A cultura eurovisiva

Page 49

A Cultura Eurovisiva: canções, política, identidades e o caso português

47

José Cid e interpretada pelos Green Windows, sendo uma ironia contra o regime político e um incentivo a que o povo saísse à rua, com alegria. A vencedora seria “E Depois do Adeus”, cuja vitória é alvo de ironia jornalística (Os Ridículos, 23 de Março de 1974). “E Depois do Adeus” encontraria uma desilusão, na Eurovisão, face às expectativas. Fernando Tordo ainda pediu a Paulo de Carvalho para que não se esquecesse de ganhar e de lhe trazer os comprimidos para a garganta (Diário Popular, 7 de Abril de 1974). A dupla formada por José Niza e José Calvário repetia a vitória em Portugal, depois de 1972, e deixara-se fotografar com Paulo de Carvalho, na objectiva do fotógrafo britânico Nick Boothman, que se deslocara a Portugal no âmbito da promoção. Antes de um adeus ao regime político de quase cinco décadas ainda se cantou na Eurovisão o tema que muitos estrangeiros acreditavam que ficaria no topo. Uma vez mais se tinham enviado imagens de Lisboa, dos seus pontos de vista turísticos, cidade que, dentro de dias, abriria as portas da Liberdade. Paulo de Carvalho não ganhou em Brighton, nem tão pouco se aproximou dos quase desconhecidos Abba, mas seria uma das senhas radiofónicas – a primeira – de um novo tempo político para Portugal. E depois do adeus, seguiu-se a madrugada, amanhecendo um tempo em que as mudanças então verificadas ao nível político, social e cultural foram influentes na música. Mas, anacronicamente, ainda se seguiu um festival velho e em mangas de camisa, que daria a vitória a quem já anteriormente porfiara. José Luís Tinoco (autor/compositor) e Duarte Mendes (cantor) apresentaram a “Madrugada” para um país que se reerguia. Esta canção vencedora, em 1975, é a evocação de quem sofreu nas mãos do regime deposto e a esperança num país renovado. Para a Eurovisão, houve quem quisesse que o intérprete fosse vestido de militar, dado que fora um dos capitães, na madrugada do 25 de Abril de 1974. Promocionalmente, recorreu-se ao cliché habitual da costa marítima – as praias de sargaços, de que fala o poema de José Luís Tinoco – e ainda ao património castelar, Ponte da Arrábida, Rio Douro, cidade do Porto, vista da Ponte D. Luís I e da Baixa,

www.lusosofia.net


Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.