entregar aos nossos meninos e meninas os conteúdos dessas disciplinas, sem perder a leveza e o fazer artístico. Aos poucos as coisas foram tomando forma: aprendemos a gravar e editar videoaulas, buscamos aprofundamento teórico para que as aulas on-line tivessem “a nossa cara”, e, com uma boa dose de criatividade, amor e parceria, o trabalho fluiu! Se, no contexto presencial, as duas disciplinas caminhavam de mãos dadas, no período remoto nós nos abraçamos. Foi unindo saberes e fortalecendo os vínculos que muitas ideias funcionaram em um ano tão diferente. Assim nasceu “Quem é você no mundo das Artes?”. Uma galeria virtual que surgiu a partir do desejo de fazer algo inédito e animado para celebrar a Semana da Criança. Em meio à chuva de ideias na equipe de Artes e Música, surgiu a proposta de uma brinca-

deira para encenar releituras de obras artísticas por meio da fotografia, utilizando a sensibilização de um vídeo com a encenação de todos os professores(as) de Artes e de Música do Vieirinha. A animação tomou conta e, durante a troca com o grupo, definiu-se por estimular nos alunos inspirações em uma obra artística ou em um artista musical. Dessa maneira, a proposta ganhou forma, cor, rostos e sentido, refletindo através das crianças o quanto a Arte e a Música estão dentro de cada um de nós de forma tão significativa. Fica evidente, portanto, que o ensino de Artes Visuais e de Música no Colégio Antônio Vieira consiste em desenvolver competências e habilidades nessas áreas do saber, estimulando um olhar crítico e perceptivo sobre a vida. Entendemos que o fazer artístico pode e deve ser um fio condutor para que as nossas crianças e adolescentes compreendam não só a humanidade, mas também todos os “eus” que habitam em cada um de nós, dando-lhes voz e cores para seguir como agentes transformadores do mundo a nossa volta.

a arte existe para que a realidade não nos destrua”

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QUEM É VOCÊ NO MUNDO DAS ARTES? Confira alguns registros do show de criatividade dos nossos alunos!

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EDUCAÇÃO FÍSICA PARA ALÉM DO MOVIMENTO

Prevista como atividade essencial pela BNCC, disciplina assume papel significativo no desenvolvimento físico, intelectual e emocional dos alunos Foi o tempo em que, equivocadamente, a Educação Física na escola era vista como uma prática complementar, como se fosse menos importante que Matemática, História ou Língua Portuguesa, por exemplo. A própria Base Nacional Comum Curricular (BNCC) classifica a Educação Física na área pedagógica das Linguagens, com a disciplina assumindo, além de toda a funcionalidade no processo de crescimento de crianças e jovens, todo um papel sociocultural importante em um contexto de formação integral, como a que se propõem as instituições jesuítas de ensino.

exemplo, a Educação Física vai ainda mais além, extrapolando toda a fundamentação pedagógica prevista pela BNCC, para se expressar por meio de algo também muito significativo para a instituição: o entusiasmo e o bem-estar que as aulas trazem para os alunos. Nas aulas remotas, em contexto de pandemia, isso ficou ainda mais evidente. A equipe do Departamento de Educação Física e Esportes (Defe), coordenado pelos professores João Amaral e Sócrates Correia, ganhou uma responsabilidade a mais, contribuindo, mais do que nunca, para o equilíbrio emocional dos estudantes.

No Colégio Antônio Vieira, por

Nas séries iniciais do Ensino Fun-

damental (EF), tudo sempre é feito com muita ludicidade, “mas sempre mantendo os objetivos propostos de desenvolvimento motor, crescimento, além das percepções espacial e temporal”, diz a professora Failane Souza, que leciona para as turmas dos 1º e 2º anos EF. Para os alunos adolescentes, submetidos à tensão da perda do convívio com grupo de amigos, as aulas foram planejadas com mais atividades de relaxamento, com exercícios voltados para o alongamento e até yoga.

AUTOESTIMA “Foi um período de reinvenção da forma, mas com a manutenção dos propósitos previstos, ressaltando a importância de se manter ativo para a saúde física e também para elevar a autoestima dos jovens”, conta a professora Mabel Santana, que dá aulas para o 4º e o 5º anos EF e também no Ensino Médio. Não deu outra: os efeitos positivos foram logo notados pela maioria das famílias. “Fui uma das pessoas que ligaram para o Serviço de Orientação Educacional (SOE) pedindo mais atividades físicas nas aulas remotas”, conta a química Josanaide Teixeira, mãe da pequena Maíra, aluna do 2º ano EF. Já a administradora Roberta Ribeiro, mãe de Paulo Roberto (8º ano EF), entrou em contato com o Colégio solicitando a liberação de vídeos com os treinos funcio-

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nais sugeridos pelos professores, para que ela liderasse uma turma, extraclasse, para manter as atividades além dos momentos das aulas. “A ideia é estimular a meninada a se movimentar, mas a partir de todo o embasamento técnico-profissional das equipes de Educação Física do Vieira”, diz a administradora.COMPREENDER E PRATICAR

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Para a professora Alice Palma, o contexto de aulas remotas também permitiu uma maior atenção dos alunos aos fundamentos teóricos da disciplina. “No contexto de pandemia, pudemos explicar mais os benefícios de modalidades esportivas feitas em grupo, mostrar nossa formação também fincada em estudos de anatomia, fisiologia, saúde, entre outros, permitindo agora que tratemos mais um pouco da teoria nas aulas presenciais”, revela. As profissionais de Educação Física do Vieira ainda destacam a importância da atividade nas relações sociais. Isso porque, tanto nas aulas da disciplina quanto nas práticas esportivas, além de promover a integração, são trabalhados conceitos que também trazem importantes valores para a sociedade, como o respeito às normas e limites, ao direito do outro, a importância do planejamento, entre outros. Sem dúvida, toda uma energia compartilhada que vai além do movimento.

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Josana Baqueiro | Psicopedagoga

PROVA DE RESILIÊNCIA

Quando o “Terceirão” se fez ainda mais desafiador Agora ex-alunos, jovens revelam como encontraram na formação do Vieira a sustentação para lidar com as adversidades da pandemia Chegar à última série do Ensino Médio em uma pandemia é, definitivamente, uma tarefa para bravos. Especialmente por se tratar de um ano escolar que representa, antes de tudo, o fechamento de um ciclo que leva, pelo menos, 12 anos, considerando apenas o início a partir do Ensino Fundamental. É um momento que, por si só, já vem carregado de muitas expectativas para os jovens e, mais do que isso, para todos que os cercam. É quando a sociedade passa a cobrar, mais incisivamente, aquela velha pergunta feita desde a infância: “O que você vai ser quando crescer?” O fato é que, mesmo crescido, nem sempre os planos estão tão claros quando se é tão jovem. No Vieira, os alunos contam com o apoio dos serviços de orientação Educacional

(SOE) e Religiosa e Pastoral (Sorpa) para auxiliá-los, desde cedo, na reflexão sobre projetos de vida. Ainda assim, lidar com todas essas emoções e vivências juntamente com os amigos, em momentos de interação, podendo também extravasar sobre o peso da responsabilidade de estudar para o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), vestibulares, acabou se tornando algo bem restrito no contexto de pandemia.

APOIO EMOCIONAL É claro que, dentro da concepção humanista que marca o Vieira, todas essas questões foram levadas em consideração pela equipe pedagógica da 3ª série EM. Além de montar um arrojado programa de preparação para o Enem e vestibulares, também para o período de

atividades remotas ou híbridas, o Colégio ofereceu, gratuitamente, já no ano passado, apoio especial aos alunos da série, com acompanhamento diferenciado pela psicopedagoga Josana Baqueiro. Dos cerca de 300 estudantes, pelo menos 80 participaram das sessões logo no início do programa. “Número que foi reduzindo, sensivelmente, até o final do ano, diante também dos resultados que íamos conquistando com o trabalho de escuta e fortalecimento emocional dos alunos”, diz Josana. Segundo ela, a formação inaciana diferenciada do Vieira também fez diferença no enfrentamento das questões pelos jovens estudantes.

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A Revista Vieirense ouviu alguns dos hoje ex-alunos, que cursaram a 3ª série EM no ano passado, para saber como lidaram bravamente com a situação. Confira!

Maria Fernanda Guedes Sempre fui do tipo que praticamente “morava” no Vieira: chegava bem cedo e tomava o café da manhã na cantina, conversava com professores e colaboradores, sempre atenciosos. Depois das aulas, permanecia na escola às tardes para oficinas, reuniões de equipe e pela própria atuação nos núcleos, como a Academia Vieirense de Letras e Artes (AVLA). Então, ficar em casa, como recomendado por conta da pandemia, era muito esquisito para mim. No Vieira, estava acostumada com espaços amplos, a área verde do bosque, a convivência com pessoas da minha idade. Por isso, diante da frustração, não pensei duas vezes em participar das sessões com a psicopedagoga Josana, e foi muito bom. Fez aflorar toda a formação inaciana que tivemos no Vieira para entender e lidar melhor com aquele momento tão atípico, assim como conhecer mais sobre mim mesma e até me interessar mais pelos temas da filosofia.

Felipe Figueiredo Sempre me identifiquei muito com toda a formação humanista e integral do Colégio e imaginava chegar à 3ª série EM aproveitando ainda mais todas essas possibilidades que o Vieira nos proporciona. Mas logo entendi que estávamos lidando com algo sem precedentes e que poderia também ser uma oportunidade para podermos nos conectar mais com a gente mesmo e se conhecer melhor. Claro que todas as cerimônias, eventos e ritos de passagem fizeram falta, mas aprendemos que a tecnologia também pode nos manter conectados para que possamos reprogramar esses eventos, sem perda de todo o sentimento envolvido de termos estudado no Vieira. Creio que a própria formação do Colégio nos fez entender que era preciso cultivar um olhar mais humano para questões diversas reveladas por uma pandemia que atingiu todo o mundo.

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Orlando Santos Filho A formação e o suporte do Colégio ao longo de todos os anos em que nele estudei foram essenciais para moldar muitos dos valores que me ajudaram a não só tolerar a situação de pandemia, mas me esforçar em produzir algo de bom em meio a tudo o que aconteceu. O aproveitamento que surgiu nesse período, seja em termos de estudos ou outras ocupações e projetos, foi facilitado por todo o aprendizado e construção pessoal dos alunos, inclusive pelo amadurecimento decorrente do engajamento nas várias atividades apoiadas pelo Colégio, além, é claro, da formação e educação constantes.

Yasmin Leal Como estudante do Colégio Antônio Vieira desde o Ensino Fundamental, sempre sonhei com a chegada ao “Terceirão”. Entretanto, o impacto da pandemia fez com que todos os planos e expectativas fossem alterados para uma nova forma de enxergar a realidade, a partir da consciência de que houve uma razão plausível: a preservação da vida e da saúde daqueles que amamos. Consciência essa reativada pelo Vieira a cada dia, por meio de atuação e atenção cruciais para que todo o alunado conseguisse encontrar a pessoalidade necessária para que a total mudança de rotina não se tornasse um peso insuportável para os seus estudantes. Por isso, ao Colégio Antônio Vieira e à comunidade vieirense fica o meu muito obrigada. Aos alunos digo: nós fizemos história e espero que levemos todos os aprendizados para a nossa vida.

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FRATELLI TUTTI

Por uma educação em prol da fraternidade e amizade social A solidariedade entre os homens, como irmãos, sempre foi uma prática estimulada entre os cristãos. Na Encíclica Fratelli Tutti, o Papa Francisco, entretanto, trouxe uma nova luz aos católicos, alertando a todos para o real sentimento da fraternidade. A carta circular do Papa, lançada em outubro de 2020, tornou-se, assim, um marco, ao promover a reflexão de que é preciso, realmente, ver o outro como irmão e não apenas entender as questões enfrentadas pelos mais vulneráveis, por exemplo, como algo que afeta “ele, ela, eles, elas”, mas, de fato, todos “nós”. Afinal, somos “todos irmãos”, como se traduz o título da publicação, do original em italiano. Como instituição jesuíta comprometida com a formação integral de crianças e jovens, o Colégio Antônio

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Vieira sempre buscou firmar, entre seus princípios, a solidariedade, a fraternidade e a amizade social, tão destacadas na Fratelli Tutti. A Encíclica, portanto, estimula o Vieira a avançar ainda mais em ações nesse sentido. A própria carta circular do Papa destaca como a Educação tem um papel importante para a transformação da sociedade, sendo evocada como protagonista para uma atuação contra a pobreza, a violência e outras mazelas a serem enfrentadas por todos nós, enquanto irmãos. “A tarefa educativa, o desenvolvimento de hábitos solidários, a capacidade de pensar a vida humana de forma mais integral, a profundidade espiritual são realidades necessárias para dar qualidade às relações humanas” (§ 167). Em outro trecho, o Papa ressalta novamente

o papel social da Educação. “Quanto aos educadores e formadores que têm a difícil tarefa de educar as crianças e os jovens (…), devem estar cientes de que a sua responsabilidade envolve as dimensões moral, espiritual e social. Os valores da liberdade, respeito mútuo e solidariedade podem ser transmitidos desde a mais tenra idade (…)” (§ 114). Ou seja: a Encíclica é também um convite para uma educação de irmãos para formar irmãos. “A partir da Fratelli Tutti e da proposta de um Pacto Educativo Global, o Papa Francisco nos diz que precisamos envidar esforços para criar uma rede de relações abertas e humanas, e, para isso, faz-se necessária uma tríplice coragem para colocar a pessoa no centro, investir as melhores energias com criatividade e responsabilidade e formar


des de uma pandemia que afetou o mundo. No ano passado, por exemplo, iniciativas nesse sentido, lideradas por alunos e ex-alunos, fizeram valer o diferencial de uma formação humanista. PEREGRINOS DE CALÇA JEANS

Peregrinos em missão

pessoas disponíveis para o serviço da comunidade. Segundo ele, é preciso agir, ligando a cabeça, o coração e as mãos”, ressalta a educadora Mariângela Risério, diretora geral do Colégio Vieira. “É neste horizonte que atua o currículo da formação integral que propomos, transformador da pessoa e da sociedade, a fim de que, de acordo com o Papa Francisco, a Educação seja o ‘princípio de um novo humanismo’, comprometido e engajado, capaz de trabalhar para estabelecer novas relações”, completa a professora Mariângela.

Foi, por exemplo, a partir de uma semana de formação inaciana, no município baiano de Capim Grosso, no evento batizado de Semana Santa Jovem, que estudantes do Vieira fundaram, em 2013, o grupo Peregrinos de Calça Jeans (PCJ). Ao longo de oito anos, 150 estudantes já integraram o grupo, com ações diversas de solidariedade e amizade social. “Lembro que uma das nossas primeiras mobilizações foi para comprar 11 violinos para jovens carentes que integravam a orquestra de Capim Grosso. Hoje vemos como aquela ação concreta transformou a realidade daqueles adolescentes, muitos seguindo na carreira da música, inclusive com gente que integra atualmente a Orquestra Sinfônica da Bahia (Osba)”, conta o ex-aluno Gabriel Cavalcanti, que está no PCJ desde a fundação. No ano passado, o grupo mante-

ve-se ainda mais coeso para traçar ações que ajudassem pessoas ainda mais atingidas, econômica, emocional e socialmente, pelas consequências da pandemia. “Fizemos uma grande campanha virtual e, com o valor obtido, pudemos ajudar, mensalmente, com 240 fraldas geriátricas, cerca de 50 idosos assistidos pelo Abrigo São Gabriel, no bairro da Boa Viagem. Além disso, também doamos, mensalmente, cestas com mantimentos e produtos de limpeza para cerca de 50 pessoas assistidas pelo Irmão Henrique, peregrino da Comunidade da Trindade, também na Cidade Baixa”, conta Gabriel.

INICIATIVA JOVEM Diante das desigualdades, reveladas ainda mais durante a pandemia, outro grupo, com cerca de 20 estudantes do Vieira, também venceu as dificuldades de tempos tão adversos, organizando-se para arrecadar recursos e fazer doações de cestas básicas e brinquedos para a comunidade quilombola Rio dos Macacos, no município de Simões Filho, na Região Metropolitana de Salvador. “Nós visamos projetos voltados para o desenvol-

Por meio de temáticas presentes no Projeto Político-Pedagógico ou envolvendo os estudantes e toda a comunidade educativa em ações de voluntariado e formação inaciana ou, ainda, pelas atividades dos núcleos específicos de protagonismo juvenil, a exemplo do Núcleo de Estudos Interdisciplinares sobre Minorias Sociais (Neims), o Vieira, assim como todas as 17 instituições que integram a Rede Jesuíta de Educação (RJE) no Brasil, passou a cultivar ainda mais o cuidado com o outro entre suas premissas, sobretudo em meio às adversida-

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vimento do protagonismo juvenil, realizando ações de voluntariado, momentos de reflexão e autoconhecimento, discussões e debates com base em uma formação integral de líderes, a partir dos princípios inacianos”, explicou a ex-aluna Ludmilla Coutinho, uma das integrantes do grupo. Ela participou da campanha no ano passado, quando cursava a 3ª série EM. Em outra iniciativa, alunos da escola e familiares também lideraram uma campanha para ajudar financeiramente o pipoqueiro Ernesto Cerqueira, o Seu Ernesto, que ficou sem poder exercer sua atividade diante da suspensão das aulas presenciais. “Foi uma ajuda grande e agradeço muito à família vieirense”, afirmou ele, em vídeo divulgado nas redes sociais do Colégio.

Aluna Júlia Kuwano fez o desenho que ilustra a capa da agenda

AGENDA 2021

A Encíclica Fratelli Tutti é o tema da agenda 2021 do Colégio Antônio Vieira. Distribuída para os alunos do 1º ao 5º ano do Ensino Fundamental (EF), a publicação a é ilustrada com desenhos feitos por estudantes e mensagens que, inspiradas nas palavras do Papa Francisco, enfatizam que somos “todos irmãos”.

HUMANISMO PARA SALVAR VIDAS “Em meio à pandemia da Covid-19, tive a oportunidade de trabalhar em cinco unidades de terapia intensiva (UTIs Covid), além de diferentes Unidades de Pronto Atendimento (UPAs). Foi um desafio, mas também um momento de crescimento profissional incalculável. Hoje em dia, sou um médico muito mais capacitado e preparado do que quando iniciei. Ao refletir sobre a questão, veio logo o sentimento de gratidão por todos os valores cristãos e humanísticos pregados pelo Colégio Antônio Vieira, que pude, mais do que nunca, pôr em prática também neste momento tão difícil para as famílias em todo o mundo. Retidão, empatia, ética e moral são aspectos fundamentais que regem a profissão médica. Tais valores são instruídos e praticados no Vieira em todas as séries”. Pedro Ramiro Muiños, jovem médico, ex-aluno do Vieira, que atuou na linha de frente de combate à Covid-19”.

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POR UM CAMINHAR DE APRENDIZAGEM E SOLIDARIEDADE

Por Padre Alexandre Souza, SJ – Superior do Núcleo Apostólico Jesuíta na Bahia

Todos nós somos chamados a uma vocação por nosso Deus, que, de alguma forma, convida-nos sempre a participar da Criação. É um tema interessante que nos envolve cada vez mais, sobretudo em tempos difíceis, em que somos provocados a alargar o nosso horizonte e perceber que, com a pandemia, talvez tenhamos ficado um pouco mais sensíveis. Não que os problemas sociais tenham surgido com a Covid-19. Nós é que estamos percebendo mais agora do que antes, quando, talvez, não estivéssemos tão atentos. Mas será que, de fato, estamos atentos? Será que estamos aprendendo, realmente, a alargar a nos-

sa capacidade humana de acolher o nosso irmão na sua diferença? Estamos dando conta de fazer esse processo, encarando o outro, nosso irmão, como parte de um sentimento real de fraternidade, de solidariedade e responsabilidade social? Ficam essas perguntas que, às vezes, a gente não sabe responder direito, mas, como se diz, é caminhando que se faz o caminho.

ítas a atuar para a transformação das realidades, a partir das Preferências Apostólicas Universais, que trazem alguns pontos: o cuidado com a Casa Comum, numa dimensão socioambiental; acompanhar os jovens em seus projetos de vida, bem como caminhar junto aos pobres e vulnerados numa missão de reconciliação e justiça, frente aos desafios da injustiça estrutural.

Guimarães Rosa, no texto “A terceira margem do rio”, fala justamente da importância da travessia. Sim, porque é na travessia que a gente vai descobrindo as coisas, como quando estamos em um barquinho no meio do rio e começamos a reparar nos detalhes, a observar as pessoas, a natureza, o movimento das águas. Da mesma forma, é muito importante que a gente não perca as oportunidades inerentes aos “detalhes” que vão surgindo nesse tempo.

É um compromisso que, no caso das instituições jesuítas de ensino, firma-se ainda mais agora diante do Pacto Educativo Global proposto pelo Papa Francisco. Aqui na Bahia também estamos construindo uma rede de solidariedade. Eu destaco o esforço de levar uma educação de qualidade para crianças e adolescentes em situações de pobreza, por intermédio da Escola João Paulo II, em Feira de Santana; da Escola de Fé e Alegria, de Ilhéus; e da educação de jovens do campo com a Escola Família Agrícola de Jaboticaba (sic), na região de Capim Grosso. São também obras jesuítas para as quais eu faço o convite a quem quiser somar conosco na missão.

A pandemia não acirrou, mas, sim, desvelou algumas questões com que, de fato, nós, enquanto sociedade, ainda não lidamos muito bem, não enxergamos com a devida atenção que merecem, a exemplo da violência doméstica, racismo estrutural e condições de vulnerabilidade enfrentadas por crianças e jovens. São questões para as quais a Companhia de Jesus já convocava todos os envolvidos nas obras jesu-

Peço a Deus que, em 2021, tenhamos também um pouco de luz para enxergarmos mais os “detalhes” deste tempo, ampliando nossa sensibilidade diante dos desafios. Que seja uma luz que nos permita olhar

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mais atentamente, e que também aqueça nosso coração, para que nosso olhar seja sempre de cuidado para com nossos irmãos, como alerta o Papa Francisco na Encíclica Fratelli Tutti, sobre amizade e fraternidade social. É uma perspectiva que, para muitos, parece nova, mas que sempre foi defendida por Jesus. Que o Senhor, portanto, ilumine o nosso coração neste ano, aquecendo a nossa capacidade de dialogar e construir uma rede de colaboração e cooperação entre nós, irmãos. Que, assim, também possamos ver melhor o caminho, sem que nos percamos em nosso caminhar. É preciso desfrutar a travessia.

Sete propósitos do Pacto Educativo Global 1 Coragem para colocar a pessoa no centro do processo educativo. 2 Ouvir as crianças, os adolescentes e os jovens. 3 Fomentar a participação educativa de meninas e mulheres jovens. 4 Considerar a família como a primeira e indispensável educadora. 5 Educar e educar-nos para acolher os irmãos vulneráveis e marginalizados.

6 Estudar formas de economia, política, crescimento e progresso que preservem o homem e a ecologia.

7 Proteger e cultivar nossa Casa Comum.

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