CARTA PECUÁRIA
PERSPECTIVAS
Edição Nº 27
ceberá que o puxão do primeiro fio, aqui, no caso, dos preços do bezerro, como dissemos, o conectará com o abate/retenção de fêmeas, com o lucro da cria e esse assim adiante conectará com todos os outros. Onde esse novelo irá? Mais cedo do que imagina você perceberá que estará voltando ao início puxando o fio dos preços do bezerro.
Rogério Goulart Editor da carta pecuária
A pecuária é um emaranhado de fios emendados uns nos outros. Puxe um fio. Quando achar que ele está no fim você descobrirá na realidade ele amarrado fortemente em outro. Puxe o fio do preço do bezerro. Preços bons, diga-se de pas-sagem. Ao puxá-lo você o encontrará amarrado no abate de fêmeas, no sentido de que a causa na alta do bezerro foi o aumento do abate de fêmeas precedente. Se você puxar o fio do abate de vacas você encontrará o fio do lucro da cria, no sentido que a causa do abate crescente de vacas foi fruto de a atividade estar lucros diminutos na ocasião. Você pode continuar a puxar os fios indefinidamente, caro leitor. Com o tempo per62 | Bovinos
A pecuária é assim. É um sistema que uma coisa puxa a outra. Não há fim. As coisas se repetem. Elas são cíclicas, em outras palavras. Ocorrem de tempos em tempos. É por isso que chamamos essa recorrência com o passar dos anos de ciclo da pecuária ou o ciclo pecuário. Os ciclos pecuários no Brasil são catalogados há décadas e se renovam entre sete e dez anos. No boi existe uma narrativa, e ela é contada em ciclos. Ciclo do quê? Existem algumas maneiras de enxergar o mesmo fenômeno. Gosto muito do ciclo de preços do boi sobre a inflação e do ciclo de oferta de animais. Mas o mais simples e elegante mesmo é olhar para o ciclo de lucro da cria. É da cria que parte o primeiro fio; é ela quem estabelece o ritmo dos elos seguintes. Por exemplo, como dissemos, o bezerro está muito bom
de preço. O bezerro estar bom de preço é peça fundamental aqui pois ele é o gatilho do movimento, caro leitor. É ele o indutor do processo de alocação de recursos para a cria ou não. Como assim? O lucro com a venda de um bezerro age e influencia no mais impor-tante: a oferta e o estoque de vacas. Uso “vaca” aqui no sentido amplo engloban-do todo o estoque de fêmeas desmamadas. “Quem manda no boi é a vaca”. Qual é o motivo da vaca mandar no boi? Porque um ambiente com lucro satisfatório saindo da cria a tendência observada é a do criador apostar ainda mais no seu próprio negócio aumentando a quantidade de vacas no seu plantel. Esse aumento ocorre de duas formas. Ele compra vacas novas no mercado ou segura suas próprias crias. No final o resultado é o mesmo: uma maior quantidade de vacas em estoque disponíveis para fazerem novas e maiores fornadas de bezerro em quantidade. Paralelamente a um mercado de cria animado há uma redução na oferta de vacas para o abate. Não são apenas as novilhas que entram no sistema, o criador tende a segurar aspróprias vacas já em reprodução dentro da fazenda. Se-
gurar as vacas na fazenda gera uma queda na oferta de vacas gordas para o frigorifico. Isso dá para ser medido. A oferta de vacas é o divisor de águas nos ciclos pecuários, caro leitor. Quem nos lê há tempos sabe que evito falar de números e de causas versus consequências sem demonstrar isso em números crus, sem interferência e ajuste de minha parte. Raramente emito opinião. A razão disso é que o mercado, e ape-nas ele, tem o ônus da prova. Prefiro que ele nos mostre o que sabe e para isso ele tem que nos mostrar duas coisas. A primeira é se ele segue algum tipo de cadência com o passar dos anos, ou seja, se ele se repete. A segunda é se essa repetição é previsível de alguma maneira. Felizmente para nós a pecuária é uma das séries em economia mais estáveis e previsíveis que existem. É estudada como exemplo mundo afora. É por essa razão que podemos fazer projeções nos desdobramentos de longo prazo dos preços. Poucos mercados possuem esse flanco. O que iremos fazer hoje aqui na Carta Pecuária Perspectivas é contextualizar essas coisas. Aonde estamos dentro do ciclo pecuário? Criar a sua Ü