Onde foi que voces enterraram nosso mortos edição atualizada

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membro da base do PCB na Faculdade de Direito da Universidade Federal Fluminense - UFF. Um dia ele me disse que não era justo eu pegar dois ônibus e mais a barca para chegar ao emprego, trabalhar o dia todo, estudar à noite e passar horas imprimindo e distribuindo o material clandestino para a militância do PCB. Prometeu arrumar-me um emprego no banco onde ele trabalhava. Dito e feito: alguns dias depois eu pedi demissão da transportadora e fui trabalhar no Banco Pareto, que era localizado nas proximidades da Praça XV, com meio expediente e recebendo um salário maior. A partir desse novo emprego comecei a ter tempo até para ir à praia pela manhã e à noite reunir-me com a turma na pracinha de Icaraí. Esse era o nosso ponto, onde a gente falava de marxismo e revolução. Daquele grupo saiu boa parte dos membros da Dissidência Comunista de Niterói, mais tarde MR8. Outros não seguiram a gente, expuseram suas divergências e adotaram outras formas de luta contra a ditadura. Em 1967 me desliguei do emprego e passei a ser funcionário do Partido. Minha tarefa era reorganizar as bases do Estado do Rio, e para tal eu e Apolônio de Carvalho, um antigo dirigente do PCB, que lutou na Guerra Civil Espanhola, viajávamos seguidamente ao interior, amealhando os quadros esparsos, reunindo as bases e coordenando as eleições para os comitês e executivas municipais. Ao mesmo tempo em que desenvolvíamos essas tarefas, editávamos juntamente com Nicolau Abrantes o mensário Avante, órgão oficial do Comitê Estadual do Rio de Janeiro. Além de ajudar a escrever, eu levava para o Rio os textos datilografados numa Remington, já bastante desconjuntada, e os distribuía para os linotipistas militantes ou simpatizantes do Partido. Passados alguns dias lá ia eu de novo percorrer as gráficas de São Cristóvão para apanhar as matrizes de chumbo e levá-las no meio da noite para impressão. Depois de pronto eu levava o jornal tamanho ofício para Niterói. Um dia estava na lancha atravessando a Baía de Guanabara quando encontrei o Manoel Valim, que havia trabalhado comigo no Plano Nacional de Alfabetização. Na saída ele se encostou a mim, deu uma olhada de soslaio e disse: “Cuidado, os homens estão de olho”. Saí rapidamente da estação das barcas, sem saber se largava o pacote com os jornais ou se seguia em frente. Não larguei o pacote.


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