Mr. 365 - Primeiros Capítulos

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1ª EDIÇÃO – 2021 RIO DE JANEIRO
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TRADUÇÃO: CLARA TAVEIRA

COPYRIGHT © 2013. MR. 365 BY RUTH CLAMPETT. COPYRIGHT © 2021. ALLBOOK EDITORA.

Direção Editorial

BEATRIZ SOARES

Assistente Editorial

ANA CAROLINA CONSOLINI

Tradução

CLARA TAVEIRA

Preparação e Revisão

RAPHAEL PELOSI PELLEGRINI e ALLBOOK EDITORA

Capa

REBECCA BARBOZA

Projeto Gráfico e Diagramação

CRISTIANE | SAAVEDRA EDIÇÕES

Publicado perante acordo com a Bookcase Literary Agency

Todos os direitos reservados e protegidos pela lei 9.610 de 19/02/1998. Nenhuma parte deste livro, sem autorização prévia por escrito da editora, poderá ser reproduzida ou transmitida sejam quais forem os meios empregados: eletrônicos, mecânicos, fotográficos, gravação ou quaisquer outros. Os direitos morais do autor foram declarados.

Texto de acordo com as normas do Novo Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa (Decreto Legislativo nº 54, de 1995)

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ Meri Gleice Rodrigues de Souza – Bibliotecária – CRB-7/6439

C537m Clampett, Ruth

Mr. 365 / Ruth Clampett ; tradução Clara Taveira. - 1. ed.

– Rio de Janeiro: AllBook, 2021.

268 p.; 16 x 23 cm.

Tradução de: mr. 365

ISBN: 978-65-86624-68-7

1. Romance americano. I. Taveira, Clara. II. Título.

21-74937

CDD 813

CDU: 82-31(73)

2021

PRODUZIDO NO BRASIL.

CONTATO@ALLBOOKEDITORA.COM

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Para Alex, Meu brilhante e fodão docinho. Meu lembrete constante

De viver com grandiosidade, Porque isso aqui não é um ensaio.

Adoro quando nos envolvemos Nos pensamentos loucos um do outro Rindo como loucos.

E adoro os momentos de silêncio quando você me vê como a pessoa que um dia espero ser.

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Capítulo Um

Sala de reuniões de enredos nos escritórios do True Blue Entertainment

— OK, ALGUÉM TEM UMA IDEIA? E NÃO UMA IDEIA PORCARIA, EU SÓ QUERO AS boas — pergunta Rachel, batendo palmas.

— Naturalmente — diz Paul enquanto puxa o rabo de cavalo de Lucy. Ela se vira e bate nele.

— Preste atenção — ela sibila. Lucy senta ereta novamente e dedica toda a sua atenção a Rachel.

O sol brilhante de Los Angeles derrama seus raios nas grandes janelas, tornando as cores sóbrias da sala de reunião, o padrão do escritório, um pouco menos maçantes.

— Você já se preocupou com o fato de que todo tipo de reality show já foi feito? — Phillip pergunta filosoficamente enquanto se inclina para trás em sua cadeira. — Pensamentos sombrios como este me tiram o sono à noite, gente. — Ele coloca os óculos na cabeça, afastando a longa franja da testa. Com uma camiseta temática do Admirável Mundo Novo e jeans, Phillip parece um ex-professor de inglês que virou roteirista de televisão, o que é exatamente o caso.

— Sempre existe uma nova ideia — diz Lucy, que ironicamente não teve uma ideia robusta em dois anos. Ela conseguiu manter o emprego sendo aquele tipo de pessoa que se esforça para trabalhar em equipe e ajudar em qualquer projeto, mesmo quando não envolve escrita.

— Podemos misturar ideias, como pessoas gordas acumuladoras ou pessoas que levam vidas secretas online à noite e colecionam cupons de desconto durante o dia — sugere Phillip.

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— Posso perguntar por que as outras salas de reunião neste estúdio tão criativo têm café e lanches e a nossa nunca tem? — Paul aponta para o bar embutido na parede com uma bancada de fórmica em vez de granito, como era no seu último trabalho. Ele passeia o olhar pelos sofás e cadeiras na área de convivência.

São móveis que tentam parecer chiques, mas na verdade ficam aquém, não muito diferente de como o True Blue se encontra na cadeia alimentar do reality show. Ainda assim, é uma boa escolha, e o melhor de tudo: é perto de casa, em West Hollywood.

— Desculpe te falar isso, Paul, mas o True Blue Entertainment atualmente não é tão criativo. — Rachel levanta sua bebida da Coffee Bean & Tea Leaf comprada no caminho para o trabalho, porque ela não pode beber a lavagem que servem na sala de café.

— Você tem razão. É pouco criativo — Paul diz entre uma tossida e outra. — Mas é um trabalho.

Ignorando a digressão, Phillip continua.

— E se conseguíssemos um monte de ex-estrelas mirins com certos fetiches e botássemos todas vivendo juntas em uma casa? Tenho certeza de que jovens perturbados têm fetiches. — Phillip é conhecido por suas ideias estranhas, várias das quais são responsáveis por programas de sucesso.

— Já sei! Que tal pessoas que ganharam na loteria e são viciadas em pornografia? — diz Lucy com entusiasmo.

— Continuem, pessoal, continuem — Rachel avisa.

— E extremistas sendo entrevistados por pessoas que desprezam seu tipo particular de extremismo, só que os entrevistados não sabem disso? — pergunta Paul.

Rachel levanta as sobrancelhas como se valesse a pena considerar essa ideia.

— Você quer dizer algo como Christiane Amanpour entrevistando a família da Honey Boo Boo?

Paul acena animadamente.

— Sim, não que você vá conseguir trazer a Amanpour, mas é essa a ideia em geral.

— Hmmm, poderia ser interessante… E o entrevistado não teria ideia do conflito?

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— Exatamente.

— Vamos dar uma passada pelo arquivo do que já fizemos. Com essa nova perspectiva, eles podem achar que vale a pena ir em frente. — Lucy analisa a estante e puxa um fichário. Ela passa o olho para algumas páginas, até que aponta para uma foto. — E aquele cara, Will, que celebra o Natal 365 dias por ano?

Rachel se inclina para a frente.

— Ah, sim, primo de segundo grau da Steph, do departamento de aquisições. Ela disse que ele sai dando presentes ou fazendo algo natalino todos os dias do ano. Parte da casa é decorada com temas natalinos o ano inteiro.

— Ele deve ser completamente fora da casinha — Paul observa.

— Ou ele odeia montar a merda toda e depois ter que guardar tudo, então faz isso pela esposa. Eu com certeza faço isso pela minha — diz Phillip.

— Ah, é muito além disso. Ele não é tipo o sujeito desleixado que deixa a árvore de Natal montada até abril porque é preguiçoso demais para guardar tudo. Ele faz isso tudo intencionalmente. — Lucy estuda a biografia do sujeito. — E é surpreendentemente bem-apessoado.

Rachel examina a foto mais de perto.

— Com certeza é, de fato não é como os caras que normalmente fazem parte desse tipo de gente maluca. Isso poderia aumentar o valor de mercado.

— Ele veste os filhos de elfos natalinos? — Paul pergunta.

Lucy verifica a ficha técnica.

— Steph disse que ele é solteiro. — Ela revira os olhos. — Não estou surpresa. Não conheço muitas mulheres que aturariam isso.

Paul levanta a mão.

— Eu quero trabalhar com esse projeto. Tenho algumas ideias para a entrevista.

Lucy balança a cabeça.

— Sei não. Você vai ser muito duro com o coitado. Ele não vai saber nem de onde veio a pancada.

— A gente arruma um produtor bondoso. Que tal a Sophia? Ela acabou de sair dos nossos programas de culinária. Lembro de quando conversamos, e ela disse que é apaixonada por essas paradas de feriados comemorativos e que adora histórias fofinhas — diz Rachel.

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— Isso não vai ser tão fofinho quando chegar na minha mão, mas talvez você tenha razão. Sophia pode conquistá-lo para que ele não saiba de onde veio a pancada. Como ela é nova nesse formato, podemos controlar tanto a ela quanto aquilo que ela vai saber do projeto desde o início — acrescenta Paul.

— Ela me disse na festa de Natal que se imagina um dia sendo uma documentarista. Acho que ela nega veementemente o propósito de um emissora de realities nesse grande caldeirão do entretenimento — diz Lucy Snickers.

— Essa é outra razão pela qual Sophia é perfeita para isso. Ela vai se concentrar em fazer uma filmagem repleta de significados e vai convencer esse tal de Will a seguir suas ideias elaboradas, enquanto nos concentramos em conseguir o que realmente queremos — diz Paul com um sorriso escancarado.

— Bom, bom… Uma ideia a menos a se pensar — Rachel diz, fazendo anotações em seu caderno. — O que mais você tem nesse fichário, Lucy? Precisamos de mais duas ideias para esse segmento, e não vou trazer o almoço até que tenhamos todas bem amarradas.

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Capítulo Dois

SENTINDO-ME ENERGIZADA, BATO A CANETA NA MESA ENQUANTO O TELEFONE

toca. Depois de anos trabalhando em programas de culinária, é emocionante me voltar para algo diferente e menos previsível. Meu estômago parece dar voltas quando penso em tudo o que devo aprender para produzir roteiros que envolvam seres humanos, mas tenho esperança de que isso seja um passo que me aproxime mais das minhas raízes documentaristas do que os programas sobre refogados de brócolis e comidas com nachos de queijo. Quando conversamos sobre trabalharmos juntos, o roteirista/diretor Paul me garantiu que Will Saunders estava adorando fazer parte do programa, mas quero descobrir isso por mim mesma. Já fui enganada antes. As pessoas nesta indústria farão qualquer coisa, absolutamente qualquer coisa por audiência e para vender um novo programa.

— Alô?

— Olá, estou falando com William Saunders?

— Sim — ele responde.

— Eu sou Sophia Worthy, produtora do True Blue Entertainment. Queria conversar com você sobre um convite para fazer parte do nosso reality show sobre pessoas com hobbies interessantes.

Ele solta uma bufada, frustrado.

— Conseguiu informações minhas pela Steph, minha prima ambiciosa? Porque eu realmente não estou interessado em participar de um programa de TV. Eu disse isso a ela.

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Ele não está interessado? É uma reviravolta irritante, com certeza, mas não vou desistir tão fácil assim.

— Sério, senhor Saunders? Posso chamá-lo de Will?

— Claro, a maioria das pessoas me chama assim.

— Ok, Will… Se você não se importar com a minha pergunta, por que não está interessado?

— Bem, Steph tentou me convencer. Ela disse que seria uma maneira de promover meu trabalho com as crianças… Mas eu duvido disso.

— Sim, minhas informações dizem que você permite que sua casa seja usada em eventos para arrecadar fundos e que você realiza passeios para arrecadar centenas de brinquedos para a Toys for Tots. Eu li que você também permitiu que os professores levassem crianças carentes para conhecer a casa em dezembro.

— Sim.

— E você distribui presentes durante todo o ano para pessoas sem-teto.

— Eu dou, mas… — Will parece desconfortável com o quanto sei sobre seu projeto.

— Bem, Steph tem razão. Muitas vezes as pessoas subestimam os benefícios que esse tipo de exposição pode trazer para suas causas.

— Mas, Sophia… Eu posso chamá-la assim, certo?

— Claro.

— Gosto do que faço, mas não quero que o mundo saia me julgando por aí. Já tenho problemas suficientes com meus vizinhos.

— Eu entendo. — Esse cara parece mais esperto do que eu esperava, então decido tentar outra tática. — Mas e se você não pudesse mais continuar com o projeto? Eu soube do problema com seus vizinhos, os Hoffmeyers, e de como eles estão tentando impedir seu trabalho.

— Então você já sabe sobre o maluco do Fred e sua família lunática?

— Ele parece impressionado, mas ainda desconfortável com quão invasiva minha pesquisa parece. — Eu gostaria que eles voltassem para o parque dos trailers, mas por enquanto sua maior ambição é me fazer sofrer por querer proporcionar a algumas crianças um feriado feliz.

— Você já pensou na hipótese de que poderíamos fazer Fred parecer bem malvado e com isso ajudaríamos a conscientizar o público sobre o seu trabalho?

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Will considera a ideia.

— Você realmente acha que isso pode funcionar?

— Você ficaria espantado com o que esse tipo de exposição positiva pode fazer. — Cruzo os dedos e espero estar certa.

— Ok. Mas como posso ter certeza de que isso vai ser vantajoso? Esses programas pintam caras como eu como uns patetas loucos só pelo entretenimento.

— Essa não é a nossa intenção — eu digo, esperando que ele possa ouvir a sinceridade na minha voz.

— Como vou saber?

— Você vai ter que confiar em mim.

— Quer que eu confie em você? Eu nem te conheço.

— Mas você poderia — eu digo educadamente. — Olha só, eu sei que você mora no lado leste da Windsor Square. Eu não estou muito longe daí. Vamos tomar um café amanhã e conversar sobre isso.

— Não sei.

— Por favor, Will? — pergunto baixinho, sendo charmosa e esperando que sua determinação desmorone. — Por favor?

— Ok — ele diz com uma risada baixa. Nos últimos anos, cheguei à conclusão de que ser uma produtora é semelhante a ser um mágico sem cartola e varinha. De alguma forma, você precisa ter uma ideia e mantê-la fresca, convencendo a equipe e, o mais difícil, alguém com potencial como Will de que a magia é possível. Podemos tirar o coelho da cartola enquanto fazemos algo que às vezes pode acabar virando uma bagunça confusa. A cada novo projeto, imagino algo grandioso. Talvez a história de Will seja um marco — esse algo grandioso que vai mudar o curso da minha jornada e impulsionar minha carreira.

Eu me despeço do Will e desligo, satisfeita. A vitória está ao meu alcance.

Quando abro a porta do café King’s Road, vejo meu reflexo no espelho de corpo inteiro na parede da entrada. Eu paro por um momento para dar uma conferida. Enquanto endireito o cinto, viro de lado, notando que as aulas de Pilates estão valendo a pena. Minhas pernas parecem especialmente longas, e minhas curvas parecem tonificadas do jeito que eu gosto.

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Eu ajeito meu longo cabelo castanho-avermelhado e verifico o batom. As pessoas dizem que sou bonita por causa dos meus grandes olhos verdes, lábios cheios e pele clara, mas não me acho isso tudo. Quando eu era mais jovem, tudo o que eu queria era ter o cabelo loiro e liso e uma pele bem bronzeada, mas não foi o que aconteceu.

Eu dou de ombros e me viro de costas para o espelho antes de entrar no café e ir encontrar Will.

Tento imaginar como deve ser a personalidade do Will. Acho que é um cara estranho, talvez com tendências excêntricas. Eu não deveria julgá-lo tão rapidamente com base em informações superficiais. Só porque ele ama mesmo o Natal não significa que seja um esquisitão bizarro. Ele pode nem mesmo ser tão estranho quanto imagino.

Eu passo o olhar pelo café e noto várias pessoas sentadas sozinhas.

Infelizmente a foto que Lucy enviou estava bastante borrada, então não tenho certeza se conseguirei reconhecê-lo.

Vejo um cara afeminado de meia-idade usando gravata-borboleta e lendo uma revista. Eu sorrio. Deve ser ele quem estou procurando.

Eu me aproximo da mesa com um grande sorriso no rosto.

— Will?

Ele olha para cima, confuso.

— Oi, eu sou a Sophia.

Ele inclina a cabeça e fecha a revista.

— Me desculpe…

— Com licença — um jovem de cabelos escuros a algumas mesas de distância me chama. — Você é a Sophia?

Eu olho na direção do cara que está me chamando, um olhar sério em seu rosto. Quase não consigo esconder o choque. Não tem como esse ser o Will. Eu olho para trás, para o cara com a gravata-borboleta e, em seguida, dou mais uma olhada no bonitão charmoso, confusa.

Ele bate no peito.

— Sophia, sou eu, Will.

Minhas bochechas parecem queimar; peço desculpas ao cara da gravata-borboleta pelo incômodo. Ele dá de ombros e volta para sua revista de design. Enquanto caminho até a mesa do Will, ele me avalia com seus olhos marcantes, e isso me faz corar.

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Ainda bem que vesti algo apresentável. Minha roupa formal e ajustada acentua minha silhueta enquanto a alfaiataria e o tecido dão um tom profissional. Eu tento não o devorar com os olhos quando ele se levanta para me cumprimentar, com a mão estendida.

— Oi, Sophia, eu sou o Will. Eu sorrio, e apertamos as mãos.

— É um prazer te conhecer, Will. Obrigada por ter vindo. Minha cabeça está girando, confusa. Este não pode ser o cara do Natal. Não só é lindo, como há uma faísca em seus olhos em um tom de azul-escuro que indica que ele é o ser mais distante possível de um pateta. É sério. Se juntassem os caras mais atraentes da idade dele em um reality show, Will ganharia o prêmio principal.

Eu verifico com o olhar o ambiente, para ter certeza de que não há câmeras escondidas. Eu não deixaria minha equipe me colocar em um desses reality shows em que eles armam encontros falsos para humilhar alguém. Eu me aproximo da minha cadeira quando não encontro qualquer coisa fora do lugar.

Will me estuda enquanto puxa minha cadeira para que eu me sente. Adoraria saber o que está pensando, já que meus instintos me dizem que é algo bom.

Depois de sorrirmos um para o outro, ele olha para o balcão do café.

— O que você gostaria de pedir?

— Chá gelado seria ótimo. O blend “paixão” é o meu favorito, se eles tiverem, mas, por favor, deixa que faço nossos pedidos. Fui eu que te convidei. — Eu pego minha carteira.

Will ergue a mão para me impedir.

— Será um prazer.

Quando ele se aproxima do balcão, eu tento me orientar, ainda não convencida de que isso não seja um engano. Esse homem lindo e robusto é o cara do Natal que está nos documentos? Não pode ser. A garota atrás do balcão está flertando descaradamente com Will enquanto ele permanece atento à vitrine dos doces.

Will é alto, tem ombros largos e uma estrutura sólida. O cós dos jeans desgastados está baixo. É uma tatuagem escapando ali debaixo da manga da

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camisa? Deus do céu! Estou pegando fogo, e me abano enquanto ele fica de costas para mim.

Will caminha de volta para a nossa mesa, a luz da janela ilumina seu rosto em uma combinação perfeita de ângulos e estruturas equilibrados, me lembrando de um busto de mármore que uma vez estudei no Museu Uffizi, em Florença. A facilidade com que caminha e sua graça natural aumentam seu encanto. Imagino que em outra situação Will poderia ter trabalhado como modelo para Horst ou Irving Penn, fotógrafos clássicos que o teriam fotografado em preto e branco, com toda elegância, destaque e sombras. O fato de fazer caridade o torna um cavalheiro aos meus olhos, apesar de sua aparência exterior. Estou definitivamente intrigada.

Quando ele se junta a mim, me entrega o chá gelado e então deixa uma pequena caixa embelezada com o rótulo da loja e lentamente a empurra na minha direção.

— O que é isso?

— Comprei para você. Eu vi e pensei que você poderia gostar. — Seus olhos estão brilhantes. — Vai em frente. Abre. Eu sorrio, notando que acabei de receber meu primeiro presente do cara do Natal. Cuidadosamente levanto a tampa. Três macarons franceses estão aninhados em papel-manteiga, cada um de uma cor diferente. Ele me observa esperançosamente.

— O rosa é de morango, o amarelo, de limão, e o laranja, de maracujá.

— Como você sabe que eu amo macarons? — pergunto.

— Foi só um palpite. Eles são meio chiques… como você.

— Chique? Eu não sou chique! — Eu rio.

Will dá de ombros.

— Se você diz. — Mas ele sorri como se me conhecesse melhor do que eu mesma.

— Qual devemos experimentar primeiro? — pergunto.

— Ah, são todos para você.

Eu pego o de maracujá cuidadosamente e mordisco um pedaço.

— Mmm, muito bom — eu digo, fechando os olhos. Quando abro, Will está me observando, então eu lentamente passo a língua pelo lábio inferior, pegando as migalhas perdidas.

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Estou flertando com ele, e eu não deveria fazer isso, já que tecnicamente estou a trabalho.

— O quê?

— Você é diferente do que eu esperava — diz ele.

— Sério? Como? E não me diga que sou chique.

— Mais suave, mais bonita. — Ele inclina a cabeça para o lado. — Você parece legal.

— E você parece surpreso com isso. O que você esperava, uma amazona com um arco em mãos, pronta para o abate?

Ele ri.

— Não, mas essa é uma ótima imagem. Minha experiência limitada com a mídia me faz pensar que são pessoas difíceis de lidar — sua expressão endurece —, e muito insistentes.

— Sinto muito que sua experiência tenha se dado dessa forma. Eu não sou assim — digo suavemente.

— Senti isso quando conversamos. Foi a única razão pela qual concordei em te conhecer. Tive um pressentimento. Quero dizer, você foi um pouco insistente, mas não muito.

Eu dou uma risada, e Will sorri.

— Certo, tomara que eu não tenha sido muito insistente… Além disso, se você continuar me mimando com macarons, posso muito bem perder minha vantagem completamente.

Eu estendo o macaron amarelo para ele.

— Por que não prova esse? É divino.

— Não, não… são para você. E estou bem só com o café.

— Tudo bem, mas você não sabe o que está perdendo — eu digo, dando outra mordida.

— Não necessariamente. É mais gostoso ver você aproveitando — diz ele com um sorriso tranquilo.

— Você também não é o que eu esperava — admito.

— Como assim? Espera… Se você me pesquisou, viu o artigo do Larchmont Chronicle. Aposto que pensou que eu viria com um suéter de árvore de Natal, certo?

— Sim, como você sabia?

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— Aquela mulher insistiu sem parar, até que eu concordei em usar o suéter para uma foto. Fiz isso só para que ela calasse a boca. Claro que foi essa a foto que eles usaram no artigo. Nunca mais eu vou ser tão estúpido daquele jeito.

— Aquele suéter realmente tinha luzes e acendia?

— Sim, tinha uma bateria e tudo mais. Você pode fazer as luzes piscarem ao mesmo tempo, como uma luz estroboscópica, ou de formas aleatórias. Foi uma idiotice. Ainda estou irritado por ter concordado em usar aquele troço, mas a história só sairia no nosso jornal local. Eu pensei: que mal tem? Mas esqueci que tudo vive para sempre no Google.

Eu sorrio.

— É, vive mesmo.

— Então eu tinha razão… Você achou que eu era um esquisitão.

— Não um esquisitão… apenas um cara apaixonado por seus interesses.

— Eu distorço a verdade para não ferir seus sentimentos. Eu gostei dele e estou com um grande desejo de o conquistar.

— Bem, eu não posso discordar disso. Eu sou definitivamente apaixonado pelos meus interesses.

— E como eu acho você interessante, tenho certeza de que outras pessoas te achariam interessante também — eu digo.

— Eu não me importo com quem além de você nesta equação me ache interessante. — Will me dá um olhar tímido.

Ninguém além de mim? Ele também está flertando? Preciso me concentrar ou nunca vou convencê-lo.

— Todos nós temos nossas questões, Will, nossas histórias, paixões, aquilo que torna cada um de nós único. A sua paixão é especialmente única, e eu adoraria ter a chance de contar isso ao mundo.

— Pega leve, você está fazendo um reality show soar bom demais para ser verdade.

— Não é bem assim. Por que as coisas boas não podem ser verdadeiras?

Eu me formei em cinema, com ênfase em documentários. Há um desafio enorme em documentar, retratar o assunto com precisão, com dignidade, além de ser um entretenimento feito de uma maneira convincente. Eu carrego esses ideais para o meu trabalho na TV.

— Aposto que no seu meio você é mais a exceção do que a regra.

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Eu dou de ombros.

— Talvez. Só posso ser responsável pelo meu próprio trabalho. Fui a uma retrospectiva do trabalho de Haskell Wexler no fim de semana passado. Você sabe quem ele é? Will balança a cabeça.

— Ele é um dos mais conceituados documentaristas da história. Há tanta verdade e beleza em seu trabalho, que eu fico sem fôlego.

Will cruza os braços sobre o peito e sorri. Talvez ele tenha vindo para essa reunião pensando que eu era uma produtora agradável, mas meio cafona. Espero o ter convencido de que sou tudo menos isso, e por essa razão pressiono mais.

— Will, não seria ótimo mostrar no programa a beleza e a alma de sua obra-prima natalina? As pessoas adorariam conhecer sua história e o motivo de você fazer isso tudo.

— Sério mesmo — ele diz como se não acreditasse em mim — que você não está só me bajulando?

— Sim, eu juro. Eu realmente adoraria entender melhor o que te motiva.

Ele levanta o café aninhado entre as duas mãos. Sinto que Will não vai contar seus segredos se eu apenas piscar meus cílios. Não, ele vai se fechar como um cofre insanamente difícil de abrir, mas entender verdadeiramente nossos objetos de interesse é um dos meus pontos fortes. Quem quer que Will pareça ser não é nada do que eu esperava. Nunca tive tanta curiosidade a respeito de alguém. Ele é um quebra-cabeça de peças perfeitas que não se encaixam.

Will finalmente fala:

— Então isso vai soar brega, mas eu acho que talvez você entenda. Há algo de especial por aí… uma espécie de magia ou qualquer coisa do tipo… São coisas diferentes para pessoas diferentes, talvez um ótimo filme ou um concerto, mas seja lá o que essa coisa for, ela pode distrair a pessoa dos momentos difíceis da vida. Então, se isso existir… Por que não nos cercar com isso se pudermos? Por que não querer isso sempre por perto?

Esse cara é de verdade? Sinto que essa ideia é em parte verdadeira, mas há muito mais no que ele faz do que está de fato admitindo. Estou mais animada do que nunca para descobrir por quê.

— Você entende? — Will pergunta, hesitante, mas esperançoso.

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— Entendo — respondo, e ele relaxa. Tomo um longo gole de chá e me pergunto que tipo de dificuldade pode ter acontecido na vida de Will para o inspirar a querer que todos os dias sejam como o Natal. O que ele está escondendo? Isso mexe com meu coração, e eu noto confiança em seu rosto. Independentemente do que possa ter acontecido, ele parece ter controle sobre tudo. Nem todos os candidatos a participante de um reality show precisam ser problemáticos, não é?!

— No que você está pensando? — Will pergunta.

— Eu estimo seus motivos — digo, pensativa, mesmo que o sentimento seja apenas parte da minha reação frente ao que ele compartilhou. Will dá uma risada.

— Bem, isso aí te coloca muito à frente de bastante gente. Eu mordisco a borda do macaron antes de perguntar:

— Então, você vai me mostrar sua casa? Steph disse que você já começou a organizar a parte da frente para os próximos feriados.

— Sim, eu gosto de organizar tudo tanto antes quanto depois, na hora de guardar. Prefiro assim.

Ele me observa por um minuto e depois sorri.

— Então, você quer passar e dar uma olhada? Não estou prometendo nada. Tudo bem pra você?

— Ok… só para ver a casa. Vou te contar um segredo. — Ele se inclina para a frente, um sorriso brincalhão no rosto.

— Sim?

— Sou uma acumuladora de itens de Natal. Honestamente, não sei o que fazer. Coleciono objetos de decoração e estátuas de Papai Noel desde os 12 anos. Acho que fui uma elfa na vida passada. — Eu coro com a confissão. — Eu aluguei um depósito, porque não tenho espaço suficiente no meu apartamento para tudo isso.

Will se inclina todo para trás na cadeira e respira fundo. Algo nos seus olhos me dá esperança de que terei uma chance de trabalhar com ele.

— Eu prometo, Sophia, você não vai se decepcionar.

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Capítulo Três

— AH, MEU DEUS! — MEU QUEIXO DESPENCA, FICO MARAVILHADA QUANDO WILL me leva para dentro de sua casa. — Quero dizer… uau! — Claramente, os arquivos sobre ele não fizeram justiça. As outras pessoas viciadas em feriados são tranquilas em comparação a Will. O que há com esse cara?

Ele ri. Will deve estar acostumado a grandes reações nessa altura do campeonato, e pelo grande sorriso que abre, posso ver que minha resposta o agradou. Ele balança a cabeça lentamente enquanto examina a sala.

— Bem, acho que dá para ver que eu não faço nada pela metade.

— Não, não faz mesmo. Assim que vi a arquitetura encantadora do lado de fora, soube que seria especial por dentro também, mas isso aqui vai além do que eu esperava! — Eu examino o saguão da casa. Com o teto alto abobadado, a madeira entalhada de forma elaborada, os fios de luzes cintilantes em cascata, é nítido que esta não é uma casa tradicional.

A enorme árvore de Natal na antessala está decorada com miniaturas de brinquedos de metal e figuras vintage. É como se Willy Wonka tivesse organizado o Natal.

— Esta é a árvore infantil que eu li a respeito? Você ainda distribui enfeites para as crianças depois das visitas delas?

Ele ri.

— Sim, é uma ótima ideia, não é? Até elas começarem a brigar sobre qual enfeite vão levar.

— Não, é sério? — eu pergunto, horrorizada. Por que esse cara iria querer lidar com um bando de crianças rudes irritantes?

Wil balança a cabeça.

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— As crianças sabem ser implacáveis. Certa vez, vi um garotinho que ficou tão irritado que seu amigo ganhou o último enfeite do Batman, que arrancou a cabeça do enfeite do amigo e jogou no mato.

— Espírito natalino uma ova.

— Tá tudo bem. Os bons meninos sempre superam os maus. Eu era meio babaca quando pequeno, então entendo.

Eu aponto para o teto abobadado.

— E o que são todos aqueles presentes embrulhados pendurados no teto? Eles estão flutuando? Como pode?

— Eles estão suspensos por uma linha muito fina que desaparece quando a iluminação especial está ligada.

— Que astuto. — Will é super high-tech, estou impressionada.

Ele abre um sorriso.

— Você está pronta para ver mais?

Eu instintivamente agarro seu braço e me inclino em sua direção.

— Sim, por favor.

Ele me puxa para mais perto.

— Para onde você está me levando? — pergunto, sorrindo e flertando.

— Você vai ver. — Will me guia para frente, me levando até sua sala de estar: o País das Maravilhas de Inverno.

— Uau!

Com exceção de um caminho com piso de madeira atravessando o ambiente, toda a sala é branca com detalhes em prata. Árvores brancas estão espalhadas por toda a sala e cobertas com luzes cintilantes brancas e enfeites de prata. Projeções de nuvens vagarosamente flutuando pelo teto e neve caindo suavemente pela parede criam um efeito etéreo, quase celestial.

— Isso é impressionante. Você deixa as crianças entrarem nesta sala?

— eu pergunto, estudando o tapete muito branco. Imagino que ele precise substituir este tapete com frequência.

— Durante o passeio, elas têm autorização somente para ficar parados aqui. É mais fácil se não estiverem tocando em tudo. Uma vez, teve um garoto que se escondeu debaixo de uma árvore, e quando o líder do grupo finalmente percebeu que ele havia desaparecido e o encontrou, o menino se recusou a sair. Mudamos as regras depois disso.

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— Ai, meu pai. — Essas crianças parecem piorar a cada minuto. Não consigo me imaginar tendo essa paciência. O que Will é, algum tipo de santo?

— Então, nada de se esconder debaixo da árvore, ok? Estou de olho em você — ele provoca.

Eu dou a Will um olhar de soslaio e um sorriso tímido.

— Aposto que está mesmo. O que é isso? — eu pergunto, caminhando em direção a uma longa mesa encostada em uma das paredes. Uma coleção de globos de neve está disposta sobre a mesa, e todos estão nevando como se tivessem acabado de ser sacudidos. — Como eles ficam nevando assim?

Ele sorri maliciosamente.

— Segredo empresarial. Eu trabalho com cenários em um estúdio, principalmente construindo os sets, então acabo conhecendo um monte de gente da iluminação e dos efeitos especiais. Temos todos os tipos de truques na manga. — Ele me leva até o sofá, e quando nos sentamos, eu observo tudo.

— Eu li que você trabalha no Burbank Central Studio, certo? — pergunto.

— Sim, tenho certeza de que dá para justificar tudo isso na minha casa com meu trabalho. Meus avós iam com tudo no Natal, mas isso tudo aqui realmente começou em grande escala depois que trabalhei em um set de filmagem durante uma sessão de fotos com temática de Natal. Era um filme independente, e eles ficaram sem dinheiro. Então, em vez de parte do meu pagamento, me deram muitos itens de cenário e de efeitos especiais. Além disso, os caras com quem trabalho estão sempre tendo novas ideias e encontrando novos efeitos e adereços. Nós nos ajudamos. Um deles costuma montar uma enorme casa mal-assombrada todo Halloween, e eu o ajudo com isso.

Eu dou uma nova olhada na sala, percebendo que tudo faz sentido agora. Os quartos têm uma sensação de cenário de filmes, habilmente encenados e dramáticos. Vai muito além da decoração normal; esta casa é um palco para suas ideias.

— É interessante que você trabalhe com construção de cenários. Eu nunca teria imaginado até ver a casa. — Estou intrigada.

— Você parece surpresa. Com o que você achou que eu trabalhava?

— Will pergunta.

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— Bem, você não se encaixa nos tipos de operários que já contratei, com certeza.

— E como eles eram?

Eu me inquieto por um momento, enquanto Will me observa.

— Não sei. — Eu coro quando olho para baixo. — Bastante esquecíveis. Não — aceno para seu jeans surrado e camiseta justa — bonitões.

Ele sorri vitoriosamente.

— Bonitões? Você acha que eu sou bonitão?

— Bem, levando em conta que você é um empreiteiro.

— Entendo, então há um padrão.

Eu balanço a cabeça.

— O quê? — ele pergunta.

— Estou perdida — eu digo, pensando alto enquanto torço uma mecha de cabelo nos dedos.

— Mesmo? E por quê?

— Porque estou sendo muito inapropriada. Eu deveria estar convencendo você a participar do programa, não…

— Flertando comigo?

— Ai, Deus — eu sussurro. — Eu sou tão óbvia assim? — Claro que ele tem razão, mas quem gosta de ser lembrada da sua falta de sutileza? Afinal, eu deveria ser uma profissional, não uma garota qualquer em um bar.

— Tenho quase certeza de que sim — ele diz enquanto se levanta e estende a mão para mim com uma piscadela. — Por favor, não pare por minha causa. Eu gosto disso. Venha, vou te mostrar mais da casa.

Eu aliso minhas calças nervosamente e pego sua mão para que ele me leve.

— Com certeza, me mostre mais.

Quando entramos no ambiente seguinte, Will está com um olhar distante no rosto. Ele enfia as mãos nos bolsos traseiros e sorri.

— Aqui temos o fundo do mar. — As paredes desta sala são pintadas de azul-turquesa, com uma árvore feita de glitter da mesma cor coberta com enfeites de sereias, conchas e cavalos-marinhos. — Este cômodo fica decorado o ano todo.

— Oh! Eu amei! — exclamo, um pouco confusa. Talvez ele seja gay, afinal de contas. Quero dizer: purpurina e sereias? Eu amei, mas que tipo de cara faz isso?

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Will concorda.

— A maioria das garotas ama este quarto. É genético ou algo assim. As garotas que conheci acham que o fundo do mar é romântico e alegre. Se você já mergulhou, sabe que não é o caso. É incrível, mas nada desse jeito aqui.

— Então o que o inspirou a fazer tudo aqui com esse tema romântico submarino?

— Bem, começou de um jeito diferente. Quando eu era pequeno, meu irmão mais velho e eu costumávamos brincar como se estivéssemos em alto-mar, em busca de tesouros afundados. Ele tirou a ideia de um livro. Aponto para um pequeno baú de tesouro na base da árvore cheio de moedas de ouro.

— Isso explica o baú do tesouro.

— Sim, e quando eu organizei a temática desse cômodo, ele era muito mais voltado para os meninos. Eu até tinha alguns modelos de criaturas marinhas que comprei dos caras dos efeitos especiais. Meu irmão teria adorado isso.

Eu observo o uso do verbo no passado. Este quarto foi feito em sua memória?

— Um tempo depois, tive uma namorada que amava sereias. Acho que ela acreditava que foi uma sereia em uma vida passada. Foi ela quem modificou a sala com todo esse glitter e coisas de menina. Andrew não teria achado graça — diz ele, balançando a cabeça. — Ele tinha uma placa de Proibido Garotas na porta do quarto.

Hmm… namorada. Will não deve ser gay, afinal de contas. Tentar entender esse cara está me cansando. Decido não perguntar nada sobre o irmão por ora.

— Então, o que é este cômodo, afinal? Era a sala de jantar? — eu pergunto, mudando a direção da conversa.

— Sim, mas eu como na cozinha. Não gosto de jantares ou coisas do tipo. Falando nisso, você quer ver a cozinha? Eu tenho que te avisar, Romeu está lá. Não sei bem se ele vai conseguir ficar perto de você. Meus olhos se arregalam.

— Perto de mim? Acho que sou muito fácil de se conviver. — Tento imaginar que tipo de pessoa não me toleraria.

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— Não é disso que estou falando. Bem, você vai entender. — Ele se aproxima da porta holandesa de sua cozinha. A parte inferior está fechada e algo a está arranhando freneticamente.

Eu sorrio de alívio.

— Romeu é um cachorro. Eu amo cachorros! Com o que você está preocupado? Ele morde ou algo assim?

— Não exatamente. Ele não é do tipo que morde. Ele tem outros problemas. — Will lentamente abre a meia porta. — Sophia, este é o Romeu. Ele é muito fofo e parece um terrier vira-lata, quase como o Vagabundo, do filme da Disney, A Dama e o Vagabundo. Eu me inclino para deixar o cachorrinho cheirar minha mão, mas ele se esquiva, vai direto para minha perna e dá uma trepada selvagem nela. Que irritante. Eu balanço a perna, mas ele continua firme e forte.

— Uau, deve ter sido um recorde! — Will exclama enquanto tira Romeu da minha perna. — Ele geralmente leva alguns minutos ou mais para começar isso aqui, então eu não estava pronto e não consegui segurá-lo a tempo. Peço desculpas. Acho que você é especialmente atraente, e não apenas para a espécie humana.

— Que sorte a minha!

Ele se vira para Romeu.

— Cara, você não tem modos. Você nem mesmo pagou uma bebida para ela antes.

— Muito engraçado, uma bebida? Você acha que eu sou assim tão fácil? — eu digo com as mãos nos quadris.

— Eu não quis dizer isso, é que se ele fosse humano, teria tentado exatamente isso com uma mulher tão bonita quanto você. O que posso dizer sobre esse cara aqui… Ele é insaciável. Você precisa ver Romeu no parque para cães.

Registro seu elogio antes de dizer:

— Não, obrigada, já consigo imaginar.

— Daí vem o nome dele. Ele ama as mulheres.

— Eu estou vendo. Ele tem uma ótima personalidade.

— Com certeza tem. — Will ri, leva Romeu para o lado de fora da cozinha e fecha a porta.

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— Por que você não faz seu reality show sobre ele? Romeu adora uma câmera.

— Vamos deixar os cachorros transando para o Animal Planet, obrigada. — Eu olho para o meu relógio. — Ai, não! Estou atrasada!

— Algo errado? — Will pergunta.

— Sim, eu já deveria ter voltado para o escritório de produção, para uma reunião.

Seus olhos perdem o brilho e os cantos de sua boca caem.

— Ok. Eu te acompanho.

Depois que Will traz Romeu de volta para a cozinha e nós dois chegamos à porta, fico desapontada por ir embora.

— Não consegui ver tudo, não é?

Ele balança a cabeça e sorri.

— Não.

Eu toco em seu braço com suavidade, e esse pequeno gesto desperta algo em sua expressão.

— Eu gostaria de voltar. Posso?

— Só para ver a casa ou para me ver também? — Ele estreita os olhos de brincadeira.

— Bem, eu veria você se visse sua casa, não é?

— Não foi isso que quis dizer. Não me importo com o programa, mas gostaria de te encontrar de novo.

— Mesmo? — pergunto, corando.

— Definitivamente. — A intensidade em sua expressão é enervante.

— Venha jantar aqui amanhã à noite.

Eu olho para cima, surpresa com sua franqueza.

— Eu posso trazer comida — digo, sabendo muito bem que não deveria concordar com algo tão semelhante a um encontro.

O que há de errado comigo? Não tenho resistência a um homem bonito que está tentando me encantar? Estou esquecendo que ele é exagerado com essas coisas de Natal e não muito diferente dos acumuladores obsessivos com os quais o cara do escritório ao meu lado trabalha?

Ele abre o sorriso de matar novamente, e minha resistência cede como um Papai Noel inflável desplugado.

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— Na verdade, eu adoraria cozinhar para você. Eu cozinho muito bem, e você não vai precisar trazer nada. — Ele inclina a cabeça e sorri. — Diga que sim.

Eu paro, olhando em seus olhos e, em seguida, para a árvore alta coberta por pequenas luzes na antessala. Droga, seu louco e irresistível bonitão natalino.

— Diga que sim — ele repete suavemente.

— E você promete que vamos poder falar sobre o programa? — pergunto, não tão distante do meu objetivo assim.

Will ergue seus dois dedos unidos.

— Palavra de escoteiro. — Ele vai até a árvore, aparentemente procurando por algo. Ele puxa um enfeite vintage de Glinda, a Bruxa Boa do Mágico de Oz. Em seguida, retorna e deixa o enfeite cair dentro de minha bolsa.

— Ei, por que você fez isso?

— Ela é a bruxa boa. Ela vai se certificar de que você vai voltar para cá… para mim. — Will abre um sorriso.

Eu coloco a mão na minha bolsa, me perguntando que outro tratamento mágico Will tem em mente.

De volta ao escritório, entro na reunião sem chamar muita atenção. Felizmente, ela começou mais tarde, então não perdi muito. Depois, encurralo Rachel e pergunto se podemos conversar por um minuto em seu escritório.

— Então, o que tá pegando? — Rachel me entrega uma garrafa de água e se acomoda na cadeira ao lado do sofá. — Como está o desenvolvimento do projeto? Você já se encontrou com o cara do Natal?

— Sim, na verdade é sobre isso que eu quero falar com você. Esse cara é um quebra-cabeça, e não tenho certeza de como lidar com isso.

— Um quebra-cabeça?

— Para começar, ele tem uma aparência rude, com um jeito sexy de cara durão. Aquela foto que temos dele com o suéter de Natal bem iluminado é muito enganosa. Ele, na verdade, é todo moderninho… Ele tem pelo menos uma tatuagem que eu saiba.

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— Mesmo?

— E ele é bonito até demais.

— E é solteiro? Talvez eu deva ir à sua próxima reunião — acrescenta Rachel.

— Mesmo? — eu pergunto, escondendo a apreensão na voz. Eu tinha esquecido o status de solteira de Rachel.

Rachel dá de ombros.

— Há coisas piores do que um cara moderninho e bonito que exagera nas comemorações de fim de ano. Meu último namorado me fez circular as páginas de um catálogo para que ele tivesse ideias de presentes.

— Que romântico — eu digo, franzindo o nariz.

— Exatamente.

Penso na atraente Rachel conhecendo Will e fico surpresa com a rapidez com que o ciúme explode dentro de mim.

— Não, não é necessário vir para a nossa próxima reunião. Além disso, ele não é adequado para um namorado. Deve ser doido para fazer todas essas coisas malucas. Não é? Eu só quero um conselho sobre como convencê-lo a fazer o programa, já que ele está desconfiado das nossas intenções.

— É como namorar um cara novo; você deve bajulá-lo e seduzi-lo até que ele queira fazer as coisas que você deseja. Se ele se distrair o suficiente, pode esquecer seu temor. Tente inflar o ego dele. Diga que as mulheres vão cair em cima dele.

Eu me ressinto dessa estratégia tão ridícula. Além disso, funcionaria com Will? Nada em seu comportamento sugere que seja esse tipo de cara. Mesmo que tivéssemos acabado de nos conhecer, eu era a única que ele queria impressionar.

Talvez eu tenha me cansado dos homens que conheci recentemente, que nunca sabem o que querem ou do que têm certeza. Will tem certeza de tudo, incluindo sua reação a mim. Por mais que eu odeie admitir, acho isso incrivelmente atraente.

De repente, fico toda protetora com esse homem que não percebe quão estranho ele é por causa da sua obsessão.

— Mas ele acha que vamos tirar sarro dele… fazê-lo parecer um idiota.

Rachel dá de ombros, desinteressada.

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— Bem, então é seu trabalho fazer com que ele ache que não vamos fazer isso.

— E nós não vamos, certo?

— Não, claro que não. — Rachel verifica o relógio e se levanta. — Ei, acabei de lembrar que tenho uma reunião com Don. Eu tenho que ir, mas você sabe o que precisa fazer, certo?

Eu suspiro e digo o que Rachel espera ouvir.

— Bajular e seduzir.

— Isso, garota — Rachel diz. — Se alguém pode fazer isso, esse alguém é você.

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