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NOVO DESIGN ORGANIZACIONAL DO PODER JUDICIÁRIO: O FUTURO É AGORA!

Período: 04 a 06 de junho de 2018 Local: Seção Judiciária do Rio Grande do Norte - Natal



ASSOCIAÇÃO DOS JUÍZES FEDERAIS DO BRASIL (AJUFE)

III Fórum Nacional de Administração e Gestão Estratégica da Justiça Federal FONAGE

NOVO DESIGN ORGANIZACIONAL DO PODER JUDICIÁRIO: O FUTURO É AGORA!

NATAL/2018


Comissão científica e executiva Alexandre Berzosa Saliba Antônio César Bochenek Arnaldo Pereira de Andrade Segundo Clara da Mota Santos Pimenta Alves Cristiane Conde Chmatalik Leonardo Resende Martins Luciana Ortiz Tavares Costa Zanoni Marcelo Lelis de Aguiar Marco Bruno Miranda Clementino Priscilla Pereira da Costa Corrêa Sophia Nobrega Câmara Lima Vânila Cardoso André de Moraes Vladimir Passos de Freitas Equipe técnica Revisão: Priscilla Pereira da Costa Corrêa Diagramação: Júlio César Américo Leitão


SUMÁRIO Apresentação................................................................. 07 Sínteses dos vencedores do III Prêmio Ajufe Boas Práticas de Gestão................................................. 09 Os reflexos da tecnologia blockchain no processo judicial e administrativo eletrônicos e a governança do Poder Judiciário........................................................ 11 Novo design organizacional no Poder Judiciário............ 25 Centros de Inteligência da Justiça Federal..................... 35



Apresentação

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Prêmio Ajufe Boas Práticas de Gestão tem o objetivo de identificar, valorizar e disseminar as experiências exitosas realizadas na Justiça Federal, além de estimular uma gestão participativa e eficiente do Judiciário por meio da difusão de tais medidas. O prêmio divide-se em quatro categorias, separadas em: (i) Boas práticas dos magistrados na Justiça Federal; (ii) Boas práticas dos servidores na Justiça Federal; (iii) Boas práticas para a eficiência da Justiça Federal (público em geral); (iv) Sugestões de estudantes universitários de graduação – Boas práticas para a Justiça Federal. Excepcionalmente, ao ser reconhecida uma boa prática de grande difusão e de mudança de paradigma, pode ser concedido o prêmio de (v) Categoria Especial, que é separado dos demais em razão de sua relevância para a comunidade jurídica ou para a Justiça Federal. Nesta 3ª Edição do Prêmio, foram inscritas 57 práticas, das quais restaram vencedoras as seguintes iniciativas:

Categoria 1 – Magistrados: Autores: Marco Bruno Miranda Clementino, José Carlos Dantas Teixeira de Souza, Gisele Maria da Silva Araújo Leite, Hallison Rêgo Bezerra e Eduardo Sousa Dantas “Centros de inteligência como instrumento de solução de conflitos a partir de uma estratégia preventiva.”

Categoria 2 – Servidores: Autores: Diógenes Alves de Oliveira e David Montalvão Junior “Residência em Tecnologia da Informação Aplicada à Área Jurídica: um amplo cenário para pensar inovação”

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Categoria 3 – Carreiras Jurídicas: Autores: Andrei Augusto Passos Rodrigues, Alessandro Jacondino de Campos, Luciano de Meneses Evaristo, Luciana do Amaral Alonso Martins, Marcelo Hen-

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rique de Avila, Franco Perazzoni, Marcia Barbosa Silveira, Marcio Ubiratan Britto Jardim, Romulo Fisch de Berredo Menezes, Geraldo Gama Andrade, Carlos Eduardo Miguel Sobral, Virginia Vieira Rodrigues Palharini, Hilton Rocha Paulo de Albuquerque e Douglas Antunis dos Santos. Projeto “Prometheus”

Categoria 4 – Estudantes Autor: Aurélio Tomaz da Silva Briltes “Prática Jurídica em Seguridade Social”

Menções honrosas – segundo colocado em cada categoria: Categoria 1 - Magistrados: Autores: Marco Bruno Miranda Clementino e Walter Nunes da Silva Júnior Projeto de ressocialização de reeducandos

Categoria 2 – Servidores: Autores: Diógenes Alves de Oliveira, David Montalvão Junior e Paulo André de Melo Costa “Agilidade em projetos: uma nova abordagem para o gerenciamento e concretização dos projetos”

Categoria 3 – Carreiras Jurídicas: Autor: Luiz Francisco da Silveira “O trabalho e a cultura como facilitadores da reinserção social – Hospital de livros” Autor: Edson Dal Pozzo Projeto Horta Solidária

Categoria 4 – Estudantes: III FÓRUM NACIONAL DE ADMINISTRAÇÃO E GESTÃO ESTRATÉGICA DA JUSTIÇA FEDERAL FONAGE

Autora: Andrezza Cesati Vitoraci “Inteligência Artificial é uma realidade e já contagia a área jurídica”

Todas as práticas inscritas nas 3 edições do Prêmio encontram-se detalhadas e disponíveis para consulta no site da Ajufe. Para conferir, é só acessar http://www.ajufe.org/premio-boas-praticas

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Sínteses dos vencedores do III Prêmio Ajufe Boas Práticas de Gestão Categoria 1 – Magistrados

"CENTROS DE INTELIGÊNCIA COMO INSTRUMENTO DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS A PARTIR DE UMA ESTRATÉGIA PREVENTIVA" Autores: Marco Bruno Miranda Clementino, José Carlos Dantas Teixeira de Souza, Gisele Maria da Silva Araújo Leite, Hallison Rêgo Bezerra e Eduardo Sousa Dantas Síntese: O projeto do Centro de Inteligência da JFRN atua com soluções preventivas, facilitando o diálogo entre os diversos atores jurídicos. O Centro se reúne a partir de temas suscitados pelos juízes ou por interessados processuais. Nas reuniões do colegiado são definidos temas que trazem o perfil de grande litigiosidade e, a partir disso, é proposta uma estratégia de ação que pode envolver convites para reuniões com entidades, audiências públicas, emissão de notas técnicas e recomendações sobre os temas.

Categoria 2 – Servidores

"RESIDÊNCIA EM TECNOLOGIA DA INFORMAÇÃO APLICADA À ÁREA JURÍDICA: UM AMPLO CENÁRIO PARA PENSAR INOVAÇÃO" Autores: Diógenes Alves de Oliveira e David Montalvão Junior Síntese: O programa de pós-graduação de Residência em Tecnologia da Informação aplicada à Área Jurídica, executado em parceria com o Instituto Metrópole Digital da UFRN, teve seu início em outubro de 2017 e se estenderá por 24 meses e conta com 12 estudantes, sendo 7 na área de desenvolvimento de software, 3 na área de infraestrutura e redes e 2 na área de Business Intelligence. Os resultados já colhidos e o engajamento dos alunos são animadores e alicerçam a construção de uma nova realidade.

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Categoria 3 – Carreiras Jurídicas:

PROJETO “PROMETHEUS” Autores: Andrei Augusto Passos Rodrigues, Alessandro Jacondino de Campos, Luciano de Meneses Evaristo, Luciana do Amaral Alonso Martins, Marcelo Henrique de Avila, Franco Perazzoni, Marcia Barbosa Silveira, Marcio Ubiratan Britto Jardim, Romulo Fisch de Berredo Menezes, Geraldo Gama Andrade, Carlos Eduardo Miguel Sobral, Virginia Vieira Rodrigues Palharini, Hilton Rocha Paulo de Albuquerque e Douglas Antunis dos Santos. Síntese: O Projeto Prometheus inova a maneira de tratar informações criminais, substituindo o modelo de processamento de notícias-crime por uma metodologia moderna de gestão de informações, com integração de bases de dados, emprego de tecnologia e, como consequência, análise da situação criminal de maneira ampliada e com foco no enfrentamento às Organizações Criminosas, buscando maior efetividade do sistema de justiça criminal.

Categoria 4 – Estudantes

"PRÁTICA JURÍDICA EM SEGURIDADE SOCIAL" Autor: Aurélio Tomaz da Silva Briltes Síntese: O projeto de Extensão da Faculdade de Direito da UFMS “Prática Jurídica em Seguridade Social”, tem por finalidade proporcionar ensino jurídico no âmbito da prática forense da seguridade social por meio do atendimento jurídico à comunidade tradicional do pantanal; e dar formação humanística aos acadêmicos do curso de Direito da UFMS e aproximar a teoria da prática diante dos atendimentos reais à população ribeirinha. Há também um conjunto de boas práticas de gestão de caráter educativo e pedagógico, social e científico com finalidade de expandir e aperfeiçoar a prestação jurisdicional às populações situadas em locais de difícil acesso na região do Pantanal de Mato Grosso do Sul.


Os reflexos da tecnologia blockchain no processo judicial e administrativo eletrônicos e a governança do Poder Judiciário Luciana Ortiz Zanoni Marcelo Lelis de Aguiar

1. Introdução Na quadra atual de nossos tempos, verificamos diversas inovações que possuem o potencial de revolucionar nosso cotidiano. Tratam-se das denominadas inovações disruptivas1, que consistem em novas aplicações ou tecnologias, atípicas e diversas das até então existentes, que possuem o potencial de quebrar paradigmas consolidados, irrompendo o processo evolutivo com um novo elemento impactante. No cenário jurídico brasileiro, notadamente no âmbito de nossa cultura forense, já se percebe a necessidade de readequação à nova realidade. Secularmente tradicional, a gestão corporativa judiciária cede espaço, do tradicional, às inovações disponíveis. Temas que até pouco tempo atrás eram abominados ou vistos com restrição na atua O Dicionário Brasileiro da Língua Portuguesa Michaelis conceitua a palavra “disrupção” nos seguintes termos: dis-rup-ção – substantivo feminino: 1 Ato ou efeito de romper(-se); dirupção, fratura; 2 Quebra de um curso normal de um processo; 3 ELETRÔN Restabelecimento abrupto de energia elétrica que provoca faíscas e enorme consumo da energia acumulada; 4 HIDROL Em escoamento de fluidos, formação e acúmulo de turbilhões ao redor de um obstáculo; deflexão. Disponível em: <http://michaelis.uol.com.br/moderno-portugues/busca/portugues-brasileiro/ disrup%C3%A7%C3%A3o/>. Acesso em 14/05/2018. Já Clayton Christensen, professor da Harvard Business School, explica, de forma singela, o conceito da palavra disrupção, em inglês “disruption”, quando distingue-a da palavra inovação (“innovation”), nos seguintes termos: “a disruption displaces an existing market, industry, or technology and produces something new and more efficient and worthwhile. It is at once destructive and creative.” CHRISTENSEN, Clayton, Como a tecnologia Blockchain pode ajudar o governo brasileiro, 2013. Disponível em: <https://www.forbes.com/sites/carolinehoward/2013/03/27/you-say-innovator-i-say-disruptor-whats-the-difference/#2cd012d6f432>. Acesso em 14/05/2018. 1

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ção estatal judiciária, tais como “autos-virtuais”, “juntada automática de petições por sistemas informatizados”, “audiências não-presenciais”, “teletrabalho”2, “intimações realizadas por meio de aplicativos de troca de mensagens”, dentre outras, são inovações que começam a fazer parte do cotidiano de diversos tribunais brasileiros. Caminhamos já na chamada Quarta Revolução Industrial, em que as novas tecnologias disponíveis contribuirão a cada dia com o aperfeiçoamento da atividade pública desenvolvida. Uma das grandes inovações já disponíveis consiste na adoção da tecnologia blockchain, que agrega a integridade e inalterabilidade de dados aos sistemas informatizados, favorecendo a governança em rede e imprimindo ao gestor público maior segurança e confiabilidade na descentralização da alimentação dos dados. No processo judicial eletrônico, no inquérito criminal ou civil, na fase de inscrição em Dívida Ativa, nas expedições de certidões cartorárias, ou na produção probatória, a perspectiva do uso da tecnologia blockchain é a de agregar provas e informações ao processo eletrônico com segurança, dado que o sistema é incorruptível e irreversível. Além disso, o uso destas tecnologias prometem grandes transformações na forma de participação dos juízes, servidores e demais agentes sociais no processo decisório de políticas públicas, permitindo designs organizacionais descentralizados e voltados a aplicar um grau cada vez maios de eficiência na prestação do serviço público judiciário.

2. A Revolução Industrial e a Era do Conhecimento e Inovação A história da humanidade sofreu marcos de evolução e inovação, com mudanças significativas no conhecimento e no modo como as pessoas vivem e se relacionam. A Primeira Revolução Industrial ocorreu no século XVIII, transformou a humanidade, com o surgimento do ferro e das máquinas, e em especial, o motor a vapor, que permitiu o surgimento das ferrovias. A descoberta da energia elétrica e o petróleo marcam a segunda grande mudança, além da produção em massa, essa Segunda Revolução tem seu início no fim do século XIX, mas durante todo o século XX pode-se identificar mudanças gerencias significativas, a partir do investimento em métodos administrativos e gerenciais. III FÓRUM NACIONAL DE ADMINISTRAÇÃO E GESTÃO ESTRATÉGICA DA JUSTIÇA FEDERAL FONAGE

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Importante observarmos que muitas das inovações – e neste ponto podemos diferenciar o termo inovação (“innovation”), ou seja, a produção de novidade consistente na realização de algo de forma diferente da usualmente adotada, do termo disrupção (“disruption”), anteriormente já explicado, pontuando-se apenas o ponto nodal de distinção, qual seja, na inovação disruptiva irrompe-se o processo evolutivo com um novo elemento impactante, elemento este que não ocorre necessariamente na inovação – o que atualmente vislumbramos em nosso cotidiano já foram idealizadas por visionários e estudiosos do quilate de Jules Gabriel Verne, George Orwell e Monteiro Lobato. Somente para ilustrar, este último brilhante escritor de nossa literatura pátria já previa, no transpassar do século XIX para o XX, o teletrabalho: “Em vez de ir todos os dias o empregado para o escritório e voltar pendurado num bonde que desliza sobre barulhentas rodas de aço, fará ele o seu serviço em casa e o radiará para o escritório. Em suma: trabalhar-se-á a distância”. (LOBATO, O presidente negro / Monteiro Lobato, 1882-1948. 2008, pg. 65)


Mas foi a internet, criada na década de 60, que transformou totalmente a forma de viver das pessoas, daí porque ser considerada a Terceira Revolução Industrial. A inovação marca e transforma o mundo com ideias disruptivas, o que leva grandes transformações na economia, sociedade e cultura. É a era do conhecimento e inovação. Finalmente, numa simbiose com a terceira revolução, novo marco pode ser identificado, que “repousa suas bases na era digital e se caracteriza por uma internet muito mais onipresente e móvel, por sensores cada vez menores, mais poderosos e mais acessíveis (movimento proveniente da Lei de Moore) e pela inteligência artificial e máquinas que aprendem (Machine learning)” (MAGALDI E NETO, 2018, pág. 44). Com a evolução do uso das novas tecnologias há uma forte mudança do comportamento do usuário dado que “As novas tecnologias da informação não são simplesmente ferramentas a serem aplicadas, mas processos a serem desenvolvidos. Usuários e criadores podem tornar-se a mesma coisa. Dessa forma, os usuários podem assumir o controle da tecnologia como no caso da Internet. Segue-se uma relação muito próxima entre os processos sociais de criação e manipulação de símbolos (a cultura da sociedade) e a capacidade de produzir e distribuir bens e serviços (as forças produtivas). Pela primeira vez na história, a mente humana é uma força direta de produção, não apenas um elemento decisivo no sistema produtivo.” (CASTELLS, 1999)

Os processos judicial e administrativo eletrônicos no Brasil. O processo judicial eletrônico no Brasil iniciou-se no Juizado Especial Federal de São Paulo (JEF/SP) no ano de 2002, coincidindo com a implantação legislativa dos juizados especiais na justiça federal, o que permitiu desde o início a implementação de modelo inovador de processamento das demandas. O programa adotado (SISJEF) foi desenvolvido dentro do próprio órgão de informática do Tribunal Regional Federal da 3ª Região. O número exponencial de processos distribuídos nos primeiros anos (em 10 anos o JEF/SP chegou a 1.500.000 processos) somente pôde ser absorvido pela pequena estrutura física e de quadro reduzido de servidores e juízes em razão dos benefícios da informatização. Ao longo dos anos outros órgãos jurisdicionais foram adotando sistemas informatizados no âmbito de suas jurisdições. Cite-se o desenvolvimento do e-PROC pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região, e depois o PJe pelo Tribunal Regional Federal da 5ª Região. Por fim, o TRF da 2ª Região contratou um sistema denominado APOLO. No âmbito da Justiça estadual, destacamos o programa desenvolvido por empresa contratada denominado e-SAJ (Sistema de Automação da Justiça). Entretanto, somente a partir de 2009 é que o crescimento de casos novos em formato eletrônico passou a ter uma curva ascendente, chegando, na média de todos os ramos de justiça federal, a 70,1% dos processos, o que consiste em 67,7 milhões de casos novos eletrônicos, conforme gráfico da publicação “Justiça em Números” do ano de 2017 (referente ao ano de 2016) 3: 3

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No Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, o maior da América Latina, com 360 magistrados de segundo grau, mais de 2.000 de primeiro grau, quase 50 mil servidores, mais de 20 milhões

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Figura 53: Série histórica da taxa de congestionamento, do índice de atendimento à demanda e do percentual de processos eletrônicos

Em 2006 foi publicado o marco legal do processo judicial eletrônico no Brasil (Lei Federal nº 11.419/2006), legalizando a adoção da informatização das demandas e disciplinando aspectos processuais daí decorrentes. Destacamos que já vigiam as Leis Federais nº 9.800/1999 e 10.259/2001 que, de alguma forma, autorizavam a virtualização dos processos digitais. Somente em 2011 o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) adotou sistema unificado para todo o Poder Judiciário (PJe). Até então, os diversos ramos de Justiça desenvolveram programas próprios, idealizados pelo staff do próprio órgão ou mediante contratação de serviço externo. O fato é que em alguns desses órgãos o processo eletrônico foi aperfeiçoado ao longo dos anos, com destinação de altos investimentos em capacitação e desenvolvimento de programas. Ademais, juízes e servidores aprenderam a trabalhar com o sistema, voltando, depois da dificuldade de seu gerenciamento, para sua zona de conforto. O próprio Conselho Nacional de Justiça adotou sistema informatizado próprio, cuja migração para o novo sistema ocorreu em 2014. Atualmente, prevalece os modelos do e-proc (desenvolvido no TRF4) e PJE (cujas raízes estão no TRF5 e posteriormente adotado e gerenciado pelo CNJ), entre outros sistemas. Hoje a informatização do processo judicial caminha a passos largos. Também o processo administrativo eletrônico (como o modelo SEI) transformou as áreas administrativas imprimindo maior organização, agilidade e transparência. III FÓRUM NACIONAL DE ADMINISTRAÇÃO E GESTÃO ESTRATÉGICA DA JUSTIÇA FEDERAL FONAGE

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Em que pese a evidente evolução, o fato é que o receio em relação à evolução do sistema informatizado, sobretudo considerando que o usuário não mais é um mero expectador, mas agente transformador, freia resultados mais satisfatórios, e acaba por levar a um modelo centralizador, que sem as arenas de participação na transforde processos, 331 foros, a informatização teve início em 2006 no chamado Expressinho do Metrô São Bento, na cidade de São Paulo, capital do Estado, com a implantação do SAJ (Sistema de Informatização da Justiça) no Juizado Especial Cível (JEC) e atualmente todo o Judiciário do Estado está informatizado e os novos processos são todos necessariamente eletrônicos. Remanescem físicos, entretanto, os administrativos e, dentre esses, os processos disciplinares. Fonte www.tjsp.jus.br/CemporCentoDigital, acesso em 4/10/17.


mação impede o setor público de avançar na mesma velocidade que o setor privado. As demandas de aprimoramento tecnológico são tantas que é preciso criar condições para que talentos da instituição cocriem e tenham espaços destinados a serem incubadoras de projetos tecnológicos. Ademais, é preciso avançarmos na automatização e o uso da inteligência artificial. A automação já é consenso nas administrações judiciais. Contudo, a inteligência artificial é vista com receio de que haverá substituição da função jurisdicional pela máquina, o que é uma falácia, dado que o sistema propiciará maiores e mais seguros elementos para se julgar. As inovações geram insegurança. Na seara dos processos criminais, a produção das provas na fase do inquérito e sua inserção no processo eletrônico ainda constitui óbice para a informatização. Muitas barreiras ainda são encontradas quando a alimentação do processo eletrônico deve ocorrer em rede. A tecnologia blockchain vem trazer nova onda de inovação, com grande potencial de transformação, pois vem justamente trazer a segurança dos dados, sobretudo na alimentação de dados em rede. Acreditamos ser este um caminho seguro para transformar o processo eletrônico.

3. A tecnologia Blockchain A tecnologia blockchain, também denominada protocolo de segurança, é uma tecnologia disruptiva que tem por principal característica a descentralização do armazenamento, tanto do registro de suas transações quanto de sua base de dados, constando todo o histórico de transações, assim como as próprias informações registradas, de forma criptografada, em base de dados formada de maneira encadeada e inalterável, visando garantir tecnicamente a autenticidade, segurança e inviolabilidade das informações nela contidas4. A informação na blockchain é construída a partir de dados criptografados que garantem a autenticidade da informação. Utiliza arquitetura computacional P2P ou “Per-to-Per” ou ponto-a-ponto, que consistem em redes de computadores descentralizadas ligadas entre si em que um computador, denominado nó ou ponto da rede (“nodes”), é, simultaneamente, cliente e servidor, permitindo o compartilhamento de dados entre si, sem a necessidade de se buscar informações em um computador central. O banco de dados na blockchain é constituído por blocos de informações, armazenadas uma após outra, formando uma cadeia de blocos, daí o nome “blockchain”. Após a gravação de um conjunto de informações, eventuais novos registros serão gravados de forma linear e cronológica aos primeiros. Ao final de um determinado número de

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Institute for Information Law, at the University of Amsterdam, tradução livre acrescida de elementos. Disponível em: <https://blockchain-society.science/research-plan/what-is-blockchain-technology/>. Acesso em 11/05/2018.

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gravações são criados os blocos. Em cada bloco há um “hash”5 de identificação, que consiste em uma “digital” própria, única e inalterável do bloco, que o individualiza dos demais, onde constam informações relevantes acerca do bloco atual, tais como a data em que foi finalizado, a quantidade de transações ou informações existentes dentro dele, qual é o número do bloco antecessor e qual deverá ser o de seu sucessor; além de ser, também, o hash, a chave de encriptografia6 das informações ali existentes. Essa combinação de registro da informação e cronologia, em situação similar aos elos de uma corrente, é um dos elementos de segurança que garantem a fidedignidade das informações armazenadas. Qualquer movimentação realizada entre os participantes gerará um novo registro, que será gravado automaticamente na blockchain. Caso subsista algum conflito de informação, por exemplo, em caso de tentativa de fraudar ou invadir a base de dados, um automático mecanismo de segurança confronta as informações existentes, garantindo que apenas aqueles dados seguros que já estavam preteritamente gravados na base de dados, em diversas cópias idênticas, permaneçam na blockchain. Todos aqueles que são usuários do sistema fazem parte também da cadeia de armazenamento de informações, que pode ser de forma pública ou privada, mas sempre indelével e compartilhada, constatável por todos os seus usuários, o que confere a credibilidade necessária apta a gerar a confiabilidade em sua utilização, tornando-se desnecessária a intermediação de terceiros no processo para fins de garantir a idoneidade das partes usuárias ou da transação realizada. Atualmente se verificam as chamadas blockchain com permissão e blockchain sem permissão. As primeiras seriam aquelas segundo as quais o acesso é restrito a determinados usuários, por exemplo, a todos os agentes públicos de determinado Estado; já as sem permissão seriam aquelas em que qualquer interessado poderia adentrar, tal qual ocorre nas afetas às moedas digitais. Finalizando esta explanação inicial acerca da sistemática de funcionamento da blockchain, reportaremo-nos a analogia usual que se utiliza para exemplificar a forma sob a qual uma blockchain é concretizada, qual seja, a de um livro-razão contábil, em que constam registros que devem ser indeléveis após sua inscrição, uns após os outros, entretanto, inovando tal tecnologia em razão de se encontrar disponível e ser possível o controle por todos os seus utilizadores, permitindo também o benefício de que tais usuários possam estar fisicamente em qualquer parte do globo terrestre, realizando transações transcontinentais em milésimos de segundos. 5

Hash é uma função criptográfica que codifica um elemento de entrada em uma sequência de caracteres alfanuméricos de tamanho fixo como saída. Exemplificando, uma hash da frase de Henry Ford “Há mais pessoas que desistem do que pessoas que fracassam” poderia ser representada com os elementos alfanuméricos “ab633086542fc0f4a4f69b011218517ace84f5d5064077c13b5c6071d229fe61”, já a mesma frase, utilizando-se o mesmo critério criptográfico, sem o acento no verbo inicial da oração, teria a seguinte estrutura “bd0fbea33eedd0272c1e2e77d3a80df410461af3ad9fff84bafacdb09c57e4bb”. Perceba-se que a hash não muda no tamanho preestabelecido, possuindo um tamanho fixo, mesmo que haja um ou mil caracteres na sequencia inicial codificada (hash criado em <https://livecoins.com.br/proof-of-work-blockchain-bitcoin/> Acesso em 11/05/2018).

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Encriptação é a utilização da criptografia para codificar determinada informação, tornando-a ininteligível, com o uso de um algoritmo, visando impossibilitar a sua leitura, salvo para quem possua a chave ou código de acesso (desencriptação). Encontra-se também sua utilização como sinônimo de criptografia.

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4. O uso da tecnologia Blockchain Compreendida a sistemática de funcionamento desta nova tecnologia, pode-se facilmente imaginar o espectro potencial de sua utilização7. E mais, visualizar as principais barreiras possíveis de serem transpostas com tal tecnologia, quais sejam, facilitar, democratizar e baratear inúmeras atividades que atualmente são realizadas e centralizadas por específicos atores sociais, muitas vezes extremamente lucrativas e delimitadoras de poder – possivelmente estas duas últimas circunstâncias serão as fundamentais barreiras, e mais difíceis, certamente, de serem irrompidas, conforme poderemos verificar após analisarmos as atuais e futuras aplicações que estão e serão empreendidas com esta nova tecnologia. Necessariamente o primeiro ponto a ser abordado consiste no sistema financeiro, elemento inspirador da tecnologia aqui abordada, entretanto, não como paradigma de funcionamento, mas sim, de maneira inversa, para fins de fundar um modelo substitutivo do atual sistema global financeiro. O mítico Satoshi Nakamoto8, idealizador da tecnologia “blockchain”, concebeu-a não como um fim em si, mas buscando uma forma de substituir as moedas estatais comuns por criptomoedas9 (“criptocurrency”) ou moedas digitais, notadamente, em seu caso específico, a Bitcoint, possibilitando a realização de transações fiduciárias entre indivíduos sem qualquer intervenção de um órgão regulador estatal, apenas por meio de transações monetárias virtuais entre as partes. O sucesso desta inovação pôde ser visualizado no montante de Bitcoins que foram minerados10 até o mês de abril de 2018, transpassando 17.000.000 de BTCs 7

Revoredo e Borges (2017), em paper intitulado “O uso da Tecnologia Blockchain na melhoria dos serviços públicos”, bem destacam as vantagens de tal tecnologia: “Em razão da sua arquitetura distribuída, seu impacto nos diversos setores da sociedade e na relação dos cidadãos com organizações e governos será profundo, sendo um importante instrumento para proteger informações, impedir atividades fraudulentas por meio de mecanismos de consenso e detectar adulteração de dados em virtude de suas propriedades subjacentes de imutabilidade, transparência, capacidade de auditoria, criptografia de dados e resiliência operacional.”

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“Satoshi Nakamoto” consiste no pseudônimo do idealizador da criptomoeda Bitcoin e também da tecnologia Blockchain. Não se conhece verdadeiramente sua identidade, havendo diversas teorias acerca de quem seja, inclusive subsiste dúvida se se trata de uma pessoa real ou se são vários indivíduos que conferem personificação a tal entidade. Em 2009, um post de Satoshi Nakamoto, realizado no grupo de discussão The Cryptography Mailing, apresentou ao mundo seu conceito da rede Bitcoin, no white paper intitulado “Bitcoin: A Peer-to-Peer Electronic Cash System (Disponível em: <https://bitcoin.org/ bitcoin.pdf>. Acesso em 14/05/2018.) implementando efetivamente seu projeto no mesmo ano, continuou contribuindo para seu desenvolvimento e aperfeiçoamento até o ano de 2011, momento em que não se tem mais noticias suas.

Moedas digitais que se utilizam da tecnologia Blockchain e da criptografia para realização de trocas fiduciárias, nos mesmos moldes usuais das moedas estatais, entretanto sem possuir qualquer ente estatal regulamentador. Na atualidade existem diversas criptomoedas circulando globalmente, sendo as mais conhecidas: Bitcoin, Ethereum, Ripple, Bitcoin Cash, EOS, dentre outras.

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“Mineração de criptomoeda” consiste no processo segundo o qual um usuário “empresta” sua capacidade de processamento computacional à rede para fins de realizar a confrontação de dados e garantir a segurança do sistema, recebendo, por tal serviço prestado à comunidade, uma certa quantidade da própria moeda virtual como pagamento, também conhecido por Proof of Work: “Proof of Work é o algoritmo que recompensa os mineradores que resolvam os puzzles criptográficos, validem as transações e criem novos blocos. Esse processo é conhecido como mineração ou mining. No Blockchain todas as transações são públicas e anunciadas para todos os nodes da rede, de forma que não existe uma autoridade central que valide transações. O sistema

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(bitcoins), ou seja, na cotação da data, cerca de 153 bilhões de dólares americanos. De outro lado, certamente se visualiza a preocupação dos Estados soberanos em razão da ameaça de perda de sua hegemonia do controle monetário global. Seguindo a linha evolutiva disruptiva vivenciada em nossa contemporaneidade, podemos tratar agora dos contratos inteligentes ou smarts contracts. Após a fase de uso inicial da tecnologia blockchain acima traçada, como meio de validação e armazenamento de informações, surge a possibilidade de utilização da blockchain agregando funcionalidades a sua estrutura, tal como ocorre na plataforma Ethereum11, em que se faz possível inserir linhas programáveis a serem executadas na própria rede. Dessa forma, insere-se uma programação na própria base de dados para realizar determinada atividade em caso de ocorrência de predetermina situação. Esta interação pode ocorrer tanto entre seres humanos como apenas entre computadores. Uma das grandes vantagens de tal disrupção consiste na comprovação efetiva da ocorrência fática de determinado evento, pois resta marcada sua ocorrência de forma indelével na base de dados da blockchain. Distinguem-se os contratos inteligentes em não propriamente ditos e stricto sensu12. Por smart contracts não propriamente ditos podemos visualizar como exemplo uma máquina, conectada ao blockchain, que detecta a falta de determinado insumo e automaticamente envia mensagem ao departamento correspondente, informando a necessidade de compra da matéria-prima13. De outro lado, caso essa máquina seja programada para enviar uma ordem de compra diretamente para o fornecedor, teremos então um smart contract propriamente dito, pois ocorre uma transação comercial entre indivíduos, possuindo, neste caso, teoricamente, validade jurídica, pois se amoldaria, em tese, no caso brasileiro, ao disposto no art. 104 do Código Civil141516. de validação das transações é chamado de Proof of Work.” (Disponível em: <https://livecoins. com.br/proof-of-work-blockchain-bitcoin/>. Acesso em 13/05/2018.)

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Ethereum consiste em uma plataforma descentralizada em que são processados smart contracts: aplicações que são executadas exatamente como programadas sem qualquer possibilidade de paralisação, censura ou interferência de terceiros (tradução livre da definição existente em <https://www.ethereum.org>. Acesso em 13/05/2018). “Basicamente a segurança e descentralização do Bitcoin são implementadas em quaisquer sistemas possíveis, por meio de contratos inteligentes. Ethereum é uma plataforma aberta (Open Source) focada na criação e distribuição de aplicações descentralizadas. Aplicações que não necessitam de intermediários, podendo interagir com sistemas sociais, financeiros, interface de jogos e qualquer outra coisa.”(Disponível em: <https://portaldobitcoin.com/tudo-sobre-ethereum/>. Acesso em 13/05/2018)

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Segundo nossa legislação pátria, contrato, que consiste em uma das espécies de negócio jurídico, é válido quando possui (CC, art. 104): I - agente capaz; II - objeto lícito, possível, determinado ou determinável; e III - forma prescrita ou não defesa em lei.

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Exemplo inspirado no texto de KADAMI, Rosine, Co-founder da Blockchain Academy. Disponível em: <https://blockchainacademy.com.br/contratos-x-smart-contracts/>. Acesso em 12/05/2018.

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Poder-se-ia questionar-se acerca do agente capaz, mas esta é a própria empresa, proprietária da máquina instalada e pré-configurada para realizar a atividade determinada por sua vontade.

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Tal realidade já é vivenciada na Blockchain Ethereum, que possibilita a inserção de códigos de programação, para serem executadas descentralizadamente.

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Muita discussão tem sido envidada no presente momento acerca da juridicidade dos contratos inteligentes, pois não se encontram adstritos a um território específico, além de existir multiplicidade de usuários ou contratantes, que por vezes sequer são seres humanos, mas, por vezes, outros smart contratcts, motivo pelo qual há quem defenda a ideia de que tais contratos seriam


Podemos imaginar, ainda, no exemplo dado, que o receptor dessa mensagem também possa ser um outro smart contratc, que recebe o pedido e o redireciona para diversos outros fornecedores. Podemos ter diversos contratos inteligentes interagindo entre si, autogovernados, sem intervenção humana, ou tê-los e ao final de determinado processo ser necessária a contratação de indivíduos não autômatos para realizar determinada ação, que serão recompensados por meio de pagamento, semelhante ao que ocorre na mineração de bitcoins17. Feita esta breve introdução da utilização destas novas tecnologias disruptivas, que por vezes nos levam a imaginar que estamos apenas lendo um bom livro de ficção científica, mas que ao final tudo isso não passaria de meros devaneios tolos a nos torturar18, voltando, ao final desse delírio, ao escritório para utilizar nosso computador como aquela boa e velha máquina de escrever aperfeiçoada, passemos, então, a realizar um breve sobrevoo sobre as possibilidades existentes para sua utilização, tanto as já realizadas quanto as em fase de implementação e, também, as que poderão vir a sê-lo, sempre focando em sua viabilidade de aplicação na atividade pública ou que com esta possua certa imbricação. Antes, porém, cabe consolidar por qual razão a tecnologia blockchain é tão vocacionada para a aplicação ao serviço público: por possuir o potencial de aumentar a eficiência, a transparência e a auditabilidade no serviço público. Essa tecnologia, não obstante tenha o potencial de manter certas informações realizadas em sigilo, a depender da conveniência, ou não, de sua publicidade, tais dados são sempre auditáveis por todo e qualquer interessado. E isso ocorre, conforme acima explanado, em razão de inexistir deleção ou alteração de registros, mas sim apenas a inclusão de novos apontamentos. Após o registro ser inserido na blockchain, este é indelével e inalterável, podendo apenas ser realizado outro registro acerca daquele mesmo item, o que torna o processo totalmente transparente, com seu histórico inteiramente auditável19. Dentre as aplicações já existentes, escolhemos citar três exemplos, já em plena atuação, e que podem contribuir com ideias para o aperfeiçoamento do processo judicial eletrônico brasileiro: MaidSafe20 é uma aplicação baseada na Blockchain Ethereum que busca descentralizar a internet, substituindo a necessidade de hospedagem, dos sites e bancos de dados, em grandes servidores para realizar o armazenamento por toda a rede mundial de computadores: trata-se de uma internet totalmente descentralizada. Imagine-se, agora, transpor essa tecnologia para o processo judicial eletrônico, independentes dos sistemas legais vigentes, devendo obediência às regras existentes dentro do universo da Blockchain Ethereum. Os pagamentos realizados na base de dados Ethereum são feitos na criptomoeda Ether (ETH) ou por meio de Tokens, que seriam criptomoedas dos próprios desenvolvedores de aplicações construídas na Blockchain Ethereum, que obedecem um padrão de interoperabilidade conhecido pela sigla ERC-20, que permite o armazenamento destas em carteiras conjuntas, possibilitando sua fácil comutação.

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Paráfrase do trecho da música Chão de Giz, do cantor, compositor e músico brasileiro Zé Ramalho.

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RITT, Edelweis; SOUZA, Marison, Como a tecnologia Blockchain pode ajudar o governo brasileiro, 2017. Disponível em: <http://www.correiodopovo.com.br/Jornalcomtecnologia/2017/11/30/ como-a-tecnologia-blockchain-pode-ajudar-o-governo-brasileiro/>. Acesso em 14/05/2018.

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<https://www.maidsafe.net/>. Acesso em 12/05/2018.

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isso levando-se em consideração que no Brasil temos mais de 1 milhão de advogados inscritos nos quadros da Ordem dos Advogados do Brasil21, cada qual com diversos computadores acessando a base de dados, e tramitam mais de 100 milhões de processos no Brasil22, não sendo difícil imaginar um armazenamento descentralizado, nos moldes blockchain, dos processos judiciais eletrônicos existentes no Brasil, diversamente do que ocorre atualmente, em que cada tribunal brasileiro, ou mesmo o Conselho Nacional de Justiça – CNJ, implementa sua base de dados centralizada própria. Proof of Existence23 e o OriginalMy24 tem por finalidade possibilitar o registro de qualquer documento, gerando uma hash do documento na rede blockchain do Bitcoin, possibilitando provar sua existência e conteúdo de maneira perpetua. O serviço OriginalMy já realiza autenticações de documentos por meio de convênio com unidade de serviço extrajudicial estatal (cartório), assim como certifica a ocorrência de determinados eventos, similarmente as atas notariais, registrando “a autenticidade de conteúdo de sites, comprovando que eles estavam publicados em certo momento”25, entretanto tal serviço pode ser realizado em qualquer parte do globo terrestre. Everledger26 tem por finalidade criar um banco de dados de determinados bens de expressivo valor, constando todas suas informações relevantes para identificação, possibilitando sua individualização durante toda a existência do ativo, visando proteger o patrimônio cadastrado. São gravados na blockchain as características, histórico de transações comerciais realizadas, linha do tempo e proprietários do bem, visando possibilitar sua identificação em casos de roubos, fraudes ou outros infortúnios envolvendo tal ativo.27 Na seara pública, os valores públicos que são geridos diuturnamente poderiam ser catalogados e gestados em similitude à esta aplicação, permitindo a rastreabilidade dos valores envolvidos, dificultando a prática de crimes que dilapidam o patrimônio público. LEMOS e GABRIEL (2017)28, em interessante artigo publicado no portal CRYPTO ID, identificam potenciais campos de utilização para a tecnologia blockchain no setor público, quais sejam: identidades digitais online, o que facilitará enormemente a

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Disponível em: <http://www.gazetadopovo.com.br/vida-publica/justica-e-direito/brasil-chega-a-1-milhao-de-advogados-636e8p084e82q2vq2du4excr1>. Acesso em 12/05/2018.

22

Disponível em: <http://www.cnj.jus.br/programas-e-acoes/politica-nacional-de-priorizacao-do-1-grau-de-jurisdicao/dados-estatisticos-priorizacao>. Acesso em 13/05/2018.

23

<https://proofofexistence.com/>. Acesso em 12/05/2018.

24

<https://originalmy.com/>. Acesso em 12/05/2018.

25

<https://originalmy.com/products>. Acesso em 12/05/2018.

26

<https://www.everledger.io/>. Acesso em 12/05/2018.

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“A empresa já registrou mais de 1 milhão de diamantes, facilitando a verificação da autenticidade e procedência (se são roubados ou vêm de áreas de mineração ilegal) e possibilitando um consumo mais ético de determinados artigos de luxo.” ARAÚJO, Fernanda, Gestão do Comum e Blockchain: governança em código, 2017, trabalho apresentado no XXV Seminário de Iniciação Científica da PUC-Rio, realizado em 29/08/2017. Disponível em: <http://www.puc-rio.br/ pibic/relatorio_resumo2017/relatorios_pdf/ccs/DIR/DIR-Fernanda%20Araujo.pdf>. Acesso em 14/05/2018.

28

ALEIXO, Gabriel e LEMOS, Ronaldo, Como usar o blockchain para projetos de interesse público?, 2017. Disponível em: <https://cryptoid.com.br/destaques/23285/>. Acesso em 14/05/2018.


ideia de governo eletrônico; plataformas de votação eletrônica; inovação no campo dos registros públicos e do sistema notarial; inovação no campo dos registros de imóveis; aumentar a transparência e responsabilização no financiamento dos partidos políticos, reduzindo as possibilidades de caixa dois e mapeando o uso e a distribuição do fundo partidário; facilitar e tornar mais transparentes processos licitatórios; criar novos sistemas para licenciar, gerenciar e coletar royalties para música e outras formas de propriedade intelectual, favorecendo os artistas e criadores e dando mais transparência aos intermediários existentes hoje; gerar certificados de origem para bens físicos, como madeira, impedindo a comercialização de madeira de áreas de desmatamento ilegal; criar um novo paradigma de segurança e novas modalidades de serviços para aplicações de Internet das Coisas (IoT); criar nova camada de certificados para a agroindústria, agregando valor ao produto brasileiro e promovendo inovação e sustentabilidade no agronegócio. Em estudo publicado pela respeitável Deloitte Touche Tohmatsu Limited29, verifica-se que em todos os continentes subsistem estudos e iniciativas de diversos países para fins de adoção da tecnologia blockchain pelo Poder Público, sendo apontadas diversas possibilidades para a sua utilização nas áreas de registro empresarial, operações bancárias (moedas digitais e meios de pagamento), registros públicos e notariais, sistemas de votação, sistemas de identificação pessoal, sistema de saúde e, ainda, mesmo que não constando na publicação apontada, mas certamente factível e recomendável, no processo judicial eletrônico.

5. Conclusão Pelas breves considerações acima traçadas, podemos chegar a algumas previsões e conclusões. Visualizamos, na atualidade, uma extensa gama de novas aplicações disruptivas, ou tão somente inovadoras, mas que conferem a ampla possibilidade de atingirmos um ganho expressivo na qualidade do serviço público. O uso da tecnologia blockchain, da inteligência artificial30, da utilização de dados estruturados, dentre outras novas tecnologias, possibilitarão um ganho qualitativo e quantitativo na prestação do serviço público, notadamente na seara judicial e do processo administrativo. Serviços que outrora eram realizados mecanicamente por pessoas, tais como juntadas de petições em processos judiciais, passam a ser realizados por computadores, 29

KILLMEYER, Jason; WHITE, Mark e CHEW, Bruce, Will blockchain transform the public sector?, 2017. Disponível em: <https://www2.deloitte.com/content/dam/insights/us/articles/4185 _blockchain-public-sector/DUP_will-blockchain-transform-public-sector.pdf>. Acesso em 14/05/2018, pg. 3.

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Os temas inteligência artificial e dados estruturados não foram abordados diretamente neste trabalho, mas tão apenas de forma indireta, tal qual nos contratos inteligentes, que podem ser exemplos potenciais de utilização da tecnologia de inteligência artificial. Esses temas serão parte integrante de nosso futuro próximo e certamente são tecnologias que deverão ser agregadas as inovações a serem empreendidas no novo processo judicial eletrônico, possibilitando um ganho expressivo na qualidade do serviço público prestado.

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possibilitando o aproveitamento da mão de obra qualificada para realizar trabalhos intelectuais e de fino ajuste. Não há que se pensar que o ser humano tornar-se-á obsoleto neste processo, ilação muitas vezes repercutida no processo de implantação de inovações, incitando o medo nas pessoas de serem substituídas por máquinas. O homem sempre será indispensável para indicar o correto caminho que deve ser seguido pelas máquinas, devendo ser potencializada a interação e simbiose entre humano-computador, realidade que já vivenciamos nesta Quarta Revolução Industrial e devemos aumentar cada vez mais sua implementação para que, além do ganho no serviço público prestado, tenhamos também um ganho verificável sob o viés laboral, contribuindo para o bem-estar do ser humano, fim maior de nossa existência no globo terrestre. No que tange à tecnologia blockchain, especificamente, em razão de sua transparência, da auditabilidade que lhe é inerente, da arquitetura distribuída dos registros de forma descentralizada em vários computadores, da utilização de mecanismos de consenso que impedem atividades fraudulentas, da impossibilidade de alteração ou deleção dos dados, acrescido, por fim, a segurança da informação existente em razão da criptografia de dados, verifica-se como um instrumento extremamente adequado para utilização no serviço público, com inúmeros campos de aplicação. De outro lado, devemos ter em mente também que o uso destas novas tecnologias não possuem o condão mágico de resolver todos os problemas e vicissitudes humanas, que devem ser resolvidas por nós, seres humanos, atuando sempre para corrigir os erros, equívocos e malfeitos existentes em nossa sociedade. Temos novas ferramentas para nos ajudar a atingir tais desideratos, mas a responsabilidade e o trabalho a ser desenvolvido será sempre nossa atribuição. Outro ponto importante que devemos ter em mente consiste na necessidade de serem realizados estudos técnicos sérios para implantação dessas novas benesses, devendo ser mantidas as paixões, interesses individuais ou financeiros afastados do interesse público primário, verdadeiro fim a ser perseguido na implantação destas novas tecnologias.

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Transpor diversas barreiras técnicas serão empecilhos muitas vezes vivenciados neste processo, pois mudar de direção e readequar o planejamento realizado, atualizando-o em consonância às novas perspectivas existentes ou em confronto a interesses individuais ou a meras vaidades, são desafios a serem transpostos nesta fase de transição pela qual passamos nesta nova fase de revolução industrial. Conscientizar-se e ter a humildade para reconhecer que não sabemos tudo e que as normas atuais de condução da sociedade global são multifacetadas e difusas, havendo impactantes mudanças em curtíssimos períodos de tempo, que irão requerer também a mudança de navegação e da rota traçada, consiste em um bom exercício para nos adequarmos a nova realidade da história humana que vivenciamos. Assim, esperamos que esse pequeno panorama aqui exposto impulsione o início do percurso para essa nova jornada, conscientes de que há um longo caminho a ser trilhado até atingirmos a excelência que desejamos no serviço público brasileiro, e, consequentemente, no processo judicial eletrônico. Cientes que, nessa empreitada, contaremos com a possibilidade de utilização de ferramentas mais ágeis e eficientes,


que ajudarão a transformar substancialmente a realidade que vivenciamos até os dias atuais. Que não percamos esta oportunidade, para que se possa, em um futuro próximo, olhar para o passado e verificar o quanto evoluímos, trazendo um grande ganho de qualidade na atividade pública e satisfação aos destinatários de nossas atividades, qual seja, o cidadão brasileiro.

6. Referências Bibliográficas AGUNE, Roberto, et al. Dá pra fazer – Gestão do Conhecimento e inovação em governo. São Paulo: Secretaria do Planejamento e Desenvolvimento Regional, 2014. ALEIXO, Gabriel e LEMOS, Ronaldo, Como usar o blockchain para projetos de interesse público?, 2017. Disponível em: <https://cryptoid.com.br/ destaques/23285/>. Acesso em 14/05/2018. ANTHONY, Scott D. Inovação. Do Planejamento à Ação. São Paulo: Editora M. Books Do Brasil Editora Ltda. 2016 ARAÚJO, Fernanda, Gestão do Comum e Blockchain: governança em código, 2017, trabalho apresentado no XXV Seminário de Iniciação Científica da PUC-Rio, realizado em 29/08/2017. Disponível em: <http://www.puc-rio.br/pibic/relatorio_resumo2017/ relatorios_pdf/ccs/DIR/DIR-Fernanda%20Araujo.pdf>. Acesso em 14/05/2018. CASTELLS, Manuel. A Era da Informação, Economia, Sociedade e Cultutra. A sociedade em rede. Vol. 1. 5a. Edição. 1999. CHRISTENSEN, Clayton, Como a tecnologia Blockchain pode ajudar o governo brasileiro, 2013. Disponível em: <https://www.forbes.com/sites/ carolinehoward/2013/03/27/you-say-innovator-i-say-disruptor-whats-thedifference/#2cd012d6f432>. Acesso em 14/05/2018. LOBATO, Monteiro, O presidente negro / Monteiro Lobato,. 1882-1948. São Paulo: Editora Globo. 2008 MAGALDI, Sandro, NETO, José Salibi. Gestão do Amanhã: tudo o que você precisa saber sobre gestão, inovação e liderança para vencer na 4a. Revolução Industrial. São Paulo: Editora Gente, 2018. REVOREDO, Tatiana; BORGES, Rodrigo, O uso da Tecnologia Blockchain na melhoria dos serviços públicos, 2017. Disponível em: <https://blockchainacademy. com.br/o-uso-da-tecnologia-blockchain-na-melhoria-dos-servicos-publicos/>. Acesso em 14/05/2018. RITT, Edelweis; SOUZA, Marison, Como a tecnologia Blockchain pode ajudar o governo brasileiro, 2017. Disponível em: <http://www.correiodopovo.com.br/ Jornalcomtecnologia/2017/11/30/ como-a-tecnologia-blockchain-pode-ajudar-ogoverno-brasileiro/>. Acesso em 14/05/2018.

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KADAMI, Rosine, Co-founder da Blockchain Academy. Disponível em: https:// blockchainacademy.com.br/contratos-x-smart-contracts/. Acesso em 12/05/2018.

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Sites Acessados sem citação de autor: <https://blockchain-society.science/research-plan/what-is-blockchaintechnology/>. Acesso em 11/05/2018. <https://bitcoin.org/ bitcoin.pdf>. Acesso em 14/05/2018. <http://www.cnj.jus.br/programas-e-acoes/politica-nacional-de-priorizacaodo-1-grau-de-jurisdicao/dados-estatisticos-priorizacao>. Acesso em 13/05/2018. <https://www.ethereum.org> <http://www.gazetadopovo.com.br/vida-publica/justica-e-direito/brasilchega-a-1-milhao-de-advogados-636e8p084e82q2vq2du4excr1>. Acesso em 12/05/2018. <https://livecoins.com.br/proof-of-work-blockchain-bitcoin/> Acesso em 11/05/2018 <https://www.maidsafe.net/>. Acesso em 12/05/2018. <http://michaelis. uol.com.br/moderno-portugues/busca/portuguesbrasileiro/disrup%C3%A7%C3%A3o/>. Acesso em 14/05/2018. <https://portaldobitcoin.com/tudo-sobre-ethereum/>. Acesso em 13/05/2018. <https://proofofexistence.com/>. Acesso em 12/05/2018. <https://originalmy.com/>. Acesso em 12/05/2018. <https://originalmy.com/products>. Acesso em 12/05/2018. <https://www.everledger.io/>. Acesso em 12/05/2018. <http://www.tjsp.jus.br/CemporCentoDigital>. Acesso em 4/10/2017

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Novo design organizacional no Poder Judiciário Antônio Cesar Bochenek Luciana Ortiz Tavares Costa Zanoni

Introdução Os processos judicial e administrativo eletrônicos constituem inovação que impõe profunda mudança na gestão do Judiciário, a fim de que seu potencial de otimização e racionalidade na execução do serviço, traga os benefícios que se almeja para uma prestação jurisdicional entregue dentro de um razoável tempo do processo e com qualidade. É preciso repensar diversas rotinas tradicionalmente adotadas para concretização dos procedimentos processuais e administrativos, a fim de que, sem descurar do respeito aos princípios constitucionais de proteção ao cidadão mas para reforçar o seu cumprimento, se possa auferir os benefícios dos avanços tecnológicos que possibilitam a automação, transcendência das estruturas e trabalho em rede. Sem esse olhar de conhecer, inovar, aperfeiçoar e avançar, a resposta à adoção da tecnologia poderá estar aquém das expectativas e potencialidade.

A Burocracia e a Nova Gestão Pública Dentro da perspectiva Weberiana, o Estado moderno pressupõe a adoção da burocracia, com a separação do patrimônio do Estado e força de trabalho profissional e especializada, que não se dedica à política, mas à administração imparcial. O Poder Judiciário, com base no insulamento, reveste-se de estrutura burocrática construída e mantida dentro do mesmo desenho organizacional, que remonta suas origens. Dividido em unidades judiciárias, a aplicabilidade da lei e normativos era o mote dos juízes e servidores.

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Sem as amarras da burocracia, o setor privado, ao contrário, há muito volta-se para necessidade de mudança como sobrevivência de suas empresas. As inovações são motores no desenvolvimento econômico dos países, conforme já apontava Joseph Schumpeter no início do século XX. Para Schumpeter a destruição criativa, por meio do qual novas tecnologias e novos produtos substituem os antigos, ocasionando a mudança ou substituição das empresas, promove o desenvolvimento econômico e propicia melhora na qualidade de vida das pessoas (FIGUEIREDO, 2015). Paulo N. Figueiredo chama a atenção para o amplo espectro incremental da inovação, não abordado por Schumpeter, para alcançar (i) a implementação de mudanças em produtos/serviços, processos e sistemas organizacionais e gerenciais – da iniciação à adaptação da menor para a avançada, que são novos no contexto do local, e não necessariamente novos para o mundo, (ii) bem como o desenho e o desenvolvimento de novos sistemas globais (2015, pág. 24). A burocracia tornou o Judiciário impermeável, ao longo do último século, à assimilação das mudanças tecnológicas e gerenciais adotadas pela iniciativa privada. Com a reforma constitucional de 1998, o movimento da Nova Gestão Pública é positivado no Brasil, e a eficiência como princípio do serviço público impõe a adoção de uma visão gerencial nas unidades judiciárias, assim como na alta administração. A curva crescente das estatísticas das demandas judiciais aliada à ausência de mudanças gerenciais e tecnológicas constituem fatores que explicam a morosidade no julgamento dos processos, objeto de forte crítica dos controles internos e externos. Estudos produzidos já neste século, revelam a ausência de adoção de teorias da administração na gestão dos cartórios ou varas judiciais, conforme relatório conclusivo do estudo “Desburocratização dos cartórios judiciais. Análise dos Juizados Especiais do Tribunal de Justiça do Estado” (IPEA: 2015). No estudo O Impacto da Gestão e do Funcionamento dos Cartórios Judiciais sobre a Morosidade da Justiça Brasileira: Diagnóstico e possíveis soluções o destaque recai sobre a necessidade de planejamento, padronização dos fluxos de trabalho e formação em administração dos Diretores do Foro, entre outras medidas (Ministério da Justiça: 2011).

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Também o relatório da pesquisa Gerenciamento de processos e cartórios judiciais. Gestão da Justiça relata experiências isoladas de inovações na estrutura organizacional com modificação de trabalho em rede a partir da informatização dos processos pelo Tribunal de Justiça de Santa Catarina, Mato Grosso do Sul e Tocantins e nova estrutura organizacional dos JEFs do TRF3, ressaltando a necessidade de implementar ampla reorganização administrativa.

O PROCESSO JUDICIAL E ADMINISTRATIVO ELETRÔNICOS: MOMENTO DE REPENSAR O NOVO DESIGN ORGANIZACIONAL DO JUDICIÁRIO. A virtualização dos processos trouxe um novo cenário, pautando a agenda da alta administração do Judiciário para repensar os modelos organizacionais existentes. De outro lado, também constitui verdadeira janela de oportunidade que se abriu

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com a forte crise orçamentária estatal, que impôs aos diversos setores da administração pública a necessidade de repensar o modelo, especialmente para fechar o ajuste das contas. O processo judicial eletrônico começou a ser implantado no Brasil em 2002, no Juizado Especial Federal de São Paulo, concomitantemente com o e-proc do Tribunal Regional Federal da 4ª Região. Ao longo dos anos, a própria Justiça Federal, assim como outros ramos de Justiça, mais recentemente sob a liderança do Conselho Nacional da Justiça, intensificaram o investimento na informatização do Poder Judiciário. Também os processos administrativos foram virtualizados, destacando-se o sistema SEI, construído pelo TRF4, que se expandiu inclusive para outros Poderes, e que trouxe grandes mudanças na administração da justiça. A virtualização dos processos trouxe grandes mudanças como a realocação da força de trabalho (atividades antes existentes como atendimento das partes e advogados para carga dos processos, autuação manual dos processos, expedição de documentos, despachos individualizados para demandas repetitivas, entre outras, não mais existem, e de outro lado, mais rapidez com que os processos chegam à fase de decisão ou julgamento); necessidade de revisão do layout das unidades judiciárias (que não mais possuem processos físicos, tampouco necessitam de tanto espaço e exigem uma remodelagem segundo valores da gestão pela inovação); eliminação das distâncias geográficas (facilitador para implementação de home office, possibilidade de trabalho à distância, e também a adoção máxima do sistema de videoconferência para a realização de audiências); necessidade de padronização dos fluxos de trabalho (a customização desses fluxos impedem resultados mais favoráveis). Entretanto, a troca do modelo de processos físicos pelo eletrônico sem a adoção de novo design organizacional e de serviços freia o potencial da tecnologia para a eficiência almejada que justifique o alto investimento. É preciso repensar a estrutura organizacional, fluxos dos processos, quadro de competências dos servidores e layout das varas. Poucas iniciativas de informatização dos processos judiciais ou administrativas vieram acompanhadas de mudanças organizacionais e de serviços. Podem ser citados alguns movimentos nesse sentido, como o modelo de secretaria única do JEF/SP, Rede PJE no âmbito do TRF3 (em estudo), Secretaria do Futuro (TJ/SP, depois adotado por outros Tribunais), modelo do TRF2. Atualmente, essa questão ganhou contornos em nível nacional, trazendo para a agenda da alta administração do Judiciário esta necessária discussão. O aprofundamento dos modelos que estão sendo pensados para o design de organização de varas e serviços é indispensável para que sejam atendidas as expectativas do usuário do serviço, entre os quais estão juízes, servidores, operadores do direito e jurisdicionados. Destacamos modelos de novos designs organizacionais de varas:

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(i) Secretaria única – A secretaria única reúne em uma estrutura todo o processamento do feitos de diferentes unidades judiciarias. Há, assim, a transferência da gestão do acervo para uma estrutura única coordenada por um juiz. No modelo dos Juizados Especiais Federais da 3a. Região, há varas-gabinete

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com quadro de apenas quatro servidores por magistrado, para realização de audiências e a elaboração de minutas de sentenças. As minutas de decisões são aprovadas pela maioria dos juízes e são feitas pela secretaria única. Não há pela secretaria minutas customizadas de acordo com o entendimento dos juízes, a decisão que foge do padrão é alterada pela própria vara-gabinete. (ii) Rede PJE – O modelo prevê: a redução da atual estrutura das Varas, com a manutenção de uma estrutura fortalecida para o desempenho de atividades de cunho decisório e gestão do acervo; a criação de uma rede para processamento eletrônico, concentrada administrativamente na Diretoria do Foro, composta por núcleos responsáveis pela execução dos serviços padronizados dos feitos eletrônicos, com possibilidade de abrangência de toda a Seção Judiciária; e a formação de um Fórum de Gestão. Outrossim, racionaliza e potencializa de forma transcendente a execução de serviços padronizados, produzindo mais com menor custo, com qualidade no serviço e na vida de juízes e servidores. A proposta contempla fluxo de trabalho em rede; execução de serviços padronizados por núcleos; núcleos independentes e transcendentes com vinculação administrativa à Diretoria do Foro; e-vara: estrutura de gabinetes para decisões e gestão do acervo – independência funcional; fórum: formado por juízes das e-varas para gestão e deliberação da Rede PJE e questões que interferem no trabalho das e-varas. De forma que neste modelo preserva-se a figura do diretor para gestão do acervo que fica a cargo da e-vara. As decisões são minutadas pela e-vara, preservando o entendimento do magistrado, que tem um gabinete fortalecido com funções para atrair e motivar servidor com capacidade técnica. Com isso, o rápido processamento dos feitos decorrente da automação pode ser enfrentado pelo gabinete. Os núcleos, por sua vez, tem característica transcendente, podendo executar decisões de qualquer subseção judiciária. O fato dos núcleos desempenharem apenas atividades de execução possibilita agilidade, padronização de fluxos mas não de conteúdo decisório; transcendência para alcançar diversas subseções. E por fim, o modelo prevê um Fórum de deliberação, permitindo uma visão delta de aperfeiçoamento constante de acordo com a vontade da maioria dos juízes, assegurando um sistema permeável a modificações e governança participativa.

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(iii) Secretaria do Futuro – Estruturada em Unidades de Processamento Judicial (UPJ), a iniciativa de mudança do Tribunal de Justiça de São Paulo, contempla a unificação de três ou mais ofícios judiciais de mesma competência para processamento e cumprimento das determinações judiciais. Além disso, o novo modelo prevê uma nova divisão de tarefas e melhor distribuição dos recursos humanos e do espaço físico. Com este modelo os gabinetes tiveram o quadro de pessoal reforçado para realização dos atos decisórios. (iv) Modelo TRF2 - Criou-se uma Seção de Atividades Operacionais, denominada SAO, na estrutura administrativa da Seção Judiciária do Rio de Janeiro, para cumprimento de atividades meramente ordinatórias e de administração determinadas em audiências, despachos, decisões e sentenças vinculadas às ordens dos juízos de duas varas federais nos processos judiciais, sendo uma


delas designada como Vara Gestora. Na prática, o modelo prevê a criação de uma secretaria única para cada duas varas federais, sendo uma designada como gestora das SAOs. (v) Especialização, regionalização e equalização das cargas de trabalho. Projeto de reestruturação de competências das unidades judiciárias de 1º grau da Justiça Federal da 4ª Região. No âmbito da 4ª Região é grande o debate a respeito da melhoria da prestação jurisdicional, equalização da carga de trabalho, otimização dos procedimentos, redução do tempo de tramitação do processo e efetivação da tutela jurisdicional. A Corregedoria do Tribunal desenvolveu nos últimos anos várias ações para enfrentar as dificuldades e obstáculos, bem como projetou algumas alternativas para solucionar e vencer os empecilhos: mutirões judiciais, reorganização das competências e até deslocamento juízes e servidores. Contudo, as medidas tradicionais adotadas apresentaram resultados paliativos e não solucionam a longo prazo os vetores principais desejados nos termos do Planejamento Estratégico da Justiça Federal, especialmente no tocante a missão e objetivos da Justiça Federal, sintetizados na agilização e redução do acúmulo de processos e satisfação dos usuários. De outro lado, o processo de interiorização, ao passo que aproximou a Justiça Federal dos cidadãos, também criou estruturas de unidades judiciárias com tamanhos e características diferentes. Mais um ingrediente a ser dosado pelo gestor público. Nos últimos dez anos, o processo de informatização, especialmente o processo eletrônico, com ferramentas e instrumentos que lhe são inerentes, possibilita a consulta de dados e informações a partir dos atos processuais realizados. O cruzamento deles revela pistas importantes para reorganizar as estruturas judiciárias. De outra banda, o processo eletrônico pode ser acessado de qualquer lugar e sem restrições temporais. Na prática judiciária, várias transformações de mundo trabalho da Justiça Federal já aconteceram em face das novas ferramentas. Certamente há muito espaço para aperfeiçoar os serviços prestados. Um tema que iniciou a ser tratado, mas não avançou, no âmbito da 4ª Região foi a criação de Secretarias únicas. Talvez um empecilho foi um incipiente debate a respeito de uma possível adequação das funções comissionadas. Para já, avança o debate e os estudos acerca da especialização, regionalização e equalização das cargas de trabalhos entre as unidades judiciárias. As diversas experiências registradas no SEI do TRF da 4ª Região e já testadas em Subseções Judiciárias revelam resultados interessantes como a eficiência operacional, melhor aproveitamento dos recursos disponíveis, equalização da força de trabalho e agilização dos processos. A adoção destas práticas é possível em face de que todas as ações são distribuídas na forma eletrônica e todas a unidades estão equipadas com sistemas de videoconferência para a realização de audiências. O projeto em estudo contempla algumas premissas a serem testadas e desenvolvidas como a especialização de varas federais por grupos maiores e bem definidos de matérias, independente de ritos processuais, nas Subseções com mais de uma vara federal, nas competências criminal, execução fiscal, previdenciária e cível. Um segundo passo é a regionalização, ou seja, a reunião de várias Subseções para criar

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uma microrregião que atenderá os processos, mediante a equalização da distribuição. Vale lembrar que há microrregiões para o atendimento do plantão judicial. As competências, especialmente a criminal e execução fiscal, seriam deslocadas para as varas especializadas da região, em regra, na maior Subseção daquela Região. Uma exceção seriam as existentes especializações das capitais que possuem mais unidades judiciárias. Ainda, um outro ponto ventilado é a equalização entre regiões próximas no caso de haver disparidade entre a distribuição de processos entre elas. Os fundamentos para a proposta residem na distribuição mais equamine entre as estruturas existente que permitirá o melhor aproveitamento do potencial humano e a otimização dos custos, essencial num ambiente crescente de carência de recursos. Também será fundamental para implantação de ferramentas de gestão estratégica e serviços de tecnologia de informação. Ainda a equalização da carga de trabalho poderá trazer mais benefícios como a maior produtividade e excelências nos serviços prestados e, consequentemente maior satisfação dos cidadãos. Os estudos avançam e as experimentação das práticas são desenvolvidas e aperfeiçoadas. Os novos modelos organizacionais abrangem ainda a formação de centrais de conciliação, centrais de penas alternativas, centros de inteligência de demandas repetitivas, atendimentos ao público monitoradas, entre outros.

Conclusão A Era do Conhecimento e Inovação convida para o pensar disruptivo, o avançar com foco no usuário,1 a construção de soluções coletivas, o engajamento de todos os atores, e a prototipagem de novos projetos. Sob esses alicerces, novos modelos encontram solo seguro para a nova estrutura organizacional.

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A mudança de estruturas organizacionais construídas sob alicerces dos valores da inovação é caminho seguro, que favorece o engajamento e permite ir além dos nossos modelos seculares. A mudança, embora possa parecer trazer insegurança em um primeiro momento, é fundamental para construir um futuro promissor, com base em recursos tecnológicos, gerenciais e arquitetônicos que impulsionem os resultados de um Judiciário capaz de cumprir sua missão institucional. O futuro é agora! Não podemos esperar mais, a sociedade clama pela mudança no serviço público!

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Tese de doutorado com enfoque conclusivo na centralidade do cidadão no sistema de acesso à justiça, elemento essencial na interação entre os Tribunais e a Democracia. Bochenek, Antônio César. A interação entre tribunais e democracia por meio do acesso aos direitos e à justiça. Brasília: CEJ CJF, 2013.


Referências Bibliográficas AGUNE, Roberto, et al. Dá pra fazer – Gestão do Conhecimento e inovação em governo. São Paulo: Secretaria do Planejamento e Desenvolvimento Regional, 2014. BOCHENEK, Antônio César. A interação entre tribunais e democracia por meio do acesso aos direitos e à justiça. Brasília: CEJ CJF, 2013. COELHO, Nuno; MATOS, José Igreja; LOPES, , José Mouraz; MENDES, Luís Azevedo. Manual de Gestão Judicial. Manual de Gestão Judicial. São Paulo: Almedina. 2015. FIGUEIREDO, Paulo N. Gestão da Inovação: Conceitos, Métricas e Experiências de Empresas no Brasil, 2a. Edição, Rio de Janeiro, LTC, 2015. Desburocratização dos cartórios judiciais. Análise dos Juizados Especiais do Tribunal de Justiça do Estado. IPEA. Brasília. 2015. Disponível em http://www.ipea.gov.br/portal/ index.php?option=com_content&view=article&id=26961. Acesso em 15/04/2017. Gerenciamento de processos e cartórios judiciais. Gestão da Justiça. Março de 2016. CEBEPEJ – Centro de Estudos e Pesquisas Judiciais do IASP – Instituto dos Advogados de São Paulo. Disponível em http://www.cebepej.org.br/admin/ arquivos/0262d3b2a16fb72a170372fe73243e9f.pdf. Acesso em 15/04/2018. O Impacto da Gestão e do Funcionamento dos Cartórios Judiciais sobre a Morosidade da Justiça Brasileira: Diagnóstico e possíveis soluções. Coordenadora Carolina Bonadiman Esteves. Brasilia: Ministério da Justiça. Secretaria de Reforma do Judiciário. 2011. Disponível em: http://www.justica.gov.br/seus-direitos/politicasde-justica/backup-fev- 2018/cejus/publicacoes/publicacoes/funcionamento-doscartorios-judiciais-2011.pdf. Acesso em 15/04/2018 Cartório do Futuro (UPJ) – TJSP. Disponível em http://www.tjsp.jus.br/CartorioDoFuturo Acesso em 02/10/2017 Implantação da UPJ de Jabaquara. Disponível em https://www2.oabsp.org.br/asp/clipping_jur/ClippingJurDetalhe.asp?id_ noticias=24422 Acesso em 02/10/2017 Secretaria única das varas da Fazenda Pública. Disponível em http://www.tjma. jus.br/tj/visualiza/publicacao/416358 http://www.tjma.jus.br/cgj/visualiza/publicacao/415360 Acesso em 02/10/2017 Secretaria única - Varas da Fazenda - Fórum de Belém. Disponível em http://www.cnj.jus.br/noticias/judiciario/81438-varas-da-fazenda-no-forumcivel-de-belem-terao-secretaria-unica Acesso em 02/10/2017

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Centros de Inteligência da Justiça Federal1 Marco Bruno Miranda Clementino2 Vânila Cardoso André de Moraes3

1. Introdução O Centro Nacional e os Centros Locais de Inteligência da Justiça Federal foram implementados pela Portaria nº CJF-POR-2017/00369 de 19 de setembro de 2017, num momento em que o sistema judicial contemporâneo é obrigado a enfrentar o maior volume de processos da sua história. Inovações visando à cooperação e à racionalidade do sistema precisam ser adotadas, pois se constata que, apesar de todo o esforço concentrado, com base num sistema de metas de produtividade, houve um aumento da taxa de congestionamento, considerando o trâmite de 109 milhões de processos no ano de 2016. “Dessa forma, mesmo que o Poder Judiciário fosse paralisado sem ingresso de novas demandas, com a atual produtividade de magistrados e servidores, seriam necessários aproximadamente 3 anos de trabalho para zerar o estoque”4. O que se avizinha, contudo, é a possibilidade de aumento de ações judiciais, considerando-se pesquisa recente elaborada por Maria Tereza Sadek5 demonstrando que a cada 5 cinco segundos um novo processo é ajuizado no Brasil. Além disso, devem ser observados os possíveis impactos de reformas legislativas, com destaque para a 1

Este texto é a compilação de dois artigos publicados na Série CEJ - Centro Nacional de Inteligência da Justiça Federal - maio/2018, Vol. I: Centro Nacional ( e Locais) de inteligência da Justiça Federal: um sistema organizacional para a construção de uma instituição eficaz e inclusiva em todos os níveis e Centros de Inteligência da Justiça Federal: legitimação pelo procedimento, fluxo de trabalho e diálogo aberto, escritos, respectivamente, por Vânila Cardoso André de Moraes e Marco Bruno de Miranda Clementino

2

Juiz Federal do Tribunal Regional Federal da 5ª. Região.

3

Juíza Federal do Tribunal Regional Federal da 1ª. Região.

4

Disponível sítio: < http://www.conjur.com.br/2016-out-17/102-milhoes-processos-passaram-judiciario-2015 > Acesso em 05/05/2017

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6 Disponível no sitio: http://www1.folha.uol.com.br/poder/2015/08/1666713-poder-publico-e-quem-mais-congestiona-o-judiciario-diz-pesquisa.shtml, acesso em 13/03/2108.

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Reforma da Previdência, bem como a utilização da inteligência artificial como instrumento tecnológico auxiliar para o ajuizamento das demandas. Nesse contexto de explosão de processos, a forma individualizada com que têm sido tratadas demandas em que há presença do Poder Público, maioria absoluta das ações que tramitam na Justiça Federal, acarreta diversas ofensas a princípios constitucionais estruturantes, em especial à efetividade, à eficiência, à celeridade e à igualdade. É notória a percepção de que lides que possuem situação fática e jurídica idêntica costumam receber decisões diferentes pelo sistema de justiça. Esse fenômeno é perverso para a legitimidade do Poder Judiciário, pois o sentimento coletivo de injustiça aprofunda-se no seio social quando no foro público não se garante a concretização do princípio da igualdade. Além disso, esse excesso de demandas prejudica o alcance da celeridade processual e a consequente eficiência na prestação de um serviço público essencial à pacificação social. O Estado brasileiro é conhecido pela sua pesada burocracia e inovar neste espaço não é uma tarefa fácil. É que, não bastasse a circunstância de o regime jurídico-administrativo brasileiro se fundar em paradigmas muito rígidos, como a legalidade, as instâncias de controle historicamente resistem ao reconhecimento da licitude de soluções criativas e que podem agregar valor público aos serviços prestados pelo Estado, mesmo quando pautadas em interpretação do regime jurídico em vigor. Os centros de inteligência surgem nesse contexto como células de articulação do Poder Judiciário com o objetivo de prevenir litígios e promover soluções estruturais para demandas judiciais repetitivas, assim como para servir de canal de comunicação entre as diversas instâncias judiciais quanto ao gerenciamento de precedentes. Nesse sentido, essa estrutura organizacional se propõe a atuar na construção de conhecimento em favor da redução de litigiosidade, por meio da racionalização do sistema judicial. Nos itens seguintes será apresentado um breve resumo dos objetivos dos centros, organograma do Centro Nacional e o fluxo de trabalho.

2. OBJETIVOS DO CENTRO NACIONAL DE INTELIGÊNCIA III FÓRUM NACIONAL DE ADMINISTRAÇÃO E GESTÃO ESTRATÉGICA DA JUSTIÇA FEDERAL FONAGE

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O Centro Nacional de Inteligência, interligado aos Centros Locais, tem como objetivos principais a elaboração de estratégias relacionadas à prevenção dos conflitos, ao monitoramento das demandas e a gestão dos precedentes. Percebe-se que possuímos um arcabouço processual voltado para a solução de lides privadas, quando a maioria das causas na atualidade tem origem em conflitos coletivos e massivos. O tratamento individualizado desses conflitos gera pulverização de demandas e repetição, fator que suscita a importância da ideia de prevenção. Acrescentem-se a isso a um excesso de burocracia, políticas públicas ineficientes e as fragilidades do processo administrativo e está formada uma avalanche de processos, reproduzindo demandas, dentre as quais muitas são artificiais, decorrentes da própria ineficiência dos procedimentos estatais.


De outro lado, muitas ações contra a administração pública versam sobre matéria jurídica já pacificada pelos tribunais. Assim, a institucionalização de um espaço público em que possam ser realizadas conciliações e mediações interinstitucionais com possibilidade de reflexos nacionais tem o potencial de proteger, ao mesmo tempo, o interesse público primário (acesso à justiça) e o interesse público secundário, configurado na relação custo-benefício e a proteção ao erário. As conciliações interinstitucionais têm uma força extraordinária na solução dos conflitos levados ao Judiciário Federal, pois conseguem solucionar ou prevenir milhares de litígios individuais. As conciliações individuais, entretanto, por diversas razões, não têm a mesma eficácia, pois existem alguns requisitos como a indisponibilidade e a isonomia que, no mais das vezes, não podem ser afastadas no trato das matérias de direito público. É importante ressaltar que o novo Código de Processo Civil, ao incorporar a conciliação e a mediação como etapas obrigatórias do processo civil, aproximou-se do denominado “tribunal multiportas”, caracterizado como instituição capaz de redirecionar os litígios para o método de resolução mais apropriado ao caso concreto, em vez de buscar o processo judicial como meio único para resolução dos conflitos. Assim, nos termos da Portaria 369/2017, cabe ao Centro Nacional trabalhar na prevenção dos motivos que ensejam o ajuizamento de demandas judiciais repetitivas ou de massa, a partir da identificação das possíveis causas geradoras do litígio; fomentar a implementação de medidas preventivas e de projetos de soluções alternativas de conflitos; propor ou realizar estudos sobre as causas e consequências do excesso de litigiosidade na Justiça Federal; organizar reuniões e propor encontros e seminários com membros do Poder Judiciário, do Ministério Público, das Defensorias Públicas, da Ordem dos Advogados do Brasil, do Poder Executivo, do Poder Legislativo, de organizações da sociedade civil, das universidades, de estudiosos e outros que, de qualquer modo, possam contribuir para o debate e apresentação de propostas que visem ao aprimoramento da prestação jurisdicional na matéria relacionada às atribuições do Centro Nacional; realizar audiências públicas visando à busca de subsídios para estudo dos temas submetidos à sua apreciação. O objetivo relacionado ao monitoramento de demandas surge como um instrumento informacional para acompanhar o ingresso e o trâmite de demandas judiciais repetitivas ou de massa no país a partir de relatórios a serem elaborados em primeira instância, com vistas a prevenir futuros litígios e propor soluções. Um dado substancial para compreender a necessidade desse acompanhamento reside na constatação empírica de que o Brasil possui mais faculdades de Direito do que todos os países no mundo reunidos. Existem 1.240 cursos para a formação de advogados em território nacional enquanto no resto do planeta a soma chega a 1.100 universidades6. Forçoso concluir que a utilização de inovações tecnológicas e da inteligência artificial pelo sistema de justiça torna-se imprescindível e necessária para monitorar esse gigantesco ambiente de litigância serial.

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Disponível no sítio: < http://congressoemfoco.uol.com.br/noticias/brasil-recordista-de-cursos-de-direito-no-mundo/ > acesso em 13/03/2018.

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O monitoramento oportuniza a elaboração de propostas e ações coordenadas entre as instituições públicas visando ao combate da fragmentação na resolução dos conflitos. Além disso, a operacionalização dos institutos alternativos às ações coletivas, como o incidente de resolução de demandas repetitivas e o recurso repetitivo, exige maior conhecimento e controle das demandas em tramitação no Poder Judiciário (ou com potencial de tramitação) para a necessária utilização eficiente desses mecanismos de julgamento coletivizado. Finalmente, o terceiro objetivo relaciona-se ao sistema de precedentes. Referido sistema no Brasil está em fase de construção e ainda há espaço para discussões jurídicas a respeito de questões que poderiam estar tendo um tratamento uniforme e isonômico. Noutra perspectiva existem ainda conflitos intraprocessuais, decorrentes das dúvidas relacionadas à extensão da afetação dos temas, que podem ser reduzidos consideravelmente por meio de um espaço dialógico entre as diversas instâncias do Judiciário Federal. Por outro lado, também se constata a inexistência de um canal de comunicação entre as instâncias do sistema judicial que permita uma necessária troca de informações a fim de permitir uma melhor compreensão do alcance de determinados precedentes e o estabelecimento de critérios de priorização e de seleção dos processos para fins de constituição de precedentes vinculativos. O fundamento dessa atuação encontra-se prevista na Resolução nº 235, de 13 de julho de 2016, cujo escopo é a padronização e a publicidade de processos que ensejam a criação de precedente vinculante e dos respectivos processos suspensos, que terão a sua tramitação diferenciada a depender do resultado do julgamento qualificado. Ademais, é essencial o investimento na organização dos precedentes para que magistrados, membros do Ministério Público, advogados e partes possam consultar de forma objetiva e direta quais são os precedentes vinculantes do respectivo tribunal, estabelecendo diferenciações entre julgados ordinários e julgados qualificados (precedentes vinculantes), mantendo uma ordem evolutiva de possível alteração jurisprudencial, evitando-se, assim, o ajuizamento de ações e a interposição de recursos em matérias já pacificadas no tribunal.

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3. Organograma O Centro Nacional de Inteligência é composto por dois grupos divididos em razão das competências institucionais de seus membros: Grupo de Decisão e Grupo Operacional (organograma ao final deste texto). Conforme art. 4º da Portaria 369, integram o Grupo de Decisão: I.

o ministro diretor do Centro de Estudos Judiciários, que o presidirá;

II.

um ministro representante da Comissão Gestora de Precedentes do Superior Tribunal de Justiça; e


III. os cinco presidentes das Comissões Gestoras de Precedentes dos Tribunais Regionais Federais. § 1º Compete ao Grupo de Decisão dar as diretrizes de trabalho do Centro Nacional e apreciar os assuntos apresentados pelo Grupo Operacional. Por sua vez, integram o Grupo Operacional, nos termos do art. 5º da Portaria 369: I.

os cinco juízes federais indicados pelos respectivos Tribunais Regionais Federais entre aqueles com experiência em gestão de demandas repetitivas ou conciliação;

II.

os cinco juízes federais, coordenadores do Núcleo de Gerenciamento de Precedentes dos Tribunais Regionais Federais; e

III. um juiz federal da Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais, indicado pelo seu presidente. Nos termos no § 2º do mesmo artigo, participam como colaboradores das reuniões do Grupo Operacional o secretário-geral do Conselho da Justiça Federal e os assessores-chefe do Núcleo de Gerenciamento de Precedentes do Superior Tribunal de Justiça e dos Tribunais Regionais. Finalmente, de acordo com o Art. 9º da Portaria 369/2017, cada Seção Judiciária terá um Centro Local de Inteligência, com a estrutura adaptada às possibilidades de cada Região, preferencialmente integrada às centrais de conciliação. Dessa forma, a partir de uma rede de comunicação e cooperação entre os núcleos de gerenciamento de precedentes do STJ e dos TRFs, por meio dos Centros Nacionais e Locais, abre-se a possibilidade de atuação preventiva e gerencial em relação ao contencioso repetitivo ou que possa causar impacto à prestação jurisdicional. Além disso, oportuniza-se a adoção de medidas concretas e normativas voltadas à modernização de rotinas processuais, organização, especialização e estruturação das unidades judiciárias atingidas pelo excesso de litigância, em integração com os Tribunais Regionais Federais e Cortes Superiores.

4. Fluxo de Trabalho Essas reflexões demonstram a relevância de se debaterem os fluxos de trabalho do Centro Nacional de Inteligência da Justiça Federal, a mais consistente inovação na administração da justiça hoje vivenciada. Por outro lado, como nas democracias a legitimação se dá pelo procedimento de tomada de decisões coletivas, é preciso seja observado um fluxo de trabalho que possibilite abertura ao diálogo, transparência e segurança jurídica. Ora, como o objetivo do centro é a instrumentalização do diálogo interinstitucional, seu funcionamento pressupõe essencialmente uma lógica colaborativa.

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Registre-se que os centros de inteligência configuram também uma novidade para o exercício de uma advocacia preventiva. Por óbvio, advogados, procuradores e defensores podem provocar o centro de inteligência quando pretendam levar ao

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conhecimento do sistema judicial determinada informação que precise transcender os limites de um processo individualizado. Quando se trata, por exemplo, de uma demanda repetitiva, o profissional do direito pode e deve oferecer subsídios relevantes para subsidiar a emissão de notas técnicas que auxiliem, por exemplo, na padronização de rotinas judiciais país afora. A ideia, portanto, é que o sistema judicial multiportas atue no campo da prevenção através dessa ferramenta, na perspectiva da promoção da gestão do serviço judiciário. Nesse sentido, os centros de inteligência inauguram também um espaço democrático para que todos os atores do sistema de justiça possam contribuir com informações relevantes para aprimoramento da gestão judiciária como um todo, tendo como foco conflitos específicos, tipicamente estruturais, que possam gerar litigiosidade artificial, em particular através da multiplicação repetitiva de demandas A definição desse fluxo de trabalho tem por pressupostos: i)

a abertura ao diálogo entre instâncias da Justiça Federal e entre esta e os demais atores do sistema de justiça, com a aceitação da legitimidade de uma lógica negociativa para solução de problemas;

ii)

a disponibilização de um canal de diálogo com os jurisdicionados, como mecanismo do sistema judicial multiportas;

iii) o prestígio a soluções coletivo-estruturais; iv) o prestígio à lógica colegiada; v)

a busca da cientificidade e da interdisciplinaridade para auxílio na tomada de decisões;

vi) a ideia de que a Justiça Federal pode ser uma gestora ativa de conflitos, sem prejuízo da inércia como princípio da jurisdição; vii) a preferência do sistema jurídico pela prevenção do ilícito do que por uma postura de reação, por meio da função jurisdicional; viii) a não usurpação de competências jurisdicionais. O êxito da inovação depende do emprego de um fluxo de trabalho cuidadoso, que possibilite a aderência dos demais atores do sistema de justiça e mesmo da população em geral às atividades do centro. Ora, como o objetivo do centro é a instrumentalização do diálogo interinstitucional, seu funcionamento pressupõe essencialmente uma lógica colaborativa. III FÓRUM NACIONAL DE ADMINISTRAÇÃO E GESTÃO ESTRATÉGICA DA JUSTIÇA FEDERAL FONAGE

Porém, a efetiva operacionalização da iniciativa exige um detalhamento bem mais rigoroso, sempre levando em conta os pressupostos já referidos. Esse detalhamento precisou ser feito, pois quanto aos seguintes pontos: i)

procedimento de levantamento de temas;

ii)

aprovação de indicação de temas para desenvolvimento;

iii) critérios para elaboração, aprovação e controle de notas técnicas; iv) controle da tramitação dos temas e do cumprimento das providências estabelecidas nas notas técnicas.

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4.1. PROCEDIMENTO DE LEVANTAMENTO DE TEMA Ante a premissa de que o fluxo de trabalho seria orientado pela definição de temas para serem trabalhados, foi necessário definir como seria feito o levantamento respectivo, assim como os sujeitos legitimados a oferecerem sugestões ao centro e o momento em que essas sugestões deveriam ser formalizadas. Tendo em vista que a execução direta das atividades do centro coube ao grupo operacional, decidiu-se que a indicação de temas pode ser encaminhada a este, por documento físico, mensagem de correio eletrônico ou mediante o uso de aplicativo específico a ser criado futuramente. A indicação do tema deve vir acompanhada de justificativa que possibilite a sua compreensão pelo Centro Nacional de Inteligência da Justiça Federal e a demonstração do seu potencial de litigiosidade. Qualquer pessoa pode fazer a simples indicação de um tema, devendo ser prestigiadas aquelas encaminhadas por atores do sistema de justiça, bem como de órgãos públicos e organizações não-governamentais. A indicação pode ser feita a qualquer momento, com o uso dos canais disponíveis. Percebe-se claramente que o fluxo de trabalho foi concebido como forma de viabilizar efetivamente a abertura ao diálogo, através de um canal democrático que prestigia a população como um todo. No mais, essa abertura mais ampla reforça a desejada interdisciplinaridade, já que profissionais de outras áreas terão um espaço legítimo de interação com a Justiça Federal.

4.2. PROCEDIMENTO DE APROVAÇÃO DA INDICAÇÃO DE TEMAS PARA DESENVOLVIMENTO A aprovação dos temas deve ser feita nas reuniões presenciais do grupo operacional ou através de painéis virtuais futuramente confeccionados, sendo a lógica colegiada sempre prestigiada. Os temas indicados por sujeitos externos são inicialmente apresentados ao coordenador do grupo operacional, que faz uma triagem prévia (com um juízo preliminar e superficial de conveniência e oportunidade) e, em seguida, submete ao colegiado para aprovação por maioria simples. Naturalmente, qualquer membro do grupo operacional pode propor temas para apreciação, mediante aprovação do colegiado, e o grupo decisório também tem a prerrogativa de determinar que algum tema específico seja trabalhado. Após aprovado, cada tema deve receber um número por meio do qual será controlada a sua tramitação. No momento da aprovação do tema, são também designados um relator e um revisor, a partir de um juízo de conveniência e oportunidade que considere critérios como formação acadêmica ou profissional, maior facilidade de acesso a dados necessários para estudo, melhor interlocução com agentes públicos e privados, interesse regional. Como se trata de um trabalho essencialmente coletivo, podem ser designados mais de um relator ou revisor para o tema, também segundo um juízo de conveniência e oportunidade.

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De qualquer forma, compete ao relator ou aos relatores o encaminhamento burocrático dos temas aprovados, a concepção de uma estratégia a ser empregada, a

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busca de dados e a realização de estudos, a confecção da nota técnica a ser submetida ao grupo operacional. O revisor tem a atribuição de promover um juízo crítico sobre o trabalho desenvolvido, antes de este ser submetido ao grupo operacional para aprovação. Assim, tendo sido adotada a lógica colegiada, a figura do relator é preponderante, consistente numa espécie de “cérebro” do tema, sob um juízo crítico do revisor. Todo o trabalho do relator é realizado com o assessoramento do Centro de Estudos Judiciários do CJF, que confere todo o suporte de pesquisa e obtenção de dados estatísticos.

4.3. CRITÉRIO PARA ELABORAÇÃO, APROVAÇÃO E CONTROLE DE NOTAS TÉCNICAS As notas técnicas, salvo justificativa fundamentada do relator, em especial por força da natureza do tema, devem ser apresentadas na reunião presencial seguinte do grupo operacional para fins de aprovação e imediata apresentação posterior ao grupo decisório. A rigor, todas as estratégias a serem empregadas em torno de um tema, embora concebidas pelo relator, devem ser objeto de nota técnica e devidamente aprovadas pelo grupo operacional, salvo urgência, caso em que aquele toma as providências monocraticamente, acompanhadas da devida fundamentação, para posterior referendo. Em determinadas situações em que as estratégias sejam mais complexas, pode ser fixado um calendário para tramitação do tema. Somente o resultado final do trabalho do grupo operacional em torno do tema é apresentado a grupo decisório, salvo nas hipóteses de estratégias de maior complexidade ou que envolvam custos, a exemplo da realização de audiências públicas. As notas técnicas devem receber um número somente a aprovação pelo grupo decisório, quando podem ser publicadas. Tratando-se de uma nota técnica de mera definição de estratégia de tramitação, não precisa ser numerada para fins de controle e consta apenas da tramitação do tema.

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Em seu formato, o modelo de nota técnica utilizada pelo Centro Nacional de Inteligência da Justiça Federal deve conter um relatório do tema, a justificativa de enquadramento deste no escopo do Centro Nacional de Inteligência, fundamentação e conclusão. A conclusão é composta por recomendações, deliberações e encaminhamentos. O controle das notas técnicas está vinculado ao controle dos próprios temas aprovados, o que viabiliza seja o fluxo de trabalho orientado pela conteúdo e não pela forma.


4.4. PROCEDIMENTO DE CONTROLE DA TRAMITAÇÃO DOS TEMAS E DO CUMPRIMENTO DAS PROVIDÊNCIAS ESTABELECIDAS NAS NOTAS TÉCNICASÉCNICAS Compete ao Centro de Estudos Judiciários do CJF o cumprimento das determinações fixadas nas notas técnicas (recomendações, deliberações e encaminhamentos). É dele a função de secretariado do Centro Nacional de Inteligência. Havendo alguma dificuldade ou entrave no cumprimento, o relator deve ser acionado para atuar, podendo este recorrer ao grupo operacional para submissão de alguma estratégia complementar ou mesmo ao grupo decisório, caso a estratégia escolhida se revele complexa. Cabe também ao Centro de Estudos Judiciários do CJF realizar o acompanhamento do cumprimento das providências determinadas nas notas técnicas, sempre a partir do controle do tema, podendo provocar também nesse caso o relator caso se exija sua atuação nessa fase. A princípio, os temas aprovados nunca são arquivados em definitivo, podendo ser concebidas eventualmente novas estratégias, diante de uma necessidade surgida a posteriori, caso em que o mesmo fluxo de trabalho deve ser observado.

4.5. CONTEÚDO DA PRODUÇÃO DO CENTRO DE INTELIGÊNCIA Para além do fluxo de trabalho, o conteúdo da produção do Centro Nacional de Inteligência deve tem cunho meramente administrativo, jamais usurpando competências jurisdicionais. A lógica negociativa empregada pressupõe também o caráter facultativo de suas recomendações, deliberações e encaminhamentos. O fundamento dos centros de inteligência é a promoção de soluções consensuais, nas quais o poder de convencimento decorre da cientificidade das estratégias de gestão empregadas.

5. Conclusão Os centros de inteligência têm por estratégia o emprego de soluções preventivas e coletivo-estruturais. A ideia é agir fora do processo e dissociado do conflito subjetivo, individual ou coletivo. Foca-se genericamente na origem dos conflitos que ensejam demandas repetitivas, nos estímulos silenciosos de litigiosidade identificados no funcionamento do próprio sistema de justiça, no diálogo entre instâncias para gestão de precedentes visando a reforçar-lhes a devida segurança jurídica, na padronização de rotinas com o objetivo de reduzir litigiosidade intraprocessual.

III FÓRUM NACIONAL DE ADMINISTRAÇÃO E GESTÃO ESTRATÉGICA DA JUSTIÇA FEDERAL FONAGE

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