Boqnews ed 848 de 09 a 15 07 11

Page 6

9 a 15 de julho de 2011

6

Boqnews

EDUCAÇÃO Cada vez mais visível, a diminuição no número de docentes é reflexo da desvalorização do papel do educador junto à sociedade

Profissão em

DIVULGAÇÃO

declínio N ARA A SSSUNÇÃO DA REDAÇÃO

Assim como descreve o educador e hoje deputado federal Gabriel Chalita, no livro Educação - a solução está no afeto, o professor é o grande agente do processo educacional. "A alma de qualquer instituição de ensino é o professor. Por mais que se invista na equipagem das escolas, em laboratórios, bibliotecas, anfiteatros, quadras esportivas, piscinas, campos de futebol sem negar a importância de todo esse instrumental -, tudo isso não se configura mais do que aspectos materiais se comparados ao papel e à importância do professor." Com tamanha responsabilidade, os professores, porém, estão perdendo gradualmente o poder e a autonomia na sala de aula, sendo vítimas - inclusive - de atos de violência. Esta desvalorização também pode ser percebida pelos salários e a falta de um plano de carreira que incentive os educadores. A consequência? É o número cada vez menor de jovens que optam pela licenciatura e cada vez maior o volume de professores que abandonam a sala de aula. Segundo levantamento do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), a questão pode ser observada pelo número de docentes na educação básica brasileira (Educação Infantil, Especial, Ensino Fundamental, Médio e a Educação de Jovens e Adultos – EJA), que passou de 2 milhões 500 mil 554 profissionais atuando em sala de aula, em 2007, para 1 milhão 977 mil 978 em 2009.

Afastados Outro dado que preocupa é a quantidade de educadores que estão afastados por problemas de saúde. De acordo com a Secretaria Estadual de Educação, somente em dezembro do ano passado 17.514 mil dos 220 mil docentes (8%) que prestam serviço no Estado estavam afastados por motivo de licença-saúde. As enfermidades mais comuns, segundo o Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo (Apeoesp), são relacionadas a estresse, barulho, falhas nas cordas vocais, tendinite, além de problemas psicológicos. "Os dados recentes da educação são impressionantes. Os cursos de Pedagogia, por exemplo, continuam com alta procura, mas percebe-se que os alunos que ingressam nas faculdades não têm como obje-

Desinteresse Péssimas condições de trabalho e a falta de perspectiva na carreira têm reduzido o interesse pela docência

tivo se especializar e melhorar a qualidade de suas aulas, mas sair da sala para conseguir funções administrativas na área da Educação", ressalta o diretor da Faculdade de Pedagogia da Universidade Santa Cecília, com licenciatura em Biologia e Pedagogia, Fábio Giordano. "Com estes dados e o desestímulo cada vez maior, teme-se por um apagão dos professores. Os jovens não têm interesse e os mais velhos ou se afastam ou se aposentam. E isto é uma realidade em todo o País. É necessário estimular a formação de professores a começar em ter um bom ambiente escolar na própria infância e adolescência, estimulando com que os jovens tenham interesse pela profissão", revela. Outra questão importante, segundo Giordano, é que os cursos de Licenciatura e Magistério não podem continuar obtendo os alunos com as notas mais baixas no vestibular. "Deveria ser ao contrário. Aqueles que tem aptidão pela Licenciatura e melhores notas é que deveriam se interessar e ingressar nestas faculdades. O profissional tem que ter uma formação moral e cultural sólida. Só assim a qualidade aumentaria", explica. O Governo paulista, segundo Giordano, avançou ao anunciar o projeto de um plano de carreira, com diversos fatores para avaliação dos professores e benefícios para os que tiveram bons resultados. "Ele será enviado para a Assembleia, mas já é um passo importante. É preciso estimular quem está na sala de aula. Hoje, o governo - por exemplo - oferece cursos de qualificação, mas quem irá estudar para não ter nada em troca?", ressalta.

522mil é a queda de professores na educação básica brasileira registrada pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) de 2007 para 2009

10% é a porcentagem estimada pelo Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo (Apeoesp) do percentual de professores da rede pública paulista afastados por estresse

Árdua rotina Para o professor de Matemática, André (nome fictício), concursado pela prefeitura de Santos como substituto e que está há cinco anos lecionando para crianças e adolescentes, a desvalorização está em todas as áreas da sociedade e não é diferente no ensino. A vontade, explica André, era lecionar para participar da formação das crianças. "Eles serão nossos futuros médicos, artistas, arquitetos... Mas a realidade é bem diferente. Quando saímos da faculdade para lecionar, a intenção é contribuir com a formação destas pessoas, inovando, promovendo atividades diferentes, porém o dia-adia nos mostra que não é tão fácil. Para tudo, a burocracia é enorme e pouco conseguimos realizar de novo com os alunos. Não existe infraestrutura adequada", lamenta. Mesmo com pouco tempo de atuação, o professor se diz cansado e desmotivado. "Começa com a falta de interesse dos próprios alunos e dos pais, que, na maioria das vezes, aparece na escola apenas para reclamar. Eles não participam", explica. Segundo André, a dificuldade começa em uma simples lição de casa. "Sinto-me péssimo quando muitos não praticam em casa. Isso porque eu dou pontos para quem o faz. O pior é que se você os repreende os pais vão até a escola não para saber o que aconteceu, mas para reclamar do porquê agirmos desta forma. Não há uma ajuda para incentivá-los a estudar. É claro que não são todos. Alguns ainda ajudam, se preocupam, mas - infelizmente - são a minoria", revela. André começou na prefeitura com turmas nos três períodos. Hoje, trabalha apenas em uma das unidades municipais no período da manhã, com o total de 30 aulas. "No restante do dia, atuo como professor particular. Assim ganho mais, com estresse bem menor", ressalta.

Salário-base Além do estresse do número excessivo de alunos na sala de aula, a pouca participação dos pais, outra questão que atrapalha é a baixa remuneração que pode ser observada no próprio salário-base de R$149,63. "Como escolhi as aulas de um professor que já está afastado há oito anos, mas continua como titular, e dou as 30 aulas dele, recebo no final do mês cerca de R$1.900. Isso por que pelas duas aulas excedentes eu recebo R$ 5,99. Os professores substitutos sem turmas, porém, recebem um pouco mais que o salário-base. Assim fica difícil segurá-los. Não há incentivo até porque nunca se sabe o quanto se receberá no final do mês", ressalta.


Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.