MEMORIA ALENTEJANA
2022 N.º 44 3€ ¯ ¯ ÉVORA MEGALITISMO NO ALENTEJO CENTRAL MONTEMOR-O-NOVO
CEDA
(Centro de Estudos Documentais do Alentejo — Memória Colectiva e Cidadania) | Director: Eduardo M. Raposo | Periodicidade Anual:
01 Editorial
CEDA
03 22 anos de revista 05 Ciclo de Colóquios 'Revoluções' 07 Apresentação do livro Amor e Vinho 08 V Encontro do CEDA 08 Protocolo entre o CEDA e o ISEC Lisboa 09 Evográfica
CADERNO TEMÁTICO
10 Évora - Megalitismo 11 Entrevista com o Presidente da Câmara Municipal de Évora - Carlos Pinto de Sá 16 Roteiro Megalítico 22 Megalitismo vs Turismo 25 Ciência e Tecnologia 27 Évora Experimental 29 Imprensa Regional
30 Recintos Megaliticos 33 Megalitismo Funerário 35 Ebora Megalithica 36 Grande Entrevista - Ana Paula Amendoeira
CADERNO TEMÁTICO 42 Montemor-o-Novo - Megalitismo 43 Entrevista com o Presidente da Câmara Municipal de Montemor-oNovo - Olímpio Galvão 48 Roteiro Megalítico 52 Política Cultural 55 Gruta do Escoural 57 Espaço do Tempo 59 Serra de Monfurado 61 Projecto Morbase 63 Roteiro Literário 65 Galeria 9ocre 67 Aguarelista 68 Imprensa Regional 70 Monte Selvagem 72 Visitas ao Património 74 Música Coral
FIGURAS 75 Luís Jordão 76 Luís Raposo - Entrevista
CRÓNICAS 79 Talha e Vitualha 80 Casas Com Alma
INQUÉRITO 82 Aeroporto de Beja: Sim ou Não?
ACONTECENDO 84 Destaque 87 Livros 94 CDs / Exposições 96 Exposições / Festivais 97 Património 98 A Fechar
Foto: P edro Soares
Eduardo M. Raposo Director Presidente do CEDA eduardomraposo0@gmail.com
O CEDA e a Memória Alentejana 22 anos e 44 edições depois
Considero o CEDA e a Revista Memória Alentejana talvez o melhor projeto de coesão do que consideramosseradiásporadoAlentejoealigaçãocomasuaregiãohistórica.
No final de 2021, nestas deambulações, qual caixeiro-viajante, ainda que não com grandes barbas como António Gonçalves Correia, o tolstiosiano que ensaiou no Vale de Santiago o seu modelo social, nem deslocando-me de pedaleira, na livraria Nazareth, em plena praça Giraldo, ao concretizar nesta livraria de referência eborense, em breve cavaqueira - pois faltava percorrer uns 500 km e outros tantos ou mais exemplares – recordava que em breve, com a próxima edição perfazia-se 22 anos de edições e uns meses depois neste formato impresso. Muitas parcerias, apoios, colaborações, construindo, no âmbito do CEDA, pontes em prol da nossa autoestima identitária, entre o Alentejo e a Diáspora, com um pé na universidade e outro no saber empírico ancestral, à soleira da porta ou na taberna bebendo a sapiência dos velhos sábios, entreamodernidadeeatradição.
E vai daí, apaixonado pelo tema de uma recensão recente a um livro – Recintos megalíticos do Ocidente do Alentejo Central, de Pedro Alvim –, publicada na edição que então distribuía referia que esta edição que agora vos chega era uma hipótese de tema para 2022. E diz a minha interlocutora:
Uma Revista com esse tema saía bem. Muito mais que os seis exemplares do costume…
Ainda ela não terminaraa frase e já me vinha à memória a edição nº 41, “Vila Ruiva.CapitaldoFresco”,quandoemmeia hora o Quiosque Bandeirante, em Beja, vendeu os seis exemplares que eram para vários meses… a isto chama-se orgulho identitário, autoestima, amor à terra-mãe. E num relance de segundos revi tantas
iniciativase as edições desde que em 2000 o CEDA foi apresentado publicamente na Casa do Alentejo, a 4 de Outubro. Tanto caminho percorrido, calcorreando a região, a pátria transtagana de lés a lés, de Portalegre, Campo Maior ou Monforte a Ourique, Odemira, Castro Verde ou Mértola, de Mora ou Montemor a Moura ou Barrancos passando por Vila Viçosa, Alcácer, Reguengos, Beja ou Évora, estas várias vezes… tantos sonhos, concretizados, alguns, raros felizmente, revezes. Trabalho persistente, permanente, até à exaustão tantas vezes, em prol dos patrimónios cultural - imaterial, construídonatural… 22 anos, 44 edições depois, sempre em estreita colaboração com as entidades, as autarquias, parceiros preferenciais, mas também, ainda que pontualmente, a CCRDAlentejo, ou privadas como a Delta e outras, ou os antigos governos civis, algumas parcerias e várias colaborações com o Turismo do Alentejo, a edição de referência “O Montado” e claro a DRCAlentejo, uma colaboração, um apoio quase permanente, porque, e cito de novo Ana Paula Amendoeira, a personalidade em destaque na 'Grande Entrevista' desta edição”: A DRCAlentejo tem tido no CEDA e na Revista Memória Alentejana um parceiro seguro e de confiança na qualidade e persistência do trabalhorealizadoaolongodosanos(…)”.
Mas também Carlos Pinto de Sá, edil de Évora, um dos autarcas há mais tempo em funções e dos mais conceituados deste nosso Alentejo, com que já tivemos várias colaborações, em entrevista considera que “Ao longo de mais de duas décadas, o CEDA e a sua Revista têm desempenhado papel fundamental na preservação, divul-
EDITORIAL
SUMÁRIO 1
Ana Paula Amendoeira Directora Regional de Cultura do Alentejo
gação e promoção da identidade única do Alentejo”, para mais adiante afirmar, referindo-se ao CEDA e à Memória Alentejana:.”Tem, de forma perseverante, aprofundado o conhecimento do Alentejo para os próprios alentejanos e para fora da Região. Tem dado voz ao Alentejo na sua luta pelo reconhecimento e pelo desenvolvimento.” Ou Olímpio Galvão, que passou o primeiro ano de mandato como edildeMontemor o-Novorefere:
“Tudo o que possa ser feito para promoveroAlentejo,paraperpetuarasnossas tradições e cultura, é de defender com unhas e dentes.” E mais à frente. “Obrigado pelo vosso trabalho e dedicação” Assim reconhecido o nosso trabalho parece ter valido a pena o esforço, o empenho, a dedicação, o espírito de missão, os autarcas que nos deixam referências à obra realizada, ou aos projectos em curso ou futuros, nos seus concelhos, com as particularidades, as especificidades, que tem Montemor o Novo, que tem Évora. Ambas as entrevistas que marcam esta edição.
Mas voltando à nossa Directora Regional de Cultura, alguém dizia recentemente:
DavaumaboaMinistradaCultura!
Eeu:
Poisdava.Nãotenhasdúvida!
Ela, Ana Paula, que nos oferta uma excelente entrevista, eixo central desta edição, sobre o imenso, o avassalador trabalho realizado desde que em 2013 assumiu funções nomeadamente, entre muitosoutros,sobreos2.000momumentos megalíticos classificados no Alentejo, algo que não acontecia desde a 1ª República, como assinala. Para ela “Todos são parte da nossa missão.” E diz: “Eu não separo a vida em gavetas. Para mim não há vidapessoal,profissional,etc.Hávida!”
Ou que: “E ter o privilégio de nascer e viver e trabalhar no Alentejo é mesmo uma bênção que eu sempre hei-de agradeceràVida.”
Ou ainda: “Tem sido uma aventura luminosa, de um enriquecimento espantoso.”
E cá estamos nós a apresentar a edição nº 44: “Megalitismo no Alentejo Central”, onde contamos com as figuras maiores, os cientistas mais conceituados, as “autoridades” nesta matéria, que solidariamente aceitaram graciosa, fraternalmente escrever artigos inéditos: Manuel Calado, Leonor Rocha, António Carlos Silva, o que faz desta edição e desta uma revista com carácter científico e não
apenas de divulgação jornalística, mas que chega a um público alargado e não apenas a uma bolha académica. Para nós; Memória Alentejana, CEDA, está aí o significado de democratizar a cultura, de levar a camadas mais abrangentes o que é património de todos e não apenas de uma pequeníssima elite. Como investigador sei o que estou a dizer e contra mim falo… se não assumisse esta missão. É pois uma edição de “luxo” esta que destaca na Rubrica Figuras um outro arqueólogo natural do Alentejo que desempenhou o mais importante cargo nacional nesta área: Director do Museu Nacional de Arqueologia. Falamos de Luís Raposo, claro, onde o seu livro A Arqueologia, Património e Museus. Meio Século de Intervenção Cívica abre o “Destaque” no “Acontecendo”. Ou ainda quem divulga na região o megalitismo “Ebora Megalithica”,SiraCamacho.
Apresentamos os Cadernos dos Concelhos que aderiram ao nosso desafio: Montemor o-Novo e Évora. Mora e Reguengos de Monsaraz não responderam.Dizopovo:”Éprecisoquemestá”.
Em Montemor o-Novo, para além da já referida entrevista ao edil, Olímpio Galvão, onde refere projectos futuros ou já em curso, no Roteiro Megalítico do concelho, surge ainda um texto sobre a grutadoEscouraleoutrosobreoprojecto MORBASE, um texto do Vereador da Cultura, o Vice presidente Henrique Lopes, que discorre sobre a política cultural no concelho. Encontramos ainda o “Roteiro Literário Levantado do Chão”, ou não fosse este o concelho onde Saramago “iniciou” o seu percurso em direcçãoaoNobel.
As artes plásticas passam pela 9ocre, a galeria que é uma referência em Montemor, tal como a obra do Amigo Manuel Casa Branca, entre o montado e o megalitismo contemporâneo, mas também pelo aguarelista Júlio Jorge. A (nossa) Folha de Montemor, referência do jornalismo regional, distinguida em 2012 com o prémio Gazeta pelo Clube de Jornalistas. Mas também o Coral de São Domingos, outra entidade onde Montemor é referência na região, no país e fora dele. A terminar o turismo natural personificado pelo parque temático “Monte Selvagem”, e o texto Visitas ao Património, do Vereador António Xavier. Um caderno muito completo e equilibrado onde, apesar de alguns atrasos, a esmagadora maioria dos convitesparaartigos foramconcretizados.
Relativamente ao Caderno de Évora, para além da entrevista ao Carlos Pinto de
Sá, onde entre outros assuntos põe a ênfase da Candidatura em curso de Évora Capital Europeia da Cultura 2027, surge o Roteiro Megalítico, como não podia deixar de ser, mas também o artigo de António Carlos Silva “A 'descoberta turística' do Megalitismo: o exemplo de Évora”, aqui inserido porque direccionado para Évora. Apresentamos ainda alguns artigos de aspectos centrais desta cidade capital do Alentejo Central e a mais importante e populosa do Alentejo, como é o caso do Parque do Alentejo de Ciência e Tecnologia, mas também o projecto artístico EVEX, dirigido pelo amigo Feliciano de Mira – a Memória Alentejana participou no painel “A edição no espaço público”, na Evográfica, o que vem referidonaRubricaCEDA
TambémumtextodoManuelMadeira Piçarra, uma figura icónica do jornalismo regional, decano do jornalismo português, referência maior no Alentejo e no país, que nos dá o privilégio da sua amizade –alvo de simbólica homenagem no lançamento de edição de 2014, onde esteve em destaque na 'Grande Entrevista', Edição “O Montado”, na Rua de Burgos, DCRAlentejo.
Nem todos os artigos solicitados nos chegaram, mas fica prometido, que em próxima edição, a presença da responsável pela candidatura Capital Europeia da Cultura 2027, Paula Garcia, sendo que sobre a iniciativa publicamos uma breve notano“Acontecendo”.
Segue-se a Rubrica “Figuras”: Luís Raposo, já referido e Luís Jordão, um companheiro desaparecido, antigo presidente da Casa do Alentejo, as crónicas, Talha e Vitualha e Casas com Alma, respectivamente, desde a Tasca Latina, PortimãoatéàCuba.
A Memória Alentejana realiza um inquérito sobre a utilização do aeroporto, promovendo o debate de ideias, assunto a quevoltaremos.
O “Acontecendo”, em destaque um livro, já referido, e dois discos, Alentejo ensemble e Cinematheque, livros, discos, exposições, festivais, patrimónios e… a terminar a referência, o início, a Rubrica CEDA: 22 anos em Revista, ciclo de colóquios “Revoluções”, a participação na Evográfica, em apresentações de Amor e Vinho e V Encontro do CEDA - Viajando Pelos Caminhos de Santiago ou o protocolo de cooperação assinado com o ISECLisboa – Instituto Superior de Educação e Ciências, assunto a voltaremos no próximonúmero.
Umforteabraço!
EDITORIAL
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Memória Alentejana Uma Revista atenta ao passado e ao futuro
Comemoramos mais 12 anos de Revista, já que a pandemia recente nos alterou os planos para comemorar os 20 anos que a Revista teve. Hojecontacom22anos.
O balanço que fazemos da continuidade desta Revista Regional dedicada ao Alentejo e tudo o que se lhe refere, é francamente positivo, pois apesar de dificuldades conjunturais, os seus colaboradores e Director têm honrado a sua saída de forma ininterrupta desde 2000, mantendo
nos últimos anos uma periocidade anual.
Esta Revista que é a 44ª, mantém a sua especificidade, dirigida a todos osinteressadospeloAlentejo,nomeadamente a investigadores e universidades, onde têm sempre lugar estudos e artigos sobre o património tradicional popular, os saberes e Identidades e a Memória Local e Regional.
Os últimos doze anos foram ricos em entrevistas das quais desta-
camos as realizadas com Joaquim Judas, na altura presidente da C.M. Almada, no 1º Aniversário do Cante. Joaquim Afonso, então Mestre do grupo “Amigos do Alentejo”; José Ernesto de Oliveira, na altura PresidentedaC.M.deÉvoraem2008.
Realizámos o Colóquio Internacional de Homenagem a António BorgesCoelhoem2008.
Entre outros entrevistados ainda destacamos o Letrista maior que é João Monge; João Boto Caieiro,
CEDA 22 ANOS DE REVISTA
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arquitecto internacionalmente reconhecido pela forma como divulga nos seus projectos a arquitectura daTerra.
António Chainho, Mestre da Guitarra Portuguesa; Cláudio Torres, no 40º Aniversário do Campo Arqueológico de Mértola em 2018; Padre Sezinando Alberto, que foi Reitor do Cristo-Rei; Pedro Mestre, o reconhecido músico e professor ligadoaoCanteeàViolaCampaniça.
Gonçalo Ribeiro Teles, Arquitecto; Rui Azinhais Nabeiro, Comendador e empresário fundador da Delta Cafés; O Arquitecto, com muitos projectos no Alentejo, José Veloso de Lagos e ainda José Manuel Castanheira,Cenógrafo.
De central importância na revista, são os seus Cadernos Temáticos, tendo alguns ganho muita visibilidade, como o sobre “O Montado”, em parceria com a Entidade Regional do Turismo do Alentejo (ERT Alentejo) em 2014. “O Cante em Castro Verde”, em parceria com o Município um ano antes da elevação do Cante a Património nas listas da Unesco. Ou “O Cante na Diáspora”, em parceria com a C.M. de Almada, no primeiro
aniversário do Cante Património da Humanidade, com lançamento de um CD apoiado pela J.F. Laranjeiro e Feijó, com 10 grupos da Diáspora: deAlmada,SeixalePalmela.
O caderno dedicado aos Caminhos de Santiago em 2020, o Centenário de Manuel da Fonseca ou os 40 Anos do Poder Local Democrático emparceriacomaCIMAC.
Temos naturalmente palavras de agradecimento aos apoios pontuais ou continuados, nomeadamente da ERT Alentejo. Da Direcção Regional de Cultura do Alentejo registamos num apoio regular imprescindível. Agradecemos a forma como os Municípios com os quais colaboramos – e são cerca de duas dezenase divulgamos nos apoiam e às empresas privadas que também o fazem. Continuaremos a procurar retomar após interregno nos últimos três anos o apoio à distribuição por parte da CIMBAL. Distribuição que tem tido sempre o apoio da CIMAC para o Alentejo Central. Continuamos ainda presentes em muitas bibliotecas, centros culturais, livrarias de referência no Alentejo e na Área metropolitana de Lisboa e
através de permutas dentro e fora do país como a Revista Estudios Extremeños (Badajoz) e associados e colaboradores (Universidade Complutuense - Madrid), mas também na Alemanha,BrasileMéxico.
Não esquecemos uma outra característica desta Revista que é a rubrica “Acontecendo” onde de forma sistemática tem a particularidade de ser muito provavelmente a publicação que, por edição mais contribui para a divulgação de novos livros, periódicos, discos que importamaoAlentejo.
Tudo isto, pensado, preparado e construído graças a um conjunto restrito e irregular de colaboradores que a fazem nas horas que retiram ao seu lazer profissional e familiar, de forma ofertada e desinteressada pelo amor e dedicação que têm à preservação e valorização da Memória do Alentejo que assumimos como um“serviçopúblico”àcomunidade.
Venham os próximos 10 anos!
CEDA 22 ANOS DE REVISTA
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Fundador e Vice-presidente do CEDA
António Ramos
CICLO DE COLÓQUIOS 'REVOLUÇÕES' PROMOVIDO
PELO CEDA
A exemplo de anos anteriores, o CEDA promoveu no último ano uma série de Colóquios desta vez subordinados ao tema “Revoluções”. Tendo contado com especialistas em diversas áreas, os Colóquios foram momentos de importantes debates e encontro de diversas perspectivas e análises sobre temas actuais, desde os 50 Anos das Cantigas de Maio, até à Guerra e Paz, passando pela influência do 25 de Abril de 1974 na Europa e no Mundo, pela importância da Comuna de Paris ou as Lutas Laborais dos primeiros anos do Século XX. O ciclo 'Revoluções' foi uma parceria entre o CEDA e a Junta de Freguesia da Charneca de Caparica e Sobreda.
50 Anos das Cantigas de Maio
No dia 21 de Dezembro de 2021, no Auditório da Junta de Freguesia da Charneca de Caparica reuniram-se Francisco Fanhais, Presidente da Associação José Afonso e Pedro Tadeu, jornalista multifacetado, para assinalar a passagem de 50 anos sobre o lançamento de “Cantigas de Maio”, de José Afonso, o disco de excelência que marca a génese da Nova Música Portuguesa. A moderação do debate esteve a cargo de Eduardo M. Raposo e houve um apontamento musical com Ruben Martins. Uma oportunidade para recordar e homenagear José Afonso,peranteumavastaassistência.
25 de Abril
“25 de Abril de 1974 – Revolução Democrática e Popular e suas influências na Europa e no mundo”, integrado no ciclo 'Revoluções', foi o tema do Colóquio que se realizou no dia 12 de Maio de 2022, e que juntou o Professor José Adelino Maltez e o Coronel e Capitão de Abril Manuel Duran Clemente. A moderação do debate foi da responsabilidade de Eduardo M. Raposo e houve um apontamento musical de Ruben Martins. Oportunidade para abordar a influência que a Revolução Democrática portuguesa teve na Europa (Espanha e Grécia também se tornaram países democráticos ao fim de poucotempo)eaténoutrospaísesnoutroscontinentes.
5 CEDA CICLO DE COLÓQUIOS
Comuna de Paris
Carvalho
da Silva
A historiadora Raquel Varela foi a convidada para o Colóquio “Comuna de Paris (1871) – o Poder aos Cidadãos”, que se realizou no dia 2 de Junho de 2022 Raquel Varela apresentou uma intervenção brilhante, reflectindo e fazendo reflectir sobre esse momento fundador em que os Cidadãos exerceram democraticamente a soberania na cidade de Paris. Apesar do curtíssimo período de apenas 72 dias de governação, esse período resultou no primeiro programa socialista da humanidade, com algumas medidas que acabaram por ser implementadas no século XX. A moderação esteve a cargo de Eduardo M Raposo e o apontamento musical de Ruben Martins. Na mesa da sessão estiveram ainda os autarcasPedroMatiaseFernandoJorgeFernandes
No dia 23 de Junho de 2022, Manuel Carvalho da Silva, uma das figuras mais carismáticas, congregadoras e mais respeitadas no mundo do Trabalho em Portugal, foi o convidado para falar sobre “Revoluções e Lutas Laborais no Primeiro Quartel do Século XX – A emergência da OIT e outros compromissos reformistas”. Carvalho da Silva fez uma excelente intervenção com esclarecedoras respostas na análise ao período abordado, percorrendo o período conturbado das últimas décadas do século XIX à importância da OIT, em 1919, onde foram institucionalizadas conquistas de grande alcance para os trabalhadores. A moderação foi de Eduardo M. Raposo e o apontamento musical de RubenMartins.
Guerra e Paz
“Guerrae/ouPaz–quefuturonoSéculoXXI?”,umtemaactualíssimo,empartedevidoàguerranaUcrânia,foiodebate a que se assistiu no dia 15 de Setembro de 2022, tendo como oradores José Evaristo, Coronel de Engenharia com Missões na Ucrânia e na Rússia, e Pedro Tadeu, Jornalista. A intenção era dar a perceber (o que foi conseguido) o que conduziu a esta guerra - que ainda continua -, mas também a necessidade de encontrar a Paz, face a esta e outras guerras que assolam o Planeta em pleno Século XXI, quando se pensava que o século da tecnologia seria impeditivo de quaisquer guerras, mas a realidade tem ultrapassado a ficção. A moderação do debate esteve a cargo de Eduardo M. Raposo e o debate contou ainda com a participação de Pedro Matias, Presidente da Junta de Freguesia da Charneca de Caparica e Sobreda, e fortes intervenções de pessoas na assistência.
CEDA CICLO DE COLÓQUIOS
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CEDA LIVRO AMOR E VINHO O CEDA CO ORGANIZOU: APRESENTAÇÕES DO LIVRO Amor e Vinho. Da Poesia Luso-Árabe à Nova Música Portuguesa. Séculos XI/XXI 7 Apresentações em: 1 - Setúbal, 2 - Silves, 3 - Beja, 4 - Pinhal Novo, 5 - Évora, 6 - Sines (FMM), 7 - Feira do Livro. 5 4 3 2 1 7 6
V
O CEDA ORGANIZOU:
ENCONTRO DO CEDA
Viajando Pelos Caminhos de Santiago 30 outubro a 1 de Novembro 2021
Protocolo entre o CEDA e o ISEC Lisboa
CENTRODEESTUDOSDOCUMENTAISDOALENTEJO
O ISEC Lisboa - Instituto Superior de Educação e Ciências, e o CEDA – Centro de Estudos do Alentejo - Memória Colectiva e Cidadania, firmaram recentemente um protocolo com o objectivo de colaborarem entre si, tendo em vista a promoção de um intercâmbio de ideias e experiências decorrentes da prossecução dos fins específicos de cada uma das entidades, estabelecendo mecanismos de cooperação, incentivando a realização de estudos, colóquios, seminários, conferências e outras iniciativascongéneres,entreoutrasactividades. Um dos principais objectivos deste Protocolo é o estabelecimento de mecanismos de cooperação, que viabilizem a concretização de projectos de formação e de investigação aplicada e desenvolvimento, prestação de
serviços, consultoria, de voluntariado ou de aprendizagem-serviço, disponibilizando os meios físicos e os recursos humanos ao serviço dessas actividades, de formaapromoveraçõesdeinteresserecíproco.
Com base no presente Protocolo, o ISEC Lisboa compromete-se, por exemplo, a conceder aos sócios do CEDA uma redução de 5% no valor das propinas e matrículas relativas a qualquer dos cursos ministrados pelo Instituto, assim como a conceder a cônjuges, familiares e descendentes de primeiro grau das pessoas abrangidas pelo referido anteriormente, condições especiais para a frequência dos cursos do ISEC Lisboa, designadamente nos valores associados à candidatura dosmencionadoscursos.
8 CEDA V ENCONTRO
Arquitectura militar de Elvas
Castelo de Vide: Grupo de participantes
MemóriaColetivaeCidadania
Revista AlentejanaMemória
Castelo de Vide: Fonte no casco histórico
A “Memória Alentejana” na Evográfica
A Revista "Memória Alentejana", representada pela direcção editorial - o director e o director-adjunto, José Alex Gandum - autor das fotos – participou no colóquio “ A edição no espaço público”, realizado na Biblioteca Pública deÉvora,dia21deOutubro,no Evográfica–EVEX2022.
Para além do anfitrião, Feliciano de Mira -estivemos bem acompanhados, entre a redactora da Revista libertária "Ideia", em representação do director, António Cândido Franco e o Paulo Piçarra, editor do histórico Diário do Sul e director de um mais recente projecto jornalístico a Sul Paulo Piçarra, com quem tivemos oportunidade de estar à conversa off de record, e apreciar a grande simpatia deste amigo jornalista, até nessa faceta extremamente parecido com o senhor seu pai, uma figura icónica do jornalismo regional, referência maior no Alentejo e no país, Manuel MadeiraPiçarra,quenosdáoprivilégiodasuaamizade.
Aconteceu um debate extremamente enriquecedor com diversas intervenções muito vivas e pertinentesreferência, entre outros a José Rodrigues dos Santos, docenteeinvestigadornoCIDEHUS/UÉvora-ondedirigiu o projecto "Dinâmicas do «cante» na cultura popular alentejana", nosso colega na Comissão Científica do II Congresso do Cante, em preparação, e que já participou em colóquionoaniversáriodoCanteemAlmada.
Eduardo M. Raposo
9 CEDA NA EVOGRÁFICA
Évora MEGALITISMO
CARLOS PINTO DE SÁ
Presidente da Câmara Municipal de Évora
Carlos Manuel Rodrigues Pinto de Sá, Montemor-o-Novo (1958) é um dos mais prestigiados autarcas alentejanos e um dos presidentes que há mais tempo exerce o cargo. Depois de ter sido edil em Montemor 18 anos (1994 – 2012) antecedido de três como vereador, onde deixou obra, conquistou o município de Évora, então com uma situação financeira muito difícil, mas que conseguiu recuperar e lançar projectos estruturantes. Actualmente com 9 anos na liderança dos destinos eborenses e tendo em 2021, não obstante uma dispersão de votos, manteve a presidência num contexto de quebra generalizada da sua força política a nível nacional.
Licenciado e Mestre em Economia, assistente na Universidade de Évora (1984-1992), onde estagiou até 1989 e voltou num curto período (finais 2012-inícios 2014), Carlos Pinto de Sá, para além de responsabilidades estudantis, associativos, autárquicos ou partidários que abraçou, exerce ou exerceu diversos cargos em 14 instituições nacionais e internacionais.
Memória Alentejana Senhor Presidente, este é o seu terceiro mandato. Com nove anos a dirigir os destinos da mais importante cidade alentejana, quais as linhas estruturantes de actuação do trabalho realizado e que balanço faz? Este terceiro e último mandato iniciado há cerca de um ano é diferente dos dois anteriores?
“ÉVORA TEM UMA DINÂMICA GLOBAL COMO NUNCA TEVE”
Carlos Pinto de Sá - A CDU ganhou a Câmara Municipal em 2013 e recebeu um Município desacreditado e falido (€ 95 milhões de dívida, 876 dias de prazo médio de pagamento, € 18 milhões de défice orçamental, € 32,5 milhões de excesso de endividamento, € 12 milhões de resultados líquidos negativos) e um concelho em perda (economiaestagnada,CentroHistóricoemdegradaçãoeparado,perdademaisde1.700postosdetrabalho). Os objectivos estruturantes eram claros: lançar uma nova estratégia de desenvolvimento de Évora, recuperar as
“Évora vai continuar a contribuir para um Alentejo mais desenvolvido!”
CADERNO TEMÁTICO ENTREVISTA Fotos Município de Campo Maior 11
contas do Município bem como a credibilidade e prestígio perdidos. Face à dimensão do descalabro económico do Município, avisámos que a recuperação ia ser demorada e, de facto, levou 8 anos e ainda estamosapagar O balanço é largamente positivo, ainda que muito limitado pelas condicionantes económicas e legais impostas ao Município: dívida foi reduzida em mais de 35%, prazo médio de pagamento inferior a 90 dias, saldo orçamental positivo, capacidade de endividamento recuperada para € 7 milhões, resultado líquido negativo reduzido em 75%. O Município e Évora recuperaram prestígio e influência nacional e internacional (recentemente, a Évora foi eleita para a direcção da Organização das Cidades Património Mundial que reúne 350cidadesdetodoomundo).
Nestes últimos 9 anos, Évora registou o maior investimento económico de sempre (acima dos € 350 milhões) com destaque para a aeronáutica, a electrónica, as tecnologias de informação, o turismo, o agro-alimentar, as energias renováveis e a inovação. Foram criados ou estão em criação 3.000 postos de trabalho. O património e a cultura recuperaram a sua dinâmica e está em curso a candidatura a capital europeia de cultura 2027. Em geral, todos os sectores registam uma dinâmica crescente. Novos investimentos estruturantes estão em curso ou previstos: novo Hospital Central do Alentejo, nova linha ferroviária Sines / Évora / Espanha, troçodoIP2.
Este novo mandato determinou uma dispersão de votos e mandatos, pelo que entendemos que a população quer que as várias forças políticas tenham capacidade de entendimento para prosseguir o desenvolvimento de Évora e não que, por calculismo eleitoral, se volte ao desequilíbrio dascontaseàregressãodeÉvora. Évora tem uma dinâmica global como nunca teve e é fundamental que possa continuar!
Além de ser sede de distrito e considerada capital do Alentejo, Évora tem uma localização privilegiada em termos de acessibilidade, pois está a pouco mais de uma hora de Lisboa e a uma hora de Badajoz, assim como das outras cidades alentejanas sedes de distrito, Beja e Portalegre. Que vantagens podem
advir desta situação geográfica estratégica para o concelho de Évora e para a sua população?
“ÉVORA E SINES SÃO OS PRINCIPAIS PÓLOS DE DESENVOLVIMENTO DO ALENTEJO”
Évora é solidária com o Alentejo. Évora pode ajudar muito o desenvolvimento do Alentejo, o Alentejo enquanto região com uma identidade única é fundamental para Évora. Nesse sentido, defendemos a cooperação entre as diferentes entidades da região em prol do combate aos problemas do Alentejo e na prossecução de estratégias de desenvolvimento comuns. Isso é patente, por exemplo, na candidatura de Évora a capital europeia de cultura 2027.
AposiçãoestratégicadeÉvorajáestáaser potenciada para Évora e para o Alentejo como se pode ver em exemplos que dei na resposta anterior Vamos continuar e reforçar a dinâmica que está a trazer novos investimentos e novos projectos em áreas diversificadas para Évora. Évora e Sines são os principais pólos de desenvolvimento do Alentejo. Évora vai continuar a reforçar essa posição até porque oferece oportunidades muito diversificadas em todas as áreas. Daqui queremos que resulte melhores condições e qualidade de vida para as populações e, para tal, é necessário que as políticas nacionais tambémvãonessesentido,nomeadamente, tornando mais justa a distribuição do rendimento, aumentando o peso dos rendimentosdotrabalho.
O concelho de Évora perdeu cerca de 3.000 habitantes nos últimos dez anos (de 56 596 habitantes em 2011 para 53 591 em 2021, censos) ainda que na cidade se concentrem 46 966 habitantes fazendo desta a cidade com mais população do Alentejo, apenas “sobrando” menos de 7.000 (6.259 habitantes para as freguesias rurais. Todavia, a maioria dos concelhos alentejanos, em proporção, perdeu mais população. Ainda assim, o concelho de Évora consegue manter um número muito regular de residentes, tendo atingido os picos nos últimos 20
anos (56 519 em 2001 e 56 596 em 2011).
Por um lado gostávamos de saber o que está a ser feito ou previsto para contrair esta assimetria, comum nos concelhos de interior e por outro lado, qual ou quais ou principais factores de atractibilidade que Évora exerce nas pessoas e que problemas cria o despovoamento do território extra-cidade?
A perda demográfica é um problema nacional. Portugal é o terceiro país mais envelhecido no mundo e há causas e políticas que conduziram a esta lastimável situação.
Évora é das localidades que menos residentes perde e em que a população presente cresce. Mas essa perda preocupanos por várias razões: primeiro, porque sofre da tendência nacional; segundo, porque decorre do acelerado despovoamento rural em curso em todo o país; terceiro, porque uma parte dessa perda se deve à procura de habitação mais barata emzonaslimítrofes.
Este é, pois, um problema de política nacional. Contudo, no que depende do Município, estamos a concretizar a estratégia que permitirá minorar e inverter a situação.
“HOJE O CENTRO HISTÓRICO TEM UMA ENORME DINÂMICA GLOBAL”
Portugal está “em alta” no Turismo. Relativamente ao Megalitismotema da presente edição da Revista Memória Alentejana – que no concelho conserva um conjunto valioso de monumentos datados de há cinco milénios, tal pode vir a ser um factor potenciador do turismo. Tendo em atenção o peso do turismo em Évora, especialmente desde que a UNESCO a inscreveu nas listas de Cidade Património Mundial da Humanidade, o que tem sido feito para o município de Évora tirar partido dessa riquíssima mais-valia patrimonial que os nossos antepassados mais distantes nos legaram?
O Centro Histórico há muito que deixou de ser apenas um recurso potencial para o turismo. O trabalho de divulgação nacional e internacional de Évora como Patri-
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mónio da Humanidade é o principal factor de atractividade turística a Évora. Desde 2013 que adoptámos uma estratégia de promoção turística e patrimonial de Évora que passou, em primeiro lugar, por uma forte cooperação e parceria com a Turismo do Alentejo mas, também, por um ambicioso Programa de Revitalização do Centro Histórico e de algum outro património de grande valia como o Cromeleque dos Almendres. Hoje o Centro Histórico tem uma enorme dinâmica global: reabilitação de infraestruturas publicas marcantes (Palácio D. Manuel, Teatro Garcia de Resende, Salão Central, Templo Romano, Aqueduto) e apoio a outras (Ig. S. Francisco, Biblioteca Pública), reabilitação do edificado, apoio e dinamização do comércio local, melhoria do espaço público, programa de animação sócio-cultural, eventosmarcantes(BienaldeMarionetas, Meia Maratona de Évora, final da Volta ao AlentejoemBicicleta).
Decisiva tem sido a capacidade de atrair investimentos turísticos desde o hotel Vila Galé, em 2014, ao Hilton com 2 investimentos emcurso demaisde35milhões de euros.
Nos anos anteriores à pandemia, o turismo em Évora crescia acima da média nacional e, hoje, está a regressar ao nível de2019,omaisaltodesempre.
importantes agentes e que repercussões locais e no Alentejo em geral tem essa interação?
O Diário do Sul é um órgão de comunicação social local notável no panorama nacional, desde logo por se manter como diário. Mas há a registar, ainda, a Defesa, a aproximar-se do centenário, projectos na área da rádio e, mais recentemente, projectos que usam as novas tecnologias e o À Sul, cuja coragem da sua criação e lançamentosaúdo.
truído e a qualidade de vida dos residentes?
Évora tem uma tradição riquíssima em termos de comunicação social. Que importância para o desenvolvimento e divulgação de actividades podem ter os jornais - Diário do Sul, ou mais recente à sul – outros periódicos, rádios, televisão, bem como para a formação de espírito crítico, pois é comumente aceite que cidadão informado é cidadão potencialmente mais reivindicativo e interventivo, o que se torna mais pertinente numa sociedade com tantas desigualdades sociais - ainda para mais em crescendo – como é a sociedade portuguesa? Como é que o município interage com estes
O Município tem por princípio, no seu relacionamentocomacomunicaçãosocial local e regional, o respeito pela autonomia e não interferência e o reconhecimento do seu papel determinante na comunidade. Vamos mais longe e temos apoiado as suas justas reivindicações de apoios do Estado e de não serem penalizados pela legislaçãonacionaloupelainterioridade.
O Município, em conformidade com a lei, canaliza a divulgação da informação institucional e continua a reforçar o relacionamento com a comunicação social local eregional.
No que concerne à mobilidade, Évora como Cidade-Museu, tem de ter algumas limitações de trânsito no seu interior. Como reage a população aos problemas de estacionamento, o que foi feito ou o que poderá ainda ser feito para continuar a conciliar a acessibilidade à Cidade, a conservação do património cons-
Está em curso a elaboração do Plano Municipal de Mobilidade Urbana Sustentável. É um plano estratégico, logo a longo prazo, muito ambicioso e de aplicação progressiva. Tem em atenção desafios como as alterações climáticas, a aposta em modos suaves como o andar a pé ou de bicicleta, a criação de novas vias pedonais e cicláveis. O futuro sustentável do Centro Histórico exige que haja uma redução substancial dos veículos, salvaguardando os residentes e as diversas actividades, nomeadamente, as económicas. O grande desafio é a alteração progressiva de mentalidades, tornando o Centro Histórico mais pedonal, mais confortável, reduzindo a poluição automóvel e equilibrando as necessidades de quem reside e trabalha no CH com tipos de mobilidades amigas do ambiente. A participação dos cidadãos tem sido significativa e apelamos para que seintensifique.
“O NOSSO OBJECTIVO FOI RECUPERAR, INOVANDO, O PAPEL REFERENCIAL DE ÉVORA NO CONTEXTO CULTURAL DO PAÍS”
Évora tem uma das melhores salas de espectáculo, o Teatro García de Resende - com talvez o melhor palco – a Sul do Tejo. Tem ainda uma
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“O MUNICÍPIO TEM COM A COMUNICAÇÃO SOCIAL LOCAL E REGIONAL, O RESPEITO E O RECONHECIMENTO DO SEU PAPEL DETERMINANTE NA COMUNIDADE”
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programação de referência, com tradição em décadas anteriores –tanto ao nível de festivais de música, artes plásticas e outras actividades performativas. Que balanço faz de nove anos de mandato e que novos projectos existem para estas áreas tão importantes e com tanta visibilidade, não apenas ao nível da cidade mas também do Alentejo e do país?
Em 2013, Évora tinha perdido grande parte da dinâmica cultural e do prestígio que, justamente, granjeara quando, logo após a Revolução de Abril de 1974, deu exemplo nacional ao criar o primeiro grande projecto de descentralização cultural em Portugal, o Centro Dramático de Évora, sediado no Teatro Garcia de Resende (TGR). O nosso objectivo foi romper com aquele marasmo e recuperar, inovando, o papel referencial de Évora no contextoculturaldopaís.
Criámos uma programação cultural anual, incluindo e apoiando os agentes culturais que estavam com dificuldades de sobrevivência. O espaço é pouco para referir todos os projectos de iniciativa municipal, em parceria ou apoiados pelo Município. Mas deixo alguns exemplos: Cantos das Janeiras, com a participação de dezenas de entidades e percorrendo toda a cidade; Vozes de Abril, nas comemorações do 25 de Abril e também com participação alargada de entidades, músicos e criadores locais; retoma da Bienal de Marionetas, organizada pelo CENDREV; Festival Artes à Rua; Festival Imaterial; Orquestra de Sopros, que permitiu revitalizar as bandas filarmónicas do concelho; Artes à Escola,ligandoculturaeeducação. No Programa de Revitalização do Centro Histórico, definimos como prioridade a reabilitação do Teatro Garcia de Resende (TGR) e a sua projeção nacional e internacional. O TGR está hoje incluído na Rede Europeia de Teatros Históricos, na Rede de Teatros e Cine-Teatros Portugueses, tem uma programação para diversos tipos de público e obteve o financiamento mais elevado concedido, em concurso, pelo Ministério da Cultura. Reabilitámos o Palácio D. Manuel, com sala de conferências, galeria de exposições e Centro Interpretativo da Cidade Reconstruímos renovando o Salão Central, em ruínas à décadas.
Este trabalho tem o seu corolário com a candidatura de Évora a capital europeia
de cultura 2027 que, com ou sem o título, já marcou e irá marcar Évora e o Alentejo paraofuturo.
Há, ainda, muito trabalho a fazer para garantir a sustentabilidade plurianual das associações e criadores, para densificar e internacionalizar o sector cultural, para colocar Évora no patamar de referência internacional.
Com todas as dificuldades, restrições e obstáculos encontrados, considero que atingimos os objectivos e Évora está em condições de dar um salto qualitativo na dinâmica e posicionamento cultural no paísenaEuropa.
“A CANDIDATURA DE ÉVORA [A CAPITAL EUROPEIA DE CULTURA 2027] JÁ MARCOU E IRÁ MARCAR ÉVORA E O ALENTEJO PARA O FUTURO”
Évora é candidata a Capital Europeia da Cultura 2027. Ainda que a candidatura tenha autonomia relativamente ao município, qual o papel da CME neste importantíssimo projecto que “mexe” com todos os alentejanos – o CEDA foi convidado a apresentar um projecto por um dos parceiros. Tendo sido a entidade promotora no lançamento da candidatura, ainda mantém um papel decisivo ou é apenas uma das instituições proponentes? É uma candidatura representativa de todo Alentejo ou centra-se sobretudo em Évora? Senhor presidente, devido ao seu empenho pessoal, pode deduzir-se que esta é uma herança que faz questão de deixar para Évora e para o Alentejo quando terminar o seu terceiro mandato? Qual o ponto de situação da candidatura?
Este é um dos maiores desafios e projectos estruturantes para o futuro de Évora e do Alentejo. Sê-lo-á com o título mas, também, em condições menos favoráveis, sem otítulo.
Évora 2027 teve a capacidade de criar uma Comissão Executiva, pondo em cooperação entidades diferenciadas com papel em Évora e no Alentejo: o Município de Évora que assume a coordenação, a Direcção Regional de Cultura do Alentejo, a Universidade de Évora, a Comissão de
Coordenação e Desenvolvimento Regional do Alentejo, a Turismo do Alentejo, a Fundação Eugénio de Almeida, a CIMAC (reúne os 14 municípios do Alentejo Central), a Agência Regional de Promoção Turística do Alentejo. Esta candidatura tem o apoio das 4 Comunidades Intermunicipais do Alentejo, onde estão todas as Câmaras do Alentejo; tem o apoio do Conselho da Região onde estão representadas as forças vivas do Alentejo. E, ainda, o apoio da Organização das Cidades Património Mundial que junta 350 cidades de todo o mundo. Há muitos outros apoios, por exemplo, de cidades da União Europeiaedeoutrasorganizações.
A candidatura é, por força do regulamento, da cidade de Évora mas foi definida desde o início como uma candidatura do AlentejoequeabarcaoAlentejo.
A candidatura assenta no conceito de “vagar” que radica na identidade cultural e na vivência secular do Alentejo e que a distingue de qualquer outra. Entendemos que “vagar” não tem tradução, sendo uma forma de valorizar a nossa língua e acrescentamos o lema “An(other) Art of Existence”. Sugiro que procurem conhecer o conteúdo!
Não é uma herança, é um projecto estruturante, colectivamente construído, para oAlentejo.
No passado dia 26/11, entregámos o dossier da 2ª fase da candidatura. O júri visitará as 4 cidades (Évora, Ponta Delgada, Aveiro e Braga) em Novembro. A 6/12, defenderemos a nossa candidatura perante o júri. A 7/12, o júri internacional comunicaráqualacidadeescolhida.
“A'PARCERIA ESTRATÉGICA' TEM VINDO A CONCRETIZARSE ENTRE O MUNICÍPIO E A UNIVERSIDADE, NA CONCERTAÇÃO DE PROJECTOS ESTRUTURANTES”
A Universidade de Évora é uma das imagens de marca da cidade, até por ser a única existente no Alentejo. Fundada em 1550 pelo Cardeal D. Henrique e apesar de ter sofrido um interregno em 1759 quando o Marquês do Pombal expulsou os jesuítas, Évora e a sua academia estão indissocialvelmente ligadas. Como é que se consubstancia, seja
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na concretização de projectos tecnológicos – parque industrial, PACT – como no âmbito das ciências sociais - História, Património edificado e imaterial –por exemplo o Cante, etc. Como é que a CME se relaciona com este parceiro estratégico e como isso se repercute no quotidiano dos cidadãos?
Logo em 2013, a Câmara Municipal assumiu o relacionamento privilegiado com a Universidade que deveria passar pelo que classificámos como uma “parceria estratégica”. Essa “parceria estratégica” tem vindo a concretizar-se numa permanente cooperação institucional entre o Município e a Universidade, na concertação de projectos estruturantes como a criação da nova Escola de Saúde e a sua integração com o novo Hospital Central do Alentejo ou como o aumento das residências universitárias ou como Évora 2027 ou como o Parque Alentejo de CiênciaeTecnologia(PACT).
No caso do PACT, o presidente da Câmara integra o Conselho de Administração, o Município cedeu os terrenos para a instalação e expansão do PACT, colabora ativamente na captação de novas empresas e investidores, terá participação no capital social. Sublinha-se que o PACT serve todo oAlentejo.
A Universidade com os seus 9.000 estudantes, corpo docente e discente, tem um papel determinante na vida quotidiana da cidade, na dinâmica económica, social, cultural e política de Évora e do Alentejo, na criação de condições de atratividade à região. Claro que há sempre alguns desequilíbrios nos modos diversos de vivência no dia a dia mas uma cidade universitária é isso mesmo: dinâmicas diferenciadas, alguma tensão, mas um contributo multifacetado para o desenvolvimento e o bemestargeral.
“O ALENTEJO [COM O AEROPORTO DE BEJA] SAIRIA MUITO BENEFICIADO BEM COMO A COESÃO TERRITORIAL”
Sobre o potencial do Aeroporto de Beja, Évora poderia beneficiar com a aposta deste Aeroporto como complemento ao aeroporto de Lisboa? De que modo?
O Aeroporto de Beja tem condições para ser alternativa ao de Lisboa. Claro que o problema decisivo é a falta de ligação ferroviária rápida entre Beja e Lisboa. Não parece que o Governo considere esta possibilidade que, julgo, deveria ser estudada tecnicamente até porque não teremosnovoAeroportorapidamente.
A ligação ferroviária rápida Beja / Lisboa aproximaria viajantes de Évora que poderiam usar com alguma facilidade o transbordo para Évora. O Alentejo sairia muito beneficiado bem como a coesão territorial.
“O CEDA E A REVISTA TÊM DESEMPENHADO PAPEL FUNDAMENTAL NA PROMOÇÃO DA IDENTIDADE ÚNICA DO ALENTEJO”
O que pensa do trabalho desenvolvido pelo CEDA e pela Revista Memória Alentejana nos últimos 22 anos, na valorização da Memória identitária e da cidadania do nosso Alentejo? O que poderia ser feito que não se concretizou?
Ao longo de mais de duas décadas, o CEDA e a sua Revista têm desempenhado papel fundamental na preservação, divulgação e promoção da identidade única do Alentejo. Tem, de forma perseverante, aprofundado o conhecimento do Alentejo para os
próprios alentejanos eparaforadaRegião. Tem dado voz ao Alentejo na sua luta pelo reconhecimentoepelodesenvolvimento. Poderemos sempre dizer que teria sido possível ir mais além, mas o que realmente conta é o trabalho feito e visível em prol doAlentejo.
Que mensagem para o futuro gostaria de deixar aos seus munícipes e aos alentejanos em geral?
Évora, apesar das dificuldades que muitos procuram omitir para que a memória não os responsabilize, tem dado e está a dar passos largos rumo ao desenvolvimento global e à melhoria do bem-estar das pessoas. A Câmara Municipal, pela falta de recursos que tem vindo a recuperar, ainda não consegue dar resposta cabal em diversas áreas, mas o caminho feito neste últimos anos permitiu a recuperação das contas e da credibilidade do Município e um importante salto qualitativo positivo rumo a um melhor futuro. Esse caminho na senda do desenvolvimento de Évora exige o contributo alargado dos cidadãos, no respeito pelas diferenças, e na procura do que nos é comum. O Alentejo precisa de Évora, Évora vai continuar a contribuir para umAlentejo mais desenvolvido!
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Entrevista conduzida por Eduardo M. Raposo com José Alex Gandum
O Megalitismo no concelho de Évora no contexto do Alentejo CentralAlguns apontamentos
Menir dos Almendres – Évora (Foto: Gustavo Val-Flores)
É no Alentejo Central que o fenómeno do “Megalitismo” em território português, atinge a sua maior expressão e importância patrimonial, sendo na região de Évora que se situa uma concentração muito significativa de monumentos megalíticos, cujo significado continua a constituir um mistério. Nesta região, entre os rios Sado e Guadiana, na confluência de três ecossistemas principais de marcado caráter mediterrânico, onde os solos apresentam maior aptidão para a atividade agrícola e a existência de áreas de granito e quartzito granitoide, é o local onde também o homem encontrou os recursos de que necessitava para se fixar e se desenvolver em comunidade. É neste contexto, que em meados do VI milénio e os finais do IV/inícios do III milénio a.C., as sociedades camponesas se desenvolvem e se consolidam as comunidades agro-pastoris. Decorrente da sedentarização das populações, do consequente aumento demográfico e da crescente complexificação social, emergiu em finais do IV inícios dos III milénio a.C., o fenómeno das inovações tecnológicas que permitiu melhorias no sistema produtivo, conduzindo ao aumento da mão-de-obra disponível, que pôde ser canalizada e aplicada na construção dos grandes monumentos megalíticos. A partir daqui as sociedades passam a depender do sucesso das suas colheitas e emerge o fenómeno megalítico como elemento agregador e memorial coletivo de grupos mais ou menos homogéneos e de matriz cultural comum.
Este fenómeno corporizou algumas manifestações rituais das sociedades neolíticas, com as quais nos é permitido traçar um ideário, ou melhor convencionar o que seriam essas sociedades, onde as convicções magico-religiosas estavam presentes no quotidiano e na vida além da morte.
Deste universo de monumentos megalíticos (do grego megas=grande; e lithos=pedra) são inúmeros os testemunhos na região de Évora, dos quais se destacam, pela sua monumentalidade, a Anta Grande do Zambujeiro, o Menir e o Cromeleque dos Almendres.
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Povoado do Alto de São Bento
O Alto de São Bento, situa-se a cerca de3kmaOestedacidadedeÉvorae 364 metros de altitude e constitui «o melhor miradouro sobre a cidade», sobre uma colina de grandes afloramentos graníticos. Ali, desde cerca de 3000 anos a.C., [embora pareça que o sítio possa ter sido habitado em época anterior, numa fase em queasúltimassociedadesdecaçadores recolectores deram lugar às primeiras sociedades agrícolas e pastoris, ocorrida, no nosso território entre os finais do VI e inícios do V milénio a.C.], erguia-se um povoado pré-histórico, provavelmente um dos maiores e mais importantes povoados dos construtores dos monumentos megalíticos da região, do qual ainda subsistem importantes vestígios
Enquanto sítio arqueológico é conhecido desde os finais do século XIX através de Émile Cartailhac que o visitou e referenciou no seu “Les âges pré-historiques de l'Espagne et du Portugal” em 1886, embora tenha permanecido praticamente desconhecido e ignorado ao longo dequasetodooséculoXX.
No contexto geográfico e arqueológico, a ocupação pré-histórica do
Alto de São Bento – Évora (Foto Mário Carvalho)
Alto de S. Bento assume um estatuto muito especial não apenas pela antiguidade relativa de alguns dos vestígios identificados, como pelas relações paisagísticas com os maiores monumentos megalíticos a Oeste de Évora e também pela sugestiva e inevitável ligação com a cidade de Évoraecomasrespetivasorigens.
Ali podem observar-se, sobre o imponente afloramento granítico, junto aos moinhos, um conjunto de sulcos alongados associados a manchas e picotados e estruturas negativas cilíndricas, de formas extremamente regulares, cujo significado se desconhece, embora possam estar associados a épocas antigas e a objetivosrituais.
No local foram também encontrados alguns vestígios materiais (arte-
factosemsílexerarosfragmentosde cerâmica decorada) pelo que pode considerar-se o Alto de São Bento como um dos grandes povoados neolíticosdaregião.
Atualmente situa-se ali o Núcleo Museológico dos Moinhos do Alto de São Bento, como hino à produção e moagem de cereais, base de subsistência das comunidades que o habitaram, que vem enriquecer ainda mais a panorâmica desta colina que continua a marcar a paisagem da cidade.
O Alto de São Bento é, hoje, também, classificado como património naturaladefenderevalorizar.
Menires e Cromeleques
Estas construções que aparecem isoladas ou em grupo, assumem, no Alto Alentejo uma expressão monumental, cujo significado mais profundo continua a ser um enigma. Local de reunião, de observação astronómica? Não sabemos. Sabemos que face à sua monumentalidade e ao esforço despendido para a sua construção, deveriam ser lugares de grande importância mágico-religiosa esimbólicadecarácterterritorial.
Os menires
A palavra Menhir, de origem bretã, significa men (pedra) e hir (grande) e ao agrupamento de menires alinhados numa determinada planta, que pode ser variável, é atribuída a designação científica de cromeleque –do bretãocrom'lech
Os menires terão sido a primeira manifestação do fenómeno megalítico, no Alentejo Central, cujo início, embora em data incerta, terá ocorrido no «Neolítico», quando as comunidades já se encontram consolidadas e hierarquizadas e em que a delimitação da propriedade se terá tornadoumanecessidade.
Simbolicamente, os grandes monólitos, para além de marcadores territoriais da propriedade de solos particularmente férteis, por parte das
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Alto de São Bento – Évora (Foto: André Bagorro- CME)
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comunidades que os ocupavam [defendem alguns autores] estariam associados à fertilidade desses mesmos terrenos, necessários à sobrevivência das comunidades que os detinham.
Gradualmente foram perdendo a carga simbólica com que foram talhados e erguidos e foram sendo, nalguns casos, reutilizados na cons-
trução das grandes antas ou dolmens.
O Menir dos Almendres Situável, sensivelmente entre cerca de 5000 e 4500 a.C., pode encontrar-se próximo do Monte dos Almendres – Guadalupe, Évora - a cerca de 1,5km a nordeste, e em linha reta, do Cromeleque dos
Almendres, a aproximadamente 60 metros abaixo da cota do Cromeleque. Implanta-se no alinhamento do Cromeleque, cuja linha marca o nascerdoSolnoSolstíciodeVerão. Construído em granito porfiroide –matéria-prima inexistente nas proximidades – encontrava-se tombado há alguns anos. Mediria cerca de 5 metros de altura. Após ter sido reerguido, mede acima do nível do solo, 3,5 metros e pesa entre 10 a 12 toneladas.
Os Cromeleques
Os Cromeleques constituem, recintos fechados, delimitados por menires, que poderão ter desempenhado umpapelidênticoaodosmenires.
Cromeleque dos Almendres Situável, cronologicamente entre o V e IV milénios a.C., é um dos maiores recintos megalíticos estruturados da Península Ibérica, e um dos mais importantes e mais antigos monumentos do seu género em toda a Europa, cuja construção terá tido
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Menir dos Almendres –Évora (Foto: Gustavo Val-Flores - CME)
diversas fases. Seria constituído originalmente por mais de uma centena de menires, mas atualmente é composto por 95, com alturas que variam entre os 2,30 metros e 1,10 metros. O seu material é constituído por granito de diversas proveniências, algumas delas de distância superiora2quilómetros.
Constituiria um dos lugares de eleição das populações do «Neolítico», sendo de admitir uma utilização ritual astronómica, face à sua orientação evidente que aponta ao nascimento do Sol, no solstício de Verão e da linha equinocial e posicionamento a meia encosta, da qual se avista uma extensa área, nomeadamente a cidadedeÉvora, Alguns monólitos – cerca de dezapesar da erosão a que estiveram sujeitos, apresentam decoração que, eventualmente, terá sido realçada com qualquer colorante que lhes conferisse maior protagonismo, incluindo «báculos» símbolo de poder, e outras figuras solares radiadas, que serão integráveis numa
derradeira fase de utilização do monumento, situável já no «Calcolítico»(finaisdoIIImilénioa.C.).
Anta Grande do Zambujeiro Ondehávivostambémsemorre. As antas são também designadas de dolmens, cuja diferenciação reside nasuaformaedimensão Trata-se, portanto, de um monu-
mento funerário, local de tumulação coletiva, que podia receber centenas de deposições (enterramentos) constituindo autenticas marcas na paisagem. A sua arquitetura contempla corredor longo com cerca de 15 metros de comprimento e câmara poligonal de 7 esteios com cerca de 6 metros de altura, encostados entre si, em cunha, que suportavam a
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Cromeleque dos Almendres – Évora (Foto: Gustavo Val-Flores - CME)
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Cromeleque dos Almendres – Évora (Foto R. Leal - CME)
grande pedra de cobertura - “mesa” “tampa” ou “chapéu” - entretanto deslocada junto à mamoa. A mamoa que envolvia o dólmen era igualmente colossal e media mais de 50 metrosdediâmetro.
O corredor, definido por ortóstatos e ainda com 3 pedras de cobertura, permitia que uma pessoa de estatura médiapudessealicircular.
Pelas suas dimensões verdadeiramente colossais é considerada uma das mais notáveis peças megalíticas de uma área extremamente rica em testemunhos do período, sendo a maior anta portuguesa e uma das mais monumentais da Europa, e por isso considerada a «joia da coroa» do Megalitismoportuguês.
Terá sido construída durante a fase final do denominado «Neolítico Final», situado cronologicamente na segunda metade do IV milénio a.C., ou seja, a fase do apogeu do Megalitismo, entre cerca de 3500 a 2900 a.C.
O seu corredor estava orientado para o quadrante do nascer do sol, na crença da existência para além da morte, razão pela qual os defuntos eram acompanhados de oferendas constituídas por objetos votivos para uso quotidiano e mágico simbólicas: asplacasdexistogravadas,pontasde seta, vasos cerâmicos, colares de contas.
Este sepulcro corporiza um dos derradeiros monumentos megalíticos, expressão do esforço coletivo das comunidades que os construíram, espaço sagrado, a cujo interior talvezsóalgunstivessemacesso.
Núcleo Interpretativo do Megalitismo de Évora
Encontra-se localizado no antigo Convento de Nossa Senhora dos Remédios, fundado como mosteiro masculino, em 1504 pela Ordem dos Carmelitas Descalços em terreno junto às Portas do Raimundo e mais tarde, em 1606, transladado para um edifício construído de raiz, cuja
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Anta Grande do Zambujeiro – Évora (Fotos: Eva Basílio - CME)
denominação ainda hoje se mantém, situadoàsPortasdeAlconchel.
O edifício conventual, foi remodelado em 2006, para acolher o Centro de Conservação / Restauro e Núcleo de Arqueologia da Câmara Municipal de Évora, onde em 2008, é criado o Núcleo Interpretativo do Megalitismo de Évora, numa primeira fase como Núcleo Interpretativo do Património de Évora, denominado Megalithica Ebora Resultou dum projeto de colaboração de um conjunto de entidades e desenvolvido no âmbito de um protocolo de colaboração entre diversas instituições – Câmara Municipal de Évora, Faculdade de Belas Artes e a Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa e o Grupo de Estudos do Megalitismo Alentejanocom a coordenação científica da responsabilidade dos Professores Manuel Calado (FLL) e Luís Jorge Gonçalves (FBAL) Este núcleo expositivoabarcava,inicialmente,osperíodos megalítico e romano, com referência aos vestígios patrimoniais mais importantes que subsistem na cidade e na região, pela particular importância que estes períodos assumem para asuahistóriaecultura
O Património Megalítico é particularmente notável não apenas no contexto regional, como nacional e até internacional, cuja importância é expressa pelas inúmeras antas e recintos que povoam a nossa paisa-
gem. Os vestígios romanos, são igualmente importantes não apenas no contexto português como internacional, com destaque particular para as ruínas do Templo, bem visíveis no centro da mais antiga zona da cidade,constituindooseuex-libris Objeto de remodelação no ano de 2016, passou a constituir apenas o Núcleo Interpretativo do Megalitismo, no qual estão representados os principais monumentos da região e algumas peças mais representativas da cultura material da época em questão, encontradas nas diversas escavações realizadas na Anta GrandedoZambujeiroeAnta2daMitrae cuja cedência se deve ao Museu Nacional Frei Manuel do Cenáculo e Universidade de Évora – LaboratóriodeArqueologiaPinhoMonteiro. Atualmente, o Centro acolhe outros espólios, razão pela qual se estuda uma nova proposta de renovação, que contempla uma redistribuição funcional dos diversos espaços, com a definição de novas zonas e discursos expositivos, no sentido de responder às novas lógicas museográficas, que permitam potenciar a experiência da visitação, que se quer para todos, e que a riqueza e importância dotemaimpõem.
Leal Arqueóloga – Divisão de Cultura / Câmara Municipal de Évora
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA:
ALVIM, Pedro, Recintos Megalíticos do Ocidente do Alentejo Central –Arquitectura e Paisagem: na Transição Mesolítico/Neolítico, Tese de Mestrado em Arqueologia e Ambiente Apresentada à Universidade de Évora, (2009), pp. 6-95.
BILOU, Francisco, As Fortificações de Évora: Imagem, Valor e Recurso, https://dialnet.unirioja.es/descarga/ar ticulo/7898534.pdf pp. 187-200
CARDOSO, João Luís, Pré-História de Portugal, Editorial Verbo, (2002), pp.155-236.
CALADO, Manuel, CARVALHO, Mário –Alto de São Bento: antes das Origens de Évora http://megasettlements.blogspot.co m/2007/01/alto-de-s-bento-antesdas-origens-de.html
CALADO, Manuel – Menires do Alentejo Centralhttps://www.academia.edu/1724714 0/Menires_do_Alentejo_CentralGénese e evolução da paisagem megalítica regional, Vols. 1 e 2.
FEIO, Mariano e MARTINS, António, O Relevo do alto Alentejo (traços essenciais), In Finisterra, XXVIII, (1993) 55-56, pp. 149-199 https://www.researchgate.net/pu blication/28181623
OLIVEIRA, Jorge de - Menir da Meada, o Mais Antigo, https://nationalgeographic.pt/historia /grandes-reportagens/2725-menir da-meada-o-mais-antigo
PEREIRA, Paulo, Artes Antigas. Rev. João Pedro Tapada. [Lisboa]: Círculo de Leitores, imp. 2 014. 279 p. (Decifrar a Arte em Portugal; 1). ISBN 978-972-42-4961-2.
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Núcleo Interpretativo do Megalitismo de Évora – Convento dos Remédios – (Foto: CME)
A “descoberta turística” do Megalitismo, o exemplo de Évora
Numa perspetiva historiográfica, o reconhecimento dos numerosos vestígios megalíticos no Alentejo Central, é um fenómeno bastante antigo. Poderíamos recuar ao Século XVIII, quando as primeiras e fantasiosas “memórias” sobre as antas e seu significado, surgiram no seio da Academia Real de História. No entanto, limitamos a nossa retrospetiva à transição do século XIX para o século XX, altura em que a Real Associação dos Arqueólogos e Architectos Portugueses, foi chamada a colaborar na identificação e seleção dos monumentos considerados de
interesse nacional. No real decreto publicado em 1910, nas vésperas da implantação da República, constam já várias antas dos arredores de Évora, classificadas como “Monumento Nacional”. A esta circunstância, não deverá ser estranha a participação no processo, do arqueólogo e historiador eborense Gabriel Pereira, a quem se devem alguns dos primeiros levantamentos (fig.1). A posterior ação do Grupo Pro-Évora, a mais antiga Associação de Defesa do Património do país, fundada em 1919, também viria a ter um papel importante no reconhecimento e na
salvaguarda de algumas antas da região. Mas quem, pela primeira vez, viria a chamar a atenção de forma direta para o potencial turístico do megalitismo eborense, seria o presidente da Associação dos Arqueólogos Portugueses, Afonso do Paço, num pequeno artigo publicado em 1963 na revista A Cidade de Évora (fig.2). À época, o alemão Georg Leisner tinha já publicado, em português e também na referida revista, um inventário de centena e meia de dolmens, (Antas dos arredores de Évora, 1949) instrumento de trabalho ainda hoje útil para o conhecimento do megalitismo regional. Afonso do Paço, embora se refira à arqueologia em geral, começa por abordar a mais valia turístico-cultural do megalitismo de Évora, dando como exemplo pelo seu estado de conservação e acessibilidade, a “Anta do Barrocal”, localizada nas proximidades da Tourega. Provavelmente, tal chamada de atenção, terá estado na origem dos trabalhos de restauro ali promovidos pouco depois (1964) pela Junta Distrital de Évora e dirigidos pelo arqueólogo Henrique Leonor de Pina. Durante esses trabalhos, graças a informações recolhidas junto da população, Pina viria a identificar a Anta Grande do Zambujeiro e o Cromeleque dos Almendres, protagonizando as grandes descobertas megalíticasdadécada.
Em todo o caso, o primeiro “instrumento” de apoio à visita turística do megalitismo eborense, organizado já numa perspetiva de "guia" (Roteiro de alguns megálitos da região de Évora) surgiria apenas uma década mais tarde, ficando a dever-se a José Pires Gonçalves, médico e arqueó-
MEGALITISMO VS TURISMO CADERNO TEMÁTICO
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Levantamentos gráficos de algumas antas de Évora, século XIX
Publicação de Afonso do Paço
logo amador de Reguengos de Monsaraz. Aquele trabalho, um opúsculo-separata de A Cidade de Évora, editado em 1975, dava realce aos núcleos megalíticos de Évora e de Reguengos mas abrangia também importantes monumentos de Montemor e de Avis. No entanto, a grande novidade desse "roteiro", era a chamada de atenção para a nova vertente megalítica que resultava da recente descoberta no Alentejo do megalitismo não funerário: menires e recintos de menires, também conhecidos como “cromeleques”. Para além dos monumentos daquele tipo que o próprio Pires Gonçalves identificara na zona de Monsaraz (como Xerez, Outeiro ou Bulhôa) aparecem também, já devidamente referenciados, os menires e cromelequesdeÉvora,comoosAlmendres e a Portela de Mogos. O "Roteiro" de Pires Gonçalves, seria a base de divulgação turística do megalitismo da região até ao final dos anos 80 do século passado, graças a um "desdobrável" produzido a partir do mesmo, com arranjo gráfico e desenhos originais de António Covinha, edita-
Desdobrável baseado no “roteiro” de Pires Gonçalves
do pela Câmara Municipal de Évora (CME) e distribuído durante largos anos no posto de turismo da cidade (Fig.3). Posteriormente, inicia se nova fase de divulgação do megalitismo eborense, já especialmente focada na monumentalidade da Anta Grande do Zambujeiro e do Cromeleque dos Almendres, cujos acessos haviam sido entretanto melhorados pela autarquia. Um novo desdobrável, apostando nalguma estética “Asterixiana”, propunha a visita àqueles monumentos excecionais, através de um percurso circular, a que se associava a possibilidade de passagemnaGrutado Escouralouna Anta-CapeladeSãoBrissos(Fig.4).
Em 1992, entretanto, foi possível conjugar os meios da Câmara e dos serviços regionais da Cultura, num projeto que à divulgação, aliava alguma intervenção no terreno. Partindo da informação disponível, identificaram se os monumentos que, pelo estado de conservação e acessibilidade,poderiam de facto ser integrados num verdadeiro percurso megalítico. Selecionados duas dezenas e meia de casos, negociada com
os proprietários a criação de acessos quando necessários (como o estabelecimento de corredores de ligação às estradas nacionais ou municipais e instalação de algumas "porteiras"), passou-se de seguida ao "plano de sinalização". O projeto partia do princípio que o turista poderia procurardescobriros monumentossem o apoio de terceiros e para além da informação escrita que seria disponibilizada num novo e completo roteiro (Fig.5), uma brochura editada em português, inglês, francês e espanhol, foi concretizadono terreno um plano de sinalização. Este incluía sinais de identificação ou mesmo de simples direção, através de um logótipo criado para o efeito. Propunham-se três circuitos diferenciados, todos com início e fim na cidade de Évora. O primeiro, de maior potencial, orientava-se para Oeste e para além dos sítios paradigmáticos como o Cromeleque dos Almendres ou a Anta Grande do Zambujeiro, incluíam as antas de Vale Rodrigo, em escavação por arqueólogos alemães, bem como a anta do Barrocal, já mencionada por Afonso do Paço. O
CADERNO TEMÁTICO MEGALITISMO VS TURISMO
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roteiro ignorava o Cromeleque da Portela de Mogos, já conhecido mas sem condições de visita, bem como o Cromeleque de Vale Maria do Meio, então ainda não identificado. Propunham-se ainda dois percursos complementares. Um na direção da Azaruja, facilitando a visita a vários monumentos mas com especial destaque para dois exemplares excecionais, as antas do Paço das Vinhas e da Herdade das Cabeças. O outro, orientado para a Torre dos Coelheiros, recuperando a memória de alguns monumentos, como as antas de Freixo de Cima que, tal como a do Paço das Vinhas, tinham sido objeto da atenção do arqueólogo francês Émile Cartaillac,noséculoXIX.
Não terminou neste projeto a valorização do património megalítico eborense, bem pelo contrário. Nos anos imediatos e ao longo da década de 90, com o apoio dos fundos comunitários (Projetos LIFE), a Câmara Municipal viria a promover diversas intervenções, concentradas na zona de Guadalupe-Valverde, que consolidariam este recurso patrimonial, como uma mais valia com futuro. Destacaram-se as escavações e restauros realizados nos recintos megalíticos dos Almendres e Portela de Mogos, sob direção de Mário Varela Gomes e em Vale de Maria do Meio, entretanto identificado e estudado por Manuel Calado. Infelizmente, em contraciclo com o crescente interesse público por este património, seguiu-se um longo período de inação por parte das diferentes tutelas, sempre justificadas por dificuldades financeiras ou administrativas. O aumento muito significativo de visitantes verificado ao longo da última década, em particular nos Almendres e na Anta Grande do Zambujeiro, veio entretanto colocar novos desafios de gestão e de conservação que tardam a ser assumidos. Se nos Almendres, ainda assim, tem sido possível responder provisoriamente às questões mais prementes dos acessos e estacionamento, já as questões relacionadas com a valorização e conservaçãocontinuamaaguardarresposta.Nesse aspecto é especialmente dramática a situação de degradação estrutural da Anta Grande do Zambujeiro, que se agrava cada dia que passa. Os diagnósticos e soluções de restauro estão disponíveis, o modelo de intervenção envolvendo proprietários privados, município e direção regional de cultura, está finalmente estabelecido. Só falta mesmo a capacidade financeira e executiva para avançar, antesquesejatardedemais.
MEGALITISMO VS TURISMO CADERNO TEMÁTICO
António Carlos Silva Arqueólogo
Folheto do Circuito Megalítico, início dos anos 90
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“Roteiro do Megalitismo de Évora”, CME, 1992
Parque do Alentejo de Ciência e Tecnologia Um Novo Alentejo, Tecnológico e Inovador
O PACT – Parque do Alentejo de Ciência e Tecnologia, situado em Évora, nasceu da vontade de posicionar o Alentejo como centro de inovação de referência global, através da dinamização e fomento de sinergias entre a comunidade académica e o mundoempresarial.
Desde o início da sua atividade, incentiva a transferência de conhecimento e posiciona se como um polo de atração para empresas inovadoras com elevado potencial para a criação de valor, assumindo-se como dinamizador da ambição de um Novo Alentejo.
Enquanto líder do Sistema Regional de Transferência de
Tecnologia (SRTT), o PACT dinamiza uma vasta rede de parceiros, pronta a alavancar empresas e empreendedores. Do seu ecossistema, fazem parte mais de 50 empresas, a Universidade de Évora, os Institutos Politécnicos de Beja, Portalegre e Santarém, seis incubadoras de base tecnológica, 25 centros de investigação, mais de 280 investigadores e mais de17milestudantes.
UM CRESCIMENTO SUSTENTÁVEL
Em2015,o PACTinaugurou o seu primeiro edifício e este ano oficializou a entrada em funcionamento do Centro Infante Dom Henrique, o primeiro de quatro
novos edifícios, assinados pelo Arquiteto Carrilho da Graça, que já se encontra completo. Este espaço irá acolher, para além de espaços dedicados à investigação, empresas como a KPMG Portugal, o CEiiA e a Compta EmergingBusiness.
O complexo PACT 2.0 contempla quatro novos edifícios, onde mais de 6100 m2 de área de construção irão permitir acolher cerca de 60 novas empresas, ligadas principalmente a áreas consideradas estratégicas pelo PACT: Aeronáutica, Economia Circular, Indústria 4.0 e TecnologiasdaSaúde.
Um crescimento que resulta de um trabalho diário em prol do
CADERNO TEMÁTICO CIÊNCIA E TECNOLOGIA
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Centro Infante Dom Henrique
desenvolvimento da região, em particular no que diz respeito às áreas da inovação, tecnologia e empreendedorismo e que pretende dar resposta à procura crescente das empresas pelo Alentejo.
Estas novas infraestruturas, que estarão concluídas em setembro de 2023, são caracterizadas por uma arquitetura moderna e uma pegada de carbononeutra
DE OLHOS POSTOS NO FUTURO
Neste contexto de crescimento do projeto PACT, surge uma nova identidade gráfica, lançada em setembro deste ano, a qual tem como objetivo refletir o “Novo Alentejo, mais tecnológico e inovador” que a entidade estádeterminadaaconstruir
Estanovaimagem,“maisforte e identitária”, “reflete a transformação do PACT ao longo dos
últimos anos, sem ser disruptiva com a herança da marca, mas estando alinhada com o nosso novo posicionamento e com o crescimento que queremos para o futuro”, refere Soumodip Sarkar, Presidente Executivo do PACT
CIÊNCIA E TECNOLOGIA CADERNO TEMÁTICO
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Vista dos novos edificios
Évora Experimental 2022
A Oficina do Espírito / Invencionarium, em co produção com a Câmara Municipal de Évora, realizou a 3 ª e d i ç ã o d a É v o r a Experimental EV.EX2022, que contou com o financiamento d a D G A r t e s e d a DRCAlentejo, o apoio do MNFMC Museu Nacional Frei Manuel do Cenáculo, Fundação INATEL, BPE Biblioteca Pública de Évora e a colaboração do Grupo Diário do Sul e da candidatura de Évora a Capital Europeia da Cultura 2027. Este programa de escritas poéticas e cruzamento disciplinar foi coordenado por Feliciano de Mira e teve como tema central a COMPAIXÃO
Entre as diferentes atividades destacamos a publicação de anúncios de poesia na imprensa local e a Global Multimedia Poetry Stands com curadoria de Rita M, que apresentou uma exposição de email-art com 135 trabalhos de 50 artistas de 24 países, apresentados no espaço públicodaPraçadoSertório.
A exposição Compaixão –Escritas Poligráficas, com curadoria de Feliciano de Mira e que decorreu no Salão Nobre do Palácio do Barrocal da Fundação INATEL. Participaram Hakou (Argélia), Almandrade e Caetano Dias (Brasil), Roberto Iglesias (Cuba), Enzo Patti (Itália)
Feliciano de Mira, Fernando Aguiar, António Barros, Isabel Murteira, Manuel Casa Branca, Jorge dos Reis ( Po r t u g a l ) , J o h n R i c h a r d McConnochie (Austrália), May Bery
(Canadá), Mahammad Shezado Majjed(Paquistão),Nieves Salvador (Espanha), Dona Mayoora (Índia) e RobinTomens(ReinoUnido).
Foram realizadas Oficinas de
CADERNO TEMÁTICO EVEX
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Artes Digitais dirigidas por Manuel Portela e de Escrita Criativa por Graça Capinha na BPE e no MNFMC, com a participação de mestrandos do Mestrado de Escrita Criativa da Faculdade de Letras da UniversidadeCoimbra.
A Videobox com curadoria de Ilda Teresa Castro, apresentou no MNFMC 17 videos realizados entre 2019 e 2021, com participações de realizadores de Portugal, Argentina, Brasil, Reino Unido, Holanda e Canadá.
A performance multimédia Bilhetes Postais realizou se no Palácio do Barrocal, uma concepção de Feliciano de Mira e a participação de Vitor Rua, Edgar Pêra, Bárbara do Canto Lagido, Helena Espvall e ElisabethWarmer.
A Evográfica decorreu na Biblioteca Pública de Évora com apresentação de livros editados em Portugal no ano de 2022, com ênfase na poesia experimental acompanhados de rodas de conversa com a presença de autores, organizadores e editores. Destacamos a apresentação de Em Questão: A Invenção organizado por Fernando Aguiar (Edição OE) reunindo os trabalhos de 16 poetas experimentais portugueses; a antologia de João Carlos Raposo Nunes Saíamos em Bandos
Disparando Brita, Prata, Fumos (Maldoror) com apresentação de Nuno Miguel Neves; o livro de Almeida e Sousa Poema Peixe Revolver| Revolver-Peixe-Poema (Arte Bruta), de Vitor Rua Eu só queria dizer o seguinte (9musas), de Miguel Carneiro XII (Oficina Arara) e de Sal Nunkachov Meia Palavra Basta comasediçõesPaperview
Na roda de conversa sobre A Edição no Espaço Público participou Mara Rosa em representação de António Cândido Franco (A IDEIARevista de Cultura Libertária), Eduardo M Raposo (Revista Memória Alentejana), Paulo Piçarra (Diário do Sul; A Sul) e Feliciano de Mira (Projeto ARO – Revista de PoesiaExperimental).
Assim criaram-se poéticas com vários sistemas de signos, materialidades e suportes, para suscitar outras tantas modalidades de reflexão, participação e cidadania, que contou com uma forte aderência de público, em conexão com o movimento contemporâneo internacionaldasescritasexperimentais.
QUANTUM
Esteve patente na Biblioteca Pública de Évora entre 24 de Setembro e 28 de Outubro a exposição Quantum de Feliciano de Mira.
Trata-se de uma exposição de poesia expandida, poesia de in(ter)venção e assemblage, assente na aplicação de uma ecologia dos processos criativos, que expressa uma inquietação metafísica:ondenasceoimpulso que se transforma em comunicação, através da linguagem poética dos sinais (palavra e imagem) ? Se em Física 1 quantum corresponde ao mínimo de qualquer grandeza, a invenção é a partícula mínima (elementar) de energia e matéria capaz de estruturar (entender e descrever), a natureza da ação criativa. Então o campo do rigor e precisão estáassociado à intuição, à criatividadeeàliberdadedecriação.
A partir da ideia de que as escritas experimentais são tão precisas quantum, apresentam-se trabalhos de poesia visual e assemblage em diversos suportes, que abordam temáticas da atualidade contemporânea. A linguagem destas escritas seguiu processos aplicados de acordo com certos métodos adquiridos por inventiva, persistindo em questionar uma sociedade carregada de inutilidades e desigualdades sociais gritantes, dando visibilidade às falas doinconformismo.
Feliciano de Mira Director da EVEX
EVEX CADERNO TEMÁTICO 28
Évora – Cidade de Cultura
A histórica CIDADE DE ÉVORA foi sempre reconhecida como lugar deCultura.
Ali viveram, nasceram ou estudaram grande número de figuras maiores na Literatura, nas Artes, na Ciência que são lembrados nos umbrais das ruas do Centro Histórico eborenseenaperiferiadedatamaisrecente.
A testemunhar essa Cultura a cidade maior do Alentejo tem a acrescentar a grande monumentalidade profana e religiosa das suas ruas e praças na beleza dos claustros da sua Universidade centenária, dos Museus valiosos que guardam grandes valores históricos; da sua prestigiada Biblioteca Pública; do seu Teatro — o Garcia de Resende — da memória recente do que foi o Instituto Superior – ISESE pela mão benemérita do Eng. Vasco Maria Eugénio de Almeida; da sua Escola de Música, desde a Sé de Évora atéaosdiasdehoje.
Nomes de grandes mestres que por aqui passaram tantos foram Europa fora brilhar em França, na Itália e outrassedesdeCultura.
Mais do nosso tempo recordemse as Sociedades Recreativas com os seus Grupos de Teatro Amador e depoisoacervodoCENDREV.
Mas para além da vida académica, as memórias lembram que na cidade de Évora, logo nos alvores da Tipografia, que melhor se chama de Imprensa por lá trabalharam grandes valores de Livreiros e impressores e nelas teria sido impresso o panfleto Manuelinho que em 1637 incitava o povo miúdo a livrar-se da tutela de Espanha.
Inúmeras foram as grandes obras impressas na cidade de Évora e espalhadas pelos Centros de Cultura europeus.
Évora não ficou para trás na sua Imprensa informadora dos que
procuraram na Leitura de Jornais as notíciasdoqueaoseuredoracontece
Por isso já antes da República ali se publicavam esses meios de cultura popular
Na 1.ª República foram inúmeros os títulos que eram impressos em Évora, alguns como diários de 4 páginas e à mercê dos seus interesses ideológicos, por isso de pouca duração.
No período do Estado Novo são já poucos os jornais da cidade valorizados pela publicação do Semanário da Igreja — A Defesa, que caminha para um século com notável percurso.
Sobreviveram o Jornal Notícias de Évora desde o ano 1900 passando por vários directores e editores até que se extinguiu nos anos 80. Registese que nas suas edições esse orgão de Imprensa trazia ao fundo da página o seufolhetimderomances.
Desde os anos 30 viera para Évora oJornal“DemocraciadoSul”queaqui passou para Almada mas não voltou a serpublicado.
Entretanto no final do ano 1957 surgiu em Évora um novo título:
Jornal de Évora semanário informativo que pouco tempo depois passou a Trissemanário com colaboração de cidadãos de diversa ideologia e que porissomotivouosleitores.
Após 10 anos passou a Diário do Sul que é o único diário do sul do País desde1969.
Refira-se, sobre a Cultura eborense que nos anos 50-60 publicaram-se ali as Revistas Literárias “Horizonte” e “D. Quixote” onde escreveram futuros nomes prestigiados da literatura contemporânea.
Actualmente em Évora publica-se na sua Imprensa o semanário “A Defesa” e o “Diário do Sul” e anualmente a revista Eborensia e a “Cidade de Évora” editada pelo Município publicaçõesdegrandecunhoCultural.
Uma palavra é devida à Direcção Regional de Cultura do Alentejo e ao Município eborense pela sua valiosa colaboração com os eventos culturais que honram a cidade de Évora que bem merece ser a Capital da Cultura de2027.
Manuel Madeira Piçarra Director do Diário do Sul
29 CADERNO TEMÁTICO IMPRENSA REGIONAL
Menires Alentejanos
1.MENIRES ALENTEJANOS: PARA UMA MEMÓRIA ALENTEJANA ANCESTRAL
Os menires são, provavelmente, o tema mais relevante da préhistória alentejana, sobretudo numa perspectiva sociocultural, mas também,indiscutivelmente,turística.
Essa relevância tem a ver, não só com a sua monumentalidade, uma vez que, tal como as antas, são obras impressionantes, implicando um enorme esforço colectivo, mas tambémcomasuararidaderelativa.
Na verdade, o megalitismo é um fenómeno quase global (embora com características que podem ser muito diversas de uma região para outra e com cronologias igualmente muito díspares), que atingiu, na fachada atlântica europeia, uma escala muito notável, tanto quanto à dimensão dos monumentos, como quanto à quantidade. Os menires alentejanos, por sua vez, estão entre os mais antigos, nocontextoeuropeu.
No Alentejo Central, região natural e administrativa que concentra uma densidade muito notável de monumentos megaliticos, conhecese hoje cerca de uma centena de sítios com menires ou conjuntos de menires,apardequaseummilharde antas (ou, usando uma terminologia maisinternacional,dólmenes).
Esta desproporção tem a ver, certamente, com a antiguidade relativa dos menires e com um notório crescimento demográfico, que se deduz também dos dados sobre o povoamento.
Esse aumento populacional foi o resultado da implementação do modo de vida agro-pastoril, a chamada "Revolução" neolítica, que veio substituir, mais ou menos gradualmente, uma economia assente na caça/pesca/marisqueio e recolecção, e que, na verdade, ultrapassou largamente a dimensão económica. Os menires foram erguidos no início desse processo, há cerca de 7000
anos, enquanto as antas começaram a ser construídas cerca de mil anos maistarde.
Convém observar que, enquanto as antas têm claramente uma função funerária (eram sepulturas colectivas), os menires são menos óbvios, no que diz respeito à funcionalidade, o que os torna naturalmente mais intrigantes...
Entre nós, a maior concentração destes monumentos localiza-se nos arredores de Évora, com um destaquemuitoespecialparaostrêsmaiores recintos meníricos peninsulares: Almendres, Portela de Mogos e Vale MariadoMeio.
2. COMO INTERPRETAR ESTES COLOSSOS?
Nas linhas que se seguem, tentarei, de forma muito resumida, apresentar algumas ideias sobre o(s) significado(s) dosmenires.
Antes, esclareço que, a meu ver, as pessoas que os ergueram eram
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CADERNO
Vale del Rei
RECINTOS MEGALÍTICOS
TEMÁTICO
gente como nós. Nem eram os brutos que alguma ficção inventou, nem os bons selvagens, imaginados por Rousseau.
Na verdade, eram os nossos antepassados e, em muitos aspectos, abriram caminho para o mundo que temoshoje.
Os menires eram monumentos públicos, obras que tal como os monumentosqueadornam asnossas cidades, pretendem evocar pessoas e/ou eventos importantes para a memóriaeaidentidadecolectivas.
Na verdade, eram estátuas, isto é, representações de entidades, concebidascombasenafigurahumana (antepassados, heróis, divindades...) e executadas de forma muito minimalista, que, de um modo ou de outro, pretendiam simbolizar as comunidadesqueosergueram.
Executados pelos primeiros grupos agro pastoris, funcionaram também como âncoras, reivindicando a propriedade sobre a terra. Símbolosdasedentarização.
O carácter antropomórfico é, nalguns casos, muito explicito, incluindo representação de elementos do rosto, ombros, cintura, por exemplo, ou objectos de adorno e armas. Outros, talvez a maioria, são totalmenteanicónicos.
As próprias formas como os menires se organizam espacialmente sugerem as cenografias dos diversos modos de relações entre as pessoas.
Vejamos:
1. Os menires isolados, evocando os antepassados comuns, numa lógica linhagística e identitária.
2. Os pares de menires, evocando a estrutura básica das relaçõessociais:ocasal.
3. Os alinhamentos pequenos, em parada, evocando a estrutura familiar nuclear: um casal comfilhos.
4. Os alinhamentos longos, organizados em fila indiana, sugerindo a comunidade ou
parte dela, tal como se dispõe nas partidas de caça ou na guerra,porexemplo.
5. Os cromeleques, organizados em hemiciclos ou ferraduras, reproduzindo a disposição dos humanos à volta da fogueira ou discutindo assuntos comuns, como nos parlamentosdetodoomundo.
6. E, finalmente, os círculos, sugerindo a dança ou outras práticaslúdicasoureligiosas.
Note-se, porém, que os modos de organização referidos nos pontos 3,4e6nãoforam,atéàdata,identificados entre os menires neolíticos alentejanos. Os alinhamentos pequenos, em fachada, são típicos da Vendeia, no SW francês, os grandes alinhamentos ocorrem sobretudo na Bretanha e os círculos são exclusivos dasIlhasBritânicas.
Mas os menires e conjuntos de menires encerram ainda outras
significações. O uso da pedra, remete metaforicamente, para uma certa noçãodeeternidade.
É razoável pensar que, na visão do mundo neolítica, as pedras e os astros eram os únicos seres que não estavamsujeitosàmorte.
Nesse sentido, talvez se entenda a relação, muito bem estabelecida em inúmeros casos, entre os monumentos e alguns eventos astronómicos elementares, relacionados com osolealua.
3. O QUE FAZER COM OS NOSSOS MENIRES?
Sendo fácil reconhecermos a importância destes testemunhos do nosso passado longínquo, coloca-se a questão de como devemos tratálos.
Em primeiro lugar, importa identificá-los e estudá-los. Conhecê-los, dentro do possível, tendo em conta que, por muito esforço que se faça
31 CADERNO TEMÁTICO RECINTOS MEGALÍTICOS
nesse sentido, haverá sempre algum mistério que fica. Como, aliás, emtudo.
Depois,importaprotegê-losevalorizá-los.
Nas últimas décadas, foi possível estudar e restaurar alguns destes monumentos, tendo em vista principalmente o respetivo potencialturístico.
A maior parte deles são hoje visitáveis, alguns integrados em circuitosdevisitação,comsinaléticasnoterreno.
Na Europa, alguns dos mais visitados, como Stonehenge, no sul de Inglaterra, ou Carnac, na Bretanha, foram vedados e, junto a eles, construídas estruturas interpretativas, disciplinando e
condicionando o acesso; a maior parte, porém, é visitável livremente e de forma gratuita
No caso do maior e mais conhecido dos nossos cromeleques, os Almendres, discutese, há tempos, se deve manter-se o acesso livre egratuitoousedevesercondicionado.
Naminhaopinião,etendoemcontaaexperiência de Stonehenge e de Carnac, deveria manter-seoacessolivreegratuito.
No primeiro caso, Stonehenge, depois de ter sido criado, nos anos setenta do século passado, um centro interpretativo adjacente, com entradas condicionadas, e após uma ampla discussão pública, foi decidido construir um novo centro a uma distância respeitável, com o objectivo de restituir o monumento ao seu contexto paisagístico, num projecto que custou cercade30milhõesdeeuros.
Em Carnac, um movimento de cidadãos, auto denominado Menhirs Libres, luta contra o sistema de entradas condicionadas (e pagas), exigindo a retirada das cercas e o regresso ao acessolivre.
A meu ver, uma das qualidades dos Almendres é o acesso livre e uma quase perfeita inserçãonapaisagem.
Assim, uma intervenção pertinente seria, sobretudo, retirar a vedação que envolve o reconto megalítico, afastando-a para uma distância razoável que permitisse ao visitante desfrutar melhor da envolvente paisagística que, na verdade, faz parte do próprio monumento.
Calado Arqueólogo (Cieba) texto e fotos
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Manuel
RECINTOS MEGALÍTICOS CADERNO TEMÁTICO
S. Sebastião, Tojal e Barrocal
Alentejo e Megalitismo: percursos de investigação e valorização
O Alentejo Central possui o maior conjunto de monumentos megalíticos da Península Ibérica, com diferentes tipologias e funcionalidades. No que ao mundo funerário diz respeito, o conjunto existente engloba monumentos que vão desde as arquiteturas mais simples, as denominadas sepulturas protomegalíticas, até aos monumentos mais complexos, as grandes antas com corredores médios a longos a que se adossam, por vezes, outras estruturas tumulares, como os de falsa cúpula.
Ao observarmos a sua disposição na paisagem percebemos que a sua localização, sobretudo ao longo das linhas de água, em cotas medianas, foi deliberadamente escolhida pelas populações que habitaram este território entre, pelo menos, 6000 a 4000anos. Pese embora esta constatação, que resulta da leitura dos conjuntos ainda conservados, não nos podemos esquecer que existem alguns problemas nesta análise, nomeadamente as destruições que
muitos monumentos sofreram nos milénios posteriores à sua construção, que nos impedirão, sempre, de saber com que percentagem estamos atualmente a trabalhar, quer em termos de números, quer de tipologiasdearquiteturas.
Ao contrário de outros países europeus, como a França ou a Inglaterra, não temos muitas fontes documentais antigas sobre o nosso megalitismo. As primeiras referências, isoladas,surgemnoséc.XVe,posteriormente no séc. XVIII, no âmbito dos inquéritos realizados aos párocos de todo o reino (Memórias Paroquiais de 1758), mandados realizar pelo Cardeal D. Henrique pelo que, até aos finais do séc. XIX possuímos apenas informação compilada de forma dispersa, pontual e sem intuitos científicos (Pereira, 1887; Fabião, 1999). A primeira metade do séc. XX marca uma viragem neste domínio, com a realização de inúmeros trabalhos de inventariação e escavação no Alentejo Central, de que Vergílio Correia, Manuel Heleno e o
casal Leisner são os exemplos mais paradigmáticos (Correia, 1921; Leisner e Leisner, 1959, 1985; Rocha, 1999, 2005, 2009/2010). Estes investigadores acabaram por intervencionar mais de meio milhar de monumentos megalíticos funerários, desde as sepulturas protomegalíticas às grandes antas de corredor. Comparativamente,asegundametade do séc. XX e primeiras décadas do séc. XXI tem sido manifestamente menos profusa, em relação ao número de escavações realizadas, mas, no global, mais minuciosa e metódica, pelo que acabamos por obtermaisdadoscientíficos.
Em termos gerias, quando examinamos a questão numa perspetiva turística, o Património visitável no Alentejo Central, excluindo o que se encontra em área urbana, é maioritariamente constituído pelo conjunto megalítico, disperso por uma paisagem mais ou menos natural. Mas, apesar do elevado número de monumentos existente neste território, quando analisamos a questão
CADERNO TEMÁTICO MEGALITISMO FUNERÁRIO
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Sepultura Proto Megalítica da Têra (Mora) e Anta Capela de S. Brissos (Montemor o-Novo). Fotos da autora.
sob o ponto de vista da valorização e fruição cultural verificamos que estamos muito aquém dos nossos colegas europeus Pese embora existirem monumentos, que se encontram assinalados nas principais vias rodoviárias, as condições de acesso, muitas vezes por caminhos rurais, possuem problemas graves a nível do pavimento e estacionamento, em muitos não existe sinalética informativa ou esta pode estar, mais ou menos, degradada devido a fenómenos atmosféricos (calor e fungos/líquenes) ou biológicos, provocados por animais. Neste domínio constitui exceção o conjunto megalítico da Herdade das Murteiras, da Fundação Eugénio D`Almeida, de fácil e livre acesso. Efetivamente, tem existido por parte da fundação um esforço para substituir, periodicamente, não só a sinalética e painéis informativos, mas também, o mobiliário (bancos) dispersos pelos percursos.
Os monumentos que poderiam ser efetivamente mais emblemáticos
do megalitismo alentejano, como a Anta Grande do Zambujeiro e o Recinto Megalítico dos Almendres, localizados no coração do Alentejo Central, apresentam problemas de conservação, valorização e fruição que ainda não se conseguiram resolver – mais graves no caso da Anta GrandedoZambujeiro.
O património megalítico, enquanto fonte de conhecimento e testemunho material das sociedades do passado, adquire especial relevo no âmbito do denominado Turismo Cultural, que tem crescido exponencialmente na última década. Contudo, a sua disponibilização, enquanto elemento passível de usufruto coletivo, não pode ser desassociada da responsabilidade assumida pelas entidades tutelares no seu estudo, preservaçãoedivulgação.
Leonor Rocha Docente Universidade de Évora/ Departamento de História. Investigadora CEAACP/ UALgUIBD/ ARQ/ 0281/ 2020 - FCT
BIBLIOGRAFIA:
CORREIA, V. (1921) - El Neolítico de Pavia. Madrid: Museo Nacional de Ciencias Naturales.
LEISNER, G. y LEISNER, V. (1959)D i e M e g a l i t h g r ä b e r d e r Iberischen Halbinsel: Der Westen 2,Berlin.
LEISNER, G. y LEISNER, V (1985)Antas do Concelho de Reguengos deMonsaraz.Lisboa.
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ROCHA, L. (2009/2010) – As origens do megalitismo funerário alentejano. Revisitando Manuel Heleno. Promontoria. 7/8. Universidade do Algarve.
FUNERÁRIO CADERNO TEMÁTICO
MEGALITISMO
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Anta de Barbacena (Elvas) e Anta Capela e Pavia (Mora). Fotos da autora.
Cultivar a Arqueologia Pública no Alentejo
O Alentejo, com o seu inegável potencial natural, favorável à ocupação humana, encerra uma História milenar e uma vasta cultura material. O megalitismo, sendo uma criação de humanos distantes no tempo e sem registo escrito, tem inspirado as mais diversas interpretações e estórias presentes, ainda hoje, no léxico popular. O seu estudo tem trazido, à luz do dia, aspectos do quotidiano dos primeiros alentejanos, pastores e agricultores, a prosperarem nas nossas planícies e serras, criando estapaisagemfeitadefloresta,terrenos agro-pecuários e pedras grandes que ainda hoje nos rodeia, protege, alimenta e apaixona. É importante, portanto, falar sobre eles e perceber como contribuíram para o nosso presente. Como lá chegamos? Atravésdainvestigaçãoarqueológica.
Foi em Montemor o-Novo, nas Jornadas de Património, que ouvi, pela primeira vez, pela voz de Manuel Calado, as duas palavras mágicas, que ditariam o meu futuro: ArqueologiaPública.
Embora a maioria das pessoas com quem me cruzo refira que consideraaarqueologiaumaprofissãointeressante ou que até sonhou, em tem-
pos, exercê la, a verdade é que existe, apesar dos esforços de grandes arqueólogosehistoriadores,umgrande abismo entre os investigadores e o público em geral. É este abismo que motiva grande parte da indiferença, abandono, vandalismo e falta de investimentononossopatrimónio.
A arqueologia pública evoluiu no sentido de criar pontes que eliminem este abismo. É uma arqueologia que se foca no envolvimento das comunidades na produção e divulgação do conhecimento arqueológico. Utilizando diferentes ferramentas, como conferências, social media, programas educativos, arqueologia experimental, turismo cultural, entre outras, um arqueólogo público pode potenciar uma melhor comunicação e educação para o património, criar sinergias que motivem a preservação do património e, essencialmente,promovamumamelhorcompreensão e relação do público em geralcomasuahistória.
O turismo cultural é a minha casa e os monumentos o pretexto para discutir temáticas da história, da cultura e comportamentos humanos, tentando sempre estabelecer ligações com o presente, incluindo os
visitantes no processo narrativo, plantando pequenas sementes de curiosidade, reflexão e civismo. Se alguma dessas sementes germinar, teremoscontribuídoparaumacomunidade informada, que se conhece no passado e no presente, e que consegue, criticamente, melhorar se para o futuro. É neste futuro que nos focamos, o futuro da História como motordedesenvolvimentopessoale cívico e de preservação dos monumentos e sítios que nos propiciam a conexãocomopassado.
Mais recentemente, integrei a equipa da Ebora Megalithica. Uma empresa fundada pelo arqueólogo Mário Carvalho, com mais de uma década de experiência em arqueologia pública. Através dos programas educativo, de arqueologia experimental e de turismo arqueológico, os clientes curiosos são desafiados a pensar sobre si, os seus antepassados e o seu contributo para um mundomaisjusto.
Estes monumentos milenares aguardam a vossa visita! Fica o desafio.
Sira Camacho Arqueóloga
TEMÁTICO EBORA MEGALITHICA 35
CADERNO
ANA PAULA AMENDOEIRA
Directora Regional de Cultura do Alentejo
“Todos os que atribuem relevância à cultura e ao património são parte da nossa missão”
Memória Alentejana Senhora Directora, gostaríamos de saber quais são as áreas centrais da missão da DRCAlentejo e como é que esta missão se desenvolve.
Paula Amendoeira,
pelos agentes culturais, entidades locais e da região. Com uma vasta experiência e um extraordinário percurso, seja na Administração Local, no ensino, na presidência do Conselho Internacional de Monumentos e Sítios (ICOMOS) em Portugal, no ensino superior ou na investigação – Grupo de Ciências do Património do Ciências do Património do Centro de Estudos em Arqueologia, Artes e Ciências do Património (CEAACP) da Universidade de Coimbra, onde foi assistente convidada da Faculdade de Letras na área da Gestão do Património. Mestre em Recuperação do Património Arquitectónico e Paisagístico pela Universidade de Évora. É a pessoa certa no lugar certo!
Ana Paula Amendoeira - As áreas centrais da acção da DRCAlentejo são a salvaguarda do património cultural classificado, a identificação, valorização e proteção dos vários patrimónios, o apoio a Museus (aqui sublinho o Museu Regional em Beja o único que está na tutela da DRC e que é um Museu importantíssimoparaaregiãopelasuahistória, valor patrimonial e do espantoso acervo que possui) , o apoio aos agentes culturais não profissionais e ao movimento associativo, o acompanhamento das estruturas apoiadas pela DGARTES na região, o apoio à edição, a criação de condições de acesso aos bens culturais em todas as suas dimensões, a cooperação transfronteiriça na área da cultura e do património, as parcerias com os organismos instituições e movimento associativo em prol de projetos no domínio da cultura e do património, a criação de condições para processos criativos e de nicho no domínio da criação cultural, a criação de condições para a valorização do conhecimento associado às ciências do património, a promoção de condições para o pensamento crítico e para a democracia cultural no quadro da Carta de Porto Santo. O nosso trabalho desenvolve-se com muitas dificuldades, mas com todos! Sempre em parceria e forte colaboração com os Municípios, as Juntas de Freguesia, a CCDRA, as variadíssimas associações, os Artistas, os criadores culturais, as Empresas, as instituições de EnsinoSuperioreosCentrosdeInvestigação, os Agrupamentos de Escolas, as Misericórdias, as Paróquias e Dioceses, a
GRANDE ENTREVISTA CADERNO TEMÁTICO
“Ter o privilégio de nascer, viver e trabalhar no Alentejo é uma bênção”
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Ana
desde que em 2013 tomou posse como Directora Regional de Cultural do Alentejo (DRCAlentejo) tem vindo a realizar um trabalho de excelência, unanimemente louvado
Entidade Regional de Turismo e os empresários do sector, as Fundações, os organismos congéneres da administração desconcentrada do Estado e as pessoas em contexto não formal, todos os que atribuem relevância à cultura e ao património no Alentejo. Todos são parte da nossamissão.
“O Alentejo e a Cultura são o alfobre em que sempre me construi”
Se lhe fosse pedido, que balanço faria do enorme trabalho realizado desde 2013: projectos concretizados, que dificuldades, desafios… Cabe a todos, menos a mim, fazer esse balanço do trabalho realizado até agora e das suas dificuldades, frustrações e sucessos, no que respeita a resultados para a região. Só posso dizer no que respeita à minha experiência pessoal no desempenho deste cargo, o balanço, pessoal (sublinho), é extraordinariamente positivo pelo que me foi dado viver e aprender ao longo destes anos com todas as pessoas nesta nossa Terra. Tem sido uma aventura luminosa, de um enriquecimento espantoso! Não trocava por nada, é uma realização plena. O Alentejo e a Cultura são o alfobre em que sempre me construi no que há de mais essencial em mim. Eu não separo a vida em gavetas. Para mim não há vida pessoal, profissional, etc. Há vida! E ter o privilégio de nascer e viver e trabalhar no Alentejo é mesmo uma bênção que eu sempre heideagradeceràVida.
É comumente aceite pelas entidades e agentes locais da região que a Ana Paula é uma aliada natural, uma Amiga, pois é incansável não apenas nos programas estruturais, mas também noutras mais pontuais realizadas até pela sociedade civil em que está presente ou quando não lhe é possível, faz-se, por norma, representar por Técnicos(as) da DRCAlentejo.
Quer-nos falar de como tem sido a relação da DRCA com as outras entidades - públicas e privadascomo o Turismo do Alentejo e Ribatejo, as câmaras municipais,
juntas de freguesia, a Igreja, mas também a sociedade civil, sejam as associações, os agentes locais, os empresários…
“A Cultura é a vida das pessoas (…) temos de passar essa mensagem e transportar a nossa gota de água para o grande lago”
Tal como referi nas respostas anteriores, eu encaro este trabalho como um serviço. Portanto eu estou aqui desde o primeiro dia para servir a região em tudo o que puder, muito para além do que diz o decreto que cria as Direcções Regionais de Cultura. E esse serviço é essencialmente para os outros e não para me focar particularmente na burocracia administrativa interna que se nós deixarmos nos pode ocupar a melhor fatia do nosso tempo. Sempre recusei isso. A Cultura é a vida das pessoas, de todos nós, uma vida melhor, mais consciente e emancipada não é possível sem a cultura, temos que trabalhar para isso, para passar essa mensagem e transportar a nossa gota de água para o grande lago. Temos que servir todos, escutar todos e contar com todos. É uma Missão. A inclusão não é uma palavra apenas para os documentos e programas, ela é central nos nossos dias. Essa é uma maneira de ver e de viver que cultivo porque acredito efectivamente nassuasenormesvirtualidadesaltruistas.
A nossa relação com as instituições, organismos e associações/entidades que refere tem sido fundamental, essencial para o cumprimento da nossa missão. Há muitas dificuldades, muitas. E muitas delas ultrapassam-se justamente porque há trabalho em conjunto. De contrário não conseguiríamos nada. É preciso contar com todos, para além obviamente dos dirigentes e responsáveis de topo com quem temos excelentes relações, os técnicos, todos os trabalhadores destas instituições (também obviamente os da DRC): a sua disponibilidade para colaborar e ajudar a ultrapassar dificuldades tem sido também fundamental porque quando se fecham umas portas podem sempre abrir-se outras. Nunca podemos baixar os braços ou desistir. Neste trabalho a resistência é essencial. É uma corridadefundo.
O Alentejo tem uma paisagem cultural com características únicas a nível nacional, europeu e até mundial, até pela dimensão do território muito heterogéneo, mas com escassa densidade populacional. Este é um aspecto em progressiva valorização.
As autoridades centrais, as autarquias alentejanas e o cidadão comum têm consciência clara do valor cultural, geográfico e até ambiental que o Alentejo tem? O que nos gostaria de dizer sobre a patrimonialização da paisagem no Alentejo? Qual o espaço da museologia neste contexto?
“Uma educação cidadã, espírito crítico para a promoção da democracia cultural”
“A paisagem e o ordenamento do território são assuntos públicos”
“A agricultura está intimamente ligada ao património arqueológico na nossa região”
“O património não é um 'dano colateral' do desenvolvimento do Alentejo”
A região do Alentejo é de facto extraordinária na sua dimensão cultural, no sentido mais abrangente do termo que inclui obviamente o território, a paisagem (que é por definição cultural), o urbanismo, as formasde ocupaçãoe exploraçãoda terra e todo o conhecimento e património comum que dai resulta ao longo de séculos e até milénios de ocupação urbana e de prática da agricultura nesta nossa terra.É precisolutarparaumatomadade consciência sobre a relevância que este legado encerra, não numa perspectiva de patrimonialização mas ao contrário, numa perspectiva justamente de construção do futuro em que esta herança e este conhecimento são vida e não passado apenas. Portanto é a meu ver muito importante que trabalhemos todos os dias para dar visibilidade pública e promover uma educação cidadã, espírito crítico para a promoção da democracia cultural como referia há pouco. Há sim
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muito a fazer. Vivemos tempos, até pela geopolítica que condiciona muito do nosso pensamento, em que a superficialidade no tratamento dos assuntos profundoséporvezesmesmoassustadora.Énos tempos mais difíceis que é necessário continuara trabalharno que acreditamos ser de interesse geral e público. A paisagem e o ordenamento do território são assuntos públicos sim. O interesse público deve sobrepor-se sempre ao privado e este ao individual. Esta é uma das bases da construção das sociedades inclusivas, integradoras, equitativas, coesas e solidárias. Este é o princípio da vida boa tal como ela é filosoficamente definida. Cair na esparrela do imediatismo dos ciclos curtos ou mesmo curtíssimos cuja hegemonia nos leva por vezes a destruir riquezas de todos e do planeta, é algo de que provavelmente nos iremos arrepender e lamentar daqui a alguns anos tal como já nos tem acontecido. Portanto defenderemos sempre esta perspectiva que é de resto a que está na base da nossa lei do Património Cultural. Lembro que a agricultura está histórica e intimamente ligada ao património arqueológico na nossa região. É a agricultura que historicamente está na base das sociedades mais sedentárias o que permite a construção de património perene que chegou até nós atravessando milénios, como é o caso dos monumentos megalíticos por exemplo. Porque temos agora que os destruir em nome de uma agricultura cega que por vezes não honra sequer a sua história? A vida ensina-nos que podemos conciliar tantas coisas respeitando o que é de todos, se quisermos. Nós queremos, e trabalhamospara essa sensibilização todos os dias. Todos temos que dar uma parte da nossa vida e da nossa acção paraoTodo.Comasactividadeseconómicas não deve ser diferente. A visão europeia é cada vez mais neste sentido de pôr tudo no prato das várias balanças para que haja cada vez menos os chamados “danos colaterais” nos nossos processos de desenvolvimento. Lutamos para que o património não seja um “dano colateral” do desenvolvimento do Alentejo como tem acontecido demasiadas vezes nos últimos anos sobretudo no que respeita à destruição de património em contexto de práticasagrícolas,masnãoapenas.
“A classificação do Megalitismo Alentejano foi uma decisão que muito orgulho”
“A classificação do Megalitismo Alentejano foi o maior processo desde a 1ª República!”
Referiu há algum tempo em declarações ao Sul Informação, que o Megalitismo Alentejano é uma "arma" da Direção Regional de Cultura do Alentejo contra ameaças ao património, especialmente em contextos de práticas agrícolas intensivas”. Como está neste momento a situação, já que classificar mais de 2.000 monumentos deve exigir um esforço gigantesco? É um esforço gigantesco sim, obrigada pelapergunta!
A iniciativa e a decisão de avançar para uma proposta de classificação do Megalitismo Alentejano foi uma das que mais me orgulho de ter tomado em toda a minha vida e não apenas no desempenho deste cargo. Trata-se de uma decisão corajosa não tenho medo da imodéstia que possa parecer ter esta afirmação. Porque não é uma coragem minha. É de todos os que me têm acompanhado nesta empresa, que conta com alguns anticorpos. Tenho que agradecer aqui à Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, Unidade de Arqueologia, Professores Vitor S. Gonçalves, Ana Catarina Sousa, Paulo Pereira, aos investigadores e arqueólogos Daniel Von Calker, Samuel Melro (e a todos os colega da DRC), à DGPC e a todos os seus técnicos empenhados neste processo, a todos os Municípios do Alentejo e da Lezíria do Tejo e aos seus arqueólogos que connosco têm colaborado para preparar este MEGA processo como carinhosamente o designamos. Trata-se da proposta de classificação de cerca de 2000 monumentos em toda a região que fazem parte deste fenómeno histórico e cultural designado por Megalitismo e que como atrás referi está intimamente ligado ao fenómeno da agricultura e da sedentarização das sociedadehumanaspré-históricas.Éesta sedentarização que permite o tempo e os meios para construir estes grandes e duradouros monumentos destinados na
sua maior parte a práticas funerárias ou de carater magico-religioso com forte ligação à natureza e aos seus mitos. Temos tido infelizmente muitas destruições destes monumentos em contexto de práticas agrícolas como atrás referi. Foi sobretudo a consciência de que muitos destes monumentos não estavam classificados e por isso ainda mais ameaçados que nos motivou a avançarmos com esta proposta de protecção através da classificação de um conjunto relevantíssimo do património do Alentejo de importância internacional. Esta classificação foi por mim simbolicamente proposta ao Conselho Nacional de Cultura com uma declaração de fundo pedindo a excepcionalidade de decisão para um processo excepcional que reage a uma onda de destruição do nosso património. Este processo foi entregue depois de um trabalho hercúleo feito por todos os que referi e neste momento aguardamos despacho da DGPC que esperamos positivo. Trata-se do maior processo de classificação desde a 1ª República! Isso é algo de que muito nosorgulhamos. Muito outro património no Alentejo merece processo desta natureza, desde logo o património rural do período romano mas não podemos fazer tudo, não temos meios e aqui tivemos um parceiro excepcional a Faculdade de Letras de Lisboa que nos permitiu avançar em tão ambiciosoprojeto.
No que concerne ao Turismo Cultural quais as acções de divulgação do património em que as populações locais são utilizadores: há uma interacção e uma adesão participativa?
Outro aspecto: a questão da mobilidade ou seu défice, das acessibilidades rodoferroviárias e aéreas. Que conexões se podem estabelecer com a Cultura, com a paisagem cultural, as deficientes redes viárias – em tempo de viagem está-se mais longe de Lisboa a Cuba ou à Vidigueira do que a Badajoz; Beja continua sem ter comboio digno e o aeroporto é um “elefantebranco”. Que consequências para a paisagem cultural alentejana têm estas realidades? Que benefícios ou
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malefícios poderão trazer à paisagem alentejana e ao seu património a provável construção de gasodutos e outras estruturas que poderão vir a atravessar grande parte do Alentejo devido à crise energética, com a aposta no terminal portuário de Sines para fornecer energia à Europa. Que implicações poderão daí resultar?
“Cultura e o património deixem de ser vistos como uma oportunidade”
Penso que é necessário que a Cultura e o património deixem de ser vistos no contexto das grandes obras públicas de infraestruturação da região apenas como um problema (como quase sempre acontece) mas também como uma oportunidade. Porque essa visão de princípio é a que faz ou pode fazer toda a diferença. Lembro sempre o processo de construção da Barragem de Alqueva que encarou efectivamente o processo também como uma oportunidade, permitiu por isso que se realizasse o maior investimento público de sempre na arqueologia
em Portugal e que através dele se produzisse conhecimento importantíssimo sobre o nosso território. E depende também do que se pretende como modelo de desenvolvimento e de crescimento infinito das regiões e das suas economias. Esse pode não ser necessariamente o guião que sempre temos que seguir. A palavra conservação não deve ter do meu ponto de vista uma conotação retrógrada ou de retrocesso, ao contrário. Hoje em dia querer conservar valores, sejam eles de ordem material ou imaterial, é quase revolucionário, paradoxalmente. Como dizia Picasso, nada é mais contemporâneo do que a tradição porque esta encerra em si o conhecimento e as competências que precisamos para construir o futurodeformaharmoniosa.
“Parceria com a Associação de Surdos para os nossos monumentos serem inclusivos e acessíveis a todos”
Ainda no que concerne às acessibilidades, mas noutra perspectiva: qual o papel da DRCAlentejo na
acessibilidade à cultura, nomeadamente a cultura popular?
Temos várias parcerias e protocolos com várias entidades no sentido de criarmos condições de acesso, conhecimento, fruição e transmissão da nossa cultura popular Destaco por exemplo o Museu do Cante em Serpa, o apoio aos vários projetos do cante nas escolas, as variadíssimas parcerias editoriais neste domínio, o apoio a práticas culturais muito identitárias como é, por exemplo, o caso da cultura e da língua em Barrancos e da sua transmissão, os variadíssimos apoios a projetos de música popular de que destaco o relativo à viola campaniça e cante ao baldão ou o auto da Trindade em Beja, por exemplo, a colaboração com a cátedra do Património Imaterial e Saber fazer tradicional da Universidade de Évora, o programa nacional do saber fazer tradicional que elegeu o Alentejo como região piloto e no qual estamos a trabalhar também com a DGPC. Destaco ainda o apoio ao teatro popular e ao movimento filarmónico da nossa região com apoio a muitos projetos de Bandas filarmónicas e Federação de Bandas do Alto Alentejo e
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ao importante projeto neste domínio a nascer no município de Arraiolos para a freguesia do Vimieiro, Seria fastidioso enumerar todos os processos em que estamos envolvidos também neste domínio mas destaquei alguns entre muitos outros também as parcerias com juntas de freguesia e misericórdias para a recuperaçãodoseupatrimóniocultural. Gostavaaindadesublinharnodomínioda acessibilidade do trabalho que temos feito em parcerias com a Portugal Accessible e outros parceiros como a CIMAC, a ERTA e o Município de Évora, Montemor e com a Associação de Surdos para tornar os nossos monumentos mais inclusivos e acessíveis a todos nomeadamente no que respeita aos projetos já concluídos para o Templo Romano de Évora, Gruta do Escoural, Coleção Flores João Cutileiro, CasadeBurgos.
“A DRC está muito empenhado em todas as candidatura à UNESCO”
Relativamente aos bens patrimoniais reconhecidos pela UNESCO como Património da Humanidade: Cante, Arte Chocalheira, Bonecos de Estremoz, quais as acções de salvaguarda em curso ou previstas? E noutras em preparação como é o caso do Montado ou do Vinho da Talha, que papel tem desempenhado a DRCA? E há outras previstas, ou que poderão vir a ser candidatáveis como o Endovélico ou outras de cariz profano – banhos de Agosto, calendário cíclicofestivo, etc?
A DRC tem participado de forma muito próxima e empenhada em todos os processos de candidatura à UNESCO no que respeita ao património cultural imaterial Tivemos a mais recente inscrição nas Festas do Povo de Campo Maior além dos referidos na pergunta Temos ainda a Dieta Mediterrânica onde participamos activamente no grupo de trabalho interdisciplinar e interinstitucional ou a nossa participação no processo de inscrição do Vinho da Talha numa parceria muito alargada sob liderança do Município da Vidigueira Sobre a candidatura do Montado sob liderança da Entidade Regional de Turismo creio que
não haverá condições para avançar dada a grande complexidade que encerra Temos apenas um caso que está inscrito na lista da UNESCO de património a necessitar de salvaguarda urgente (arte chocalheira), candidatura também liderada pela Entidade Regional de Turismo do Alentejo e onde há muito trabalho a fazer para recuperar este conhecimento este saber fazer e a sua transmissão e ligação à paisagem histórica do Alentejo, às paisagens sonoras. Os Bonecos de Estremoz têm tido uma excelente aplicação sistemática do plano de salvaguarda aprovado pela UNESCO com resultados muito positivos e muito animadores para o futuro destepatrimónio
“O contributo de todos os projetos é essencial para a coesão das nossas comunidades”
A música que se faz no Alentejo: desde os projectos mais inovadores até ao Cante – ou este com novas “roupagens” - às filarmónicas, às artes plásticas, artes performativas, teatro, qual a sua importância e (contributo para a) coesão social?
A importância da criação e da cultura que se faz na região hoje é total! Numa região com tão baixa densidade populacional é preciso regar as vontades de continuar a trabalhar ou de começar de novo projetos culturais na nossa região Apoiamos todos e há muitos que felizmente têm surgido na nossa região. Refiro a título de exemplo estruturas tão diferentes mas tão relevantes como o Museu de Arte Contemporânea de Elvas (coleção António Cachola) o único a Sul do Tejo, projetos como o Cortéx Frontal (Arraiolos), a coleção Marin Gaspar e a Intermeada (Alvito) os encontros de Alvito, os Bonecos de Santo Aleixo e todo o teatro popular que se faz na região, a BAAL 17 a Lendias d'Encantar, o CENDREV, o Teatro do Mar, o Espaço do Tempo e todo o trabalho do coreógrafo Rui Horta, as Oficinas do Convento, o projeto Futurama em alguns concelhos do Baixo Alentejo(Beja, Castro Verde, Mértola e Serpa) o Festival Terras Sem Sombra, o Festival de Música de Marvão
(que apoiamos no âmbito do orçamento participativo para a cultura), os encontros e master class de música no contexto do movimento Filarmónico e a sua relevância na formação musical em contexto não formal com forte penetração em toda a região, todo o trabalho da Escola de Artes da Universidade de Évora (artes cénicas, música, arquitectura, audiovisual, escultura, os festivais de músicas do mundo com particular destaque para o de Sines que está na origem de outros de menor dimensão na região mas muito relevantes, os encontros da canção de protesto em Grândola, o FITA, o Festival do Crato, o centro de artes de Ponte de Sôr, o Artes à Rua em Évora, as feiras históricas e tradicionais muito importantes para a economia cultural da região no que respeita aos produtos endógenos como a Feira de Castro, Feira do Queijo, Festa da Vinha e do Vinho, Feira dos Santos, FIAPE, Santiagro, PIMAL, o projeto AGIF que desenvolvemos no Gavião, as visitas ao património que a DRC promove em todo o Alentejo, o conjunto de museus municipais da região que é muito relevante. Os projetos de associações privadas ou de fundações como a Eugénio de Almeida e Casa de Bragança, a programação cultural de iniciativa privada independente como é o caso do Armazém 8. A Biblioteca Pública de Évora (a mais antiga do país e a única na tutela da Biblioteca Nacional), O Museu Nacional Frei Manuel do Cenáculo em Évora e o Museu Regional Rainha Dona Leonor em Beja são instituições absolutamente essenciais que têm na sua origem uma figura comum Frei Manuel do Cenáculo Vilas Boas Destaco aqui o Museu Rainha Dona Leonor que passou para a tutela da DRCAlentejo após o que tratámos do provimento do lugar de Director do Museu (no caso a Diretora, Deolinda Tavares) e conseguimos captar investimentos de cerca de 4 milhões de euros para a requalificação quer de obra de conservação e restauro do edifício, digitalização das coleções, produção de visita virtual e instalação de wi fi. Estas intervenções têm financiamento comunitário no quadro do Alentejo 2020 via Município de Beja com comparticipação da DRCAlentejo com o importante apoio
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da Associação Portas do Território e do PRR, viaDRCAlentejo Refiro como é óbvio alguns dos muitos exemplos que temos de projetos criativos e catalisadores de vontades e de acolhimento de equipas de artistas das mais diversas proveniências o que é muito enriquecedor para a nossa região. Muitos projetos até editoriais foram selecionados no âmbito do programa Magalhães para as chamadas indústrias culturais e criativas (artériaLab).
O contributo de todos os projetos não apenas os que citei (não consigo citar todos) é essencial para a coesão das nossas comunidades E tão importante é um pequeníssimo projeto numa aldeia como a Trindade ou um festival internacional de grande implantação Todos precisam da nossa atenção mas os pequenos precisam muito mais Porque a coesão não se faz de cima para baixo mas de baixo para cima, escutando e apoiando as pequenas flores que insistem em continuar apesar da terra seca. São as chamadas plantas pioneiras em linguagem agronómica
“O nosso património cultural é um pilar essencial para o futuro do Alentejo”
Queria por fim referir que a DRCAlentejo encomendou o estudo para a estratégia da Cultura no Alentejo, esse estudo foi realizado pelo OPAC (Observatório Português de Actividades Culturais) e apresentado publicamente na CCDR em julho de 2022 e entregue também à CCDR no âmbito e como contributo para o PO Regional 2030 e o papel da Cultura e do património na estratégia regional. No seguimento desse estudo foi também entregue à CCDR as prioridades de investimento na recuperação patrimonial da região através da elaboração da carta
de Risco que a DRCAlentejo realizou com o apoio dos municípios e temos muita expectativa que esse seja também um contributo para a construção de mais e melhor coesão social no Alentejo no próximo quadro de financiamento comunitário. O nosso património cultural é, deve ser, um pilar essencial para o futuro do Alentejo onde poderá dar um essencial contributo para as dimensões da economia circular, da adaptação às alterações climáticas, do programa Novo Bauhaus Europeu onde o conhecimento tradicional e a sua actualização através da produção e transferência de conhecimento é donossopontodevistaessencial.
Qual o apoio que tem vindo a ser dispensado à divulgação e edição de trabalhos científicos, literários e outros sobre o Alentejo/ de autores alentejanos?
Temos provavelmente neste domínio a nossa maior e mais sistemática dimensão de apoios financeiros. Creio que é justo reconhecer o grande contributo que temos dado para que seja possível publicar e divulgar tanto do conhecimento que tem sido produzido na e sobre a nossa região. Em todos os domínios. Trata-se de larguíssimas dezenas de edições apoiadas pela DRCAlentejo ao longo dos últi-
mos anos. É também uma linha de intervenção de que muito nos orgulhamos.
“O CEDA e a Memória Alentejana são talvez o melhor projeto de coesão entre a diáspora do Alentejo e a região”
“O CEDA e a Revista Memória Alentejana são um parceiro seguro e de confiança na qualidade e persistência do trabalho”
Como vê a acção do CEDA - Centro de Estudos Documentais do Alentejo Memória Colectiva e Cidadania? E o papel da Revista Memória Alentejana na salvaguarda da identidade?
Considero o CEDA e a Revista Memória Alentejana talvez o melhor projeto de coesão do que consideramos ser a diáspora do Alentejo e a ligação com a sua região histórica. Para além de muitos outros projetos e serviços que tem prestado à cultura e à identidade do Alentejo, esta dimensão é no meu ver absolutamente essencial e a par com o papel da Casa do Alentejo (de formas diferentes) é uma entidade que muito honra o Alentejo e os Alentejanos estejam eles onde estiverem A DRCAlentejo tem sempre tido no CEDA e na Revista Memória Alentejana um parceiro seguro e de confiança na qualidade e persistência do trabalho realizado ao longo dos anos e por isso tem apoiado também sempre, na medida das suas possibilidades, os projetos sobretudo editoriais mas não só, que muito contribuirão sem dúvida para a memória e a identidade do Alentejo, a terra do nosso coração Muitoobrigada!
Entrevista de Eduardo M. Raposo com José Alex Gandum
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Montemor-o-Novo MEGALITISMO
Olímpio Galvão é Presidente da Câmara Municipal de Montemor-o-Novo desde Outubro de 2021. Com 50 anos, nascido e residente em Montemor-oNovo, Olímpio Galvão é formado em Economia pela Universidade de Évora, Contabilista Certificado, e tem estado sempre ligado ao Alentejo, em particular ao concelho de Montemor-o-Novo, onde foi Vereador na Câmara Municipal, antes de chegar à Presidência. Em entrevista à Memória Alentejana faz uma análise das potencialidades do concelho que dirige, destacando o privilégio da sua localização, a sua história de mais de oito séculos, a riqueza natural, cultural e patrimonial, apontando soluções para alguns dos problemas que atingem o segundo concelho mais populoso do distrito de Évora, tendo em vista a melhoria de qualidade de vida dos montemorenses e para que Montemoro-Novo seja um território de referência e de desenvolvimento nas suas diversas valências.
Memória Alentejana Senhor Presidente, foi eleito há cerca de um ano. Quando tomou posse que radiografia fazia do concelho de Montemor-oNovo? Quais as linhas estruturantes de actuação da sua equipa neste primeiro ano de mandato?
Olímpio Galvão - Em primeiro lugar quero agradecer o convite e a possibilidade de mostrar Montemor o-NovoaoMundoatravésdaRevistaMemóriaAlentejana. Em outubro de 2021, aquando da tomada de posse dos órgãos municipais, Montemor o-Novo estava completamente fechado sobre si próprio, tinha perdido 20% da população nos últimos 20 anos e encontrava-senumaespiraldedecréscimoeconómico,turísticoedequalidadedevida.
“Montemor-o-Novo tem uma riqueza histórica importantíssima que merece ser descoberta pelo Mundo” OLÍMPIO GALVÃO Presidente da Câmara Municipal de Montemor-o-Novo CADERNO TEMÁTICO ENTREVISTA 43
Este primeiro ano de mandato foi naturalmente para reorganização interna, para planeamento dos anos seguintes e para a tão esperada e desejada, aberturadoconcelhoaoMundo.
Conforme a Carta Estratégica Montemor-o-Novo 2025, o Concelho de Montemor-o-Novo integra o Corredor Central (assim, referenciado pelo PROT Alentejo), eixo atravessado pelo mais importante corredor rodoferroviário que assegura a ligação entre Lisboa e Madrid, representando um instrumento poderoso para suportar processos de integração económica e fluxos de relações comerciais entre a fachada atlântica (Lisboa, portos de Setúbal e de Sines) e a Europa, via Espanha. Pela sua situação geográfica posiciona-se quase à mesma distância de Lisboa e de Badajoz. Que vantagens podem advir desta situação geográfica estratégica para o concelho de Montemor-o-Novo e para a sua população?
Já de há muitos anos que venho a defender que um dos principais fatores diferenciadores do concelho é a sua localização geográfica, que é impressionante.
Localizado no Alentejo, com a qualidade de vida que daí advém, e apenas a uma hora de Lisboa, uma hora das praias alentejanas, e uma hora de Espanha, este eixo rodoviário vende por si só. Há cada vez mais procura de terrenos por investidores, que reconhecem esta grande vantagem de Montemor o-Novo.
A pandemia, que muito de mau trouxe a todos nós, também trouxe algo positivo. O desenvolvimento de ferramentas tecnológicas de trabalho à distância, fez com que assistíssemos nos últimos tempos a um “contra-fluxo” populacional com muitos profissionais liberais a procurarem habitação no nossoconcelho. Acreditamos que nos próximos anos
este fluxo seja ainda maior, e para isso já estamos a trabalhar em soluções de habitação que possam receber e acolher quem queira vir a ser Montemorense.
“ESTAMOS A TRABALHAR EM SOLUÇÕES DE HABITAÇÃO QUE POSSAM RECEBER E ACOLHER QUEM QUEIRA VIR A SER MONTEMORENSE”
Montemor-o-Novo, ainda sendo a segunda cidade do distrito em população – 10.842 habitantes (Censos 2021) - mais de 2/3 dos habitantes do concelho, 15.804 habitantes (eram 15.335 habitantes em 1890) vivem na sede do concelho, sendo um dos concelhos que tem vindo a perder população progressivamente, como acontece com a grande maioria dos concelhos alentejanos. Que medidas estão previstas para contrariar esta situação, nomeadamente ao nível dos investimentos no parque industrial, assim como na agroindústria ou noutras áreas socioeconómicas? O que está previsto nos próximos anos para fomentar a atratividade do concelho e o bem-estar da população residente?
A perda de população nos últimos 20 anos foi superior à média do Alentejo, pela não abertura do concelho a investidores, a empresários e sempre privilegiando a Câmara Municipal como maior empregadora do concelho, na expetativa que a carteira de votos estivessegarantida.
O desinteresse pelo investimento empresarial era tanto que a própria Zona Industrial da Adua se encontra “estrangulada”, sem lotes para venda e sem planeamento para expansão. É já deste executivo o planeamento e o projeto para a mesma se expandir e vir a receber quem queira investir no nossoconcelho.
A abertura do concelho em termos turísticos tem sido um investimento deste executivo no último ano, mostrando a riqueza do nosso património histórico, cultural, natural, gastronómico e valorizando a forma de receber quetantonosdiferencia.
O surgimento próximo de loteamentos municipais, tanto na sede do concelho como nas freguesias rurais, irá dar hipótese de fixar os nossos jovens a preços acessíveis ou quem queira vir a morar e criar a sua família no nosso território.
Ou seja, emprego e habitação como fatores determinantes para contrariar o desafio demográfico que temos pela frente.
Portugal está “em alta” no Turismo. O Megalitismo - tema da presente edição da Revista Memória Alentejana - tem as características para vir a ser um factor potenciador do turismo –num inventário (2001) foram identificados 104 monumentos megalíticos no Concelho de Montemor. O que está previsto para o município de Montemor-oNovo vir a tirar partido dessa riquíssima mais-valia patrimonial que os nossos antepassados mais distantes nos legaram? Montemor-o-Novo tem uma riqueza histórica importantíssima e que merece ser descoberta pelo Mundo. A Gruta do Escoural com as suas pinturas rupestres, a “primeira arte”, são um exemplo disso. Irão ter um grande investimento para a sua interpretação naViladeSantiagodoEscoural. A rota do megalítico terá que ser um fator de atração de público nacional e internacional, trazendo uma maisvalia económica para os agentes turísticos locais, e para a hotelaria e restauração.
É importante dinamizar as localidades àvoltadosnossosmonumentosmegalíticos Em São Geraldo temos a Anta do Estanque e a Anta Grande da Comenda da Igreja No Ciborro a Anta do Paço
ENTREVISTA CADERNO TEMÁTICO 44
Em São Cristovão o Conjunto Megalítico do Tojal. São apenas alguns exemplos do riquíssimo património megalítico que temos em quase toda a área do concelhodeMontemor o Novo Mas o investimento da autarquia no megalitismo só fará sentido se existir vantagens económicas para todos os quetrabalhamnosetordoturismo.
“TODO O NOSSO PATRIMÓNIO HISTÓRICORELIGIOSO É DIGNO DE SER MOSTRADO”
Município com mais de oito séculos (1º foral vem de 1203), que outras propostas na área do turismo cultural tem Montemoro-Novo para oferecer a um público cada vez mais interessado no património, na História, na identidade?
A primeira referência de Montemor data de 1181 e o primeiro Foral foi
atribuído por D. Sancho I em 1203.
Nos últimos mandatos sempre foi evidenciado o nosso percurso histórico do pós 25 de Abril de 1974, quase apagando a importância histórica de Montemor o-Novo ao longo dos últimos8séculos.
Este executivo está a dinamizar o Centro Interpretativo de S. João de Deus, nascido em Montemor em 1496, e cuja Ordem Hospitaleira se encontra espalhada pelos quatro cantos do mundo. Todo o nosso património histórico-religioso é digno de ser mostrado e visitado por portugueses e estrangeiros.
É também rico o nosso património natural, com a importância do ecossistema do montado, que pode ser visitado através da ecopista ou através do Centro Interpretativo dos Baldios, com passeios pelos sítios de Cabrela e Monfurado. Estamos também a começar a Rota do Montado, com um grande percurso pedestre que atravessa a áreadoconcelho.
As nossas adegas e a qualidade dos nossos vinhos terão que ter também um roteiro, e os 45 kms da Estrada Nacional 2 que fazem parte do concelho terão que ser ainda mais divulgadas.
Os nossos restaurantes que promovem com excelência a gastronomia alentejana merecem uma vista, para serem desfrutadoscomtempo.
Em Montemor-o-Novo estão instalados projectos estruturantes – “Espaço do Tempo” - e acontecem festivais – música, teatro, artes performativas, etc. Mas também existe um jornal –distinguido com o prémio Gazeta pelo Clube dos Jornalistas em 2012, uma galeria de arte quase no centro da cidade – para além da municipal – um coral, o grupo de teatro, entre outros, entidades coletivas ou individuais da sociedade civil bem ancoradas na comunidade local que concor-
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rem para a coesão social e para o espírito crítico cidadão. Como vê a Câmara Municipal estas entidades locais e estes agentes, qual o relacionamento e a aposta do município nestas mais-valias locais?
A dinâmica dos Montemorenses é extraordinária, no que diz respeito à sua intervenção no associativismo. Temos mais de 160 associações sem fins lucrativos, nas mais diversas áreas, na cultura, no desporto, na solidariedade social, no socorro à população, na economia, na agricultura e produção pecuária,etc.
Este esforço desinteressado dos Montemorenses será sempre apoiado por este executivo e quem está no terreno sabe bem que conta com a Câmara Municipal no seu trabalho diário em proldaqualidadedevidadoscidadãos.
“A DINÂMICA DOS MONTEMORENSES É EXTRAORDINÁRIA, NO QUE DIZ RESPEITO À SUA INTERVENÇÃO NO ASSOCIATIVISMO”
Montemor-o-Novo foi palco de um festival literário “Poesia da Terra em Monte Maior”, em três edições: 2011, 2012 e 2013, onde se homenagearam escritores como José Saramago, Manuel da Fonseca, Urbano Tavares Rodrigues e que trouxe a Montemor autores como, entre outros Manuel Alegre, Mário de Carvalho, José Luís Peixoto, Miguel Real, o próprio Urbano – ainda que online - e personalidades como Eduardo Dâmaso, Hélder Costa ou Luís Filipe Rocha. Todavia, não teve continuidade. Equaciona-se a possibilidade de ressurgir, seja por iniciativa do município ou há disponibilidade de se equacionar propostas da sociedade civil?
O Município está aberto a propostas
de festivais literários e realço o encontro literário deste ano, com o tema Literatura e Cinema, que juntou em Montemor um conjunto de ilustres escritores e realizadores, como foram os casos de Mia Couto, José Eduardo Águalusa, José Miguel Gervásio, João Luís Nabo, Davide Drumond, Jorge GonçalveseFernandoVendrell.
O Município apostou bastante no regresso - depois da pandemiada Feira da Luz/Expomor 2022, que se realizou recentemente. Gostaríamos de saber quais os objectivos traçados e se foram alcançados com o regresso desta Feira icónica de Montemor-oNovo e do Alentejo em termos económicos, socioculturais, desportivos e outros?
A Feira da Luz 2022 é um dos maiores eventos em todo o Alentejo. Foi o momento de reencontro após a pandemia que nos assolou desde 2020. Foi também a ocasião de nos voltarmos a abraçar, de festejar a vida e os objetivos foram largamente atingidos. Podemos com certeza dizer que foi a melhor FeiradaLuzdesempre!
A aposta cultural foi forte, com nomes sonantes da música portuguesa como Carolina Deslandes, os Clã, Diogo Piçarra, Luís Represas, Sara Correia e os Calema, mas também teve um espaço para tasquinhas que muito agradouaquemestevepresente.
Mas acima de tudo realço a forte ligação à Apormor, que com a Expomor 2022 mostrou ser a maior mostra de gado do país, e um certame importantíssimonadefesadoMundoRuraledas suastradições.
Houve um importante momento de abertura democrática com a participação nos discursos de abertura, do Sr. Presidente da CCDRA, Dr Ceia da Silva, e do Sr Presidente da Apormor, Eng. Joaquim Capoulas. Em todas as anteriores edições apenas era dada voz aoPresidentedaautarquia.
Nosdiasdocertamenteentrarammais de uma centena de milhar de pessoas
no Parque de Feiras, o que trouxe uma dinâmica gigantesca aos agentes económicos da restauração e hotelaria, quer estivessem na Feira quer fora damesma.
“EM TERMOS DE MOBILIDADE A GRANDE APOSTA DESTE EXECUTIVO É RETIRAR O TRÂNSITO DE PESADOS DE MERCADORIAS DA AVENIDA GAGO COUTINHO”
Relativamente aos transportes e mobilidade em geral. Parece que o estacionamento é um dos maiores problemas do centro da cidade. Que medidas estão a ser tomadas para atenuar esse problema? O que podia ser melhorado em termos de mobilidade para quem vem de fora? O regresso da ferrovia poderá vir a ser equacionado?
Em termos de mobilidade a grande aposta deste executivo é retirar o trânsito de pesados de mercadorias da avenida Gago Coutinho, com pressão nossa para existiram negociações entre a autarquia, a Infraestruturas de Portugal e a Concessionária da Autoestrada, por forma a utilizar a Autoestrada A6 como circular da cidade, apenas parapesadosdemercadorias. A avenida será depois intervencionada, por forma a ser convidativa a parar, paraquemnosvisita.
Temos a decorrer um concurso para instalação de uma rede de bicicletas elétricas na cidade, bem como o fornecimento do serviço de minibus que sirva os bairros de Montemor e que una equipamentos comerciais, de serviços edesaúde.
Para as freguesias rurais estamos a implementar um serviço de transporte a pedido, numa forma de conciliar viagens entre utilizadores, utilizando numa primeira fase os táxis, e com o apoio das Juntas de Freguesia e do Município.
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Estas são as principais medidas no que dizàmobilidadeurbana.
Relativamente à ferrovia, e apesar de ser um transporte coletivo de excelência, creio que não será uma realidade nospróximosanos.
Em termos de ambiente, em que fase está a despoluição do rio Almansor? E qual a solução equacionada para o trânsito de veículos pesados que transitam diariamente pelo centro de Montemor, poluindo e provavelmente não sendo uma mais-valia ao concelho?
Este ano, sendo ano de planeamento, está a decorrer a execução de um projeto para a instalação de percursos pedonais ao longo do Almansor Há muitos anos que o Município e os próprios montemorenses estão de costasviradasparaoAlmansor.
Acreditamos que nos próximos anos, este projeto venha a ser uma âncora turística, juntamente com o estudo geológico do Rio Almansor, para trazer muitosturistasànossacidade.
Relativamente à questão da Avenida Gago Coutinho, como disse anteriormente, o objetivo é retirar o trânsito de pesados de mercadorias. Para isso já elaboramos um estudo de contagem de tráfego e estamos na fase final de um estudo de qualidade do ar É preciso ter suporte cientifico para negociar comasentidadesenvolvidas.
“UM POSSÍVEL AEROPORTO INTERNACIONAL EM BEJA IRIA BENEFICIAR O ALENTEJO TODO”
Sobre o potencial do Aeroporto de Beja, Montemor-o-Novo poderia beneficiar com a aposta deste aeroporto como complemento ao aeroporto de Lisboa? De que modo?
Um possível Aeroporto Internacional em Beja iria beneficiar o Alentejo todo. Mas recordo que a opção Alcochete
atéficariamaispróximodeMontemor o-Novo.
O que pensa do trabalho desenvolvido pelo CEDA e pela Revista Memória Alentejana, nos últimos 22 anos na valorização da Memória identitária e da cidadania no Alentejo? O que poderia ser feito que não se concretizou?
Tudo o que possa ser feito para promover o Alentejo, para perpetuar as nossas tradições e cultura, é de defender com unhas e dentes. Acredito que é uma luta dura, com resultados que por vezes nos fazem perguntar se vale a pena continuar, mas como alguém uma vez disse, “só é vencido quem desiste de lutar”. Obrigado pelo vosso trabalhoededicação.
Que mensagem para o futuro gostaria de deixar aos seus munícipes e aos alentejanos em geral?
Montemor o-Novo e o Alentejo têm futuro! Acredito todos os dias que temos o melhor território do Mundo para viver. Acredito que é possível fixar os jovens no Alentejo com cada vez maior qualidade de vida, com respeito pelas tradições, com espírito empreendedor e inovador, mas com consciência ambiental, equenosfaçaprosperar.
Viva Montemor o-Novo, Viva o Alentejo,VivaPortugal!
Entrevista conduzida por Eduardo M. Raposo com José Alex Gandum
TEMÁTICO ENTREVISTA 47
CADERNO
Montemor Megalítico
Anta grande da comenda da igreja
Há cerca de 5000 anos, Antas, tholos, cromeleques e menires povoavam o território que hoje é Montemor-o-Novo. As populações que os construíram possuíam já um pensamento simbólico estruturado no culto ao sagrado. Cromeleques e menires eram erguidos em locais considerados sagrados, marcavam o território e seriam, igualmente, pontos de observação dos astros. As antas eram locais de enterramento dos mortos. A crença na vida após a morte é comprovada pela deposição de inúmeros objetos rituais junto dos corpos.
A construção de qualquer um destes monumentos implicava um enormeesforçocoletivoquedeveria agregar muitas centenas de pessoas. Estas eram sociedades que já não dependiam exclusivamente da caça e da recoleção de alimentos, praticando uma agricultura e criação de gado que, embora incipientes, lhes permitia tempo livre para a idealização e construção destes grandes monumentos.
O Alentejo, e o concelho de Montemor o-Novo em particular, são reconhecidos como a região onde se pode encontrar uma maior concentraçãodestefenómenomegalítico.
No concelho de Montemor o Novoestãoinventariados222monumentos, sendo as antas em número consideravelmentesuperior.
Se olharmos para um mapa vemos que praticamente todo o território tem representação de monumentos megalíticos. Verificase, contudo, uma particular concentração na parte norte do concelho, entre as localidades de S. Geraldo e Ciborro. Esta localização coincide em grande parte com o trajeto da Ribeira de Lavre e com solos com melhor aptidão para as práticas agrícolas.
Deste muito cedo estes monumentos despertaram na população um interesse particular, levando a associá-los a casas de mouros ou local de tesouros escondidos. Foram inclusivamente transformados em templos cristãos e adaptados para casasdehabitação.
Grande parte destes monumentos encontra-se classificado como Monumento Nacional ou Imóvel de
ROTEIRO MEGALÍTICO CADERNO TEMÁTICO
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Interesse Público e o estado português está atualmente a desenvolver esforços no sentido de classificar a totalidade deste património, impedindoassimasuadestruição.
O Megalitismo montemorense atraiu, desde o início do século XX, os mais reputados arqueólogos e investigadores. José Leite de Vasconcelos, Manuel Heleno, Manuel Farinha dos Santos, Manuel Calado, Leonor Rocha, Rui Boaventura, Pedro Alvim, entre muitos outros, realizaram trabalhos arqueológicos no território Desses trabalhos resultou um espólio abundante, diversificado e de grande valor histórico que se encontra maioritariamente nas Reservas do Museu Nacional de Arqueologia e uma pequena parte pode ser visitada no Museu de Arqueologia do Grupo dos Amigos deMontemor o-Novo.
Apesar de todos os monumentos se encontrarem em propriedade privada, o Município de Montemor o-Novo efetua trabalhos regulares de limpeza de vegetação em alguns deles, bem como apoio à investigação e divulgação deste importantíssimopatrimónio.
Apresentam-se de seguida alguns dos mais importantes monumentos megalíticos que podemos visitar em Montemor o-Novo e que constam do Roteiro do Megalitismo de Montemor o-Novo, disponível no Posto deTurismolocal.
Alertam-se os visitantes para que todos os portões e/ou vedações sejam deixados tal como foram encontrados.
ANTA GRANDE DA COMENDA DA IGREJA
É o maior monumento do concelho de Montemor o-Novo e um dos maiores do país, encontrando-se em bomestadodeconservação.Acâmara possui 8 esteios com cerca de 6 metros de altura e um diâmetro de 4 metros. O corredor, com 11 metros
de comprimento, mantém-se intacto com todos os esteios de cobertura. Parte da mamoa ainda é visível, envolvendotodoomonumento.
Esta anta foi escavada por José Leite de Vasconcelos, Manuel Heleno e Mário Varela Gomes, daqui resultando um vasto e diversificado espólio que se encontra atualmente noMuseuNacionaldeArqueologia.
ANTAS DO PAÇO
Conjunto de duas antas situadas muito próximas Encontram se ambas em bom estado de conserva-
ção mantendo a mamoa, a câmara e vestígios do corredor A sua presença marcou definitivamente as populações da zona, que chamaram ao vale onde se encontram o Vale das Antas e à fonte próxima a Fonte das Antas. Segundo a lenda, existia um túnel que ligava as duas antas e que estas eram habitadas por mouros, possuidoresdegrandesriquezas.
ANTA DO ESTANQUE
Este é um curioso exemplar de umaantaaquefoiadossadaumacasa de habitação há mais de 100 anos. A
CADERNO TEMÁTICO ROTEIRO MEGALÍTICO
Anta do estanque
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Anta do Paço
anta conserva a câmara, com sete esteios visíveis e dois deles embutidos nas paredes da habitação Enquanto parte integrante de uma casa, a anta foi utilizada para diversos usos domésticos como lareira, galinheiro, coelheira e atualmente é localdearrumos.
ANTA DE TORAIS
Este é um dos mais conhecidos monumentos megalíticos do concelho por se encontrar bem visível à saída da cidade de Montemor, na estrada para Évora, à direita. Possui seis esteios e a laje de cobertura in situ. Os esteios do corredor desapareceram e da mamoa restam ténues vestígios. No século XX foi reforçada com alvenaria, uma vez que, até à década de 60 do século XX, era ali que um sapateiro local exercia o seu ofício.
THOLOS DO ESCOURAL
O Tholos do Escoural foi identificado e escavado em 1964, após a descoberta da Gruta do Escoural, e nas suas imediações. Trata-se de um monumento de falsa cúpula com uma câmara de cerca de seis metros de diâmetro e corredor com mais de 3metrosdecomprimento.
No seu interior foi encontrado um expressivo número de objetos votivos como pontas de seta e utensílios em cerâmica. Neste conjunto destacam-se claramente as placas de xisto, com mais de cem exemplares de várias tipologias e decorações. Uma parte do espólio do tholos do Escoural pode ser visitado no núcleo de arqueologia do Museu de S. DomingosemMontemor o-Novo.
ANTA CAPELA DE NOSSA SENHORA DO LIVRAMENTO
No século XVII, as populações locais aproveitaram a estrutura de anta e transformaram-na em capela, dedicada a Nossa Senhora do Livramento. Do monumento original
ROTEIRO MEGALÍTICO CADERNO TEMÁTICO
Anta de Tourais
Tholos do Escoural
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Anta Capela de Nossa Senhora do Livramento
identificam-se a laje de cobertura e cinco esteios perfeitamente visíveis, apesarderebocadosecaiados.
Até há pouco tempo, a capela era local de romaria em datas como a 2ª feira de Páscoa e a 5ª feira de Ascensão e, em anos de seca, faziam-se procissõesàcapelaapedirchuva.
MENIR DA COURELA DA CASA NOVA
Este menir só foi identificado na segunda metade do século XX, quando se apresentava caiado e com barra almagre. O granito encontrase atualmente à vista e foi, entretan-
to, reforçado com alvenaria. Possui 2.7 metros de altura e 1 metro de diâmetro. Investigações arqueológicas nas suas imediações revelaram a existência de um povoado de época anterior à construção do menir e um cromeleque contemporâneo constituído por 11 menires, atualmente tombados.
CONJUNTO MEGALÍTICO DO TOJAL
A presença megalítica na Herdade do Tojal foi identificada há pouco mais de 20 anos. Num território relativamente pequeno podem ser
observadas duas antas, um cromeleque e um menir. Após escavações arqueológicas nas imediações do menir, foi encontrado o seu local original e, numa ação de arqueologia experimental, foi possível voltar a colocá-lo na sua posição primitiva recorrendo a cordas e alavancas. Numa das faces deste menir é visível um painel com um conjunto de “covinhas”.
CADERNO TEMÁTICO ROTEIRO MEGALÍTICO
Manuela Pereira Lopes Coordenadora da Unidade de Património Cultural do Município de Montemor o-Novo
Menir da Courela da Casa Nova
Conjunto megalitico - cromeleque do Tojal
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Conjunto megalitico - menir do Tojal
Por uma visão política, cultural e artística em
Montemor-o-Novo
A cultura constitui, cada vez mais, um pilar essencial do desenvolvimento social e económico, quer num contexto local, quer regional, nacional e até internacional, em que a informação e o conhecimento, a aprendizagem, a qualificação, a criatividade e a inovação surgem cada vez mais como fatoreschavedacompetitividade.
Neste contexto conturbado em que vivemos, entre uma pandemia e uma guerra, recordo as palavras do grande maestro e músico espanhol Jordi Savall: “A arte deve estar sempre doladodapaz,contraaguerra.”
Todos percebemos como na conjuntura pandémica, na sua fase mais aguda, em que o isolamento a que fomos obrigados, as expressõesartísticas (e não só) tiveram um papel funda-
mentalnasaúdementaldetodosnós.
Eduardo Lourenço, notável ensaísta, pensador e filósofo afirmou a propósito da arte que “a experiência fundamental da Humanidade é imediatamente de ordem artística." Afirmou também no que diz respeito à arte, que esta: "Pelo menos interroga-nos, põe-nos em causa, diz-nos quem somos. Dá-nos uma emoção diferente de todas as outras emoções." Este enquadramento também de ordem emocional,nãodeveserignorado.
Como refere o cantautor Sérgio Godinho num das suas canções: «isto está tudo ligado». Não é certamente por acaso que o sociólogo e filósofo francês Edgar Morin disse que «o desafio do século XXI era religar os conhecimentos» e refere o papel da
educação, “a qual deve ser um despertar para a filosofia, para a literatura, para a música, para as artes. É isso que preenche a vida. Esse é o seu verdadeiropapel.”
Neste sentido, importa cada vez mais reforçar as parcerias e as dinâmicas com as escolas, neste caso específico com o Agrupamento de Escolas de Montemor o-Novo, de modo a fortalecer e dar mais escala à educação artística, desde os primeiros anos de escolaridade e deste modo também contribuir para o aumento da literacia artística e consequentemente para a formação de públicos. Contribui-se, assim, decisivamente para a sensibilidade e a afetividade e o desenvolvimento da imaginação, da criatividade e doautoconhecimentodoserhumano.
POLÍTICA CULTURAL CADERNO TEMÁTICO
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Sabe-se que as artes têm perdido espaço nas diferentes arquiteturas curriculares. Já em 2006, o prestigiado neurocientista António Damásio referia que “esquecer as artes e as humanidades nos novos curricula é o equivalente ao suicídio cultural”. A nossa existência sem a Cultura, a Arte e a Criatividade seria certamente muito mais pobre e cinzenta. Esperamos que o Plano Nacional das Artes possa contribuir para uma melhoria substancial do reconhecimento do papel da cultura e das artes na vida de todos nós. Como disse o realizador Emir Kusturica: “A felicidade produzida pela arte é o maior feito dos homens”.
A cultura e Arte também conferem Alegria à vida de todos nós. Jorge Silva Melo (cineasta, encenador, ator, dramaturgo, tradutor, escritor entre outas coisas e falecido há pouco tempo) afirmava a este propósito que: "Eu gostaria de manter a alegria em todos os momentos da vida. É aquilo que nos ultrapassa. Que nos tira da mesquinhez, da inveja. É aquilo que nos dá grandeza." Considerava mesmo o filme “Serenata à Chuva” o filme da humanidade, por ser alegre do princípioaofim.
É necessário criar e promover eventos que apuram a sensibilidade e a afetividade e fornecem meios para a vivência artística e cultural, assim como a formação, a consolidação e a
diversificação de públicos Tendo também como objetivo fundamental a possibilidade de acesso de todos às práticasculturais.
Os projetos municipais, alguns com décadas de existência, ajudam a promover oportunidades de autoexpressão, trazendo o mundo interior de cada um para o mundo exterior da realidade concreta. Temos no Concelho de Montemor exemplos como o Centro de Animação Sócio EducativoOficina da Criança, a Biblioteca Municipal, a Galeria Municipal, a Oficina do Canto, A Escola de Ballet, o Cineclube & Filmoteca Municipal e o Roteiro Literário Levantado do Chão (em
cidade e os sonhos
torno da obra homónima de José Saramago), para além de uma programação diversificada de Eventos culturais, marcados pela qualidade, assim como o apoio a muitas associações culturaisdoConcelho.
Estruturas como o Espaço do Tempo (fundado no início deste milénio em Montemor o-Novo e dirigido durante duas décadas pelo coreógrafo Rui Horta, as Oficinas do Convento, A Almad`Arame,entreoutrasentidades apoiadas pela dgARTES, contam igualmente com o apoio do município. Não esquecendo a importância da cultura tradicional-osaberfazertradicional.
Este estímulo às iniciativas locais
CADERNO TEMÁTICO POLÍTICA CULTURAL
Ballet
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A
Pregões
reforça as raízes da vida cultural do concelho garantindo a permanente e espontânea experiência humana, um conceito tão básico e tão importante no apuramento do sentido de cidadania, do pensamento criativo, crítico e estético. Daí também resulta o bemestar individual e coletivo da comunidade. Um verdadeiro processo de democratização, possibilitando a existência e acesso a agentes e produtoresdecultura.
A criação do Conselho Municipal de Cultura e Arte de Montemor o Novo, o qual pretende ser uma entidade com funções de natureza consultiva, sem personalidade jurídica, visa promover a articulação, a consulta, a troca de informação e a definição de estratégias de cooperação entre as entidades envolvidas e com intervenção relevante e reconhecida no desen-
volvimento cultural e artístico do concelhodoMontemor o-Novo.
Este Conselho constitui um Instrumento fundamental para definição de uma estratégia cultural e artística sustentada. Agostinho da Silva referiu que "como nada entenderam do passado nada podem sonhar para o futuro”. Por isso, é também essencial atuar num contexto de defesa, preservação e valorização da identidade da região e das suas gentes; Contribuir para a formação de novos públicos e a descentralização cultural (com as freguesias); Descentralizar cada vez mais e melhor a oferta cultural e artística num território de baixa densidade como é o caso de Montemor o-Novo, que é o sétimo maior concelho do país em área (cerca de 1232 km2); Integrar cada vez mais nos roteiros culturais e artísticosregionaisenacionais.
Um marco importante foi a criação da agenda cultural. Esta cresceu. Com uma periodicidade quadrimestral Trabalhou se a construção de uma publicação caracterizada pela informação diversificada, criativa, responsável e útil, constituindo assim, um meio privilegiado de comunicação que contribui para o desenvolvimento intelectual e humano da população e ao mesmo tempo valoriza a existência diversificada dos diferentes territórios artísticos. Esta nova agenda dita o início de um caminho em que se pretende promover o potencial do serviço público, e reflete o equilíbrio de Montemor o Novo no peso entre a arte e o entretenimento, ou seja, entre o ser e o ter O músico Josh Tillman (hoje mais conhecido como Father John Misty) mencionou que o entretenimento serve para esquecer a vida, e a arte paraalembrar
De algum modo, tentaremos contribuir para combater aquilo que o cineasta italiano Federico Fellini ainda no século passado já tinha claramente identificado: "A televisão é o espelho onde se reflete a derrota de todo o nosso sistema cultural." A programação televisiva é muito frágil e pouco robusta em torno da cultura e das artes, prevalecendo maioritariamente oentretenimentofácil.
Em suma, queremos ter uma cultura menos marcada pelo caráter ideológico, com uma fruição artística mais respirável e desenhada pela matriz da liberdade, da criatividade e do pensamento crítico. E sob este prisma termino voltando a Agostinho daSilva:
Pela liberdade de cultura, o homem poderá desenvolver ao máximo o seu espírito crítico e criador; ninguém lhe fechará nenhum domínio, ninguém impedirá que transmita aos outros o que tiver aprendido ou pensado.
POLÍTICA CULTURAL CADERNO TEMÁTICO
Henrique José Lopes Vereador da Cultura e Arte de Montemor o-Novo
Vínculo de Vida - Renata Bueno
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A Gruta do Escoural - A quase 60 anos da descoberta
Num final de tarde em abril de 1963, aparentemente igual a muitos outros finais de tarde na pedreira, dois trabalhadores preparavam-se para entrar numa fenda da rocha deixada a descoberto por uma explosãorotineira.
As pedreiras eram um dos principais empregadores da freguesia do Escoural durante os anos 60. Exploravam o mármore numa estreita faixa de 2 km de longo por 140m de largo e, nessa faixa, junto à estrada para a Giesteira ficava a pedreira da HerdadedaSala.
É precisamente neste sítio que se dará a descoberta da Gruta nesse fim de tarde de abril de 63. Cedendo à curiosidade, os dois trabalhadores entram pela fenda provocada pelo rebentamento, para sair momentos
depois a toda a velocidade, aterrorizados pela quantidade de ossos humanos que viram, e pisaram, no curto percurso que lá fizeram dentro. Segundo o depoimento do Sr. Olímpio Graixinha, um dos que entraram, a cavidade estava na altura cheiadeágua.
Apesardasadvertênciasparaque não se divulgasse o achado, aconteceu o que acontece a todos os segredos bem guardados – Nessa noite já quase toda a gente da aldeia sabia da descoberta.
Três dias depois, os jornais noticiavam o achado, dando o mote o “Diário de Notícias” a 19 de abril seguido do “Montemorense” a dia 21 de abril. Até 1965 não param as reportagens e artigos sobre a Gruta do Escoural e, nesse meio tempo,
sucedem-se as visitas dos mais iminentes arqueólogos de então, nomeadamente Farinha dos Santos, que irá dirigir várias campanhas de estudodolocal.
Inicialmente, o que havia chamado à atenção foi a extensa necrópole doNeolíticoqueusavaosrecônditos da Gruta como lugar de sepultamento, deixando ver ossos, cerâmicas e mais espólio funerário sob as capas de calcite produzidas pelo constante gotejardoteto.
Porém, o que tornaria o achado singular seria a arte parietal paleolítica pintada e gravada nas suas paredes, até à data inédita em Portugal. Logo em 1964 eram noticiadas no “Montemorense” nove figuras paleolíticas e em 65 o Abade Glory, uma autoridade em Pré-História, confir-
TEMÁTICO GRUTA DO ESCOURAL
CADERNO
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ma a autenticidade da arte paleolítica do Escoural e a necessidade de lhe dar a devida importância no contextoeuropeu.
Importa ter em atenção que a arte paleolítica da Gruta do Escoural foi das primeiras, senão a primeira a ser descoberta em Portugal. Depois disso há alguns exemplos esporádicos, como o cavalo de Mazouco, descoberto em Freixo de Espada à Cinta, em 1981, que deixa antever a descoberta dos núcleos de arte rupestredoValedoCôa,nosanos90 eemgeografiapróxima.
Ainda assim, o Escoural continua a ser o único ambiente de gruta com arte paleolítica em Portugal. É certo que as gravuras do Côa ofuscam estas em termos de quantidade e qualidade técnica, mas, ainda assim não lhes retiram importância devido ao contexto e, para todos os efeitos, seja em ambiente fechado, seja de ar livre, é o único sítio no País com pinturadesteperíodo.
Os trabalhos arqueológicos começaram logo a 28 de abril de 1963, a poucos dias da descoberta, tomando o Museu Etnológico (percursor do Museu Nacional de Arqueologia) as rédeas da investigação. Na altura, Manuel Heleno, diretor do Museu, delega em Farinha dos Santos a condução dos trabalhos procedendo ao registo minucioso dos sepultamentos neolíticos existentes nas galerias secundárias e recolhendo os materiais soltos que se encontravam espalhados pelo chãodagruta.
A partir de 1966, uma segunda campanha incide do lado sul onde se encontrava a entrada original da Gruta, obstruída provavelmente por um desabamento ainda durante a Pré-História.
Em paralelo, Farinha dos Santos escava um tholos (monumento de
falsa cúpula) a curta distância da Gruta, recuperando mais de cem placas de xisto gravadas, pontas de flecha, cerâmicas e objetos de adorno do Calcolítico. De algum modo este monumento funerário parece estar relacionado com o povoado fortificado, da mesma época, situado imediatamenteporcimadagruta.
Entre 1977 e 1984 o estudo da Gruta entra numa segunda fase com a inclusão de uma nova geração de arqueólogos como Jorge Pinho Monteiro e Mário Varela Gomes. É feito um decalque rigoroso dos motivos artísticos e descobertos novos. São também identificados no exterior vários painéis com gravuras da Pré-História recente que corresponderiam a um santuário calcolítico,tambémassociadoaopovoado.
A partir de 1989 novos trabalhos vêm trazer luz às diversas ocupações humanas da Gruta. Investe-se novamente na entrada sul, vindo a ser identificados vestígios do Paleolítico médio e superior, anteriormente restringidos à própria arte. Desta vez para além dos testemunhos gravados e pintados nas paredes, havia contextos arqueológicos que os relacionavam diretamente com assentamentos humanos, além de ficar provada a sua ocupação pelo HomemdeNeandertal.
Apesar de os vestígios identificados terem origem em deposições secundárias, ou seja, a partir de escorrências de outros pontos da Gruta, foram recolhidos alguns artefactos de pedra lascada e numerosos restos de animais A maior parte destes animais estão extintos, como o auroque (boi selvagem), ou apenas os associamos a sítios longínquos como a savana africana: hiena e leão (das cavernas) - vestígios de um mundo ligeiramente diferente do nosso em que a última
glaciação tornava o clima frio e seco O terreno, menos florestado, era invadido por herbívoros e, à espreita, os seus predadores incluindooshumanos.
É neste mesmo mundo que os homens do Paleolítico Superior vão às profundezas da Gruta para deixar a memória das suas crenças, memórias e talvez registo de coisas tão prosaicas como simples gatafunhos, à semelhança dos que fazemos quandoestamosentediados.
Segundo os dados mais recentes, obtidos ao abrigo do projeto FIRST 1ART a cronologia dos motivos artísticos não se esgota no Paleolítico Superior e estende-se até ao Mesolítico, ou seja, ao período a seguir à glaciação o que permite a ligação entre os primeiros habitantes neandertais e os posteriores enterramentos neolíticos que, encerrados pelo abatimento da entrada da Gruta, irão ter continuidade no povoado calcolítico no topo do monte. Entretanto haviam passado 50 mil anos de história de ocupações e reocupações do mesmo espaço fosse dentro da Gruta ou fora dela, nunca se perdendo o fio condutor que ligava as pessoasàmemóriadosítio.
Da mesma maneira, decorreram 59 anos desde que uma explosão pôs acidentalmente à vista um buraco no meio das rochas até a Gruta se tornar num dos sítios arqueológicos mais importantes de Portugal. Pelo meio houve muito trabalho de investigação, muitas pessoas envolvidas e, do “petromax” do Sr Francisco Porteiro que iluminou 30 anos de visitas, passou-se a um percurso fixo, coerente e explicado no interior da Gruta.
Gonçalo Lopes
Arqueólogo do Município de Montemor o-Novo
1 Parceria entre a Junta da Extremadura (Espanha), a Direção Regional de Cultura do Alentejo, o Município de Montemor o-Novo e o Município de Mação - Museu de Arte Pré-histórica e do Sagrado do Vale do Tejo, para a investigação e promoção conjunta da Gruta do EscouraleGrutadeMaltravieso.
GRUTA DO ESCOURAL CADERNO TEMÁTICO 56
O Espaço do
Tempo: o intangível e o indelével
Ontem
Em agosto de 2000, acabado de chegar a Montemor, nunca imaginaria a bela história que iríamos escrever Até conseguia imaginar o Convento da Saudação plenamente recuperado, ao serviço das artes e da comunidade, mas tudo o que de intangível se criou ao longo dos últimos 22 anos era impossível de prever: as criações mais desafiantes, os artistas que fizeram deste projecto a sua casa e sobretudo os afectos, não apenas com estes, mas com toda uma comunidade que generosamente nos acolheu e a quem nós tudo fizemos para retribuir O Espaço do Tempo, hoje um dos mais reconhecidos centros de produção e residências artísticas na Europa, acolhendo anualmente cerca de 100 residências e 60 eventos, é sobretudo uma casa de portas abertas e um espaço do mundo, protegido para os criadores, mas em sintonia com a comunidade que o acolhe. A energia do projeto justificou inúmeros apoios públicos e privados consolidando a nossa tarefa, de forma a
que, mesmo nos diversos períodos de crise, pudemos ser um porto de abrigo, contribuindo para a resiliência do sector e mantendo viva a chama da criação Resiliência é mesmo a qualidade que aprendemos, face ás troikas, derrocadas de abóbadas, pandemias e o mais que inevitavelmente virá, pois sempre vem Justamente, quando fomos obrigados a sair do Convento da Saudação devido à derrocada de uma das abóbadas, mantivemos a nossa programação e, durante a pandemia, período em que praticamente não parámos a nossa atividade, fomos novamente um lugar seguro para a criação portuguesa, tendo aberto uma nova área de residênciasnaHerdadedoFreixodo Meio e posteriormente a nossa XL Box, um espaço de grandes dimensões que permite residências de maior escala Ao longo dos anos, a nossa relação com as associações do concelho, com o tecido escolar e com a comunidade em geral, solidificou-se num extensíssimo projeto de mediação cultural e programação
regular, um imperativo que fazemos com paixão pois não existe arte sem cultura, nem criação sem afectos Mas também, ao longo dos anos, tudo isto só foi possível pelo estabelecimento de relações de confiança com a autarquia, hoje amplamente vistas como um exemplo de boas práticas no nosso país. Ao fazer um balanço destas duas décadas, não podemos esquecer a internacionalização, participando em algumas das mais importantes redes europeias, bem como o nosso projeto bandeira, a Plataforma Portuguesa de Artes Performativas que, ao longo das suas 7 edições, apoiou fortemente a divulgação internacional dos criadores portugueses ou residentes no nosso país E, se o Espaço do Tempo caminhou este percurso, generosamente reconhecido pelo Prémio Almada do Ministério da Cultura e o Prémio Gulbenkian do Conhecimento 2019, tal deve-se essencialmente às suas equipas e à energia que cada dia investem nesta aventura, sabendo que o melhor prémio será o regresso à sua casa-mãe, o Convento daSaudação
Hoje e amanhã
Durante o corrente ano, o Espaço do Tempo lançou um concurso internacional para um novo Director Artístico, uma decisão que tomei sem hesitar, consciente de que aquilo que construíramos tinha que ser, doravante, defendido e ampliadopornovasvisõesenovosdesafios, só possíveis com uma mudança geracional. Após um demorado e laborioso processo, Pedro Barreiro foi escolhido entre inúmeros candidatos e candidatas de enorme valor. Não poderia estar mais certo desta
CADERNO TEMÁTICO ESPAÇO DO TEMPO
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escolha, uma surpresa para mim, um colega com quem, nos últimos anos tive algumas das mais entusiasmantes discussões intelectuais e que nunca imaginara que se candidatasse. Mas assim é, pois estes são os misteriosos caminhos de um concurso liderado por um experiente júri internacional: a resposta estava ao virardaesquina…
A pertinência do projeto do do Espaço do Tempo, descentralizando a criação artística experimental numa cidade do interior, continuará a ser o seu fator distintivo. Com uma curadoria exigente, alicerçada na experimentação, esta problematiza algumas das mais pertinentes questões da contemporaneidade. Assim, o Espaço do Tempo está e estará implicado na emergência de novas dramaturgias teatrais, na pesquisa coreográfica e nas novas linguagens cénicas, mantendo e ampliando a sua identidade de laboratório das artes
E estou certo que prosseguirá a sua política de inclusão de artistas e
espectadores, lutando contra a discriminação das minorias étnicas e das assimetrias, promovendo o respeito pela identidade de género e lutando contra todas as descriminações. Queremos continuar apromover os valores da cultura, das práticas democráticas, e uma vigorosa reflexão e envolvimento prático com a sustentabilidade ambiental, tendo como contexto a nossa comunidade.
É claro que não sabemos o dia de amanhã, mas talvez o consigamos imaginar um pouco melhor do que há 22 anos… Acredito que iremos continuar a ser um pilar da vida na nossa comunidade, mas também uma casa de criação para os que a habitam vindos de todo o mundo, e acredito que, sob a direção do Pedro Barreiro, o Espaço do Tempo irá cumprir se plenamente no seu potencial
Rui Horta Cenógrafo e bailarino Antigo Director do Espaço do Tempo
ESPAÇO DO TEMPO CADERNO TEMÁTICO
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Serra de Monfurado A Importância dos Ecossistemas
É sempre com alguma dificuldade que falo sobre a importância dos ecossistemas ou da biodiversidade Não por ser difícil encontrar razões para justificar a sua importância, mas por ser algo tão vasto e tão fundamental, a dificuldade é escolher a forma de abordar o tema e quais as perspetivas a mostrar Falamos, no fundo de descrever em poucas palavras, qual a importância e porque devemos valorizar e proteger a vida. E a complexidade da vida escapa de tal forma à nossa compreensão que não temos sequer, uma boa definição para o que é a vida Uma coisa é certa: se estamos a ler este artigo, estamos vivos! - Fazemos parte do que chamamos “biosfera”, a componente viva do planeta Terra Todas as formas de vida interagem com o seu meio envolvente, o seu meio ambiente Ao conjunto de formas de vida, as suas dinâmicas e interações com o meio ambiente envolvente, chamamos “Ecossistemas ” É, portanto, um conceito artificial que podemos aplicar a uma escala muito pequena, ou a uma escala planetária (já que a vida não tem limites e ocorre de forma contínua em todo o planeta) Apesar disto, estes conceitos que nos permitem “isolar” determina-
das comunidades, são de extrema importância para que possamos abordar os assuntos relacionados com a vidaeomeioambiente Enãodevemos esquecer que sendo a vida um todo, quaisquer ações sobre uma determinada comunidade, têm impactos não apenas sobre essa comunidade, mas, emúltimocaso,sobretodaavida
O Alentejo central é, em grande medida, dominado por paisagens artificiais (ou antropomórficas), sejam agrícolas, florestais ou agroflorestais, com grande destaque para o montado. São paisagens e comunidades moldadas pelas espécies animais e vegetais cultivadas bem como pelas práticas agrícolas. O facto de, na sua maioria, serem explorações extensivas e não intensivas, permite ainda assim o estabelecimento de comunidades interessantes e a convivência com diversos habitats selvagens como sejam as galerias ripícolas, os arrifes ou manchas de matagais ou mesmo bosquetes.
A Serra de Monfurado em particular, situada nos concelhos de Montemor o-Novo e Évora, é uma pequena serra, com uma extensão algures entre 20km a 40km conforme as fontes, e
uma altitude máxima de 441m. Apesar disto, tem uma influência forte no território: em certas zonas, existem desníveis significativos que podem chegar ao 100m relativamente à paisagem de peneplanície envolvente. Este relevo faz com que se crie aqui um microclima ligeiramente diferente da área circundante, mais húmido que, associado à diversidade de solos e exposições, a torna bastante interessante do ponto de vista da conservação.
O seu nome deriva de “Monte furado” e, provavelmente, é assim denominada devido às inúmeras cavidades lá existentes. Supõe-se que a ocorrência de grutas naturais como a Gruta do Escoural, possa ter contribuído para este nome. Também as galerias resultantes da exploração de minérios de ferro, que remonta à época romana como sejam a Mina dos Monges ou a Mina de Nogueirinha, deverão ter contribuído ou estado na origem destenome.
Aqui, ocorrem diversas espécies de carvalhos como o sobreiro, a azinheira, o carrasco, o carvalho cerquinho e o carvalho-negral. A diversidade de habitats naturais desde
CADERNO TEMÁTICO SERRA DE MONFURADO
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Montado - Serra Monfurado
as galerias ripícolas, aos charcos temporários, o mosaico entre o montado, os bosquetes e as pradarias, fazem com que esta zona albergue comunidades de espécies muito diversas e mais ricas que a paisagem dominante em entorno. Estão aqui identificados diversos habitats prioritários para a conservação e diversas espécies ameaçadas como sejam a boga-portuguesa, a águia-de-bonelli ou o morcego-deferradura-mediterrânico. Este conjunto de valores naturais (que vale a pena explorar em detalhe), valeram a classificação de Sítio de Interesse Comunitárioem2007.
Mas afinal porque devem estes ecossistemas naturais estar no centro dasnossaspreocupações?
Em primeiro lugar, porque é a diversidade biológica que nos permite viver Quanto mais diversas forem as comunidades de um local, mais resilientes serão a perturbações. Com a previsível redução de disponibilidade de água nos próximos anos bem como o aumento de fenómenos extremos como ondas de calor, este é um fator com relevância acrescida. É previsível que as alterações climáticas, seja em forma se manifestem, venham alterar as comunidades e os ecossistemas atuais. No entanto, com comunidades saudáveisediversas,estatransiçãonão tem que ser necessariamente abrupta,
dando tempo para nos adaptarmos e encontrarnovosequilíbrios.
Os ecossistemas são reservatórios de ferramentas genéticas que devemos valorizar e com os quais devemos trabalhar As nossas atividades económicas serão também tão mais resilientes e sustentáveis quanto mais as conseguirmos compatibilizar com os sistemas naturais. Um novo paradigma para as atividades agrícolas e florestais deverá surgir, mais diverso, mais sustentável e cada vez mais imersivo nos ecossistemas naturais. A serra de Monfurado tem sido um exemplo de como as atividades económicas se podem interligar com as comunidades selvagens, mas com os desafios económicos e ambientais que se avizinham, é necessário ir mais além nesta relação. Felizmente, surgem neste território (e cada vez mais), diversas iniciativas e explorações que caminham nesse sentido.
A serra de Monfurado é habitada pelo Homem desde os tempos préhistóricos. Muitas atividades se desenvolveram até aos dias de hoje, algumas bastante impactantes. Ainda assim, teve sempre a capacidade de se regenerar e continua a ser uma zona relevante relativamente à paisagem envolvente.
As florestas e bosquetes são importantes sumidouros de carbono
permitindo uma melhor qualidade do ar que respiramos. Espécies selvagens como os carvalhos, os medronheiros, os coelhos, javalis, perdizes ou veados são recursos naturais que podemos explorar com racionalidade. A diversidade de flora e de habitats, são verdadeiros motores para as comunidades de invertebrados onde se incluem polinizadores, decompositores e predadores importantes para as nossas produções extensivas. As linhas de água de regime torrencial, são importantes zonas de infiltração de água no solo, recarregando aquíferos que por sua vez alimentam as nossas árvores em tempos estivais. São também importantes corredores ecológicos para diversos dispersores de sementes em especial as aves e os mamíferos. As grutas e cavidades naturais albergam espécies únicas, raras ou ameaçadas com reconhecido valor de conservaçãoanívelinternacionaltrazendovalor acrescido ao território. Os mosaicos de ocupações de solo naturais intercaladas entre zonas culturais, contribui para solos mais férteis, microclimas, barreiras a ventos ou eventos extremos que se traduzem em maior produtividade para atividades como a pecuária ou a cortiça. Sistemas produtivos mais saudáveis e sustentáveis trazem uma importante mais-valia para a saúde da população. A paisagem diversa e natural traz serviços difíceis de contabilizar, mas nem por isso menos importantes: a qualidade de vida com possibilidade de atividades recreativas ao ar livre, em locais sem poluição de qualquer tipo é algo cada vez mais valorizado nas sociedades modernas.
Por tudo isto e muito mais, locais como a serra de Monfurado são verdadeiras joias que importa gerir como tal para que continuem a acompanhar a evolução de forma sustentável valorizando os seus ecossistemas em formas compatíveis com a nossa presença e com o proveito dos serviços que nos prestam.
SERRA
CADERNO TEMÁTICO
Ricardo Ramos da Silva Câmara Municipal de Montemor o-Novo
DE MONFURADO
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Gruta - Serra Monfurado
De
Montemor-o-Novo para o mundo: a virtualização do património a abrir portas para o conhecimento
Uma boa ideia surge sempre associada a algum risco. O serviço de património cultural do Município de Montemor o-Novo assumiu-o quando, em 2013, propôs ao executivo um projeto sem paralelo na arqueologia nacional.
Por esta região existia investigação historiográfica, há já algumas décadas, aliada a projetos de escavação arqueológica com foco nos trabalhos do Programa do Castelo (2003-12). De forma a tornar o conhecimento mais transversal e acessível, merecia a pena ancorar um projeto que criasse pontes entre a comunidade científica e a comunidade interessada. Após vários meses de desenvolvimento e de captação de profissionais locais (na investigação, na programação e no vídeo), a Morbase é lançada no dia 10 de Maio de 2014 como a plataforma online de valorização do património histórico e cultural do concelho de Montemor o Novo. Esta plataforma surge através das linhas condutoras da arqueologia pública, apresentando os dados e as interpretações científicas ao público
em geral, possibilitando, da mesma forma, a interação com a comunidade científica. Incentiva ainda a inovação das técnicas de apreensão do conhecimento científico e das técnicas de registo e diálogo com o património, desenvolvendo a arqueologia experimental, assim como a comunicação no âmbito do património. A primeira versão da plataforma apostou na divulgação das bases de dados de espólio arqueológico do serviço de património municipal, nas exposições online e nos conteúdos em vídeo. Com o lançamento da Morbase, chegava ao Youtube e às redes sociais o documentário “Cerâmica Montemorense sam pucaros que nunqua sam velhos”. Seguiram-se os documentários “A Cripta dos Mascarenhas” e a “Gruta do Escoural” publicados ainda durante aqueleano.
Após esta fase inicial, as técnicas de virtualização do património, através do uso da tecnologia 3D, começam a integrar progressivamente o projeto. A influência desta nova vertente vai
culminar no primeiro projeto de reconstrução virtual 3D da Morbase: a sala do capítulo do convento de São Domingos ou de Santo António de Lisboa e no documentário “Cerâmica Quinhentista do mosteiro de Sto. AntóniodeLisboa”.
Seguiu-se, em 2015, a reconstrução virtual da Igreja de Santa Maria do Bispo do Castelo, que estreou o projeto “Montemor o-Novo 1534” e promoveu uma intenção de longa data de produzir uma imagem do que seria o Castelo de Montemor o-Novo no século XVI. Esta reconstrução virtual seria apresentada, pela primeira vez, no primeiro aniversário da Morbase, durante o 1.º Simpósio de Arqueologia Virtual. Uma iniciativa que teve início em Montemor o-Novo e, atualmente, já possui um caráter internacional e 6 edições realizadas. O documentário “Santa Maria do Bispo 3D - Montemor o-Novo” é apresentado no congresso Digital Heritage, em GranadaEspanha. Com estes trabalhos, a Morbase é reconhecida pela Rede Comum
CADERNO TEMÁTICO PROJECTO MORBASE
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Reconstrução virtual do Castelo de Montemor o-Novo
de Conhecimento como exemplo de boaspráticasnafunçãopública.
Em 2016, a série de vídeos “Montemor o Novo 1534” conheceu depois mais dois vídeos. Primeiro com a reconstrução virtual do Paço dos Alcaidese,depois,comareconstrução virtual completa do Castelo (com a representação de todos os monumentos no seu interior), apresentada na exposição “Património, Partilhar o Passado - Construir o Futuro” na Feira daLuz.
Neste mesmo ano, numa parceria com a Direção Regional de Cultura do Alentejo e o Município de Évora, lançase o projeto Anta Grande ². Com foco
no registo tridimensional dos monumentos megalíticos da região de Évora e de Montemor o-Novo efetuou-se o levantamento fotogramétrico 3D da Anta Grande da Comenda da Igreja e daAntaGrandedoZambujeiro.
O ano seguinte (2017) trouxe a versão 2.0 da Morbase, com novo design e inclusão do Museu Virtual, com integração do visualizador interativo 3D do Sketchfab. Mais de cem modelos 3D do património montemorense estão disponíveis para visualização tridimensional e interação. Desde peças arqueológicas a peças museológicas (do Museu Nacional de Arqueologia ou do Museu de Arqueologia do
Grupo dos Amigos de Montemor o Novo), é ainda possível visitar em 3D vários sítios arqueológicos e/ou monumentos históricos. Surgem, ainda, novas categorias como “Montemor à Mesa”,a “BibliotecaDigital”e umnovo documentário:“Gente que nunca mais existiu – o Megalitismoem Montemor o-Novo”. Em 2018, a versão 2.0 da Morbase é distinguida na gala dos prémios do Turismo do Alentejo e Ribatejo da Entidade Regional de Turismo do Alentejo e Ribatejo na categoria deTecnologiaeComunicação.
Atraída pelo trabalho desenvolvido localmente na Morbase, a fundação americana sem fins lucrativos Global Digital Heritage desenvolveu, em 2019, uma campanha de digitalização 3D no Alentejo. No concelho de Montemor o-Novo são executados levantamentos 3D no Castelo de Montemor o-Novo, na Gruta do Escoural e naAntaGrandedaComendadaIgreja.
Os últimos três anos da Morbase têm sido marcados pela utilização dos conteúdos produzidos no seu âmbito para exposições permanentes e temporárias. Foi o caso da renovação do Centro Interpretativo do Castelo, reaberto em Março de 2020, ou da exposição temporária “Património Interativo”, aí patente entre Abril de 2021 e Abril de 2022. Esta última, com o ensaio do uso de réplicas de peças arqueológicas impressas em 3D. Este modelo de exposição, com resultados positivos, foi novamente utilizado no projeto da nova exposição do Centro Interpretativo da Gruta do Escoural, a inauguraremJaneirode2023.
Enquanto preparamos a versão 3.0 do website, visite a Morbase através do endereço www.montemorbase.com, nas redes sociais Facebook, Instagram e Youtube. Veja ainda o nosso mais recente documentário “Os Judeus de Montemor o-Novo” ou o documentário do Castelo, produzido para a exposição do Centro Interpretativo do Castelo de Montemor o Novo.
Município de Montemor o-Novo
PROJECTO MORBASE CADERNO TEMÁTICO
Carlos Carpetudo Arqueólogo do
Reconstrução virtual da Igreja de Santa Maria do Bispo
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Reconstrução virtual do Paço dos Alcaides
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Roteiro Literário Levantado do Chão
Um exercício de memória colectiva
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“Levantado do Chão” , editado em 1980, é um dos romances que presta maior homenagem à Memória Alentejana. A história desta terra e da sua gente é contada por José Saramago através de quatro gerações de uma família de apelido Mau-Tempo, residente em Monte Lavre, claramente uma referência à Vila de Lavre, do concelho de Montemor o-Novo. A narrativa desenrola-se durante o séc. XX, terminando poucos anos após a queda do Estado Novo com a revolução de 25 de Abril de 1974, e refere ainda, por analepse, um tempo histórico mais recuado, com a introdução do personagem Hamberto Horques, cuja referência histórica remete para o alemão Lamberto de Horques, Alcaide-Mor do Castelo de Lavar no século XV É um romance de metaficção histórica, onde o autor, através de várias figuras de estilo como a ironia, a paródia ou o sarcasmo, revela o carácter viciado da história (com “H”), e, ao emprestar a sua voz àqueles que de outraformaanãoteriam,prestahomenagem à memória colectiva dos trabalhadores rurais alentejanos e restituilhes, em obra literária, a dignidade da condição humana que ao longo dos séculosnãolhesforareconhecida.
Em “Levantado do Chão” encontramos muitas referências a locais e a pessoas do concelho de Montemor o Novo e tal facto deve-se, sobretudo, ao processo criativo do autor. O trabalho de pesquisa e de recolha da documentação preparatória para a produção de “Levantado do Chão'' assemelha-se, em grande parte, a um estudo etnográfico. A associação é clara, o escritor, como um etnólogo, deslocouse para o território e foi viver junto da comunidade que viria a inspirar a sua
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narrativadeficção.
O registo deste labor é-nos dado pelo próprio no seu caderno de apontamentos, onde, por exemplo, a 29 de Março de 1977, regista as notas: “Todo o dia, praticamente a copiar as gravações: ao todo, 24 páginas, e na transcrição sacrifiquei bastante de menos interesse. [...] À noite, gravei o João Bazuga, que andava ansioso por falar Ficámos em meio. Há coisas importantes. No entanto, por duas coisas soltas que eu ouvi, a Mariana Amália tem muito para contar E é indispensável.
Falta-me o lado quase sempre obscuro 2 destaslutas:asmulheres.”
Através do prefácio de José Sarama3 go em “Uma Família do Alentejo” , de João Domingos Serra, editado em 2010, uma biografia que constitui um dos maiores contributos para a narrativa de “Levantado do Chão”, podemos encontrar descritos alguns nomes com quem o autor terá falado, entre eles, o próprio João Serra: “O meu plano de trabalho era simples Antes de mais, conhecer a vila e os seus arredores, a ribeira, a ponte em ruínas a que atribuíam uma
3 SERRA,João(2010),UmaFamíliadoAlentejo,Lisboa,FundaçãoJoséSaramago
CADERNO TEMÁTICO ROTEIRO LITERÁRIO
Encontro com o escritor José Saramago - Lavre 28 de Outubro de 1998
SARAMAGO,José(1980),LevantadodoChão,Lisboa,Caminho
SARAMAGO, José (1977-1979), Caderno de apontamentos para a composição de Levantado do Chão, Espólio de José Saramago, Biblioteca NacionaldePortugal,Lisboa,cit.pp.18,19
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Casa em Lavre
origem romana, mas que foi construída no séc XVI, a represa e o moinho, enfim, pôr a mão em cima das coisas como me habituei a dizer, depois descobrir aqueles que dariam conteúdo e substância ao futuro livro [...]. Encontrei os, falei com eles, gravei bobinas e bobinas de conversações [ ] João Besuga, António Joaquim Cabecinha, Manuel Joaquim Pereira Abelha, Joaquim Augusto Badalinho, Silvestre António Catarro, José Francisco Curraleira, e outros, João Machado, Herculano António Redondo, Mariana Amália Besuga, Maria Saraiva, António Vinagre, Ernesto Pinto Ângelo... 4 EJoãoDomingosSerra” .
É a partir da evidência de relações entre a ficção e a história, que nasce o projeto Roteiro Literário Levantado do Chão, lançado em 2020 pelo Município de Montemor o Novo, em parceria com as juntas de freguesia do concelho, os municípios de Évora e de Lisboa, a Fundação José Saramago, o Museu do Aljube, a Biblioteca Pública de Évora e a Entidade Regional de Turismo do Alentejo e Ribatejo, projeto cofinanciado porTurismodePortugal
Este Roteiro, baseado no romance “Levantado do Chão”, de José Saramago, é apresentado com a proposta de
propiciar ao viajante uma experiência entre a ficção e a história Com efeito, a investigação deste projeto fundamentou se em percorrer inversamente os passos do escritor no seu processo criativo. José Saramago deslocou se a Lavre em 1977 com o intuito de se documentar para a escrita do seu romance e, 40 anos volvidos, os investigadores do roteiro partiram do romance em busca dos lugares e das pessoas comquemoautorfalounesseperíodo. Desta forma, durante o processo de construção do Roteiro Literário 5 Levantado do Chão , foi possível identificar um grande número de lugares de interesse interpretativo e selecionar 28 lugares para o Roteiro, agrupados em 3 percursos temáticos, entre Lisboa, Montemor o-Novo e Évora, num total de 238 km rodoviários e 8 km pedestres. Através dos vários dispositivos de informação do Roteiro, comooGuiaRoteiroLiterárioLevantado do 5 Sobre o processo de “roteirização”, consulte: CACILHAS, Nuno (2020), Roteiro literário Levantado do 6 Chão , a App ou o Website roteirolevantadodochao.pt, o visitante pode, por um lado, aceder a um conjunto de informação de contextualização de
cada local, com excertos da obra de Saramago, mapas, textos científicos, entrevistas, excertos de jornais, cartazes, fotografias, etc. Por outro lado, o visitante acede a um conjunto de informação sobre as referências históricas dos personagens, complementando, desta forma, a relação entre a ficção e a história proposta na viagem do Roteiro. Destacamos aqui o conjunto das entrevistas realizadas: António Serra, Elvira Saraiva, Florinda Vagarinho, Jesuíno Nifra, Joaquim Vinagre, Margarida Machado, Mariana Besuga, Teresa Fonseca e Vitalina Sofio. E destacamos ainda outra investigação realizada no âmbito deste projecto, que representa um grande contributo para a memória alentejana, e que se resume no artigo: “A relação entre a obra Levantado do Chão de José Saramago e os cidadãos de Montemor o-Novo detidos pela 7 políciapolítica(1933-1974)”
O Roteiro Literário Levantado do Chão é um projecto inovador de turismo literário que alia as novas tecnologias à literatura e à memória colectiva. Tendo como principal objetivo contribuir para o estudo, a valorização e a divulgação da obra homónima de José Saramago, assim como de todo o contextobiográfico, históricoeetnológico do romance que nos remete, essencialmente, para o património material e imaterial do concelho de Montemor o Novo. Com efeito, deixamos o convite para ler “Levantado do Chão” e percorrer alguns dos lugares de referência da obra, numa viagem única entre a ficção e a história quecelebraaMemóriaAlentejana.
www.roteirolevantadodochao.pt roteirolevantadodochao@cmmontemornovo.pt
Nuno Cacilhas
Câmara Municipal de Montemor o-Novo
5 Sobre o processo de “roteirização”, consulte: CACILHAS, Nuno (2020), Roteiro literário Levantado do Chão, Dos Algarves: A Multidisciplinary eJournal,37,59-74.DOI:10.18089/DAMeJ.2020.36.4
6 CÂMARA MUNICIPAL DE MONTEMOR O-NOVO (2020), Guia Roteiro Literário Levantado do Chão, Montemor o-Novo, Câmara Municipal deMontemor o-Novo
7 SOFIO, Joana (2022). A relação entre a obra Levantado do Chão de José Saramago e os cidadãos de Montemor o-Novo detidos pela polícia política (1933-1974),Montemor o-Novo,AlmansorRevistadeCultura,nº5,3ªSérie
ROTEIRO LITERÁRIO CADERNO TEMÁTICO
SARAMAGO,José,prefácio,in,SERRA,João(2010),UmaFamíliadoAlentejo,Lisboa,FundaçãoJoséSaramago
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Megalitismo Contemporâneo e uma Galeria em Montemor-o-Novo
OMegalitismo Contemporâneo é uma excelente expressão dita com muita amizade, pelo grande arqueólogo Manuel Calado, acerca do meu trabalho de pintura sobre os vestígios do que resta na nossa paisagem relativamenteaopatrimóniomegalítico.
Agradeço ainda o desafio lançado pelo amigo Eduardo M. Raposo para escrever algumas palavras nesta Revista sobre esta vertente do meu trabalho que se engloba num projecto maior relativo à paisagem como património eco-histórico. A paisagem num sentido local, mas também num sentido lato, Ibérico, Mediterrâneo,Mundial.
Pretendo assim que o meu trabalho seja um contributo para valorizar este dito património ecológico, simbolizado pelas nossas árvores emblemáticas, onde elejo o sobreiro (Quercus suber spp.) como personagem principal. Nas minhas deambulações
“Cópia de
- carregador para uma pilha de nervos entre outros”
pelo Montado, ao longo dos últimos trinta anos como pintor, também senti um forte apelo pelas pedras que foram utilizadas pelo homem para deixar, de uma forma que se quer eterna,asuamarcacivilizacional.
Pretendo assim, igualmente, através da minha pintura chamar a atenção para as questões do património cultural na paisagem que é igualmente alvo de agressão causada por interesses económicos por vezes duvidosos nas consequências futuras queacarretam.
Temos por um lado as alterações climáticas que fragilizam perigosamente todo o sistema, e temos por outro, a destruição arbitrária deste patrimóniohistórico.
Proponho então aos leitores uma visita visual a alguns dos meus trabalhosqueaquiapresento.
O primeiro que escolhi intitula-se Cromeleque dos Almendres - Mon-
tanha Suporte, é um tríptico com dimensões totais de 160 X 180 cm, cuja técnica é o óleo sobre tela. A composição foi concebida, negando a continuidade entre telas, com distorções e sobreposições que representam as disrupções que o monumento sofreu ao longo da história, do sagrado ao inútil, do absoluto desconhecido ao pop star turístico. Acima de tudo um espaço que é nosso, onde podemos ser e estar… carregar forçaseboasenergias.
Ainda pegando na deixa energética e, com algum humor, contraponho aqui um outro exemplo de trabalho queconcebocomoumaltardedicado à contemplação da narrativa do Montado como espaço de ritual. Intitulase Remontado - Carregador para uma pilha de nervos! Entre, outros elementos destaco do conjunto de panos recortados, um em forma de megalito, na zona inferior da compo-
CADERNO TEMÁTICO GALERIA 9OCRE
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Remontado
sição. Na zona central está acoplada uma assemblage com a forma de caixa e que tem suspensa uma peça de cerâmica na técnica de Raku, que realizei para o efeito. Junto ainda do menir em pano pintei um rosto que descobri num afloramento junto à Nacional 2, na aldeia de S. Geraldo, e que estava esgrafitado em algumas partes para sugerir e acentuar a face que já era evidente naquela rocha, não muito longe de uma zona de dolmens. O que fiz foi sintetizar e simplificar a forma e reintroduzi-la na minha gramática formal ligada ao megalitismo. apresento uma foto deste quadro, em contexto expositivo, na Galeria 9ocre situada na zona histórica de Montemor-o-Novo, da qual sou proprietário e onde abro as portas para diversas actividades culturaisdesde2005.
A propósito da Galeria 9ocre, acrescento que, dadas as suas características, as exposições são normalmente planeadas para ocorrerem em períodos de longa duração, há no entanto a possibilidade de expor pequenos projectos pontuais mediante a sua sujeição à calendarização da galeria. Neste momento, para
além das exposições, estamos numa nova experiência com aulas de Yoga entre a pintura exposta. Há também no 1º andar, um espaço de atelier e alojamento para residências artísticas,entreoutraspossibilidades.
A galeria 9ocre não esquece o local onde está implantada, tem igualmente dado oportunidade aos
criadores locais mais jovens de apresentar o seu trabalho num desafio pela qualidade, bem como, oferece uma possibilidade a quem tenha necessidade de analisar, em situação de exposição, algum aspecto do seu projectoartístico.
Casa Branca
GALERIA 9OCRE CADERNO TEMÁTICO
Manuel
Anta do Pinheiro do Campo - Estrada de S. S. Giesteira - Escoural
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“Montanha Suporte” - Almendres
The final disappoitment watercolor on paper 640gm satin 105x75cm
Árvores mutiladas
Júlio Jorge, nasceu em 1959, em Montemor o-Novo, uma pequena cidade do sul de Portugal. É autodidata e trabalha com aguarela desde 1997, participando desde cedo em várias exposições. Atualmente vive e trabalha na cidade em que nasceu. Neste momento tem em curso dois projectos, a saber:
- "olhem para nós, porque nós não somos invisíveis", Conjunto de retratos que pretende chamar a atenção para a solidão e abandono em que vivem muitos dos idosos do nosso país.
- " As árvores mutiladas", pretende chamar a atenção para a forma indiscriminada como estão a ser devastados e substituídos os olivais tradicionais, por olivais de regadio, tendo apenas em linha de conta uma perspetiva puramente economicista sem haver qualquer preocupação com o impacto patrimonial e ambiental que este tipo de acções acarreta.
Apontamento
A minha pintura, preferencialmente retratos, é de cariz realista, precisa e meticulosa. A minha técnica é muito lenta e exige muita paciência, pois na maioria das vezes é feita com o papel ainda húmido, aplicando pequenas pinceladas, permitindo que as cores se fundam e se entrelacem até atingirem os tons que eu considero os corretos. Esse tipo de técnica só é possível com aguarela. Basicamente, eu construo os meus rostos, ajustando as pequenas pinceladas como se fossem as peças de um quebra-cabeças... "
BREVE RESENHA:
Júlio Jorge, participou em mais de uma centena de exposições em Portugal e no estrangeiro nomeadamente em países como: Canadá, China, Espanha, França, Grécia, India, Itália, Japão, Malásia, México, ReinoUnido,PaquistãoeUSA.
Actividade:
É sócio e membro fundador da AAPOR (AssociaçãodeAguareladePortugal).
É desde 2018 Team Leader de Portugal para o evento FabrianoinAcquarello (Itália)
É Sustaining Associate da AWS (American Watercolor Society) e da NWS (NationalWatercolorSociety).
É Presidente da AAPOR (Associação de AguareladePortugal),desde2020
Prémios:
DeenaandKenAltmanFamilyAward
2021 - Alicante, Espanha - XI Premio InternacionaldeAcuarelaJulioQuesada
2018 - Prémio de aquisição da NWS, LosAngeles
2018 - Silver Star atribuída pela NWS,LosAngeles
2015 - 7éme Salon de LÁquarelle du Haillan, Bordéus, França,( 1ère Prix du Public) USA Honor Society
2019 - NWS
CashAwardofExcellence,LosAngeles
2020 - 3rd International Watercolor
Biennale, Pakistan 2020, Watercolor MasterAwardforFigurativePainting
2020 - Malaysia International Art Competition Excellence Award Category-Flora
2021 - Malaysia International Art Competition Excellence Award Category-Figures andFaces
2021 - SDWS - San Diego California -
Publicações:
2015 - Página na revista "The Art of Watercolour" e " L'Art de L'Aquarelle", comoArtistaRevelação.
2019 - Artigo na revista " The Art Of Watercolour e " L'Art de L'Aquarelle", JúlioJorge"Keeper of Time"
2019 - Artigo na Revista" Watercolor Artist", considerando "Mario" uma das 21 melhoresaguarelasdoanonosUSA
2021 - Artigo na revista " The Art of Watercolour" e " L'Art de L'Aqurelle",
Júlio Jorge, "Painting the passing of time". Tehcnical guide.
CADERNO TEMÁTICO AGUARELISTA
Árvores mutiladas
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A Folha de Montemor e o jornalismo regional Fazendo jornalismo de proximidade
concelhos existentes nestes três distritos, apenas em 21 deles existe pelo menos um órgão de comunicação registado, o que significa que em 21 concelhos (50%) esta figura do jornal regional ou local já desapareceu dohorizontenoticioso.
A palavra jornal é derivada de 'jour' tendo sido utilizada para designar o relato diário de acontecimentos e passou depois a definir toda e qualquer publicação periódica impressa. Assim, desde o início da sua existência que os jornais têm a função de fazer o relato daquilo que acontece. Ora nas regiões do interior, esse papel só pode ser feito através dos jornais regionais e locais que estão próximos das populações. Os jornais nacionais apenas se interessam pelo que se passa no interior se aqui existir uma tragédia; caso contrário, o interior não será notícia sem a imprensa regional. É ela que vai aos acontecimentos que aqui existem, que os relata, que interroga os principais protagonistas e leva à primeira página quem se destaca nos mais variados assuntos. No fundo, os jornais locais são a voz de quem não tem voz; são o registo das pequenas coisas, são a interpretação da vontade de quem não vive nos grandescentros.
O Estatuto da Imprensa Regional refere que a imprensa regional é “o
único veículo de publicitação das aspirações a que a imprensa de expansão nacional dificilmente é sensível; e constitui, por outro lado, um autêntico veículo de difusão, junto daqueles que se encontram fora do País, daquilo que se passa com os que não os quiseram ou não puderam acompanhar”. O Estatuto sublinha também que as funções específicas da imprensa regional são a promoção da informação respeitantes às suas regiões, a contribuição para o desenvolvimento da cultura e identidade regionais, o favorecer de uma visão da problemática regional integrada no todo nacional e internacional, entre outras.
Contudo, a situação da imprensa regional no país e principalmente no Alentejo não é famosa. Olhando para os dados publicados pela ERC em julho de 2021, os três distritos do Alentejo (Portalegre, Évora e Beja) tinham registos de 45 publicações, onde 19 eram on-line, 17 em suporte papel e nove publicações utilizavam o papel e o on-line. Contudo, dos 42
Mas nem tudo são más notícias. Um estudo recentre sobre os hábitos culturais sublinhava que “se os dados de 2007 apontavam o jornal como o objeto da cultura tipográfica com mais leitores em Portugal, o mesmo continua a verificar-se à luz dos dados deste Inquérito (43% dos portugueses com 15 ou mais anos leram jornais em papel no último ano).Também na esfera digital os jornais são a publicação mais lida (por 21% dos portugueses inquiridos), vindo só depois, a maior distância, os livros e as revistas (10% de leitores para ambos os suportes)”. O estudo acrescenta ainda que “é nas regiões Açores, Alentejo e Centro que se encontram mais adeptos da leitura de jornais regionais”.
O jornal Folha de Montemor completou este ano 33 anos de atividade no concelho de Montemor o Novo. Ao longo destas três décadas aqui ficou relatado o que de mais relevante se passou nesta comunidade do interior alentejano, tanto nas questões de ordem política, social, económica, cultural ou desportiva. Neste projeto têm participado dezenas de pessoas que, num espírito altruísta e de cidadania têm dado o melhor de si para que fique registado oquetemacontecidonesteconcelho.
A ideia de fazer um novo jornal em Montemor o Novo tomou forma depois da realização de uma ação de formação sobre jornalismo que teve lugar naquela cidade em 1988. Alguns dos participantes decidiram que não iam esquecer aquilo que aprenderam
IMPRENSA REGIONAL CADERNO TEMÁTICO
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Da esquerda para a direita: Manuel Casa Branca, Manuel Giga Novo , António Nabo Paulo Arrifes (sentado).
e lançaram mãos à obra para colocar umnovojornalnasbancasdacidade.
Assim, começaram a ser feitos contactos para formar uma equipa de redação e foi necessário dar um nome à publicação, bem como constituir uma empresa que desse o necessário suporte legal aos proprietários do novo título. Depois de definido o nome – Folha de Montemor – a equipa começou a trabalhar para fazer o primeiro número que apenas viu a luz do dia a 28 de abril de 1989. Este número teve como diretor Pedro Coelho, hoje jornalista na SIC, que comandou os destinos do jornal duranteosprimeirosseisnúmeros.
O testemunho de liderar o jornal passou então para João Luís Nabo que iria dirigir a publicação durante os 14 anos seguintes. Durante todo este período a Folha cresceu e começou a ganhar o seu espaço próprio junto da sociedade de Montemor o Novo através de uma nova abordagem a um
vasto conjunto de questões que foram captando o interesse e marcando a diferença para muitos novos leitores.
Em 2003 a publicação faz uma mudançaradical,alterandoodiretore toda a grafia do jornal. Estas mudanças incluem também vários elementos da redação que entram e saem. Com uma nova roupagem a Folha de Montemor começar uma nova época e uma nova abordagem a todos os temasdasociedademontemorense.
Em 2012, o jornal volta a concorrer ao Prémio Gazeta de Imprensa Regional e acaba por vencer nessa categoria, o que constituiu uma enorme alegria para todos aqueles que, de uma ou outra forma, contribuíram para o projeto. A Câmara Municipal emitiu uma saudação a congratular a publicação referindo que “tal distinção constitui, não só, um prémio pelo esforço e empenho da equipa de colaboradores regulares do referido
mensário, mas também o reconhecimento da qualidade do trabalho produzido, factos que pela sua importância contribuem grandemente para a dignificaçãodaimprensaregionalista”.
Fazer um jornal regional é uma hoje uma espécie de missão, mas para aqueles que têm participado neste projeto há mais de 30 anos, certamente que poucos se arrependeram da sua contribuição, qualquer que ela tenha sido. Miguel Esteves Cardoso, em entrevista ao jornal Expresso, publicada em novembro de 2020, sublinhava que fazer um jornal “é uma coisa maravilhosa, esse momento de produção, de criar, de escrever uma coisa em conjunto. Os jornais são coisas lindas! O grafismo, as palavras, a maneira como se escreve, o papel. Tudo é lindo nos jornais. Por isso temosdeosdefender”.
António M. Santos Nabo Diretor da Folha de Montemor
CADERNO TEMÁTICO IMPRENSA REGIONAL
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Primeira Folha
MONTE SELVAGEM
Um centro de conservação da Natureza no Alentejo! Em Lavre, Montemor-o-Novo, este parque promete muita diversão para toda a família! Com animais selvagens e domésticos, muita biodiversidade e equipamentos de aventura, para todas as idades!
• Construído e gerido com base no Respeito pela NaturezaenaSustentabilidadedoplaneta;
• É um exemplo na redução do consumo de matériasprimasnovas;
• Promove o contacto com a Natureza e seu conhecimento;
• Educaparaasustentabilidadeambientaldoplaneta;
• Só aloja animais excedentes de outros parques ou encaminhadospelasautoridades;
• Promoveobem-estardosanimaisaseucargo;
• Os seus espécimes estão todos registados no Sistema InternacionaldeRegistodeEspécies(SPECIES360);
• Apoia estágios e disponibiliza dados para trabalhos, dacomunidadecientíficaeacadémicaemgeral;
• É membro da Associação Ibérica de Zoos e Aquários (AIZA);
• Apoia projectos de Conservação ex situ (em habitats alternativos)einsitu(noshabitatsnaturais).
MONTE SELVAGEM CADERNO TEMÁTICO
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Um parque privado, inaugurado em 2004, que, além de todas as biodiversidade do montado onde se insere, aloja cerca de 50 espécies selvagens e domésticas, num total de cerca de 250 animais. Aberto habitualmente ao público durante 9 meses do ano, de Fevereiro a Outubro, nasceu da ideia dos seus sócios, de criarem um espaço de respeito pelo ambienteedeprotecçãodosanimaisedaNatureza.
Tem como missão proporcionar habitats alternativos para animais que necessitem e promover o contacto das pessoas com a Natureza, protegê-la, conservá-la e educar paraasuasustentabilidade.
Através de um passeio pedestre, podem-se conhecer melhor os animais e encontrar múltiplos espaços de aprendizagem, descanso e brincadeira! Avestruzes, gamos, macacos, cangurus, crocodilos, iaques e lamas, são algumas das
espécies que se podem conhecer Parques para picnics, cafetaria, loja, um trampolim gigante familiar, casas nas árvores, um baloiço gigante e vários slides, são alguns dos equipamentosqueprometemmuitaaventura!
Fruto do sonho de uma família e do trabalho dedicado de uma pequena equipa técnica pluridisciplinar, actua com base na legislação actual e respeita as convenções e os programas nacionais e internacionais do sector. Trabalha em rede com a comunidade global de zoos e aquários, seguindo as suas estratégias globais e unificadoras, bem como cumprindo com os seus standards técnicos. Trabalha em rede com a comunidade científica (universidades e escolas em geral), com os representantes das comunidades locais, agências governamentais, gestores da vida selvagem e outras organizaçõesconservacionistas.
O Monte Selvagem é um dos mais característicos espaços nacionais de alojamento e proteção da biodiversidade e de contacto com o meio natural, em Portugal, tendo sido já distinguido com diversos prémios:
• em 2010 recebeu o Prémio Mais Turismo, instituídoanualmentepelarevistaMaisAlentejo;
• em 2012 foi premiado pela Entidade Turismo do Alentejo – ERT, com a distinção de Melhor Empreendimento de Animação Turística do Alentejo;
• em 2016 recebeu o Prémio Excelência Sensação, instituídoanualmentepelarevistaMaisAlentejo;
COMO AJUDAR:
• Visitandooparque!
• em 2016, 2017 e 2018 ficou no TOP 5 dos Pumpkin Awards, onde as famílias portuguesas distinguiram os nossos serviços entre os 5 melhores de Portugal nas categorias de Actividades Fins-de-Semana, e de Serviço Educativo
• em 2018 e em 2019 foi o vencedor do Prémio Portugal Cinco Estrelas, na categoria “Parques Temáticos”
CONTACTOS:
• Doando qualquer quantia, para IBAN do Monte Selvagem PT50 0033 0000 00269925005 05
• Doando alimentos para animais (preferencialmente rações e fenos, porquestõesdedificuldadedearmazenagemdeprodutosfrescos).
MONTESELVAGEM–ReservaAnimal,Lda. MontedoAzinhal,7050-467Lavre 265894377 www.monteselvagem.pt geral@monteselvagem.pt
CADERNO TEMÁTICO MONTE SELVAGEM
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Visitas ao Património
As “Visitas ao Património” são, de forma muito objectiva, visitas guiadas gratuitas, que pretendem dar a conhecer o vasto património cultural e natural do concelho de Montemor o-Novo.
Esta (re)descoberta do património, acompanhada por especialistas de diversas áreas do saber, tem permitido visitar locais, alguns dos quais não se encontram abertos ao público, e conhecer a sua história, o seu significado e o seu valor artístico, culturaloucientífico.
Essencialmente, o nosso interesse, através destas visitas, é o de valorizar o património de Montemor-o-Novo que muitas vezes passa ao lado dos olhares dos mais distraídos, abrindo portas, criando sinergias e fomentado boas relações e parcerias entre as várias entidades
que têm interesse em mostrar e abrir as suas portas a quem queira conhecer um pouco mais sobre o nossovastíssimopatrimónio.
Estas visitas são, na verdade, uma faseinicialdeumprocessodedinamização turística do concelho que, para além de poder vir a gerar um impulso económico relevante, também dará destaque à necessidade de reabilitaçãoemanutençãodopatrimónio.
Acredito que será este casamento entre Turismo e Património Cultural que permitirá, por um lado, um maior desenvolvimento dos agentes turísticos que beneficiam da maior oferta turística e, por outro lado, a necessária consciencialização para importânciaepotencialdopatrimónio.
Em jeito exemplificativo, deixo uma lista de algumas visitas que realizámosem2022:
• Visitas guiadas à cripta, igreja e enfermarias do antigo convento de S. João de Deus, dando a conhecer o património histórico e artístico associado a S. João de Deus;
• Visitas guiadas ao Convento de S. Domingos, dando a conhecer os seus núcleos museológicos: Arqueologia, Etnografia, Arte Sacra, Cerâmica e Tauromaquia, bem como aspectos do edifício conventualedaigreja;
• Visitas às margens do rio Almansor, que permitiram descobrir a riqueza de um património geológico único, num local de grande valor paisagístico com os geólogos Ícaro Dias da Silva (FCUL IDL) e Manuel Francisco Pereira (UE-ICT);
• Visitas guiadas à Igreja e Sala do
PATRIMÓNIO CADERNO TEMÁTICO
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Este texto é escrito ao abrigo do antigo acordo ortográfico
Despacho da Santa Casa da Misericórdia de Montemor o Novo, com a historiadora Teresa Fonseca. Esta visita abre as portas a um património histórico e artístico de grande valor, testemunho de mais de 500 anos de existênciadain;
• Roteiro de devoção mariana, ao qual demos o nome de “Roteiro Mariano”, que mostra o património histórico, artístico e simbólico existente em Montemor o Novo. Constitui um conjunto de três visitas guiadas ao Centro
Histórico, Castelo e Ermida de N.Sra.daVisitação;
• Do Paleolítico ao Calcolítico: A Gruta e o Povoado Fortificado de Escoural. Visita guiada com os arqueólogos António Carlos Silva, Carlos Carpetudo e Rui Mataloto. A Gruta e o Povoado Fortificado de Escoural sempre foram alvos de muita curiosidade, são também uma viagem no tempo, que noslevaatéàpré história;
• Paraíso Próximo: A Serra de Monfurado. Visita guiada com AnaFonseca(biofísica);
Visita às margens do rio Almansor
• Visita guiada ao Castelo de Montemor o-Novo, no âmbito da comemoração do Dia Nacional dosCastelos;
• “Roteiro dos Conventos de Vila Nova”. Roteiro literário com base na obra “Ciclo Lunar”, de João Luís Nabo, com passagem nos Conventos da Saudação, S. Domingos e S. Francisco. Com JoãoLuísNaboeSiraCamacho.
CADERNO TEMÁTICO PATRIMÓNIO
António Xavier Vereador do Património Cultural de Montemor o-Novo
PS: Importa deixar uma nota de destaque e um agradecimento aos técnicos Carlos Carpetudo, Filomena Caetano, Gonçalo Lopes, Manuela Pereira, Zilia Tovar pela sua dedicação e trabalho diferenciado.
“Roteiro Mariano” - Visita à Ermida de N. Sra. da Visitação
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“Roteiro Mariano” - Visita ao Castelo
Coral de São Domingos
Escrever sobre o Coral de São Domingos é como escrever sobre um filho feito a várias vozes, nos primeiros dias do ano de 1987, no Convento de São Domingos, em Montemor o-Novo. Nesse tempo, fazer avançar um projecto com estas características numa cidade do interior era ainda um risco. Polifonia sacra e peças tradicionais com arranjos para coro foi o menu-base que começou a ser servido aos nossos conterrâneos, os nossos primeiros espectadores e os nossos primeiros juízes. Estávamos, sem o sabermos, a fazer história, na tradição de um projecto mais antigo, mas que acabaria por morrerpoucodepoisdoseuinício.
No dia 7 Janeiro daquele ano, o Coral de S. Domingos começava, então, a dar os seus primeiros passos. No decorrer destes trinta e cinco anos de existência, contracenaram com o grupo montemorense largas dezenas de coros e muitas centenas de cantores, tendo recebido o aplauso de milhares de espectadores, quer em Montemor e um pouco por todo o Portugal, quer noutros países, onde procurou, sempre, honrar o nome da cidade que o viu nascer Em Montemor, recebeu coros de diferentes pontos da Europa, da Ásia, dos Estados Unidos da América e do Brasil. Experiências que ficaram para a vida.
Pouco tempo depois do início desta incomparável aventura, vieram as gravações de CDs, a pressão da rádio,
dos programas de televisão, a participação em encontros de coros e festivais internacionais em vários países europeus, onde o Coral de São Domingos acabaria por contracenar com osmelhorescorosdoplaneta.
São esses laços, frutuosos e inquebráveis, nascidos e cultivados em todo o país e um pouco por todo o mundo, o troféu mais valioso para o qual não há, nem montra, nem vitrina, nem expositor físico que o destaque. É no coração, na simplicidade, na seriedade e no profissionalismo amador destes cantores montemorenses que residem, com morada permanente, os seus colegas coralistas e todos os amigos espalhados pelo globo. A música, esse elo mágico, acaba por trazer à superfície de cada um o que cada um tem de melhor: a amizade, a disponibilidade, o sentido de hospitalidade, a tolerância e o respeito pelo Outro na sua diversidade pessoal, linguística emusical.
Os princípios do grupo foram, desde sempre, simples e claros: preservaredivulgaramúsicacoralportuguesa, estudar e apresentar obras de todo o mundo, sem excepção, navegando num extraordinário clima de trabalho, amizade, empenho e confiança, traços comuns às dezenas de coralistas que fizeram parte do grupo no decorrer
destas três décadas e meia, sempre com a colaboração do autor destas linhas e com o apoio das várias instituições que continuam a olhar para o Coral de São Domingos como um dos mais genuínos representantes da música e da cultura montemorenses.
Recordo uma pergunta que alguém fez, um dia, a um dos nossos cantores: “Podias viver sem o Coral de São Domingos”? Ao que ele respondeu: “Poder… podia, mas não era a mesma coisa.”
Láteveassuasrazões.
João Luís Nabo Maestro
e Escritor
MÚSICA CORAL CADERNO TEMÁTICO
28.° Encontro de Coros, Igreja de São Domingos (Julho 2022) Concerto do 35.° aniversário, Igreja de São Domingos (Abril 2022)
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Concerto comemorativo do 73.° aniversário da assinatura da Declaração dos Direitos Humanos, Sé de Évora (Dezembro 2021)
Alentejanista, antigo presidente da Casa do Alentejo que deixou obra
Luis Bento Balão Jordão, que nos deixou aos 76 anos, foi Presidente da Assembleia Municipal de Mourão - mandato de 1982–1985 - e Presidente da Casa do Alentejo (C A) e Diretor da Revista Alentejana entre 1994 e 2003.
Luanda e sobretudo Uíje– estamos em 1969, em plena guerra colonial, onde ouve Zeca Afonso e faz várias amizades, entre elas o comandante da companhia, capitão Pardal, futuro militar de Abril, e reforça o a sua consciência política, com diversos antecedentes familiares.
Regressa e já com família – o primeiro filho, homónimo, nasce em 1970 - passa por várias empresas ligadas a tintas, onde assume cargos diversos, vivendo intensamente o períodorevolucionário.
Entrevistei-o duas vezes, no final dos anos 90 – para a Alma Alentejana –Revista Cultural, nº 2, Setembro de 1998, com a participação do Carlos Godinho, e em Dezembro do ano seguinte para a Revista Vilas e Cidades, na rubrica “Retratos”, onde nos leva a percorrer o seu percurso desde a meninice passada na Rua de Foraposteriormente Rua de S. Sebastião –em Mourão, até aos 11 anos, quando o pai, canteiro de profissão, parte para a diáspora com a família “para vir fazer as cantarias do Estádio do Restelo.” Refere “uma das razões da vinda do pai para Lisboa” foi para ele estudar: EscolaFerreiraBorgeseoCursoGeral do Comércio, na Escola Veiga Simão e actividade profissional desde os 12 anos, tornando-se aos 15 sócio da Casa do Alentejo (CA), seguindo os passosfamiliares.
Depois de ser marçano numa ourivesaria e empregado de balcão na Robbialac, foi cabo miliciano em Santarém e Vendas Novas, seguindo-se a guerra colonial passada em Angola -
Em 1980, torna-se dirigente da CA, ao protagonizar com outros jovens a mudança na CA que não tinha acontecido com o 25 de Abril, como refere. Eleito para vários cargos, até que em 1994 assume a presidência da CA. Entretanto em 1981 forma uma pequena empresa na área da construçãocivil.
Alentejanista, para Luís Jordão a militância do Alentejo estava em primeiro lugar A nossa proximidade iniciou-se no final dos anos 90, estava ele no seu penúltimo mandato na presidência da Casa do Alentejo, tendo eu vindo a integrar o seu último mandato como seu Vice-presidente com o Pelouro do Património, período querecordocomsaudade.
Nesse período numa deslocação à Universidade de Évora, em representação da CA, convidou-me para uma açorda na sua casa em Mourão, antecedido de um branquinho na “sua” Adega Velha e recordo a sua presença na apresentação dos meus livros, nomeadamente no Museu República e Resistência
Frontal, irreverente, por vezes a raiar a truculência, Luís Jordão deixou marca na CA. Entre outras áreas, o investimento na comunicação com o
relançamento da Revista Alentejanaque tinha estado com a edição parada 13 anos – editando a 2ª série até em Março de 2003, nº 26, quando cessou definitivamente Esta Revista que recordo com saudade, onde tive o privilégio de ter colaboração permanente – crónica “À Soleira da Porta” e entrevistas, entre elas a António Chainho que teve destaque em capa –periódico trimestral editada pelo saudoso jornalista Manuel Geraldo que coordenava uma equipa editorial com a saudosa Isabel Carvalho – também já desaparecida, tal como o Geraldo – e AnaFonseca.
Também deste gabinete foram publicados quatro número dos Cadernos CA, dirigidos pelo Amigo Domingos Carvalho - pai do Mário de Carvalho - que me convidou para integrar os órgãossociaisdaCA.
Também na área das obras, o restauro do belo edifício, o antigo Palácio Alverca que foi classificado como edifício de interesse público, Luís Jordão deixou marca. A assinatura de um protocolo com o presidente do IPPAR, Luís Calado, e que teve “ponto alto” a visita do então ministro da Cultura Manuel Maria Carrilho, algo inédito nesta “nossa” associação regionalista que em 2023 completa 100 anos, permitiu um conjunto de obras de conservação e restauro no total de 36 mil contos – desde as lambrilhas do chão do belo Patéo Árabe, às diversas salas, mobiliário este também muito rico, mantendo a traça original, quer o estuque,quernasmadeiras.
Luís Jordão, alentejanista, amigo querecordocomsaudade.
Eduardo M. Raposo CHAM -Centro de Humanidades / NOVA FCSH-UAc
FIGURAS LUÍS JORDÃO
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LUÍS RAPOSO
Desde jovem liceal, Luís Raposo é um cidadão empenhado, nomeadamente desde os 16 anos com artigos da imprensa, bem estruturados e denotando uma maturidade inimaginável para a sua juventude. A arqueologia, o ensino – secundário e superior –o cargo de director do Museu Nacional de Arqueologia, anteriormente, mas também a presidente do ICOM Europa, exercida até Agosto, seguida de eleição para Membro do Conselho Executivo mundial do ICOM (o primeiro português naquele lugar, desder a criação do ICOM em 1946) e também a Vicepresidência da Associação dos Arqueólogos Portugueses, mais de dez títulos – alguns em coautoria - e 250 artigos científicos, entre muitos outros, fazem de Luís Raposo, que é e sempre foi um cidadão empenhado, uma das personalidades mais importantes do Portugal democrático, mas também da Europa, no que concerne à arqueologia, mas também ao património e à museologia.
Luís Raposo, que tem ascendência familiar em Ferreira do Alentejo (Figueira dos Cavaleiros) e em Beja (Beringel), começou ainda no final da ditadura a participar activamente na construção da democracia, tendo iniciado um percurso fulgurante espelhado no seu mais recente livro Arqueologia, Património e Museologia. Meio Século de Intervenção Cívica e Cultural, de certa forma uma obra autobiográfica - obra, aliás, em destaque na Rubrica Acontecendo desta edição da Revista Memória Alentejana - onde encontramos logo nos primeiros artigos, nomeadamente: 1971 – 16/10: O Estudo da Pré-história em Portugal; 11/12: O muito que falta em Portugal à arqueologia e aos arqueólogos: 1972 – 22/2: Reportagem sobre o Grupo para o Estudo do Paleolítico português no Museu Nacional de Arqueologia; 1980 – 22/6: Plano Nacional de Trabalhos Arqueológicos; 1981 – 7/1: 1980 – Arqueologia: Um ano de crise… de crescimento?; 1988- 29/5: A Arqueologia em Portugal um futuro por desenhar, denotando uma cidadania activa e uma reflexão madura, apesar da sua juventude de então.
FIGURAS LUÍS RAPOSO - ENTREVISTA Arqueologia,
Património, Museologia
Cidadania
História,
e
empenhada
Foto: P aulo Semedo da Graça
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Presidente do ICOM Europa
Memória Alentejana - Luís Raposo, gostávamos de saber, hoje, em 2022, num contexto totalmente diferente, quais as linhas estruturais que mudaram e como e/ou o que permaneceu?
Luís Raposo - Bom, muito mudou. Se me reportar aos meus primeiros textos, escritos em 1971, mudou quase tudo: mudou desde logo o regime, de ditadura para democracia, e isso tem um valor inestimável. Mas mudou muito mais: por exemplo, dizia nessa altura que não havia estudos superiores de arqueologia, agora há; que não havia laboratórios e outros meios científicos, agora há; que não havia sequer profissionais de arqueologia, agora há… Quando às vezes ouço dizer, em conversas de má língua, que 'isto está pior do que antigamente', bom, isso revolta-me, e só pode ser dito por quem realmente não sabe comoascoisaseram.
Dito isto, é claro que as insuficiências são imensas e pode mesmo dizer-se que houve alguma regressão tanto da arqueologia e do património, como dos museus, sobretudo nas duas últimas décadas. Dou-lhe um exemplo de cada uma das destas áreas. No Património Cultural em geral continuamos sem fazer cumprir a velha Lei de Bases e tem-se acentuado muitíssimo o abandono, mesmo de bens classificados como monumentos nacionais. O que se passa com a Anta Grande do Zambujeiro, por exemplo, é escandaloso e deveria fazer envergonhar todo a nossa geração, ageraçãodeAbril.
Quanto à Arqueologia, ela tem vindo sucessivamente a perder importância nos organismos de tutela administrativa central. Já houve até um Instituto (ou seja, uma estrutura ao nível de Direcção Geral) e hoje não passa de área dentro de um Departamento de Bens Culturais e tudo dentro de um gigante ingovernável que até na designação, DGPC, tem a infelicidade (ou a intenção?) de recuperar a figura que existia no final da Ditadura. Enfim, um caso muito lamentável de retrocesso, para já não falar na supressão de todo e qualquer sistema verdadeiramente demo-
crático e representativo de participação da chamada “sociedade civil” na definição das políticas do sector: a Associação dos Arqueólogos Portugueses, por exemplo, que sempre teve lugar nos organismos de consulta dos governos desde a 1ª República pelo menos, deixou de o ter neste século XXI. Quanto aos museus, a situação é dramática: não somente não se cumpre a LeiQuadro do sector, como se destruiu quase a Rede Portuguesa de Museus e se retira autonomia aos museus nacionais É verdade que houve durante o governo da chamada “geringonça”, e mais concretamente durante o mandato ministerial de Luís Castro Mendes um vislumbre de evolução positiva com a nova legislação de autonomia destes museus. Mas tudo foi regredido logo na governação da ministra seguinte e tem vindo a ser cada vez mais até hoje. Basta dizer que os museus nacionais continuam sem quadros de pessoal e orçamentos próprios, como sempre tiveram no passado, seja em Ditadura, seja em Democracia.
Como vê o futuro da arqueologia em Portugal? E de que forma a museografia, nos nossos dias, se repercute na valorização do património, numa perspectiva identitária?
Curiosamente, alguns pensarão estranhamente, tenho uma visão positiva do futuro. Pode talvez dizer-se que sou um pessimista na razão, mas um optimista na vontade. Todos os dramas que acima referi, sendo reais, não impedem o que antes também tinha dito: eppur si muove, dizia o Galileu em relação à Terra e digo eu em relação a estes domínios patrimoniais, Eles movem-se,
mesmo quando o Estado, através dos governos, fica parado. Movem-se em bons e em maus sentidos, claro. Mas movem-se. Na Arqueologia, por exemplo, existe hoje uma qualidade de trabalho, mesmo no campo empresarial, que eu nunca imaginaria. Se a DGPC é o que é, as DRCs têm conseguido em alguns casos ser mais atentas e actuantes.ÉocasodaDRCdoAlentejo. Asautarquias,essas,sãomuitodesiguais, mas também possuem hoje maior capacidade e conhecimento técnico do que anos atrás. O que falta? Falta cerzir tudo isto através de uma política de governo mais qualificada e, já agora, verdadeiramente democrática. O problemaéqueaalteraçãodapaisagem rural feita nestes últimos anos provoca destruições quase sem paralelo em anos passados. Num dos meus primeiros textos incluídos no livro que referiu falo sobre dois termos que nos faziam então tremer, “despedrega” e “rusticar”, mas os actuais são muito mais… “intensivos”,diria,efazem-nosmesmochorar. Quanto à relação dos museus com as identidades locais e a valorização do património, diria que também tenho
FIGURAS ENTREVISTA - LUÍS RAPOSO
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grande optimismo pelo futuro. Creio, aliás, que é sobretudo aí que esta o futuro dos museus. Claro que os os grande museus continuarão sempre a ser as nossas maiores referências nacionais, porque somos uma realidade histórica, um “país” com tantos séculos – e nem usamos o termo “país” a nível regional ou local, como noutros países/Estados sem semelhante sedimentação nacional. Mas a vida comunitária local ganha cada vez mais força. E os museus constituem uma das principais expressões desse movimento. Existem já hoje em Portugal largas dezenas de museus comunitários e, claro, centenas de museus autárquicos, que em muitos casos são também comunitários. É verdade que ainda se faz muito o mais do mesmo. Por exemplo, o museu etnográfico em que se repete de aldeia em aldeia os mesmos discursos narrativos, servidos em muitos casos pelas mesmas colecções. Mas começa também a existir, e talvez seja já maioritário, o enfoque em que cada
comunidade privilegia aquilo em que é distinta, realizando ademais a ligação de objectos móveis, guardados dentro de paredes, e lugares de afeição ou memória, sob a forma de percursosdepasseio.
O que pensa da actualidade desta edição, sobre o megalitismo no Alentejo Central?
Qual o papel que tem, pode ou deve ter o CEDA e a Revista Memória Alentejana, na valorização patrimonial da autoestima identitária do nosso Alentejo?
Vai fazer três décadas que concebi e aceitei dirigir uma colecção de “Guias Arqueólogos de Portugal” que era suposto vir a ter dez títulos. Infelizmente, por debilidade económica da editora, a Fenda, virada quase somente para poesia com tiragens diminutas, esse projecto não foi adiante, tendo sido apenas publicado o primeiro volume, para o qual eu convidei a minha colega do Museu Nacional de Arqueologia, Ana Isabel Palma dos Santos, para escrever e depois, na prática, fizemos os dois. Chamou-se “Monumentos Megalíticos do Alto Alentejo” e hoje creio que apenas se encontra em alfarrabistas. Mais tarde, durante o mandato de José Sasportes como ministro da Cultura, faz pouco mais de duas décadas, fui nomeado como representante da Cultura em comissão interministerial destinada a propor ao governo as prioridades em matéria de propostas de classificação como património mundial: e de novo aí propus o Megalistimo Alentejano, em candidatura conjunta com a Andaluzia. Tambémissosoçobrou.
Se cito estes dois exemplos – e desculpe-se fazê-lo – é para demonstrar a importância que sempre atribuí e atribuo ao “fenómeno” (os arqueólogos gostam de chamar assim, ou pior, “epifenómeno”, àquilo que antigamente se chama por “culturas”, porque não os querem confundir com o sentido actual do termo, adoptando afinal um outro ainda mais insubstantivo) do Megalitismo Alentejano. E como me dói, dói profundamente, quando vejo ignorado ou, pior ainda, destruído. Já antes referi o caso chocante da Anta Grande do Zambujeiro, mas o mesmo se poderia dizer de dezenas de antas, menires e cromeleques que vão quase ou mesmo desaparecendo sob os nossos olhos. Por isto, tudo o que se faça em prol do seu registo e divulgação, tem o meu aplauso.
O que pode mais ser feito? Bom, precisamente aquilo que o CEDA se propõe fazer, desde logo na sua designação: aprofundar as relações entre memória e cidadania. As edições bilbiográficas ajudam, certamente. Mas é preciso ser mais audacioso. Dou um exemplo: aquando do Ano Europeu do Património Cultural, em 2017, a cujo comité de partes interessadas pertenci em representação do ICOM, propus entre outras a seguinte iniciativa: criar o “autocarro do património”, uma carrinha ou camião, com uma exposição itinerante do património cultural europeu, que circulasse entre cidades e em cada uma estivesse estacionado em área central para promover o conhecimento e o debate cidadão. Não foi feito porque a burocracia europeia consegue ainda ser maior do que a portuguesa. Mas porque não repescar esta ideia no Alentejo, com a contribuição das Câmaras Muncipais, da DRC e demais organismos regionais? Não penso que seja assim tão dispendioso ou difícil de executar Enfim, o que é preciso mesmo é furar o cerco, agitar consciências e poderes públicos. E para este objectivo todos os meios serão bem-vindos.
Entrevista de Eduardo M. Raposo
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Tapa Latina – Portimão
Em pleno período estival, em terras transtaganas, bem ao sul, na cidade de Lagos, fomos dar um passeio de fim de tarde à cidade mais próxima – Portimão. Na hora em queoapetitefoidespertado,nãonos apeteceu comer peixe, mas sim algo cuja apresentação visual e aroma nos suscitasse a possível saciedade de desejos já quase esquecidos no mês deagosto.
Assim, bem no centro da cidade de Portimão, por detrás do local mais conhecido como ponto de centralidade para os encontros - a Casa Inglesa- podemos disfrutar do prazer de petiscar ou tapear um mix de cozinha alentejana e algarvia, encontramos a Tapa Latina, que é já um ponto de encontro para convívio nesta cidade, onde as palavras
podem fluir bem acompanhadas pela qualidade do sabor da comida e da bebida.
Com uma equipa maioritariamente masculina na área de serviço e produção, oferece qualidade gastronómica até às 22h, com música ao vivo às terças-feiras e aos sábados. O serviço de bar- cafetaria estádisponívelatébemmaistarde.
Apesar da variedade disponível para a escolha, incluindo produtos com origem marítima, aconselhamos as bochechas de porco, confecionadas por uma senhora a quem felicitámos pela genuinidade do sabor da tradição alentejana. Contudo, a inspiraçãodaofertaé,nasuaessência, mediterrânica. É este conceito que torna bem interessante a descoberta dosprodutosdescritosnacarta
O edifício feito em pedra rebocada, mantém a aura do lugar com memória, que podemos associar ao conforto, incluindo o térmico, no interior no Inverno comonoVerãopeseofactodenesta última estação ser bastante agradável e convidativa a permanência na esplanada, nomeadamente à noite.
O encantamento é fácil neste espaço onde o serviço é feito por pessoas que têm real empatia pelo cliente. A variedade da simplicidade dos produtos disponibilizados, mas com cunho de autenticidade, quase rara nos centros de acolhimento turístico, é também cativadora da fidelização dos clientes. Voltaremos sempre que nos seja possível, sem dúvida.
CRÓNICAS TALHA E VITUALHA
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Na Cuba
Muitas vezes passei pela vila de Cuba quando ficava no trajeto para outros locais/destinos para onde nos encaminhavam compromissos das nossas agendas lúdicas ou culturais, fazendo pontuais visitas a locais específicos, sem delongas. Sempre que me perguntavam se conhecia Cuba, respondia que não. De facto, apenas alguns traços soltos identificadores, tanto do espaço como das pessoas, consegui guardar na memória.
O abraço da amizade, para o alentejano é algo de forte, envolvente. Começa, geralmente com uma 1tanganhada bem apertada e potenciada gráfica e simbolicamente com movimento que evolui para todo o corpo físico dos comunicantes, transcendendo os. Do individual estende-se ao coletivo, quase como que de forma ritual, ciceronizando através dos espaços públicos, privados e liminares, introduzindo quase que de forma iniciática o visitante como hóspede, a quem se abrem as portas do conhecimento datradição.
As impressões que venho aqui deixar são traços do que captei, não de uma ou outra casa visitada, usufruída em termos de serviços, mas sim da vila de Cuba como hospedeira de forasteiros Uma grande casa, um pulsar de coração amaciado pelo veludo doce do cante chãoedovinhodetalha.
Sublinhada como terra com Alma, no site oficial do município, a vila de Cuba, também designada por Virgílio Loureiro como capital da taberna alentejana, tem o espírito destas duas designações imbuído nas vivências do espaço, mantendo
viva a memória no conceito dos espaços de convívio. Nestes, o vinho e o petisco são o acompanhamento da palavra, do olhar e da cumplicidade química, possíveis com a proximidade física, que a nossa tradição mediterrânea enraizou relativamente à forma e conteúdo das relações associadas à palavra confiança.
A designação dos espaços vocacionados para lazer, mais procurados pelos habitantes da vila, naturais do Alentejo, patenteia, por tradição, o nome do(s) proprietário(s), individual ou plural, decantando-se a linha-
Contudo, ultimamente, a convite de amigos, por umas vezes alonguei a minha permanência neste território, ainda que não mais de dois dias e meio. 1 Apertodemão.
CRÓNICAS CASAS COM ALMA
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gem desde os primeiros até ao atual; para ilustrar temos a antiga taberna das Manas, que passou a ser conhecida como do Chico Fitas atualmente encerrada. As características destes plasmam a qualidade da interação entre o serviço e o consumo. O coletivo, por excelência, vive e revive momentos e emoções, através da partilha da proximidade, o conhecimento e o reconhecimento de rostos, almas e objetos, com imagens em alguns destes locais preservadasatravésdefotografias.
Contudo, não são estes espaços que, na sua maioria, surgem indicados para o exterior, através de sites que classificam as escolhas dos clientes. Havendo, contudo, exemplosdeextraordináriarecuperaçãoe revivificação de espaços, tal como a Antiga Adega do Barreto, atualmente Adega do Canena. A indicação para o exterior inclui, espaços para
experiências diferentes, boas, mas diferentes.
Modernidade na conceção arquitetónica, que pese a aprovação da edilidade para construção, tal como tantas outras neste país, tem traços da massa cultural global, em termos conceptualização do desenho do espaço interior assim como da construção, identificando-se aqui os materiais e, a consequente climatização por vezes geradora de diferenciação da ambiência tradicional.
Pese o apego à manutenção da ancestralidade dos edifícios vocacionados para o que de mais privado há nos edifícios destinados ao lazer público, há lampejos de criatividade em empreendedorismo onde o mix da conceptualização, que se encontra entre a tradição e a novidade exterior, geram produtos de fusão que, por si, se constituem como
complementos de atratividade, tanto para a população local, como paraturistas.
Cuba é uma vila que ainda tem memória e recria-a nos espaços públicos. Apesar do crescimento e o desenvolvimento potenciados por naturais e não naturais da terra, incluindo-se população imigrante, sente-se o espírito do lugar, bafejado pela ancestralidade. Estórias com rostos, sons, reconhecimento de património imóvel, natureza com nomes que configuram a identidade. Local único, sem dúvida, para sentir a autenticidade que arroupa e cativa forasteiros; terra mátria que nos desperta para o conhecimento do que realmente é importante- a memória, a natureza da vida e da 2amizade
CRÓNICAS
CASAS COM ALMA
Ana Pereira Neto ISEC Lisboa, CHAM, FCSHNOVA
2 EspecialmençãoaosamigosJoséRoqueeTeresaCardoso.
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Taberna do Manuel Rui com elementos do Grupo Coral Bafos de Baco
AEROPORTO DE BEJA
COMPLEMENTO AO SOBRELOTADO AEROPORTO DE LISBOA: SIM OU NÃO?
A 29 de Julho, foi publicado um artigo de opinião no jornal “Público” "Aeroporto de Beja: juntem-se, porra!" da autoria dedoisantigosdirigentesregionais,FernandoCaeiroseJoséLopesGuerreiro. A Memória Alentejana, solidária que esta questão de cidadania, colocou duas questões a alguns figuras alentejanas sobre as potencialidades, ou não, do Aeroporto de Beja para servir de apoio ao Aeroporto de Lisboa, já que as opções políticas têm voado ao sabor dos ventos: Montijo, Alcochete, Alverca, Santarém… e por que não Beja, que já está construído, temtodasasinfraestruturasnecessáriaseéoúnicoAeroportoemPortugalcapazdereceberaviõesdegrandeporte.
1. A utilização do Aeroporto de Beja, poderá ser uma alternativa, a curto prazo, face aos actuais constrangimentos do Aeroporto Humberto Delgado, em Lisboa, dando um contributo nacional para a situação aeroportuária actual?
2. Esta solução seria uma mais-valia para o Alentejo? Que impactos, que vantagens e/ou desvantagens poderia ter para o Alentejo e para os Alentejanos?
Fernando Mão de Ferro, 69 anos, Editor, natural de Portalegre, residente em Lisboa
O Aeroporto de Beja deveria ser um complemento ao Aeroporto Humberto Delgado, em Lisboa, durante a construção e, também, depois de o novo aeroporto estar concluído. Só a falta de horizontes políticos o impede de ser O desinvestimento no interior do país está à vista: desertificação, aumento de problemas sociais e de insegurança. No caso do Alentejo, a paisageméradicalmentetransformada com culturas intensivas, sem benefício para as populações e altamente prejudiciais para os recursos naturais. Sem perspetivas de futuro, as populações abandonam o território e não há massa crítica capaz de contrariar a erosão social,climáticaepaisagística. A fixação da população depende do investimento económico e da melhoria de condições sociais. A utilização do Aeroporto de Beja poderá contribuir para que isso seja possível, mas só compolíticasdecoesãosocial.
Luís Palma, Presidente da Junta de Freguesia de Laranjeiro e Feijó, natural de São Brissos, Beja
O Aeroporto de Beja é uma realidade deinvestimentonaregiãoquedeveser considerada pela importância que tem paraodesenvolvimentodopaís.Devemos olhar para esta mais-valia da região Alentejo e concretizar em definitivo a sua rentabilidade com uma visão estratégica que integre a resposta ao desenvolvimento da agricultura, indústria, turismo e dos próprios serviços da aeronáutica de carga, logística, parqueamento e manutenção, e, simultaneamente, assegurar as ligações rodoferroviárias necessárias que estabeleçam as acessibilidades comLisboa,Sines,AlgarveeEspanha. Construímos o sonho, mas não podemos adiá lo mais Devemos isso ao futuro Que seja esse o nosso desígnio.
João Paulo Ramôa, 61 anos, Engenheiro civil, antigo governador civil, natural e residente em Beja O Terminal Civil de Beja é sempre uma alternativa a qualquer Aeroporto se for necessário receber aviões, como já tem acontecido, mas não como alternativa a Lisboa. É desconhecer o que existe em Beja. Existe uma placa de estacionamento que fica completa-
mente ocupada com 10-13 aviões, e que já nesta fase está congestionada. É completamente impossível utilizar Beja como alternativa a Lisboa porque esgotaria em 10 minutos. A função de Beja é de utilização industrial, não invalidando que receba aviões esporadicamente no verão, mas como alternativa a Faro e apoio à zona da Comporta.
O potencial de Beja e que neste momento até se encontra esgotado, é como aeroporto indústria. Já está a trazer atividades que requerem mão de-obra qualificada e melhor remuneradas. É sempre uma mais valia a sua utilização, pois é o único aeroporto do PaísquetemumazonaIndustrialanexa (80ha).
José Matias, 63 anos, Técnico de Património, natural e residente em Santiago do Cacém
Urge colocar o Aeroporto de Beja ao serviço do país, rentabilizando o como alternativa a Lisboa e, por vezes, a Faro, não deixando degradar uma das nossas melhores infraestruturas aeroportuárias. A eletrificação da via férrea Beja-Casa Branca, deve ser encarada como uma obra prioritária,
INQUÉRITO AEROPORTO DE BEJA
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passando a permitir uma boa ligação Beja-Lisboa.
Futuramente, o Aeroporto deverá contar com ligações rápidas, ferroviárias e rodoviárias, com Lisboa, Faro e Sines, nomeadamente, com a conclusão da A26, e a beneficiação das ligações a Évora e Espanha Deverá também, na sequência da obra de beneficiação em curso, do ramal de Sines, ser encarada a construção do troço ferroviário entre Ermidas Sado e Beja, permitindo assim, uma boa ligação a partir de Sines, a mercadorias e passageiros Esta solução seria a mais valia há muito esperada pelos alentejanos.
Sofia Vieira, Tourist Guide, natural e residente em Portel
Com a reabilitação da linha férrea Beja-Lisboa (sem necessidade de expropriações, apenas reabilitação da linha férrea e respectivas estações)
Beja ficaria à mesma distância que alguns aeroportos limítrofes de Londres, por exemplo. Seria um excelente Lisboa+1.
E no caso de precisar aumentar para poder expandir a sua função estacionamento, espaço de oficinas de reparação, também em Beja essa facilidade existe. Beja, está estrategicamente entre Lisboa e Faro, o que permite poder ser um apoio a ambos os aeroportosenãoapenasaodeLisboa. Estasoluçãoseriaumamaisvaliaparao Alentejo, sobretudo por poder dotar a região de mais infraestruturas (acessibilidades) que permitam combater a desertificação, reduzir a sazonalidade em termos de turismo (quase inexistente de Novembro a Março) e atrair o turismodenegócios.
Victor Dordio, Presidente da Direção do DynMed, natural e residente em Évora
Não creio que o Aeroporto de Beja seja uma alternativa, mesmo que de carácter temporário, ao Aeroporto
Humberto Delgado em Lisboa. Admito que em caso de emergências, quando as aeronaves estão impedidas de aterrar em Lisboa o possam fazer em Beja, em alternativa a desvios seja para Faro, seja para o Porto. Fora destes casos, e em situação de “constrangimento”, por exemplo nos picos de tráfego nos meses de Verão, a sua utilização carecerá sempre da aprovação das companhias aéreas envolvidas nessa mudança de destino, o que não me parece fácil, dada a distância (180 km) e o tempo de viagem (2 horas) que separamBejadeLisboa. Estes macro investimentos, geralmente de natureza estrutural, são inquestionavelmente uma mais-valia para as regiões onde se implantam. No caso concreto do Aeroporto de Beja, a dimensão da mais-valia para a região terá que ver, essencialmente com a escala e a natureza do seu funcionamentonofuturo.
Álvaro Martins Fernandes, gestor e empresário, natural das Minas de São Domingos, Mértola Penso que opção do aeroporto de Beja já deveria ter sido abordada faz muito tempo. O Alentejo continua a ter pouco peso politico no contexto do governo e decisões que o promovam e desenvolvam como foi o projeto do Alqueva tardam sempre para alem do razoável. Este projeto tal como o Alqueva, são as bases para um desenvolvimento sustentável, repovoamento do Alentejo e descentralização dos equipamentos importantes de Portugal. Vamos fazer a nossa parte, lembrar que estamos aqui, somos portugueses e queremos crescer com o resto do pais.Somoscapazes!
Maria Albertina Amantes Raposo, Professora Coordenadora do IPBeja, natural e residente em Beja
A médio prazo é uma excelente alternativa e a curto prazo também o pode-
ria ser se para tal se desse atenção ao transporte e alojamento. Há muita vontade local e interesse empresarial. O grande estrangulamento é mesmo a rede viária. Tanto a rodoviária como a ferroviáriaestãoobsoletas.
Outras vantagens: maior diversidade de oferta de serviços, aumento de postos de trabalho, fixação de pessoas à região, eventualmente uma nova oferta formativa no IPBeja que sirva este setor; portanto, impactos social e económicopositivos.
Em termos de impacto ambiental, tem certamente aspetos que importa questionar,mas tendo em conta o histórico de atividade aérea militar naquele local, tudo o que já está construído e as medidas de minimização e compensação de impacto ambiental que se possam vir a desenvolver, acho quenãoéumentrave.
Luis Sotto-Mayor, Consultor na área gestão, natural e residente em Évora
Nunca foram apresentados números sobre o custo da inutilização do aeroporto de Beja, assim como qual o impacto se começasse desde já a funcionar Contabilizando então os custos da ligação a auto-estrada, bem como da melhoria rede ferroviária… e este número poderia ser apresentado com a vertente da ligação ao Algarve como complemento de Faro Se calhar não interessaria pois não se verificou a compra de terrenos para agro especularcomoaeroporto.
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Também ninguém refere que com a tendência para aviões maiores (como A380) estes não podem aterrar nem Montijo nem Alcochete… o que existe opera por Beja através da White. É questão para perguntar: onde estão as Entidades, deputados, políticos, partidos, representantes da sociedade civil do Alentejo? Não se ouvem a colocar este tema em cima da mesa e a lutar porele!
NOTA: Em virtude da paginação, no caso dos contributos mais longos apresentamos uma síntese, mantendo o essencial da opinião.
A Memória Alentejana vai continuar a acompanhar o desenvolvimento deste tema.
INQUÉRITO
AEROPORTO DE BEJA
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DESTAQUE
Arqueologia, Património e Museus
Luís Raposo
Editorial Colibri, 2021, Lisboa, pp. 581
Admito que a revolução seja uma utopia, mas no meu dia-a-dia procuro comportar-me como se ela fosse tangível. Continuo a pensar que devemos lutar onde exista opressão,sejaaquenívelfor
José Afonso
Ao tomarmos contacto com esta vasta obra, ao deixamo-nos deliciar, surpreender, percorrendo estes 129 textos – crónicas, reflexões, estudos, entrevistas - divididos tematicamente por Arqueologia, Património e Museus, sentimo-nos cheios, exuberantes perante a sapiência, o rigor, a paixão, a dedicação de meio século aoserviçodeummundoquetambém éonosso.
A um mundo, onde tentamos, nos últimos 22 anos que a Memória Alentejana assinala nesta edição, e de
outras formas, dar o nosso singelo contributo, modesto, também para a sua valorização, mas que gostaríamos de conhecer melhor, viver mais intensamente. Essa nossa insuficiência deixa-nosumtravoamargode não ter percorrido esses caminhos que também fazem parte da nossa genética cultural enquanto seres sociais e… pensamos que noutra encarnação talvez claro que neste processo diacrónico que é a vida percorremos outros com mais acuidade que estes, mas não deixamos de nos sentir “pequenos” perante a imensidão do saber que é impossível cada ser abarcar Tal perspectiva ainda nos deixa mais admiração pela figura do Luís Raposo, cientista social, líder, dirigente associativo de cariz científico e cultural, cidadão empenhado einterventivosempre. É assim que entre 16/10/1971, no Comércio do Porto – muito jovem, aos 16 anos e 06/09/2021, no público, em 21 periódicos de diversa tipologia, mas onde sedestacaojornalpúblico. Luís Raposo – que surge em entrevista na Rubrica “Figuras” é uma figura maior da cultura portuguesa. Com raízes familiares alentejana Figueira dos Cavaleiros (Ferreira) e Beringel (Beja), desde muito, muito jovem –passaram 60 anos a 16 de Outubro sobre o início da sua marcante actividade arqueológica, como se pode ver no texto referido, publicado em 1971,noComérciodoPorto. Antigo Director do Museu Nacional de Arqueologia, é actualmente Presidente do ICOM Europa e Vice presidente da Associação dos Arqueólogos Portugueses, entre muitas outras actividades e funções, desde o início da juventude escolheu arqueologia, mas também o património e a museografia, a que se tem dedicado de corpo e alma como se espelha nesta obra de referência que
passa em revista 50 anos destas três áreas tão decisivas do saber, da identidade e da memória em Portugal
Luís Raposo deixa-nos “um panorama indispensável a todos os que se interessam por cultura e ciência ou, mais amplamente, aos que almejam melhor compreender a história recente do nosso País e da sua inserção na Europa e no Mundo”, como escreve Fernando Mão de Ferro na contracapa.
Luís Raposo, defensor de um Estado forte, regulador do bem comum, que na área do património cultural entende “que a 'idade adulta' só existirá quando tivermos pessoas livres no pensamento, na palavra e na acção (…).”, pois “a vida é tanto mais bela quantomaislivrementeavivermos.”
Esta obra, que é, de certa forma, também um balanço da própria sociedade portuguesa, sobretudo do Portugal desde a Revolução de Abril, mas onde é patente, antes de mais, o seu compromisso não com o poder mas sim como o rigor, com a seriedade na defesa da Arqueologia, na defesa do Património, na defesa da uma verdadeira política para os museus portugueses, sempre com um espírito livre, o que lhe valeu dissabores vários ao longo do seu vasto e riquíssimo percurso, onde certamente se poderia utilizar aquele frase certeira do Zeca Afonso: Eu sou o meu próprio comitécentral!
Como referiu no lançamento desta obranaCasadoAlentejo,peranteum mar de gente no salão Agostinho Fortes, com muitas figuras públicas, caso de, entre outras, do antigo ministro da cultura, Pedro Roseta, ou António Carvalho, actual director da MNA, Luís Raposo, declarou mais ou menos isto: “Perdoem-me os meus amigos de direita, eu gosto de dizer quesourevolucionário”.
Estátudodito!
Em nome da CEDA, da Memória Alentejana e pessoal, deixo um imenso obrigado e um abraço fraterno, LuísRaposo.
ACONTECENDO DESTAQUE
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DESTAQUE
Rancho dos Cantadores de Paris Compagnie des Rêves Lucides, Serpa, 2020
Finalmente chegou ao nosso convívio um disco há algum tempo esperado, referido nas duas edições anteriores da Memória Alentejana (2021 e 2020). As vicissitudes provocadas pela pandemia atrasaram a sua distribuição, todavia, quando esta edição chegar aos leitores o Rancho dos Cantadores de Paris, já terão realizado a tournée prevista para o Alentejo e outros locais do país, entre 22 e 29 de Outubro – dia 29 estarão em Almada, com um lançamento organizado pelo CEDA e pela Junta de Freguesia de Charneca de CaparicaeSobreda.
Comoreferenotextointrodutórioo amigo Carlos Balbino, jovem e dinâmico etnomusicólogo, director e mentordogrupo: “Este disco tem como aspiração divulgar o Cante Alentejano contemporâneo Nesta obra temos oportunidade de ouvir várias correntes actuais do Cante: desde o tradicional a cappella a novos arranjos para instrumentos eléctricos, passando pelos gruposdejovensemulheres( )”
Fruto da colaboração com 11 grupos de Cante e de diversos artistas –músicos / intérpretes / instrumentistas / arranjos / ensaiadores –Nelson Conde, Pedro Mestre, Armando Torrão, Celina da Piedade, Antón i o B e x i g a , Francisco Pestana e dois grupos de música tradicional, o CD apresenta 19 modas do Cancioneiro Tradicional Alentejano, com arranjos e participação dos artistas e dos dois grupos, adicionando uma componente instrumental diversificada, caso da viola campaniça mas também a viola eléctrica.
Em 2018 e 2019, com duas modas, “Margarida” e “Adeus, ó meu lindo amor ” , unicamente interpretados pelo grupo de Paris, o disco ainda em 13 das modas tem a participação de grupos de Serpa –a maioria – mas também de Beja, da Cuba, da Aldeia (agora Vila) Nova de S. Bento, Pias ou Castro Verde o que perfaz a diversidade do Cante, pois cantar à “moda de Pias”, ou de Serpa é substancialmente diverso de cantar à moda da Cuba ou ainda de Castro, propósito que Balbino refere – aplicando aqui a terminologia científica certamente fruto de trabalho de mestrado realizado na Cuba - e transparece na gravação. Pese o esforço realizado e o resultado, com resultados aspectos excelentes, neste livro/CD muito completo, que ainda, no capítulo “Cartes”, apresentam se os 10 locais –desde Portel até Aldeia do Corvo (Castro Verde) – de onde são originários os temas interpretados.
Com uma grafismo cuidado de Daria de Guigné e Anna Turtsina, que assina também as ilustrações, fotos de Ana Baião e prefácio de Salwa Castelo Branco, textos de director artístico do grupo Carlos Balbino e ainda de Mariana Cristina e de Filipe Pratas, respectivamente coordenadores dos “Ceifeiras de Pias” e dos “Ganhões” de Castro Verde, neste disco que é afinal um livro - com 167 páginas - de pequeno formato, surgem muitos dos actuais protagonistas do Cante no Alentejo, consubstanciando um registo singular do nosso Cante, deste grupo, Rancho de Cantadores deParis
Editado e produzido pela Compagnie de Rêves Lucides - a companhia que Balbino fundou em Paris para a produção da peça sobre tauromaquia “La Derniére Corrida” e em 2016 deu origem ao Rancho de Cantadores de Paris. Com ideia original, direcção artística e textos de Carlos Balbino, tradução dos textos para francês a cargo de Marie Odite Thiry Duarte, gravações, mistura e masterização de André Espada, gravado por seis membros do grupo - Carlos Balbino, Cécile Lasserre, Claire Mathaut, Estela Basso, Karim Abdelaziz e Julia Alimasi - entre Setembro de 2018 e Fevereiro de 2019 – nos estúdios da Musibéria, em Serpa, foi patrocinado pela D R C Alentejo e C M Serpa –CasadoCante. Assumindo-se como “uma homenagem ao Cante Alentejano actual” é, dizemos nós, um contributo sério e muito belo ao Cante como fenómeno social dinâmico, do Grupo de Cantores de Paris que é uma exemplo único da disseminação internacional do Cante, neste caso na região de Paris mas também por toda a França, desta prática secular numa perspectiva diacrónica enquanto expressão artística e cultural da Pátria transtagana, no Alentejo ou na Diáspora.
ACONTECENDO DESTAQUE
Alentejo ensemble
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DESTAQUE
Cinematheque
Jorge Moniz Edição de Autor, 2022
Esteanotivemosoprivilégiodecomemorar o Dia Mundial da Música – 1 de Outubro - a preceito. Referimo-nos à apresentação de Cinematheque, o último trabalho de Jorge Moniz, saído já este ano, que teve lugar no Auditório Municipal do Fórum Cultural do Seixal.
Trata-se de um auditório com uma excelente acústica permitindo um som perfeito completado com um conjunto de imagens completamente envolventes.
Esta conjugação excepcional resultou num concerto único, algo que há muito não assistia a um espectáculo musical assim em sala, algo tão completo,tãopleno…
O Jorge é um músico completo, uma referência no Jazz - dirigiu a Academia de Jazz do Barreiro e é o director artístico do Festival de Jazz no Parque, profundo conhecedor do Cante,
respira-se aqui um universo erudito, onde na execução musical se destaca o piano - excelente o desta sala no dizer do Jorge - mas também o quarteto de cordas, clarinete baixo e voz, sendoestaaformaçãonodisco: Jorge Moniz - piano, composição e direção musical; Jorge Vinhas - violino I; Francisco Ramos – violino II; Eurico Cardoso - viola; Emídio Coutinhovioloncelo; Inês Jacquees - sintetizadoresevoz;AnaRitaPratas-clarinete Gravado nos estúdios Vale de Lobos, com gravação, mistura e masterização a cargo de João Alves, esta edição de autor, com produção e edição de próprio Jorge Moniz, este Cinemateque apresenta uma capa suavemente sedutora, com a assinatura do designer Chris Bigg, - autor da identidade visual da editora de música alternativa 4AD.
agora presenteia-nos com este disco sublime, instrumental que apenas tem um tema vocal, tema interpretado, de forma serena e suave por Inês Jacques.
Jorge Moniz, um Amigo querido e fraterno, com quem muitas vezes podemos contar, quer respondendo aos meus convites da apresentação do meu último livro - onde esteve em três - a assistir a colóquios - assim como a participar como orador nos colóquios de aniversários do Cante em Almada - ele que no Mestrado estudouos"CeifeirosdeCuba".
Jorge Moniz trilha aqui um novo caminho, ele que para além de músico é compositor e maestro, elevando-se aqui a um patamar incomum, a que poucos,muitopoucoscriadoresmusicais portugueses podem aspirar, pois
Neste excelente espectáculo de apresentação de Cinematheque, tivemos a possibilidade de saborear a formação musical clássica de excepção do Jorge, aliada a uma componente visual, seja pelo desenho de luz e especialmente nas imagens projectadas, de grande beleza, da autoria do realizador Fernando Silva, transportando-nos a uma beleza sensorial estimulando todos os sentidos. Assim percorremos as paisagens da Dinamarca, com os seus ambientes húmidos e enublados, assim como uma que percorre o crescimento da sua filha, desde tenra idade e a sua descoberta com os instrumentos musicais - recordamo-la bebé de poucos meses no Festival Músicas do Mundo, onde o Jorge é presença assídua - terminando num tema composto há mais de dez anos, recolhido por Michel Giacometti na regiãodeÉvora.
Imagens de uma beleza avassaladora, que nos remetem para o nosso Alentejo.
Obrigado, Amigo Jorge Moniz pela excelência do teu novo trabalho, na permanente busca do Belo... beleza aquitãocompleta,tãoatingida!
Eduardo M. Raposo CHAM, FCSH-NOVA
ACONTECENDO DESTAQUE
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Revista de Estudios Extremeños
Tomo LXXVI - ANO 2020 NºIII
Revista de Estudios Extremeños
Tomo LXXVII - ANO 2021 NºI
dura, na 1º parte mostra-nos a grande heterogeneidade estadunidense, como nação de emigrantes, e a importância e o legado das comunidades hispânicas. Na 2º parte, mostra-nos os grandes eventos, protagonizados por Hernando de Soto, um conquistador por terras americanas, e mais em particular na região da Florida. Procura dar uma imagem mais realista, sobre o que realmente se passou, nas descobertas /conquistas, e trazer luz, a muitos preconceitos instalados, em muitos casos por desconhecimento.
Centro de Estudos Extremeños
Diputación de Badajoz - 2020, 7591299 pp.
Este terceiro número da Revista de Estudios Extremeños de 2020 (setembro dezembro), revista histórica e artística fundada em 1927. Apresenta dezassete artigos, dos quais podemos destacar: Evolución en la juventud extremeña y española del racismo y de la leyenda negra (1986-2019). ¿Deben conmemorarse los 500 años de la conquista de México por Cortés? De Tomás Calvo Buezas, artigo muito interessente e totalmente atual, nos nossos dias; um outro artigo, Las huellas de la brigada de voluntarios católicos irlandeses en la ciudad de Cáceres durante la Guerra Civil de María del Carmen Alvarado Parra, um artigo peculiar, sobre um contingente de 700 voluntários irlandeses recebidos em Caceres como membros da “La Legión Espanhola bajo la XV Bandera del Tercio, llamada la Brigada Católica.”, com uma péssima prestação na guerra civil espanhola, sendo classificada, pelas altas patentes militares espanholas,de“indisciplinadaycaótica”.
João Santos
Centro de Estudos Extremeños
Diputación de Badajoz - 2021, 642 pp.
Este número faz uma importante homenagem a Marcelino Cardalliaguet Quirant, que faleceu em dezembro de 2020. Foi alguém que participou ativamente na Revista EstudiosExtremeños.
Para além desta particular homenagem, apresenta uma serie de outros artigos, muito curiosos, onde assinalamos alguns deles: Formas de vida de las comunidades hispanojudías en la Península Ibérica de David Hernández Jiménez, Estudiante de Historia y Patrimonio Histórico Universidad de Extremadura, uma boa forma de ficar a conhecer, o modo de vida das comunidades judaicas na Península Ibérica, a forma como se organizam entre si e a sua relação com a outra parte da sociedade; um outro artigo muito interessente, que se encontra-se dividido em duas partes, I. Los conquistadores españoles en el imaginario norteamericano - II. La relevancia de la obra sobre el jerezano Hernando de Soto de Feliciano Correa y Juan José Estepa de Tomás Calvo Buezas Catedrático emérito de Antropología de Iberoamérica y Medalla de Extrema-
Arrayollos
Revista de Cultura do Município de Arraiolos, nº3
Edições Colibri - 2022, 265 pp.
Esta é uma revista anual, de carácter científico, que vai já na edição nº4. Apresenta um conjunto de catorze artigos, agrupados, em três “gavetas”: Estudos Locais, onde destacamos This place is kept by powerful gods - a Idade do Bronze nos Soeiros (Vimieiro, Arraiolos) do arqueólogo Rui Mataloto, com um importante estudo sobre o sítio de Soeiros, durante a ocupação na
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LIVROS
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João Santos
Idade do Bronze; e um outro artigo, Uma nova abordagem às origens do Tapete de Arraiolos de Rui Miguel Lobo, um artigo, que visa a preparação, de uma nova edição do livro “Origens e influências decorativas do Tapete de Arraiolos”; Estudos Gerais, aonde podemos dar como exemplo, Miguel de Arruda e a Capela das Onze Mil Virgens, em Alcácer do Sal: para uma valorização documental e interpretativa da obra e do seu autor, de Francisco Bilou, um interessente artigo, sobre o verdadeiro obreiro, ou a pessoa que conduzi-o os trabalhos desta enigmática capela; Estudos Institucionais, nesta ultima “gaveta” ou conjunto de estudos assim agrupados, destacamos por obséquio, Miróbriga: breve apontamento sobre o passado e o presente, de Manuela de Deus, um interessente trabalho e, que permite para quem pretende visitar, esta antiga cidade romana, entender o sítio do ponto de vista, geográfico, histórico, urbanístico, bem como todo o percurso de investigação. Para além disto, faz referência às atividades, que têm sido levadas a cabo, nos últimos anos,comosmaisdiversospúblicos.
João Santos
Nova Síntese
I – Alves redol – Presente e Futuro da Sua Obra II – Neo-Realismo Português e Realismo no Mundo (cont.)
Edições Colibri/Associação
Promotora do Museu do NeoRealismo, Lisboa, 447 pp.
Sempre resistente, esta revista deveria ser a nº 18. Por motivos alheios aos seus criadores saiu sem indicação de número. Esperamos que a resistência da equipa extraordinária que edita a Revista, continue por muitos e bons anos. Para quem a não conhecer, esta Revista é a única
que em Portugal promove o conhecimento da corrente literária Neo Realista, editando os muitos trabalhos sobre Alves Redol que se vão produzindo nas universidades de todo o mundo, promovendo ainda iniciativas as mais diversas sobre os artistas plásticos e escritores deste movimento, pois é um facto que com o tempo, o estudo do movimento neo-realista português está cada vez mais arredado do ensino académico. Vivemos tempos de obscurantismo, cegueira e lavagem revisionistanomundoacadémico.
Obra densa com vinte e um artigos assinados por autores nacionais e estrangeiros, galegos e brasileiros, divide se em duas partes A primeira com o sub título Alves Redol – Presente e Futuro da Sua Obra A segunda: Neo-Realismo Português e RealismonoMundo(cont.).
Desta revista com um preço quase simbólico, registamos de uma dos seus coordenadores, Paula Godinho, o seguinte: “Dignificar os seres humanos através de uma obra sem concessões significa em Alves Redol a lucidez de penetrar a fundo num domínio do saber aconchegado às pessoas, sem, todavia, descurar o lado estético(…)”
Paramaisinformaçõessobreesta Revista divulgamos: Associação
Promotora do Neo-Realismo, Rua Alves Redol, 45, 2600-099, Vila FrancadeXira.
António Ramos
A Casa Forte Alentejana Na transição da Época Medieval para a Época Moderna
Margarida dos Santos Contreiras Edições Colibri - 2022, 170 pp.
Um importante estudo, bem fundamentado,cominúmerosexemplos, da evolução da Casa Forte Alentejana. Esta teve uma implantaçãoumpoucomaistardiaemrelação ao Entre Douro e Minho, onde existe um grande expoente desta arquiteturaeorganizaçãoterritorial.
No Alentejo vamos assistir a partir do séc. XV, à implantação desta demonstração de poder por parte das famílias importantes, com uma nova abordagem e uma nova organização do território. Este trabalho permite ter um conhecimento de toda esta dinâmica, que tem na Casa Forte Alentejana a sua expressãomaisvisível.
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João Santos
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Da Toponímia de Évora SéculoXVI,vol.III
Afonso de Carvalho Edições Colibri, 2021, 560 pp.
Uma importante publicação, que torna o passado desta cidade de Évora, mais presente. Através da toponímia, este trabalho transporta nos para uma Évora do séc. XVI, com as suas ruas e as suas gentes, que moldaram, deram identidade e uma históriariquíssimanestanobrecidade.
Nasprimeiraspáginastemosuma planta do séc. XVI, que nos permite situar em toda a leitura ou pesquisa deste trabalho. Para além de um índice, com todos os nomes da toponímiatratadosnapresenteobra.
João Santos
Cadernos de Viagem, Galiza 1905, de Fialho de Almeida
Introdução e notas de Lourdes Carita
Associação Cultural Fialho de Almeida e Edições Colibri Lisboa, 2022, 343 pp.
Através deste livro, fica-se a conhecer melhor o alentejano Fialho de Almeida. Desta vez, na sua activi-
dade de jornalista e escritor, como viajante que documentou lugares por onde passou. A Galiza foi um deles, e embora Fialho de Almeida tivesse ordenado a destruição, à data da sua morte, de todos os seus escritos que não estivessem prontos para publicação, um seu grande amigo e testamenteiro, Xavier Vieira, em boa hora manteve os 14 cadernos manuscritos em que o escritor registara as suas impressões de uma das três viagens que fez à Galiza. Tal facto permitiu, também em boa hora, que esses documentos fossem trabalhados e editados na Galiza (Loiavento, 1996), com introdução e notas de Lourdes Carita, agora lançado também pelas Edições Colibri. Um documento indispensável para melhor perceber as relações de proximidade e cumplicidade entre o Norte de Portugal e a província galega, que vêm de longe e ainda se mantêm.
José Alex Gandum
A presente obra “leva-nos a viajar no tempo, até ao século XX, e facilmente nos conduz à reflexão sobre as mudanças sociais que, desde então, tiveram lugar. Só alguém que nasceu, foi criado na terra e aí viveu anos marcantes da sua vida nos consegue descrever tão fielmente as gentes e as vivências da pitoresca aldeia marvanense de Cabeçudos”. Não poderia haver melhor introdução a este livro que este começo do prefácio, feito por Teresa Simão, investigadora na UniversidadedeÉvora.
Rostos Graníticos
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Relatos da Povoação de Cabeçudos
Hermínio Felizardo C.M. de Marvão e Edições Colibri Lisboa, 2022, 193 pp.
O autor, Hermínio Felizardo, não podia ser o mais “adequado” para rescrever os testemunhos reproduzidos nestaobra. Assimhouvesseem cada aldeia portuguesa um filho da terra que fizesse um levantamento do local e das suas gentes, e o registasse em livro. Por isso o Posfácio, da autoria de Luísa Maria Dia, também faz jus à dedicação do autor, licenciado e, Artes Plásticas e docente no ensino secundário: “o presente livro é um excelente exemplo, de recordações vividas num tempo e local singulares, que o autor na sua mestria de escrita narrativa, rejeita apagardamemória”.
Alex Gandum
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José
Évora, anos 30 e 40
gueses mais marcantes dos séculos XX e XXI em Portugal, e não só, GalopimdeCarvalho.
José Alex Gandum
Cristóvão- Memórias do Alentejo em meados do século XX
intimidade das emoções e sentidos, assim como pela satisfação da revivificação das almas dos lugares que julgávamos já perdidas num limbo distante.
Mantem-se vivo o património quando há reconhecimento da sua existência. O patrocínio à edição pela Freguesia de S. Cristóvão, patenteia o interesse que o poder localtemnestatemática.
Recomenda-se a leitura desta pequena obra, para quem tenha interesse na cultura tradicional, assim como por quem tenha vontade de fazer partilha da sua própria memória e, para o efeito queira ter um bom exemplo de estrutura organizativa.
A.M. Galopim de Carvalho Âncora Editora, Outubro 2021, 231 pp.
O Professor Galopim de Carvalho não é só o “pai dos dinossauros” português. É, antes de mais, um caso impressionante de lucidez e de produção literária em muitas vertentes: geologia, gastronomia, história, antropologia… lançando livros aos 91 anos de idade e mantendo uma actividade diária intensa no Facebook,porexemplo.
Neste livro, o Professor reuniu uma série de crónicas da vida que se viveu em duas décadas do século passado tão marcantes, na cidade onde nasceu e cresceu, Évora. Para elaborar este livro, Galopim de Carvalho repescou livros e revistas onde participou, acrescentando outras crónicas publicadas em blogues e no Facebook. E para quem tenha curiosidade e fascínio pela vida em Portugal e pelo património identitário, particularmente no Alentejo, na primeira metade do século XX, em pleno Estado Novo, este livro é uma boa companhia. Ainda por cima escrito de uma maneira acessível e apelativa, como é o timbre da escrita edamaneiradeserdeumdosportu-
Caeiro Edições Colibri, Lisboa: 2022, 173 pp.
Com o apoio da Academia Portuguesa de História, cuja Presidente assinou a Nota de Abertura, este livro é um excelente registo de memória sobre o quotidiano transtagano desde os anos cinquenta do séculoXX.
O coletivo transmitido pelo filtro individual da autora que, de forma muito clara e muito gráfica, nos transporta para as vivências da realidade de um mundo marcado pela dinâmica cultural, pautada pelos ritmos da mecânica extensível à natureza humana e animal é, de facto,fascinante.
Quem ainda lembra algumas vivências em espaços e períodos específicos tão característicos da sociedade tradicional portuguesa, não pode deixar de sorrir ao ler este testemunho tão caracterizado pela
Aldeia Nova de São Bento: Memória, Estórias e Gente.
Saúde Edições Colibri, Lisboa: 2021, 293 pp.
A partilha da memória tem rostros e alma de gentes que configuram a essência e a história, com passado recente na Aldeia Nova de são Bento. Pese o facto de o registo ter o cunho individual da memória do autor, os pormenores serão
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S.
Zulmira
José
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identificáveis por quem vive ou viveu nestavilaalentejana.
O livro está bem estruturado no que refere às temáticas, constituindo-se um conjunto agradável para quem queira focalizar atenção a detalhes da vivência social, cultural e desportiva.
Obra que pode interessar a quem queira conhecer melhor as marcas da ruralidade, no contexto de dinâmica socioeconómica da vila em apreço. Escrito com interpretações de manifesto carinho sobre registos fotográficos que, para além da escrita que estimula a integibilidade simbólica, impulsionam a capacidade de recordar sempre que se tenhaestaobra“àmão”.
Ana Pereira Neto ISEC Lisboa, CHAM, FCSHNOVA
A Escola Gabriel Pedro
memorialísticoincomumpois,metodologicamente foi sendo escrito graças à investigação em arquivos, espólio documental disperso, fontes icnográficas particulares, entrevistas a antigas pessoas que trabalharam e estudaram nesta escola durante as suas vidas. Daí termos por um lado um corpo de escrita historiográfico muito rico e interessante e um outro corpus constituído por uma rica bibliografia citada, Fontes, um anexo e índice de entrevistas em número detrinta.
Obra de grande rigor científico sem ser propriamente académica, é uma preciosidade para aqueles que que ainda puderam de alguma forma participar para ela, para os actuais “actores” diários da Escola e para os investigadores que trabalham em especial a evolução do Ensino em Portugal.
Esta escola começando por ser de ensino técnico e comercial, sofreu as alterações na educação em Portugal e acabou por sobreviver às convulsões ou “reformas do ensino” que foram mais que muitas, mas conseguindo ainda hoje reafirmar-se mesmo que num sistema unificado Secundário, Profissional, Científico e Humanístico, como uma referência nacidadedeÉvoraenaregião.
Destaque para os trinta testemunhos orais que enriquecem esta peça, repita-se de grande valor historiográfico local regional e nacional.Parabénsaoautor.
António Ramos
pós-Doutoramento, financiado pela FCT, a investigadora apresenta-nos uma abordagem multidisciplinar, com um cunho de cariz etnológico sobre as transformações da sociedade rural e as suas repercussões nos usospolíticosdacultura.
Pese o cunho científico de norteia com qualidade esta obra, a autora utiliza uma linguagem de leitura inteligível para quem tenha gosto por temas relacionados com a cultura.
O questionamento da validação das declarações patrimoniais é tónica nesta obra, que se constitui um excelente estudo de caso sobre a construção de identidades onde a música, a política e o meio bio sociocultural são orientadores de pesquisa.
Fernando Luís Gameiro Edições Colibri, Lisboa, 2021, 292 pp.
Por motivo do seu centenário, o da “Escola Gabriel Pereira” – Évora, decidiu o autor com a ajuda de centenas de entusiastas da ideia, escrever este livro que é um reportório
Práticas da cultura na Raia do Baixo Alentejo. Utopias, criatividade e formas de resistência
Dulce Simões Edições Colibri, Lisboa: 2021, 327 pp.
Com a edição deste livro que surgiu no âmbito de um projeto de
Um livro fundamental para perceber a génese da produção criativa tradicional, algo que se torna imperativo atualmente para compreensão da autenticidade que vai faltando atualmente através da banalização das rotulagens de produtos turísticos, tão características da sociedade neoliberal.
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Ana Pereira Neto ISEC Lisboa, CHAM, FCSH-NOVA
Onde
José Luís Peixoto
Quetzal Editores, 2022, Lisboa: 139 pp.
Da série Língua Comum, que inclui toda a obra de José Luís Peixoto, como refere no verso da página final, sobre o autor, este livro de pequeno formato conduz-nos, mais uma vez como acontece tantas vezes na obra de José Luís, a lugares onde transparece a afectividade que marcaram o autor provavelmente na sua infância A escolha de três concelhos, cidades, vilas, nas margens do Tejo, próximo geograficamente da sua Galveias natal, Sardoal, Abrantes e Constância Pequenos textos, num total de 62 - 20 cada, excepto Abrantes com 22 – sobre igrejas, miradouros, jardins, bibliotecas, um castelo, um convento, um mosteiro, uma casa-museu, praças, um largo, um moinho, um chafariz, duas aldeias, mas também, sobreiros, um eucalipto, um museu, um roteiro, uma praia fluvial, um cais de acostagem ou a confluência dos rios Tejo e Zêzere são os objetos deste livrinho
Seria mais um um tema, interessante mas não é totalmente
inédito – não fosse a força telúrica da prosa, sempre poética, de José Luís que nos aprisiona do primeiro ao último texto – a ordem pode ser diversa.
Como inicia “Praça da República” PERANTE UMA GEOGRAFIA DE TEMPO E ESPAÇO, o centro do Sardoal é o centro de mundo. Essa é a grandeza desta Praça da República, olha em volta. A partir daqui, começa um livro. (…) A personagem principal és tu. Eu?, perguntas tocando o peito. Sim, tu. Cada passo que dês a partir daqui, cada palavra que digas ou penses pertenceráaesselivro.(…)
Ouestroutro: ConfluênciadosriosTejoeZêzere CONSTÂNCIA
UM RIO QUE SE MISTURA COM OUTRO RIO, como luz que se mistura com luz, sombra com sombra, como um nome que se mistura com outro nome, como um olhar que se mistura comoutroolhar(…)
Um rio que se mistura com outro rioquempoderásepará-los?
Ninguém. No mundo, não existe forçaoucompetênciacapazdeseparar duas gotas de água que decidem fundir-se.
Dois exemplos. Muitos outros se poderiam referir, onde o rio e a sua memóriaéumaconstante.
Acabadinho de sair – soubemos pela nossa amiga Bibliotecária de Beja, Maria Paula Santos, a que o Zé Luís tinha transmitido na última estada recente em Beja, de início somos levados a comparar com o anterior e soberbo Almoço de Domingo – foi destaque na edição anterior – mas rapidamente ficamos seduzidos.
Onde, neste território de descobertas, onde uma folha anónima é pincelada de uma deslumbrantebeleza.
Ciclo Lunar
Duas Novelas Góticas e uma HistóriadeAmor
João Luís Nabo
Editorial Colibri, 2022, Lisboa: 188 pp.
Este novo livro de João Luís Nabo, tem novamente como “pano de fundo” a – sua – Vila Nova, desta vez transportando-nos até aos séculos XVI e XVII, mais precisamente entre 1510 e 1620, isto é, desde a inauguração do Convento da Nossa Senhora da Saudação, entregue a um grupo de dez freiras locais da Ordem Dominicana. Este edifício só é possível com os actos beneméritos da senhora Dona Constança Bastos de Moura viúva do Cavaleiro do Reino, Dom Álvaro Paes de Moura, que aplicou toda a sua fortuna na construçãodoConvento.
Como o subtítulo indica, João Luís Nabo conduz-nos através de Duas Novelas Góticas e uma História de Amor, especificamente“O Cordeiro”, “O Abismo” e “Sara”, a 1 de Setembro de 1620 e ao fim dos amores de Sara e Raimundo, quando esta chega com a família e outros cristãos novos denunciados a Lisboa e depois expulsos para Jerusalém, interrompendo assim um grande amor que conduzirá ao fim de ambos. É assim que, com eco nos nossos dias, o
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autor, com uma escrita fluente e cativante, como é seu apanágio, nos deixa seduzidos da primeira à última página,revelando-noscaracterísticas do Convento da Nossa Senhora da Saudação onde os “vários acontecimentos vieram a fazer dele o mais misterioso, sinistro e enigmático Conventodasredondezas.”
Tem sido muito interessante acompanhar o percurso literário de João Luís Nabo, que se veio a afirmar pela sua maturidade e riqueza narrativa e que, ainda que em períodos históricos tão diversos como os que surgem nesta obra e o século XX no romance anterior, Sertório, uma história de Vila Nova – referido na nossa última edição – parece estar sempre presente uma aposta clara na valorização da memória e dos valores identitários desta Vila Nova que cresceu em torno do seu “Monte Maior”. Pela autoestima identitária emqueseempenhaatravésdaverossímil criação literária, João Luís Nabo está de parabéns pelo seu – mais este - contributo inestimável para a literatura com origem no nosso Alentejo. Aquilheenvioomeuabraço!
Eduardo M. Raposo CHAM, FCSH-NOVA
Calamento
Romeu Correia Edições Colibri, 4ª edição, Lisboa, 2022, 208 pp.
“-Dáumtostãoavó,dá?...
Palmira remexeu no bolso do avental e só encontrou um lenço enxovalhado, um tubo de linhas, umatesoira….
- A avó não tem!...Não tem! – e a velha indignou-se contra a sua condição. -Não tem, escusas de pedir! Rai´s parta isto! Toda a vida a aparar crianças e nem ganho pra mandar cantarumcego!...
Teve um desalento maior – E pra
mais ajuda, tenho agora pla proa uma pigonheiraapôrmãosnoofício…
ACustódiaabriumuitoaboca:
- Ah! Já dei fé nisso, já! É de Lisboa, não é? E com carta de autorização passada nos hospitais…Veste com´umamédica,todadebranco…
- Tá lindo isto, não haja dúvida! –Fez a outra, compondo, no colete da neta, dois montinhos de trapos simbolizando seios. – Qualquer dia deitam uma pedra ao pescoço da gente e atiram-nos ao mar! O qu´isto foi e o qu´isto tá!...-Dantes viviamos em palhotas, mas eram só nós! Lá nos arremendávamos…e inté o mar era mais pescarejo! Agora…é o que está á vista: construções e mais construções, foguetes e mais foguetes, e o estupor da praia cada vez mais embruxada! Que m´importa a mim qu´isto tenha rótulo de cedade, que qualquer dia façam pr´aí um campo pra órplanos, luxos e mais luxos, se tamos todos na penúria!?Ora chiça comadre!...
- Nem mais! Dou-lhe toda a razão!...”
Que outra forma de chamar à atenção do leitor que deixar aqui um pouco da prosa de Romeu Correia, felizmente agora reeditado nesta sua obra “Calamento”, sobre a vida dos pescadores da Costa da Caparica, de
todasasCostasdePortugal….
Quase milagre este, graças ao esforço e empenho de António Mota Redol e do incansável promotor da Cultura que é o editor Fernando Mão-de-Ferro.
Uma reedição imprescindível em qualquer biblioteca agora que é quase impossível encontrar alguma ediçãoantiganainternet…
Dói-me tudo, senhor Doutor!Estórias com humor apesar da Covid-19
Jorge Branco Edições Colibri, Lisboa, 2022, 158 pp.
Eis um livro verdadeiramente surpreendente Diz se livro de humor O senhor bastonário da Ordem dos Médicos (in prefácio) refere-o como livro “Sério e divertido”. A dificuldade de catalogação é pordemaisevidente.
Depois de lido, avidamente lido, são incontáveis as histórias clínicas que o autor, felizmente para todos nós,deitouaoprelo.
Estamos muito longe de um “Retalhos da vida de um médico” de Fernando Namora, 1949, mas é na
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mesma uma colecção salutar de histórias vividas, que em grande parte deixam bem dispostos os que as lerem e ao mesmo tempo, são escritas com o máximo de consideração e dignidade pelos protagonistas, os pacientes regra geral semianalfabetos e que dão origem a diálogosengraçados.
Claro está, há uma parte séria neste livro Sem serem uma denúncia, muitas das histórias só acontecem devido a equívocos administrativos, alterações burocráticas impostas aosmédicosequelhesafligemassuas vidas, um rol de coisas que poderão ser hilariantes mas que não deixam demostrarumarealidadediferente,a de desconsideração com que o Sistema Nacional de Saúde (SNS) trata os médicos anos após ano Por exemplo este pormenor delicioso “(…) dez horas consecutivas prescrevendo à mão; sexta feira continuava a não se entender com a “besta” ( o PEM) ( ) indo já no terceiro dia “ a lutar de punho”(…) com esferográfica modelo BIC, à conta de Laelovac 500mg cujo uso ilegal o nosso ministro não se cansava de sublinhar, desde que proibida qualquer oferta, de qualquer brinde, a clínicosdoSNS ”
Ou ainda a menina Graça que se queixa. “Não é preciso confirmação microbiológica, o diagnóstico não deixa dúvidas, é dos livros: extremo malestar,ousejasensaçãoabsolutade estar doente, calafrios, mialgias ( aqui a doente responde à pergunta incapaz de localizar a dor e diz: Dói-me tudo senhordoutor(…)”.
Sim, um trabalho escrito por quem já tem experiência e que nos deixa testemunhos de uma profissão superiormente mal qualificada mas apaixonante na sua dimensão humana.
Receita-se a leitura para casos de stress, abatimento moral, nostalgias, etc...
Cantigas Judias Sefarditas
Eduardo Ramos Edição de autor, Silves, 2021
Eduardo Ramos apresenta-nos neste seu trabalho 13 temas – um é de sua autoria, um belo instrumental – fruto da alguma pesquisa, mas grosso modo temas do seu conhecimento “passados de boca em boca”, temas para alaúde e alguns para guitarra, como nos refere, com origem nos séculos XIII e XIV, cantados em hebraico peninsular ou língua ladina.
Remete-nos para uma continuidade histórica, para um período de tolerância em que as “três religiões do livro” coexistiram pacificamente na Península Ibérica como não mais viria a acontecer, até aos nossos dias - onde existe ainda algum estigma deixado pelos séculos “negros” da Inquisição.
A comunidade judaica no actual território nacional, desse período conhecido como muçulmano, de apogeu civilizacional, que soube fazer convergir as três comunidades, período praticamente contemporâneo de Afonso VI – avô do nosso Afonso Henriques - que dizendo-se imperador inicia a derrocada dos reinos muçulmanos, então organizados em taifas, depois do desmembramento do califado. Continuidade que seu neto, dito o ruivo, duas gerações depois, soube perceber, contexto cultural que se estende até aoreinadodeD.JoãoII.
Afonso Henriques, instalado em Coimbra vai “beber” o saber mediterrânicodosdescendentesdapoderosa comunidade moçárabe, a sua nova elite guerreiro oriunda da baixa-nobreza, cavaleiros-vilões que vão “resistindo” à liturgia romana imposta pelos cristãos vindos do Norte, no contexto da reforma do Papa Gregório VII fazendo deles o seunúcleoduro, Eduardo Ramos, tantas décadas a oferecer nos a música e o contexto cultural do período referido no nosso território e na península, a que se tem dedicado como mais nenhum músico/compositor português traz me, neste disco, em edição de autor, com uma apresentação singela, mas onde não faltam imagens que nos indiciam o mundo sefardita, como uma referência à cabala a par com uma boa foto de Eduardo, da autoria de André Bôto. Mas este disco vale essencialmente pelo rico espólio poético/musical, estas cantigas judias de uma comunidade que, quando a isso impelida, soube espalhar se pelo mundo e ao contrário tanto dos muçulmanos como dos moçárabes peninsulares, manteve quase intactos os traços genéticos identitários.
Eduardo assume como é costume, a voz, o alaúde árabe, mas também a guitarra, gambry e flauta de bambu acompanhado por habituais companheiros de palco Tiago Rêgo, Baltazar Molina, Tiago Jónatas na darbuka e no bendir e Joaquim Galvão e Carlos Mendonça na flauta transversal, neste interessante disco com composição gráfica de FernandoLobo.
Parabéns, mais uma vez ao Amigo Eduardo Ramos, presença frequente nas páginas desta Revista, um abraço fraterno por nos devolveres em cada trabalho a nossa identidademilenáriaibérica.
ACONTECENDO CDs / EXPOSIÇÕES
António Ramos
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Paulo Ribeiro Açor, Lisboa, 2021
Neste seu disco Paulo Ribeiro, com a sua voz melodiosa, oferta nos uma diversidade temática onde realçam quatro temas populares que ele adapta de músicas tradicionais, mas também letras de autor, dele próprio, caso da “Moda do Luisinho”, dedicada ao seu menino quando este completou três meses, mas também de Almutâmide,refiro mea“Afã”,deManuel Alegre, o belo “Nocturno de Beja”, de Alberto Caeiro “Ah, só eu sei”, dedicado a Janita Salomé, também um – único – tema em inglês “Alentejo seen from the train”, de Fernando Pessoa, ou de João Monge, ”tenho saudades, mais nada” ou finalmente “Minha mãe, estou d'abalada”, de Romão Janeiro. Todas estas músicas são da autoria de Paulo Ribeiro, que reafirma aqui a sua vertente de compositor, e para além de interpretar faz coros em quatro temas e voz e harmónica noutro, enquanto Jorge Moniz assume a produção musical, ao mesmo tempo que participa directamente em 10 temas, seja na bateria, bateria e coros, percussões, programação, bateria e percussão, programação e teclados ou nopiano
“Ribeiro é um curso d'água alimentado por diversos braços E Ribeiro sou eu também, influenciado por diferentes sonoridades Obrigado a todos que em mim flutuam Obrigado aos músicos, à minha família e aos convidados Rão Kyao e Emídio Coutinho”, escreve Paulo Ribeiro, no interior do disco Os músicos são, Luís Barrigas, no teclado, João Custódio no contrabaixo, João Vitorino na guitarra e coros.
Este último disco de Paulo Ribeiro, com um grafismo cuidado, subtil da Ana Carla Faísco, que vai ao pormenor de apresentar no livreto um excerto da ilustração, na perpendicular, de Susa Monteiro para o tema “Nocturno de Beja”, ou o Paulo como que a tentar agarrar - o mundo, dizemos nós, ou um sapato – talvez do caminho, no próprio disco, que ao girar, caminha – ou ainda de entre as fotos da gravação, uma com o Luisinho ao colo,ououtrapetiscando,parece.
Com gravação a cargo de João Portela, Saafran Studio, com mistura de João Martins Sela, estúdio Ponto Zurca, masterização de Rui Dias, estúdio Mister Master e com gravações adicionais nos Estúdios Musiberia e Ponto Zurca, este disco homónimo de Paulo Ribeiro consubstancia-se mais um degrau de percurso, um caminho que o autor, músico, interprete e compositor tem feito caminho, com registos tão diversos, do rock ao Cante, da tradição à modernidade, mas sempre com a alma do Alentejo, com as raízes identitárias presentes, onde temos vindo a acompanharasuacarreiravaipara20anos.
Parabéns, Amigo, por mais este bonito contributo para a música portuguesa!
António Couvinha expõe no Palácio D. Manuel
Eduardo M. Raposo CHAM, FCSH-NOVA
Trata-se de vasto conjunto de trabalhos de desenho e pintura de António Couvinha, conceituado artista plástico eborense, que expõe no Centro Interpretativo da Cidade deÉvora,PaláciodeD.Manuel.
Organizada em dez núcleos “temáticos, permite fazem uma retrospetiva dos 50 anos de criação do pintor (1972 - 2022), a exposição, Inaugurada em Outubro, vai estar patente ao público até 21 de fevereirode2023.
No catálogo o autor refere a satisfação de voltar ao local - agora renovado–onde,em1985,apresentou a sua primeira exposição individual. “Aqui ficam estes desenhos e estas pinturas, como peças de um puzzle desfeito, apelando à vossa imaginação. Tudo feito em silêncio. O silêncio foi quase sempre o cenárioacústicodosmeustrabalhos”.
Na abertura da exposição, Carlos Pinto de Sá, Presidente da Câmara Municipal de Évora, entidade que organiza o evento, destacou a “grande satisfação” com que a autarquia e a cidade recebem esta mostra de um “notável artista de quem Évora é devedora por décadas de arte”. Manuel Branco e Francisco Bilou, ambos historiadores de arte, teceram também palavras elogiosas para comoautor
Horário: segunda-feira a sábado, entre as 9h30 e as 12h30 e as 14h00 eas18h00.
ACONTECENDO CDs / EXPOSIÇÕES
Ribeiro
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José Moutela
A personalidade homenageada em 2022 foi o cenógrafo e arquitecto José Manuel Castanheira (entrevistado, em destaque na nossa edição º 42,2020)
A consolidação da sua matriz internacional, pois 13 dos 20 espectáculos de teatro são oriundos de oito países – Suiça , Inglaterra, Itália, Espanha (duas companhias madrilenas) França (Marselha, Toulouse, Paris e Cébazat), França e Chile, Alemanha, Bélgica - de dois continentes–EuropaeAméricadoSul.
Em destaque estiveram nomes consagrados como Robert Wilson, com o Théâtre de la Ville, a companhia Baro d'evel, de Toulouse, Thomas Ostermeier, director artístico da histórica companhia belinense Schaubühne ou o criador belga Wim Vandekeybus. No que concerne às companhias nacionais, além da anfitriã,aCompanhiadeTeatrodeAlmada, a assinalar produções da Close2Paradise (Lisboa), Teatro Experimental de Cascais, Teatro dos Aloés (Amadora), Artistas Unidos (Lisboa), Arena Ensemble (Lisboa) e Ar de Filmes/TeatrodoBairro.-
A terminar a 39ª edição do Festival de Almada, dia 18 de Julho, o público votou e escolheu o espectáculo que vai voltar na próxima edição do Festival como Espectáculo de
Honra: Eu sou a minha própria mulher
Foram também atribuídos os Prémios Internacionais de Jornalismo Carlos Porto, referentes aos textos publicados o ano passado na Comunicação Social, sobre o Festival de Almada: Grande Prémio Carlos Port,o Prémio Carlos Porto – imprensa generalista, Prémio Carlos Porto –imprensa especializada O júri atribuiu ainda três Menções Honrosas, entre eles o texto publicado na revistaJeu(Canadá).
O Festival de Almada voltará para o ano, com a 40ª edição, de 4 a 18deJulhocoméhabitual.
nalguns temas a solo, sem qualquer instrumento, com um domínio pleno e inimaginável da voz deste espanhol de Eche, artista multidisciplinar, com registos entre o flamenco, o rock, a música erudita contemporânea, a performance e tonalidades latino americanas - e a sua relação com o flamenco - onde não faltou uma homenagem a Victor Jara. O músico acompanhante, enorme guitarrista brindou-nos com um tema a solo, umflamencodearrepiar.
O grande, enorme, fantástico concerto da noite, este sim excedeu todas as expectativas - e eram muitas - foi Omara Portuondo Peláez, cubana de Havana, que em Outubro completa 92 anos, que já há mais de 70 anos que tem vindo a alcançar sucesso internacional - «É a diva de todos os cubanos» que referiu a Embaixadora de Cuba, acompanhada do Autarca Nuno Mascarenhas, que subiu ao palco que lhe dar um ramo de flores com as cores da PátriadeChe.
O FMM – Festival Músicas do Mundo,apósdoisanosdeinterregno regressou a Sines entre 22 e 30 de Julho, apresentando múltiplas geografias de 27 países, onde houve a preocupação em dar às artistas mulheres a visibilidade correspondente ao seu contributo real para a músicaàescalaplanetária.
Nesta edição destaque para dois grandes, excelentes espectáculos, na programação dos tês dias que passamosemSines.
Niño de Elche, a revelação da penúltima noite, diria mais, do FMM - de todos os concertos a que assistimos. Um espectáculo soberbo,
Memorável esta senhora que partilhou palcos com Nat King Cole, esta lenda viva com total mestria nessa sua longa carreira praticando géneros como o feeling, o jazz, a nueva trova, o son, o bolero e a habanera. Em Sines tivemos o privilégiodeaouvir,deavervibrarmeneando-se ao som da sua excelente banda, ainda que actuando sentada devido à dificuldade em andar Bridou-nos com temas que fazem parte do imaginário de diversas gerações, da humanidade, como "Bejame, bejamemucho"...
Neste FMM, a última noite teve grandes espectáculos - de entre os 15 que saboreámos - três deles foram em língua castelhana: Albert Pla, Niño de Elche e Omara Portuondo-Catalunha,AndaluziaeCuba.
Voltamos em 2023 para o grande - e verdadeiramente, único - festival de músicas do mundo que acontece emPortugal.
ACONTECENDO EXPOSIÇÕES / FESTIVAIS
FMM - Niño de Elche e Omara Portuondo em Sines
José Manuel Castanheira homenageado no Festival de Almada em 2023
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O Centro Interpretativo do Vinho de Talha distinguido
O Centro Interpretativo do Vinho de Talha (CIVT) de Vidigueira recebeu uma menção honrosa na categoria “Coleção Visitável”, na edição de 2021, dos Prémios da APOM – Associação Portuguesa de Museologia. A entrega dos prémios teve lugar a 29 de outubro, noMuseudaMarinha,emLisboa.
O Centro Interpretativo do Vinho de Talha fica localizado na freguesia de Vila de Frades e tem como objetivo “ transmitir aos visitantes as memórias, as vivências e as experiências relacionadas com o vinho de talha e com as gentes que ciclicamente fizeram chegar estatradiçãoaosdiasdehoje”.
Curiosamente foram encontradas duas em Vila Alva, respectivamente de 1673 e 1681com uma cruz desenhada com círculos e em Alcobaça, bem mais ao norte, existe uma talha com a mesma data e os mesmos símbolos destas existentesnaTabernadosArcos.
Animação este a cargo de elementos do Grupo Coral de São Cucufate, a que se juntaram alguns cantadores e amigos do Cante, enquanto decorria a prova enogastronómica, frequentada pormuitasdezenasdepresentes.
O CEDA e a Revista Memória Alentejana estiveram presentes e deixamos o nossa bem haja, à Daniela Almeida, directora de Comunicação, pela sua disponibilidadeeextremasimpática.
Évora Capital Europeia da Cultura em 2027
Dia 07 de dezembro ficaremos a saber que cidade portuguesa será Capital Europeia da Cultura em 2027. Para além de Évora, são finalistas as cidades de Aveiro, Braga e Ponta Delgada. A candidatura de Évora 2027 parte do conceito de VAGAR e leva-o mais longe como uma outra arte de existência para a Humanidade.
Paula Mota Garcia Coordenadora Equipa de Missão
Na Taberna dos Arcos, em Vila de Frades, recentemente restaurada pela Adega Cooperativa de Vidigueira, Cuba e Alvito (ACVCA), procedeu-se no dia 5 de Novembro à abertura de duas talhas – uma de branco e outra de tinto –datadasde1656.
Na cerimónia considerado um marco histórico “para a nossa Adega, pois teremos um vinho produzido na talha mais antiga que a nossa Adega tem aos dias de hoje”, usou da palavra José Miguel Almeida , presidente da ACVCA que realçou a simbologia do momento devidoàdataçãodestastalhas.
Informação no local realça a importância, para os produtores, do seu uso ao longo dos séculos e o seu fabrico, nomeadamente nas principais povoações do centro e Sul do Alentejo, especialmente Vila Alva, Cuba, Serpa, Vidigueira e Campo Maior. Por outro lado, a configuração das talhas varia de localidade para localidade, assim como o tipo de inscrição que estas apresentam.
Eduardo M. Raposo CHAM,
FCSH-NOVA
II CONGRESSO DO CANTE ALENTEJANO – 26/27 Maio de 2023
Várias instituições – Instituto Politécnico de Beja (José Orta e Patrícia Hermozilha), Direção Regional de Cultura do Alentejo (Carlos Pedro), Confraria do Cante (Francisco Torrão) , Museu do Cante (João Matias), Centro UNESCO de Beja (Alexandra Feire) e Associação MODA (José Roque) – decidiram organizar o II Congresso do Cante Alentejano, a ter lugar nos dias 26 e 27 de Maio de 2023, contribuindo assim para a salvaguarda do Cante, bem como para o seu estudo e divulgação.
A Comissão Organizadora deste evento decidiu criar uma Comissão Científica presidida pela Profª Salwa Castelo-Branco e formada ainda pelos Professores e investigadores Pedro Prista, José Rodrigues dos Santos, Paulo Lima, Sónia Cabeça, Eduardo M. Raposo, Ana Machado, Armando Torrão, António Cartageno,todoselesestudiososdocante.
(A partir de Nota de Imprensa recebida de José Orta)
SAUDAÇÃO
Festas do Povo de Campo Maior Património Imaterial da Humanidade
Em Dezembro de 2021 as Festas do Povo de Campo Maior ficaram inscritas nas listas de Património Imaterial da Humanidade da UNESCO
As Festas do Povo de Campo Maior integram agora esta importante lista da UNESCO, da qual já fazem parte o Fado, o Cante Alentejano, a Louça de Bisalhães, os Chocalhos de Alcáçovas, os Bonecos de Estremoz eosCaretosdePodence.
As Festas, que «acontecem quando o povo quer», decoram o centro histórico com milhões de coloridas flores de papel, mas abrem a vila a todos os portugueses, contribuindo demodosignificativoparavalorizare salvaguardar este património que nosécomum.
O CEDA e a Revista Memória Alentejana – na sua edição anterior dedicada a Campo Maior – saúdam fraternalmente o Município que coordenou esta candidatura e colectivamente todos(as) os(as) campomaiorenses muito justamente distinguidos(as).
ACONTECENDO PATRIMÓNIO
Abertura de Talha de 1656
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CEDA
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