Revista Varal do Brasil especial de natal 2014

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Edição Especial de Natal e Ano Novo 2014 /15

Tributo a Minha Avó Por Nilda Dias Tavares Elegante e orgulhosa nos seus sessenta anos, com a sua inseparável bengala preta com castão prateado, minha avó Ana parecia uma figura saída de algum castelo francês, das histórias que eu lia quando menina. Seus cabelos totalmente brancos estavam sempre impecavelmente arrumados e presos por uma travessa de prata, presente do vovô Paulo. Seus olhos verdes, grandes como duas esmeraldas, teimavam sempre em revelar as emoções que vovó queria esconder. Suas roupas sóbrias e elegantes inspiravam respeito e admiração a todos que a conheciam. Era uma mulher forte que sofrera perdas terríveis, mas mantendo-se firme como uma rocha, mantinha a família unida. Muito cedo aprendi com meus pais a admirar e amar vovó Ana. Meu pai era um professor alegre e carismático. Criado em um orfanato sem conhecer seus pais, apaixonou-se imediatamente pelo carinho de vovó Ana. Ele costumava brincar com minha mãe dizendo: -Só me casei com você pra ficar com “mãe Ana. Em 1959, com catorze anos, perdi meus pais em um acidente de automóvel e vim para esta casa morar com vovó Ana. Ela era mãe da minha mãe e sofreu tanto quanto eu a morte dos meus pais, a quem ela amava profundamente e perdeu tão prematuramente. Eu nunca tinha visto vovó chorar, mas seus olhos eram a testemunha muda da dor que ela escondia. A princípio, unidas pela dor, nos amparamos uma na outra, mas, com o passar dos dias os conflitos de gerações afloraram inevitável e fortemente. Vovó Ana tinha ideias pré-concebidas sobre quase tudo, incluindo bailes, minissaias, “Rock and Roll” e namorados. Como era de se esperar, rebelei-me. Quando vovó me comprava roupas comportadas, eu usava mini-saias ou jeans. Quando me proibia de usar maquiagem, eu levava tudo na bolsa e usava no banheiro da escola. Fazia pirraças todo o tempo, queria mostrar que era adulta e ninguém devia me controlar. Queria liberdade.

Tenho certeza, que naquela época eu transformei a vida de vovó Ana num verdadeiro furacão. Mas, as coisas foram se ajeitando com o passar do tempo e com a paciência e o carinho da minha avó, eu aprendi a ceder de vez em quando para manter a nossa paz. Ela cedeu muitas vezes também. Vovó Ana era uma pessoa séria, mas atenciosa e bondosa e eu só a via rir com vontade, junto aos netos. Não era uma pessoa fria, pois cercava de amor toda a família. Ajudava inúmeras obras assistenciais, mas, não permitia que comentássemos com ninguém. Aos dezesseis anos, no Natal de 1961, eu queria dar a minha avó um presente todo especial, algo que falasse do meu amor, do quanto ela me havia ajudado a superar a perda dos meus pais e também pedir perdão por todas as vezes que eu fiz uma verdadeira revolução em sua vida. Encontrei num antiquário o caderno mais lindo que eu já tinha visto! Na capa havia um camafeu de madrepérola e em volta, violetas pequeninas adornavam toda a capa. Escrevi no caderno todas as palavras que eu não disse, todas as desculpas que eu não pedi e todo o amor e gratidão que eu sentia. Colei fotos antigas comigo, vovó e meus pais, coloquei uma rosa entre as páginas e assinei meu nome: Mariana! Depois, botei tudo em uma linda caixa desenhada com rosas amarelas e amarrei com um grande laço de fita branca. Ficou lindo! O dia 24 de dezembro começou com a chegada dos meus tios e primos e a alegria contagiando a todos. O espírito do Natal pairava no ar! Enquanto vovó e as tias cuidavam da preparação da ceia, meus tios arrumavam o quintal e o jardim com mil lâmpadas que piscavam alegremente. Eu, minhas quatro primas e dois primos, enfeitávamos com bolas coloridas a árvore de Natal, arrumávamos os presentes e a decoração da casa. Parecíamos formigas agitadas cuidando de um formigueiro. A noite chegou e todos elegantemente vestidos, nos sentamos à mesa. Como sempre fazíamos, demo-nos nossas mãos e fizemos uma oração de agradecimento a Deus, por estarmos juntos e por todas as bênçãos recebidas. (Segue)

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