31ª Bienal de São Paulo (2014) - Livro

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O significado de levar crianças e jovens das periferias à Bienal Visitantes-sujeitos, por Aldo Victório Filho Conduzir jovens e crianças da escola ou do meio em que vivem para atividades extraclasse com vocação “cultural” pode ter significados e resultados diversos. O senso comum afirmaria que uma visita a qualquer museu, exposição etc. seria sempre positiva e, portanto, recomendável. Contudo, a observação atenta a esse tipo de prática impõe pensar em formas, meios e propósitos – evidentes e dissimulados – que a norteiam. Muitas visitas a exposições de arte redundam mais em evidenciar e marcar no imaginário de crianças e jovens as distâncias e a inadequação de suas presenças nos espaços visitados, seja por causa de mediação desatenta às sutilezas das diferenças culturais, seja por essa mesma mediação se sustentar no pressuposto da importância, inquestionável, do que é exposto e da instituição expositora. Ou seja, pela desatenção ao princípio de que todo ato pedagógico (e todo contato com museus e demais espaços expositivos) é uma experiência de aprendizagem que tende a determinar as distâncias e a localização, quase sempre hierárquica, entre o aprendiz e o aprendido. Em outros termos, a possível inadequação da mediação, ou sua ação tendenciosa, pode, planejadamente ou não, inferiorizar o estudante/público diante do bem cultural apresentado. Assim, a presença da juventude periferizada pode ter significados antagônicos em função da ideologia e, obviamente, de sua consciência que conduz tais ações. Clarificar os sentidos políticos e os interesses das instituições de arte e oferecer meios amistosos e afetuosos de desfrute das obras tornará a experiência preciosa e útil para qualquer visitante, obviamente no mais favorável dos sentidos. Mas, se a ação for baseada na ideia de concessão de “cultura” para os pobres ou em outra pantomima de equívoco semelhante, só ocultará a intenção, óbvia, de legitimar a privatização de um espaço público e de desfrute da cultura para apenas uma pequena parcela da sociedade. A transparência das intencionalidades, por Cayo Honorato Em princípio, se poderia supor que a Bienal disponibiliza à crianças e jovens das periferias que visitam a exposição recursos artístico-culturais importantes para sua formação como cidadãos. Que, por serem das periferias, a Bienal lhes reserva uma oportunidade incomum, potencialmente transformadora. Que a Bienal, desse modo, se mostra como uma entidade socialmente responsável, intervindo na distribuição desigual de capital cultural, democratizando o acesso ao que ela oferece. Que, assim, se justificaria o empenho de dinheiro público na realização do evento. No entanto, se poderia supor também que esses são os argumentos em favor da visita para a Bienal, não necessariamente para as periferias ou, melhor, para os sujeitos periferizados. Qual seria, então, para esses sujeitos, o significado de ir à Bienal?

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