Financeiro 45 - Abril 2007

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artigo atuação da livre iniciativa. O ato de produzir para si e de gerar lucros é justificável, com tanto que os indivíduos também tenham responsabilidade social, comunitária e ecológica e queiram dispor-se efetivamente a retribuir de fato quando auferem ganhos, convenientemente a favor dos mais desassistidos e carentes. O assunto é complexo. Não há ciência exata na construção de um molde socioeconômico, que é gelatinoso e de formas mutantes, que dê suporte à coexistência e à construção de uma sociedade em busca de um patamar mais alto de civilização. A luta pela renda, posse e propriedade é um motor contínuo da civilização ocidental. E inexistem soluções prontas e perfeitas para questões tão pujantes que lidem com interesses humanos de enriquecimento e pujança econômica. Correções e acertos de rota foram feitos e tentados na era Vargas, com a introdução de regras mais claras para a contratação de pessoal, visando-se criar concursos públicos isentos e corretos. Contudo, o Estado continuou crescendo, posto que foi incorporando a maior parte das atividades produtivas nacionais e concentrando as melhores condições para produzir e gerar bens públicos e bens que normalmente seriam feitos pela iniciativa privada. Pela fragilidade de uma indústria nascente e de imigrantes descapitalizados, que tiveram de montar suas estruturas fabris com diminutas poupanças, os grandes projetos empresariais e corporativos do século XX foram formulados, financiados e desenvolvidos den-

tro das estruturas do Estado brasileiro. O Estado cresceu e muniu-se de talentos. Criou uma estrutura portentosa, poderosa e alicerçada em inúmeros técnicos capacitados, que não encontravam na iniciativa privada a capacidade de serem empregados e bem-remunerados. Acrescente-se a isso a percepção keynesiana, de que o Estado é capaz de tirar da crise, da recessão e, sobretudo, da estagnação as economias nacionais, tal como sucedera após o grande crack da Bolsa de Nova York, mediante o uso de políticas fiscais que incentivaram gastos públicos direcionados a investimentos e a custeio. Contudo, após a Segunda Guerra Mundial, o Brasil experimentou uma fase longa de crescimento econômico significativo, que firmou a iniciativa privada doméstica e multinacional e permitiu que as relações intra-sociedade e economia fossem revisadas. Infelizmente, essa revisão se dá ainda de forma lenta, disforme e errática. E não se direciona necessariamente à formação de um Estado mais enxuto, modernizado e produtivo. As configurações que o Estado assume dependem em grande medida de quem está de fato no poder e de sua ideologia momentânea. Ausenta-se um pacto intergerações, sobre a evolução e a identificação da curva e do circuito ideal de contrato de longo prazo para a nação nas dimensões social e econômica. Portanto, o contrato socioeconômico brasileiro navega conforme a força das marés. Ora pende ao intervencionismo e ao estadismo, em

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que benesses e assistencialismos tomam conta do País e os contribuintes são chamados para pagar as contas da generosidade dos políticos; ora pende mais timidamente ao liberalismo cercado por pruridos intervencionistas, com a adoção de privatizações e pequenas aberturas do mundo de negócios ao exterior. Esse movimento pendular e meio errático move a sociedade para frente e a favor do progresso. Mas, por falta de melhores definições e pulso da autoridade, gera uma sensação simultânea de desordem, de caos, de confusão e de turbidez, da qual se aproveitam numerosos grupos dentro e fora do Estado para agir contra a lei e de modo ilícito. Por essas razões, o Brasil precisa rever as bases sobre as quais assenta as relações sociais e econômicas, o que equivale dizer que precisa rever a sua Constituição. De fato, a Constituição revisada de 1988 concebeu muitas obrigações ao Estado, inúmeras despesas e poucas novas fontes de renda real que estejam alicerçadas em setores dinâmicos e lucrativos. E isso significa que, quanto mais se adiarem as boas práticas da relação contratual macrossocial, mais duras e impopulares serão as regras de transição que precisarão ser estabelecidas. Pode-se assegurar que o contrato social e econômico brasileiro atual gera um crescimento baixo da produção, o que se comprova mediante pífias taxas de crescimento do PIB. Entre 1998 e 2006, a taxa média anual foi de 2,6%, superando apenas o Haiti, na América Latina.

FINANCEIRO

16/5/2007, 09:36


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