Revista ZacatraZ nº 199

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Editorial Revista “ZACATRAZ”

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Editorial PROPOSTA DE REVISÃO DA ORIENTAÇÃO ESTRATÉGICA DA AAACM, SUBMETIDA À ASSEMBLEIA GERAL EM 19 DE JUNHO DE 2015 - COMENTÁRIOS EXPLICATIVOS

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proposta de Revisão da Orientação Estratégica da AAACM, submetida à Assembleia Geral em 19 de Junho de 2015, decorre de um debate muito aprofundado que teve em conta as recomendações do Conselho Supremo transmitidas à Direcção em Fevereiro de 2015. Esta revisão visa actualizar a orientação estratégica aprovada pela Assembleia Geral em Outubro de 2012, adaptando-a objectivamente à evolução entretanto ocorrida no Colégio Militar As orientações 1, 2, 3 e 5 são mantidas sem alterações em relação à orientação estratégica de 2012. A orientação 4 aponta um caminho para que a introdução de internato em regime misto possa resultar em benefício para o Colégio Militar, promovendo uma interpretação feminina do seu ethos e a igualdade entre os dois sexos, mas rejeitando o caminho insensato que procura tratar de forma igual, algo que é intrinsecamente diferente: o processo de desenvolvimento dos dois sexos na adolescência. As orientações 6 , 7 e 8 reflectem preocupações permanentes da AAACM mas às quais o processo de reestruturação reforça a dimensão estratégica. A cada uma destas orientações está associada uma justificação que procura sintetizar o debate aprofundado que foi realizado. Debate este que decorreu na continuidade da reflexão que a AAACM produz há mais de uma década, a qual tem permitido fundamentar uma constante atitude de diálogo construtivo com todos

os níveis da tutela do Colégio Militar. A análise do processo de reforma dos EME demonstra que, apesar dessa atitude, a tutela sempre optou por ignorar o nosso conselho. Esta é uma responsabilidade histórica que cabe inteiramente aos responsáveis políticos e militares que intervieram e intervém na reforma sem a reflexão prévia e abertura ao diálogo que o processo exige. Não somos movidos por preconceitos, saudosismos ou interesses, mas conhecemos bem a essência do Colégio, difícil de apreender por quem não a viveu. Somos movidos apenas pelo amor, pela gratidão e pela clara noção de utilidade para Portugal, por isso a AAACM não deixará de, em cada momento e face à realidade objectiva, afirmar as orientações que melhor servem o Colégio Militar. Esta é o fundamento essencial da proposta que aqui se apresenta.

1. Defesa de um Colégio Militar de excelência, público, veículo estratégico da Lusofonia, tutelado pelo Exército, enquanto unidade militar, em regime que permita autonomia de gestão administrativa e financeira. O Colégio Militar evoluiu sempre no contexto e sob a tutela do Exército. Não acreditamos que um qualquer instituto privado ou fundação, consiga reproduzir ou continuar estas características genéticas. Acreditamos que, se o Exército Português não tiver a capacidade e autonomia para continuar a instituição com padrões de excelência e no longo prazo, isso significa que se perdeu a própria matriz mili-

tar da sociedade, a qual justifica a existência do Colégio. O nosso depurado modelo de educação militar é reconhecido e procurado nos países lusófonos, facto que deve ser utilizado na cooperação com esses países.

2. Exigência da preservação da nossa identidade através dos Pilares distintivos da Formação Militar e Liderança, da Formação Desportiva e do ethos do Colégio Militar. Nenhum dos três pilares poderá ser enfraquecido mas é essencial que a nossa cultura e identidade sejam preservadas. Não é o passado dos Antigos Alunos que justifica a necessidade de preservar a cultura e identidade, a principal justificação reside no facto de que quem escolhe o Colégio para os seus filhos ou filhas, procura também essa cultura e carácter distintivos, mesmo que por vezes os não saiba identificar ou respeitar em concreto. Se se perderem os factores distintivos, o Colégio será um “liceu com farda”. Essa farda, não representando, no futuro, nada de substancialmente diferente, poderá até ser modificada ou suprimida. 3. Exigência de uma gestão eficiente do Colégio Militar, incluindo uma coordenação pedagógica competente para recolocar os resultados académicos do Colégio Militar no nível de excelência. O nível da excelência (resultados sempre nos 10% superiores) é uma condição necessá-


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Editorial

ria à manutenção do Colégio, porque os resultados são um critério importante na escolha da escola. Mas, acima de tudo, os bons resultados fazem parte do nosso ethos: no Colégio valorizam-se a superação e os resultados individuais, através do seu impacto no desempenho do grupo. Esta é uma das razões pelas quais o Colégio Militar é diferente. É necessário definir e cumprir objectivos de desempenho académico e essa é a missão do responsável pela coordenação pedagógica. Os professores têm de, empenhadamente, conhecer e cultivar o ethos, com o qual tem de ser harmonizada uma cuidada orientação pedagógica. Esta é uma condição necessária ao bom desempenho.

4. Exigência de que os novos formatos de educação que existem no Colégio Militar (externo e misto), coexistam com o modelo de internato masculino de orientação militar, o qual é genético das características diferenciadoras Colégio Militar, sem degradar essas mesmas características diferenciadoras do Colégio Militar, sendo que: 4.1. Os alunos, independentemente do sexo, deverão estar enquadradas num modelo formativo de natureza militar e de liderança, com conteúdos formativos diferenciados para os alunos dos regimes de internato e externato no que se refere aos horários com presença exclusiva de internos. 4.2. As funções de graduados serão sempre assumidas por alunos ou alunas que, cumulativamente, frequentem o CM em regime de internato e que nos 3 anos que precederam a sua graduação o tenham feito em idêntico regime. 4.3. A organização e enquadramento do enquadramento de alunos: 4.3.1. O Batalhão de Alunos deverá estar organizado em companhias, constituídas por pelotões de alunos do mesmo sexo. 4.3.2. O enquadramento das companhias e respectivos pelotões será realizada por uma estrutura de graduados que respeitará, também, a diferenciação de sexos. 4.3.3. A organização da Escolta a cavalo terá uma estrutura de graduados única e mista.

4.3.4. As funções da estrutura do Comando do Batalhão Colegial não obedecerá a distinção de sexo. 4.3.5. No que se refere ao enquadramento de Anos e Turmas deverão manter-se as chefias de Turma podendo os Chefes de Turma ser alunos ou alunas, internos ou externos, e deverão sempre ter a tutoria de um graduado rapaz e um graduado rapariga. 4.3.6. Em relação ao cerimonial (ex: 3 de Março), a organização deverá ser definida em conjunto com a Direcção do CM. A organização e enquadramento de alunos é um tema distintivo e caracterizador do modelo de formação do Colégio. O que o caracteriza é resultado da organização em companhias e a existência dos graduados. As companhias do Batalhão Colegial foram sempre definidas pelas idades. Em cada companhia o Colégio sempre juntou alunos com idades semelhantes. No passado existiram até sete companhias, uma por cada ano. Este tema é estruturante no internato pelo que deve ser nesse contexto que o avaliamos. Para os externos também é importante a vivência nas companhias, mas sem relevância e intensidade comparáveis com os internos. Isto é válido para os alunos mas também para os seus Encarregados de Educação (o Encarregado de Educação de um externo não se preocupa em saber que acompanha o seu filho durante a noite). A camaradagem é essencial ao Colégio Militar. A camaradagem que prevalece e resiste ao tempo é gerada pelas dificuldades superadas em conjunto. As dificuldades não residem na interacção com os adultos educadores. As verdadeiras dificuldades nascem na interacção social complexa no ambiente do Corpo de Alunos, essencialmente nas últimas horas do dia, onde os alunos recolhem à Companhia. As verdadeiras dificuldades podem ser, por exemplo, vencer um jogo de futebol, resolver um “caso grave” que ocorra na sociedade dos alunos, ter uma prova escolar que a todos preocupa ou treinar para o 3 de Março. Qualquer Antigo Aluno do CM reconhecerá como verdadeiras estas afirmações. As “dificuldades” são as mais das vezes ingénuas e à medida dos interesses e da idade dos alunos, mas são o que na realidade gera a identidade única do Colégio Militar. A Companhia é assim a unidade essencial e, como dito anteriormente, agrupa alunos da mesma idade. A intensidade e modo

de apresentação das “dificuldades” são diferentes, note-se que até a escolha dos graduados sempre reflectiu essa diferença: qualquer Antigo Aluno sabe distinguir as características de um potencial Comandante da 1ª ou de um potencial Comandante da 4ª. A interacção social relevante para gerar a identidade prolonga-se para o espaço mais íntimo das camaratas ou da sala de leitura e termina no sono de cada dia. A Companhia vive, prepara-se e “combate” junta, tem o seu comandante e oficiais e uma coerência interna de onde decorre muita da diferenciação educativa do Colégio. Esta realidade é muito intensa e é essa intensidade que a torna distintiva e formativa, tanto para os graduados como para os restantes alunos. Em resumo, a intensidade formativa só é possível por quatro razões principais: • As Companhias estão organizadas em grupos etários homogéneos, com maturidades e interesses comuns. • Os graduados dormem no mesmo local onde dormem os alunos desse grupo etário, actuando de acordo com o perfil dessa faixa etária. • Os alunos são adolescentes, vivendo em simultâneo as “fragilidades” e as “intensidades” características da idade. • A Direcção do Colégio e os Encarregados de Educação conhecem, confiam e sabem controlar esta realidade. Uma companhia deixará de ter as características formativas acima descritas, mesmo se for homogénea quanto ao sexo dos seus componentes, quando: • Seja formada por dois grupos distintos em termos de maturidades e interesses. • Um grupo passa noite num local e outro grupo noutro local. • Alguns graduados dormem nas instalações de um grupo e outros nas instalações do outro grupo. Neste caso de desestruturação de uma companhia: • A unidade da companhia desaparece dada a composição em dois grupos com características distintas e alojamentos em locais distintos. • A função de comando dos graduados, apesar de ser única, fica limitada / impossibilitada / dividida durante a noite, período de tempo extremamente sensível (nomeadamente para os alunos mais novos e para os Encarregados de Educação). • A Direcção e Oficiais do Corpo de Alunos e os Encarregados de Educação terão grande dificuldade em interagir ao verificarem que


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a estrutura de graduados da companhia não corresponde com a estrutura de graduados que de facto passa a noite no mesmo local que os alunos. A criação de companhias mistas, como parece ser o plano para o Colégio, configura, de forma agravada, as situações de desestruturação referidas representando uma ameaça importante ao modelo formativo do Colégio: • Rapazes e raparigas adolescentes têm maturidades e interesses profundamente diferentes. • Vão viver em “casas” diferentes. • A actuação dos graduados é limitada nos casos de comandarem alunos de sexo diferente, não podendo passar a noite no mesmo local. • A actuação dos graduados é dificultada pela heterogeneidade / divisão do conjunto de alunos sob o seu comando impossibilitando abordagens conjuntas consistentes. • Haverá enorme dificuldade em enquadrar a sobreposição de funções de comando com a dinâmica emocional de jovens de sexos diferentes. • A Direcção e Oficiais do Corpo de Alunos e os Encarregados de Educação dificilmente conseguirão perceber como estão enquadrados os alunos e quem são os graduados “de facto” dado que a resposta resulta da hora e do assunto específico... nem todos os assuntos “masculinos ou femininos” podem ser partilhados e tratados com graduados do sexo oposto… nem um Comandante de Companhia rapariga pode viver a realidade de uma camarata de rapazes… Outro aspecto a ter em conta são as assimetrias e tensões sociais que se geram nas hipotéticas companhias mistas, as quais serão de uma enorme dimensão e dramatismo (alguns casos ocorrem já no CM), sendo totalmente incompatíveis com o modelo que gerou a essência do Colégio e acarretando riscos muito elevados. Nas idades mais jovens 10-13 anos a separação natural entre os jovens dos dois sexos é de tal forma evidente que é quase ridículo pensar que entre eles se formará uma “unidade”. A resposta a esta enorme tensão terá de passar por um muito maior controlo pelos responsáveis do Corpo de Alunos, com uma muito maior presença e, muito provavelmente, dispositivos de controlo mais intrusivos (ex: câmaras de vídeo vigilância). Qualquer Antigo Aluno saberá explicar que o CM sempre foi um espaço de liberdade individual e que este factor essencial está na base do sentido de responsabilida-

de característico do seu modo de educar: sem liberdade não pode haver assunção plena da responsabilidade! O enquadramento de inspiração militar gera regras claras e sobra dessas regras e obrigações diárias um espaço de autodeterminação e respeito pela individualidade, bem significada pelo tratamento por “Senhor Aluno”. Este respeito pela individualidade gera Antigos Alunos com respeito por si próprios. A intrusão necessária a controlar as óbvias tensões da mistura dos sexos determinará um ambiente concentracionário e com liberdade limitada, que será um ácido forte a corroer a identidade do Colégio. Por isso o Colégio Militar misto deve ter companhias separadas por sexos e idades, estendendo a lógica que sempre teve à nova realidade. Poderão ser 5, 6, 7 ou 8, o que importa é que mantenham a capacidade de formar alunos (e alunas) do Colégio Militar. Na Duke of York´s Royal Military School, um dos casos analisados pela direcção da AAACM como referência para comparação, a transformação para o regime misto ocorreu há já alguns anos. Nesse caso os grupos correspondentes às “Companhias” estão separados por sexo e idade.

5. Assegurar participação formal e eficaz da AAACM na definição, condução e acompanhamento do processo de mudança. Esta orientação estratégica é particularmente importante no momento em que a revisão do estatuto do Colégio Militar parece ignorar a participação formal dos Antigos Alunos em órgãos de conselho relevantes para a sua gestão. 6. Reforço da informação à comunidade dos Antigos Alunos sobre a situação e evolução do Colégio Militar. A situação de risco em que a instituição foi colocada e se mantém, exige que os Antigos Alunos tenham acesso a informação completa sobre as alterações introduzidas e as suas consequências actuais e potenciais. Os Antigos Alunos deverão formar a sua opinião com base em informação actualizada e completa. A complexidade do processo de reforma e a velocidade das transformações que são produzidas implica um esforço de informação que permita a cada um formar uma opinião responsável. 7. Reactivação do Conselho de Tradições com um enfoque no seu papel estruturante enquanto guardião do ethos e identidade Colegial.

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É aos Antigos Alunos que compete esta missão, devendo ser aumentada a intensidade e actividade na análise e intervenção sobre a evolução do CM neste âmbito.

8. Assegurar sempre que possível que as posições da AAACM sejam desenvolvidas e alinhadas em colaboração com a APEEACM e com a Direcção do CM. Os Pais e Encarregados de Educação e a Direcção do Colégio Militar são considerados interlocutores privilegiados da AAACM. No quadro de uma relação de mútuo reconhecimento e reciprocidade, tudo faremos para produzir sinergias e entendimentos estáveis, essenciais ao futuro do Colégio Militar. 9. Promoção da revisão dos Estatutos da AAACM tendo em consideração as novas realidades, i.e. alunas e externos. A AAACM deverá adaptar-se à nova realidade, dando o exemplo de uma evolução harmoniosa integrando todos os Antigos Alunos do Colégio Militar, mantendo, aqui também, a nossa identidade. Trata-se de uma tarefa de grande complexidade e importância que deverá acompanhar a evolução do CM nos próximos anos. A Direcção da Associação dos Antigos Alunos do Colégio Militar


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Ficha Técnica

CORPOS SOCIAIS DA ASSOCIAÇÃO PARA O TRIÉNIO 2014-2016

Ficha Técnica PUBLICAÇÃO TRIMESTRAL Fundada em 1965 Nº 199 Abril/Junho - 2015 FUNDADOR Carlos Vieira da Rocha (189/1929)

DIRECÇÃO Presidente Vice-Presidente Secretário Tesoureiro 1º Vogal 2º Vogal 3º Vogal 4º Vogal 5º Vogal 1º Vogal Suplente 2º Vogal Suplente 3º Vogal Suplente

DIRECTOR Gonçalo Salema Leal de Matos (371/1949)

António José Sousa Valles e Saraiva de Reffóios - 529/1963 José António Madeira de Ataíde Banazol - 631/1968 Pedro Miguel Correia Vala Chagas - 357/1977 Vítor Manuel Galvão Rocha Novais Gonçalves - 666/1971 Carlos Francisco da Silva do Rio Carvalho - 307/1971 Pedro Manuel do Vale Garrido da Silva - 53/1961 Luís Baptista Esteves Virtuoso - 72/1973 José Afonso Correia Lopes - 237/1976 José Nuno Castilho Ribeiro Pereira - 233/1973 Miguel Assis das Neves Carneiro de Góis - 188/1983 Gustavo André dos Santos Lima – 248/1994 Afonso Castelo dos Reis Lopez Scarpa - 222/2000

CHEFE DE REDACÇÃO Luís Filipe Ribeiro Ferreira Barbosa (71/1957) REDACÇÃO Nuno António Bravo Mira Vaz (277/1950) Pedro Manuel do Vale Garrido da Silva (53/1961) João Carlos Agostinho Alves (110/1996) CAPA Estandarte Nacional na Parada do Corpo de Alunos ©Foto Leonel Tomaz ENTIDADE PROPRIETÁRIA E EDITOR Associação dos Antigos Alunos do Colégio Militar MORADA DO PROPRIETÁRIO e SEDE DA REDACÇÃO Quartel da Formação - Largo da Luz 1600-498 Lisboa Tel. 217 122 306/8 Fax. 217 122 307

ASSEMBLEIA GERAL Presidente Vice-Presidente 1º Secretário

António José Fonseca Cavaleiro de Ferreira - 332/1950 Duarte Manuel Silva da Costa Freitas - 199/1957 João Miguel Jardim de Abreu Ferreira Pinto - 261/1980

TIRAGEM - 1350 exemplares DEPÓSITO LEGAL Nº 79856/94 DESIGN E EXECUÇÃO GRÁFICA: Tm. (+351) 933 738 866 Tel. (+351) 213 937 020 info@smash.pt www.smash.pt

CONSELHO FISCAL Presidente 1º Vogal 2º Vogal 1º Vogal Suplente 2º Vogal Suplente

José Manuel Spínola Barreto Brito - 539/1963 Eurico Jorge Henriques Paes - 306/1957 José Francisco Machado Norton Brandão - 400/1961 António Emídio da Silva Salgueiro - 461/1972 João Luís de Mascarenhas e Silva Schoerder Coimbra - 54/1984

DISTRIBUIÇÃO GRATUITA AOS SÓCIOS DA AAACM Isenta de registo na Entidade Reguladora da Comunicação Social (ERC), ao abrigo do nº 1 da alínea a), do Artigo 12º do Decreto Regulamentar nº 8/99, de 9 de Junho. Os artigos publicados são da responsabilidade dos seus autores. Esta publicação não segue o novo acordo ortográfico.

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NO VO

35€


Sumário

08 Conselho Supremo

Alterações na sua composição

09 Colégio Militar Berço de Grandes Portugueses 15 Antigos Alunos em Destaque 19 A Nossa Luz e o Código de Honra

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Assembleia Geral 27 de Março de 2015

23 O "expresso" da Professora Amélia 32 Curso de 1965/1972

Romagem dos 50 Anos de Entrada

33 Curso de 1982/1990

Romagem dos 25 Anos de Saída

34 Curso de 1987/1995 Romagem dos 20 Anos de Saída

35 O 212º Aniversário do Colégio Militar 37 Colégio 2015 38 Confraternização do 3 de Março 40

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Centenário do Moca 1915-2015 Cândido Gomes Alves

Zum Zaravalho

41 VII Festival dos Estabelecimentos Militares de Ensino

44 As Eleições Presidenciais de 1958 no Colégio Militar

50 O Mirolho

- Alberto Sanches de Castro (219/1898)

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Entrevista a Catarina Moutinho

54 Os Gloriosos Malucos das Máquinas Voadoras 60 José Fanha (289/1961) 62 Deambulações pela Literatura, Matemática, Física e Filosofia...

69 Os que nos deixaram

30 O Colégio Militar no Futuro, no Passado e no Presente

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Assembleia Geral 27 de Março de 2015

Assembleia Geral 27 de Março de 2015 ©Fotos Leonel Tomaz

A Direcção, a Mesa da Assembleia Geral e o Conselho Fiscal

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o passado dia 27 de Março decorreu no Teatro Dom Luiz Filipe a Assembleia Geral da Associação, tendo sido abordados os seguintes temas: Apreciação e votação do Relatório e Contas do exercício de 2014; Deliberação sobre quaisquer propostas formuladas nesse Relatório ou no Parecer do Conselho Fiscal sobre ele exarado; Apreciar a acção da Direcção e do Conselho Fiscal; Apreciação e votação do Orçamento para 2015; Ponto de situação sobre a Reestruturação do Colégio Militar; Ponto de situação sobre o “Quartel da Formação”; Eleição de novos Conselheiros para o Conselho Supremo. Os trabalhos foram conduzidos pelo Presidente da Mesa da Assembleia Geral, António Cavaleiro de Ferreira (332/1950), coadjuvado pelo Vice-Presidente Duarte Manuel Costa Freitas (199/1957) e pelo Primeiro Secretário João Ferreira Pinto (261/1980), com a presença de António Saraiva de Reffóios

(529/1963), Presidente da Direcção, José de Ataíde Banazol (631/1968), Vice-Presidente, Vítor Novais Gonçalves (666/1971), Tesoureiro, Pedro Chagas (357/1977), Secretário, os Vogais Carlos Rio Carvalho (307/1971), Pedro Garrido da Silva (53/1961), Luís Virtuoso (72/1973), Afonso Lopes (237/1976) e José Nuno Pereira (233/1973), José Manuel Spínola Barreto Brito (539/1963), Presidente do Conselho Fiscal, Eurico Jorge Henrique Paes (306/57), Primeiro Vogal, e José Francisco Machado Norton Brandão (400/1961), Segundo Vogal. Verificado o número de presenças, lamenta-se que de um universo de mais de um milhar de sócios, apenas participassem 35 Antigos Alunos havendo 3 procurações válidas. Sem mais comentários! A Acta relativa à Assembleia Geral anterior, realizada em 7 de Março de 2014, foi aprovada por unanimidade.

Concedido um período antes da Ordem de Trabalhos para apresentação e debate de quaisquer assuntos, verificou-se uma total ausência de inscrições. O Presidente da Direcção António Saraiva de Reffóios (529/1963), fez a apresentação do Relatório e Contas de 2014. Concluída a apresentação e o detalhe do Relatório e Contas da AAACM de 2014, foram solicitados esclarecimentos relativos às rubrica “Sala de Armas” e “Equipa e Clubes de Futebol”, os quais foram prestados, seguindo-se a votação de que resultou a aprovação por unanimidade. Foram votadas as seguintes propostas formuladas no Relatório da Direcção:


Assembleia Geral 27 de Março de 2015

1. Em cumprimento das disposições estatutárias, propomos que o resultado líquido negativo apurado no exercício no valor de 30876,75 euros, seja afecto ao Fundo Estatutário; 2. Voto de agradecimento à Mesa da Assembleia Geral e muito especialmente ao seu Presidente, pelo apoio e colaboração prestada à Direcção no decurso de 2014; 3. Voto de agradecimento ao Conselho Fiscal pelo seu acompanhamento e verificação das contas ao longo do ano; 4. Voto de agradecimento à Direcção do Colégio Militar pela resposta positiva que sempre deu às nossas solicitações, em particular às relacionadas com a utilização das instalações do Colégio para as reuniões de Cursos de Antigos Alunos; 5. Voto de agradecimento ao Gonçalo Leal de Matos (371/1949) e ao Luís Barbosa (71/1957), respectivamente, pela gestão e pela colaboração na Revista; 6. Voto de agradecimento a todos os sócios que apoiaram e ajudaram a Direcção – que felizmente, continuam a ser muitos – quer aos que o fizeram a titulo pessoal ou através de empresas a que estão ligados, quer aos que contribuíram com os seus donativos para as acções de solidariedade da Associação e de apoio ao Colégio; 7. Voto de agradecimento ao Conselho Supremo e muito especialmente ao seu Presidente, pelo apoio e colaboração prestada à Direcção no decurso de 2014; 8. Voto de agradecimento ao Presidente do Conselho de Delegados, pelo apoio e colaboração prestada à Direcção no decurso de 2014; 9. Voto de saudação à Associação de Pais e Encarregados de Educação dos Alunos do CM pela forma como tem sabido defender a Instituição saindo em sua defesa sempre que necessário; 10. Voto de saudação a todas as Associações congéneres e, muito em especial, à Associação das Antigas Alunas de Odivelas e à Associação dos Antigos Alunos dos Pupilos do Exército; 11. Voto de pesar, respeito e saudade por todos os sócios que faleceram, lembrando, em particular, o Presidente da Mesa da Assembleia Geral no triénio 2011-2013 o Manuel Carlos

Teixeira do Rio Carvalho (124/1945) e o Frederico Rosa Santos (78/1957), vogal da Mesa da Assembleia Geral no triénio 2011-2013; 12. Proposta do Conselho Fiscal: voto de louvor à Direcção pelos esforços efectuados na concretização das realizações que trilham os desafios AAACM. Todas as propostas foram aprovadas por unanimidade, tendo a última que foi formulada pelo Conselho Fiscal, sido aprovada com abstenção dos membros da Direcção presentes. O Orçamento para 2015, apresentado pelo Presidente da Direcção e após os esclarecimentos solicitados e prestados, foi aprovado por unanimidade. Relativamente à situação sobre a Reestruturação do Colégio, o Presidente da Direcção referiu que se encontra um Grupo de Trabalho a estudar o assunto com vista a elaborar um documento com recomendações, sujeito a debate no Conselho Supremo e no Conselho de Delegados e a discussão em Assembleia Geral extraordinária. Importa pensar e debater temas como a questão do Director Pedagógico, a substituição dos docentes que estiverem aquém do esperado, o acompanhamento dos graduados, etc. Nas diversas intervenções, em síntese, foi referida a necessidade de todos apoiarem o Colégio, de lutar por um Colégio melhor com um rating correspondente a uma posição adequada e honrosa, foi prestada informação de que o desempenho académico foi abordado no Conselho de Delegados que está a acompanhar o assunto, foi referido que o Colégio tem um problema de aproveitamento desde há alguns anos que teve sempre tratamento secundário, existindo actualmente problemas que foram criados por quem planeou irresponsavelmente o desrespeito para com o Colégio. Foi também referido que o antigo Ministro da Defesa Nacional, Dr. Rui Pena, sempre defendeu o Colégio Militar. Martiniano Gonçalves (9/1958) interveio lendo um documento de sua autoria com vista a esclarecer uma situação vergonhosa de procedimento de alguns Antigos Alunos a propósito de uma reflexão que a Direcção da AAACM efectuou, em Julho de 2012, em documento enviado em resposta a solicitação do Prof. Marçal Grilo sobre o Relatório (PROP-ET), por si coordenado, que em 30 de Maio se pronunciou sobre os 3 Estabelecimentos Militares de Ensino. Referiu-se a um email que em 27 de Janeiro do corrente ano foi difundido por um Antigo Aluno para umas dezenas de destinatários Antigos Alunos, que de acordo com o que é habitual, foi,

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por sua vez, novamente difundido para mais algumas centenas de outros Antigos Alunos e foi, igualmente, objecto de divulgação no Facebook onde mereceu comentários diversos. Trata-se de um email que anexava um documento não assinado em que se atribuía, erradamente, à Direcção da AAACM uma parcela de texto que se encontra incluída no referido Relatório (PROP-ET), em que, entre outras coisas, se propunha o encerramento do Instituto de Odivelas. A não conveniente leitura da reflexão de Julho de 2012 pelo autor do texto e a difusão irresponsável de um texto não assinado, não impediram o lançamento, pelos intervenientes neste triste episódio, de suspeições sobre o comportamento de alguns Antigos Alunos no quadro da sua participação no processo de reestruturação dos Estabelecimentos Militares de Ensino e que fossem feitas afirmações graves sobre o seu carácter. Proposta uma Moção de repúdio do email referido e da conduta dos que nele intervieram, foi de imediato votada e aprovada por unanimidade. Foram ainda feitas sugestões de apoio aos Alunos e a necessidade de apoiar e desenvolver verdadeiros êxitos, como é a classe especial que tão bem sempre representou o Colégio Militar. Quanto à situação sobre o “Quartel da Formação” foi transmitida pelo Presidente da Direcção a incerteza existente quanto ao futuro da presença da AAACM nas instalações do “Quartel do Formação”. Foi trocada correspondência em 2012 e 2013 entre a AAACM e o Chefe de Estado-Maior do Exército. A AAACM aceitou receber as instalações e recuperá-las, tendo gasto cerca de €700.000,00 com a recuperação e conservação do “PM 34”. Relativamente ao Lar de Odivelas, ele é gerido em proveito próprio pelas Antigas Alunas de Odivelas, contando e continuando a beneficiar com o apoio inicial da Segurança Social de cerca de um milhão de euros. O Presidente do Conselho Supremo, Martiniano Gonçalves (9/1958) em relação aos dois Antigos Alunos indigitados para o Conselho Supremo, Bernardo Manuel Diniz de Ayala (171/1953) e António José da Silva Coutinho (249/1980), referiu ambos serem sobejamente conhecidos e que a sua apresentação seria redutora. Os indigitados foram eleitos para o Conselho Supremo. Com um agradecimento à colaboração prestada por Alina Nogueira, Leonel Tomaz e Ana Maria Carvalho, foram encerrados os trabalhos.

Gonçalo Salema Leal de Matos 371/1949


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Conselho Supremo Alterações na sua composição

Conselho Supremo Alterações na sua composição D

e acordo com o disposto no Regimento do Conselho Supremo da Associação dos Antigos Alunos do Colégio Militar, os Conselheiros efectivos transitam para a situação de Conselheiros vitalícios quando completam dois mandatos, ou quando completam 80 anos de idade. Completaram recentemente dois mandatos como efectivos os Conselheiros José Alberto Lopes Carvalheira (301/1946) e João Augusto de Oliveira Ayala Botto (254/1948), pelo que transitaram para a situação de Conselheiros vitalícios. Tendo ficado abertas duas vagas de Conselheiros efectivos, o Conselho propôs, para o preenchimento das mesmas, os Antigos Alunos Bernardo Manuel Diniz de Ayala (171/1953) e António José da Silva Coutinho (249/1980). Na Assembleia Geral da AAACM realizada a 27 de Março de 2015, no teatro D. Luis Filipe, foram eleitos para integrarem o Conselho Supremo os dois Antigos Alunos propostos, aos quais foi de seguida conferida posse, como membros efectivos, pelo Presidente da Assembleia Geral António José Fonseca Cavaleiro de Ferreira (332/1950). Assinala-se ainda que houve uma baixa no Conselho, devido ao falecimento do Conselheiro vitalício Pedro José Rodrigues Pires de Miranda (372/1940), Antigo Aluno ilustre, com uma carreira profissional de elevadíssimo mérito e com uma dedicação exemplar ao Colégio e à nossa Associação. Breves notas curriculares sobre os recentemente empossados Membros do Conselho Supremo.

Bernardo Manuel Diniz de Ayala (171/1953)

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uando Aluno do Colégio, no seu ano de finalista, comandou a 4ª Companhia. Actualmente foi eleito Delegado do Curso 1953/1961, integrando o respectivo Conselho de Delegados. Recebeu em 1965 as asas de Piloto Aviador tendo efectuado durante os mais de 30 anos de serviço na Força Aérea Portuguesa cerca de 4.000 horas de voo, essencialmente como piloto instrutor e de combate. Reformado no posto de Coronel Piloto Aviador. Integrou a Patrulha Acrobática Diabos Vermelhos que utilizava os muito evoluídos bimotores a jacto T-37C. Ao longo da sua carreira cumpriu uma comissão de serviço no Ultramar Português no Norte de Moçambique e desempenhou diversas funções de comando e chefia, nomeadamente em Unidades Base, Estado-Maior da Força Aérea, Comando Operacional da Força Aérea e Estado-Maior General das Forças Armadas. Desempenhou em Bruxelas, na Delegação Portuguesa junto da NATO as funções de Conselheiro Militar do Embaixador para os assuntos aeronáuticos, findo o que presidiu a um Comitté da OTAN (Panel on Air Defence Weapons), cargo que desempenhou até finais de 1990. Foi, seguidamente, durante dois anos, Comandante da Base Aérea n.º 6 (Montijo). Tirou vários cursos no país e no estrangeiro e possui diversos louvores e condecorações de que se destacam as Medalha de Prata de Serviços Distintos com Palma e duas Medalhas de Serviços Distintos. Em Março de 2002 foi eleito Secretário da Direcção da Associação funções que desempenhou até Março de 2008, período de seis anos consecutivos de inexcedível dedicação, com sacrifício pessoal e familiar, no desempenho destas funções, tendo defendido de forma intransigente e com humildade, na sombra e longe de vaidades, os valores e interesses da Associação e do Colégio, o que lhe granjeou o respeito de todos os que, ao longo dos anos, tiveram a possibilidade de acompanhar o seu trabalho, constituindo um invulgar exemplo de extrema lealdade, sã camaradagem e colaboração para com os restantes elementos da Direcção da Associação e da Direcção do Colégio. Foi Vice-Presidente da Assembleia Geral da Associação.

António José da Silva Coutinho (249/1980)

Q

uando Aluno do Colégio, no seu ano de finalista, comandou a 3ª Companhia. Licenciado em Engenharia Civil pelo Instituto Superior Técnico, iniciou a sua carreira a fazer projectos de estrutura numa empresa pertencente aos irmãos Appleton. Fez então um mestrado de Investigação Operacional no Técnico com o objectivo de uma mudança de carreira. Como consultor desempenhou funções durante 6 anos na The Boston Consulting Group (BCG). Entrou para a EDP em 2003 para montar a área de Planeamento da Holding. Em 2007 foi para os EUA para as Energias Renováveis, donde regressou em 2010 para organizar o negócio de Serviços e Eficiência Energética. Actualmente é Administrador da EDP Comercial, responsável pela venda de energia e serviços a empresas, e integra a Associação de Pais e Encarregados de Educação dos Alunos do Colégio Militar (APEEACM). Gonçalo Salema Leal de Matos (371/1949) Luís Filipe Ribeiro Ferreira Barbosa (71/1957)


Colégio Militar Berço de Grandes Portugueses

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José Alberto da Costa Matos 96/1950

Colégio Militar

Berço de Grandes Portugueses Carlos Claudino Dias (50/1885) Oficial do Exército, professor e pedagogo

Carlos Claudino Dias

N

asceu em 5 de Fevereiro de 1844, em Lisboa, na Rua de Santana à Lapa no n.º 41, filho de Luís Miguel Dias, cirurgião-mor do Hospital da Estrela, e de Claudina Rosa Ferreira Dias. Ainda criança, passava grande parte do seu tempo na leitura de livros de estudo e, sempre que conseguia iludir a vigilância materna, escapava-se a correr rua fora a caminho da Biblioteca

Nacional, atraído pela leitura dos livros. Em 1855 foi admitido como aluno do Real Colégio Militar, onde lhe foi atribuído o n.º 50. Ao longo do curso colegial, que concluiu em 1861, foi figurando no quadro de honra. De seguida, assentou praça voluntariamente no Regimento de Cavalaria n.º 4, como 1.º sargento graduado aspirante a oficial. Matriculou-se de seguida na Escola Politécnica onde, em Julho de 1862 terminou os estudos preparatórios, sendo graduado em alferes para fazer na Escola do Exército o curso de Cavalaria que concluiu em 1864, pelo que, em 2 de Agosto foi promovido a alferes efectivo. Em Julho de 1867 foi transferido para a Guarda Municipal de Lisboa, sendo promovido a tenente em Setembro desse ano. Decorridos sete anos foi servir para o Regimento de Cavalaria n.º 8, ascendendo a capitão em Junho desse ano de 1874. Paralelamente ao seu mister castrense, Claudino Dias ia-se dedicando ao estudo de Pedagogia e de Filologia, matérias a que dedicava especial interesse, a par das obras dos antigos clássicos. Por portaria de 13 de Julho de 1874 foi, em comissão de serviço, colocado no Colégio Militar

como professor das cadeiras de Eloquência e Filosofia, vindo no mês seguinte a ser provido em definitivo no cargo. Exerceu a docência no Colégio Militar durante 23 anos, tendo também ensinado Português, Oratória, Latim e Francês. Sobre ele, informava então o director do Colégio: «É um filólogo distinto. A elevada e especial instrução deste oficial sobre Filologia, manifestada pelas suas publicações, e a maneira distinta como rege a cadeira a seu cargo, torna-o credor de especial consideração.» Quatro anos após a sua chegada ao Colégio Militar, escreveu «Apontamentos sobre a significação de palavras compostas e derivadas» (1878). Em fins de 1884 foi promovido a major, mantendo-se porém nas funções docentes, a par de uma estreita relação com a Biblioteca colegial, tendo anos antes sido escolhido para a comissão encarregada de proceder à sua transferência em 18751 bem como à catalogação dos livros nela existentes, tarefa em que veio a ser louvado pelo zelo, inteligência e boa direcção dada ao trabalho. Mais tarde, em 1886, voltaria a ser louvado, agora pelo seu trabalho na comissão de escolha de obras que deveriam ser adquiridas para a biblioteca.

1 No começo do ano lectivo de 1875/76, a Biblioteca foi instalar-se onde, desde que o Colégio regressara em 1873

à Luz, vindo do Convento de Mafra, funcionava provisoriamente a enfermaria.


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Colégio Militar Berço de Grandes Portugueses

Entretanto, publicou «Exercícios Preparatórios de Composição» (1882), obra de feição didáctica na qual divulga e aplica os princípios gramaticais de Epifânio, e também «Rudimentos de Gramática Portuguesa» (1885). Em 1886, em acumulação, foi nomeado professor de Alemão do Liceu Central de Lisboa. Conhecedor dos movimentos pedagógicos renovadores que se manifestavam noutros países, procurou revolucionar o ensino da leitura e da escrita através do seu «Método analítico-sintético de aprender a ler», publicado em 1888. Nesse mesmo ano, em Setembro, foi promovido a tenente-coronel. O método analítico-sintético, empregado tanto na teoria como na prática, não agradou a alguns professores que preferiam a comodidade de processos antiquados que de há muito se serviam. Precipitadamente, o Director da Instrução Pública suspendeu-o de funções no Liceu Central, onde há nove anos leccionava com exemplar proficiência. Gerou-se enorme indignação nos principais professores da capital e os alunos e docentes do Liceu promoveram-lhe uma manifestação de apoio, consideração e simpatia. No ano seguinte publicou «Exercícios franceses para uso nas escolas» (1889). A 30 de Setembro de 1892 foi promovido a coronel, sendo então colocado no comando do Regimento de Cavalaria n.º 7, onde se manteve até ter requerido a sua passagem à situação de reforma, a qual lhe foi concedida a 20 de Outubro. Regressou então ao cargo da sua predilecção: professor do Colégio Militar. Por essa ocasião, ofereceu ao Colégio 36 volumes de cada uma das suas obras, para serem usadas pelos alunos, gesto que veio a ser objecto de público louvor. Em 1897 tinha-se manifestado no Colégio um surto de papeira e, ao findarem os exames desse ano lectivo, o professor Claudino Dias começou a sentir-se mal mas, apesar de assistido, a doença adquiriu proporções tais que lhe provocaram a morte no dia 3 de Agosto desse 1897, tinha então 53 anos de idade. Apesar de ter deixado escrito que dispensava honras militares, os alunos, professores e oficiais do Colégio Militar estiveram presentes no seu funeral, para prestarem publica homenagem àquele que foi um dos seus mais notáveis mestres. Distinguindo a sua importante contribuição para o ensino em Portugal e exaltando a importância do seu trabalho didáctico, foi agraciado em 1886 com o grau de oficial da Ordem de Santiago e, em 1896, com o grau de comendador da Ordem de Avis.

Sala de aula antiga

Ordem de Avis

Ordem de Santiago

Carlos Sanches de Castro da Costa Macedo (394/1916) General e Chefe do Estado Maior da Força Aérea

Carlos Sanches de Castro da Costa Macedo

N

asceu em Viana do Castelo a 10 de Julho de 1905, filho de Adriano da Costa Macedo e de Alice do Livramento Coelho de Vasconcelos Sanches de Castro. Estudou no Colégio Militar, onde foi admitido como aluno em 1916, sendo-lhe atribuído o n.º 394. Concluiu o curso colegial em 1921, após o que ingressou na Escola Militar onde veio a concluir, em 1924, com apenas dezanove anos, o curso de oficial de Artilharia de Campanha, seguindo-se-lhe na Escola Prática de Artilharia, em 1924/25, o tirocínio para oficial daquela arma. Mas por pouco tempo pois, em 1928, foi aprender pilotagem na Escola Militar de Aeronáutica, então instalada na Granja do Marquês

(Sintra), talvez influenciado pelo percurso do seu tio materno, Carlos Alberto Sanches de Castro (também ele antigo aluno do Colégio Militar), que tirou o “brevet” na Escola de Aviação de Voisin, em França, e foi o primeiro português a efectuar um voo sobre território nacional, a 10 de Setembro de 1912. Terminado o curso de pilotagem, durante o qual revelou excepcional aptidão aeronáutica, Costa Macedo foi escolhido para continuar naquela Escola, mas agora como instrutor, sob a orientação de Craveiro Lopes, que também havia sido Menino da Luz e que viria mais tarde a ser Presidente da República. Passou então a dedicar-se também, e de um modo muito particular, à acrobacia aérea, sobretudo a partir dos anos trinta, época essa em que rivalizava com Plácido de Abreu1, seu antigo camarada no Colégio Militar. Mas a esta rivalidade sobrepunha-se sempre a velha camaradagem colegial, de tal sorte que, no festival aeronáutico de 11 de Junho de 1933, que assinalava oficialmente a criação do Grupo Independente de Aviação e Bombardeamento, para disputa do “Troféu Diário de Notícias”, Costa Macedo, seu vencedor por desclassificação de Plácido de Abreu, fez questão de entregar a este a taça que lhe havia sido entregue. Participou em competições internacionais de acrobacia em 1934, em Lisboa, no Porto e em Vincennes (França) e, em 1935, de novo em Lisboa. Em fins de 1931 realizou a ligação aérea Lisboa – Bolama (Guiné) - Lisboa aos comandos de um


Colégio Militar Berço de Grandes Portugueses

avião “Puss Moth”, que tinha uma autonomia de 10 horas. Fez por isso escalas em Casablanca, Agadir, Cabo Juby, Port Etiène a S.Luís, tendo percorrido 7370 Km (400 dos quais sob chuva intensa e em voo rasante), a uma velocidade média de 230 km/h. Acrescente-se que ao avião fora adaptado um tosco equipamento de voo nocturno que fora engendrado e improvisado em Sintra. Tratou-se de uma arrojada e corajosa missão que, pela sua importância e valor fizeram com que tivesse sido agraciado com a Ordem da Torre e Espada. Em 1935 preparou-se para bater o recorde da ligação Lisboa - Rio de Janeiro a bordo de um avião “De Haviland-Comet”, tendo como companheiro de voo o piloto civil Carlos Bleck. Mas a jornada ficou-se pelos momentos que antecederam a partida, pois o avião sofreu um acidente quando rolava para a descolagem. Em 1939 frequentou nos EUA o Curso de Link-Trainers, semelhante ao simulador de voo, de que, aliás, veio a ser um dos introdutores em Portugal. Serviu durante cerca de vinte anos na Base Aérea n.º 1, sobretudo em funções relacionadas com a instrução de novos pilotos, tendo sido também seu comandante de Junho de 1947 a Agosto de 1952. Representou o país em várias missões no estrangeiro, foi director do Serviço de Instrução e Treino e, mais tarde, Chefe do Estado-Maior da Força Aérea.

Em Junho de 1960 foi nomeado Presidente do Supremo Tribunal Militar, cargo que exerceu até poucos dias antes de acontecer o seu falecimento, em Lisboa, a 30 de Janeiro de 1974. Foi Presidente da Cruz Vermelha Portuguesa de Abril de 1966 a Março de 1969 e, além de servir apaixonadamente a Força Aérea, foi também instrutor, director de instrução e presidente da direcção do Aero Clube de Portugal (de 1947 a 1955), o qual havia sido fundado em fins de 1909 por um grupo de oficiais do Exército a fim de promover a aeronáutica e impulsionar a existência de uma aviação militar. A escola de pilotagem do clube só veio porém a ser criada em 1930. Era agraciado com os graus de oficial da Ordem da Torre e Espada, cavaleiro, comendador, grande-oficial e com a grã-cruz da Ordem de Cris-

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to e grã-cruz da Ordem do Infante D. Henrique, e condecorado as medalhas de ouro e de prata de Bons Serviços, com duas de prata de Serviços distintos, com a grã-cruz, 1.ª e 2.ª classes de Mérito Militar, com as medalhas de ouro e de prata de Comportamento Exemplar e com a placa de Honra da Cruz Vermelha Portuguesa. Possuía também a grã-cruz e a cruz de 2.ª classe de Mérito Militar com distintivo branco (Espanha), cruz de 2.ª classe de Mérito Aeronáutico com distintivo branco (Espanha), cavaleiro da Ordem da Coroa (Itália), comendador da Legião do Mérito (EUA), grande-oficial da Ordem do Mérito Aeronáutico (Brasil), grã-cruz da Ordem do Cruzeiro do Sul (Brasil) e grande-oficial da Legião de Honra (França).

Torre e Espada

Ordem de Cristo

Infante D. Henrique

Bons Serviços

Serviços Distintos

Mérito Militar

Placa e Honra da CVP

Mérito Militar de Espanha

Mérito Aeronáutico Espanha

Coroa de Itália

Legião de Mérito dos EUA

Mérito Aeronáutico Brasil

Legião de Honra

Cruzeiro do Sul

1 Faleceu tragicamente em 1934, no Campeonato do Mundo de Acrobacia, em Vincennes (França), em plena competição.


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Guilherme Ivens Ferraz (5/1878) Vice-Almirante e Deputado

Guilherme Ivens Ferraz

N

asceu em Ponta Delgada a 14 de Setembro de 1865, filho do general Ricardo Júlio Ivens Ferraz e de Laura Mendes de Almeida Ivens Ferraz. Foi admitido como aluno do Colégio Militar em 1878, sendo-lhe atribuído o n.º 5. Enquanto aluno foi graduado em Comandante de Companhia em 1882. Concluído o curso colegial em 1883, assentou praça no Regimento de Infantaria n.º 2 e, como 1.º sargento graduado em aspirante, matriculou-se na Escola Politécnica onde fez os estudos preparatórios com vista a sua admissão na Escola Naval, passando à Companhia de Guardas Marinhas, como aspirante provisório, em Novembro de 1885, saindo guarda-marinha em 1889 Ainda no posto de guarda-marinha, seguiu em comissão de serviço para a África Oriental. Distinguiu-se imediatamente no apresamento de pangaios negreiros e na ocupação

de Tungué, no levantamento e balizagem do canal da entrada dos rios Pungué e Buzi, no reconhecimento da baía e bancos madrepóricos do arquipélago de Bazaruto e no estudo do rio Chinde até à sua confluência com o Zambeze. Em Março de 1891 foi promovido a 2.º tenente e, no ano seguinte, é nomeado governador da Companhia da Pesca das Pérolas de Bazaruto (Moçambique). De 1894 a 1895 comandou a lancha-canhoneira “Sabre” durante as campanhas de Lourenço Marques contra a ameaça dos vátuas sobre a capital da colónia. O seu destemor fez com que fosse superada a ausência de navios que pudessem navegar no rio Incomáti, única via de penetração para o interior. O 2.º tenente Ivens Ferraz oferece-se para realizar essa empresa, mesmo sabendo que a “Sabre” era destinada a navegar em águas mansas e haveria que enfrentar as ondas revoltosas do canal de Moçambique. Com efeito a grande agitação marítima acabou por deixar exausta a corajosa guarnição, restando então três fogueiros, um marinheiro e ele, o comandante, que se conservou ao leme horas sem fim, amarrado ao mastro para não ser levado pelas ondas. Aproveitando uma aberta, acabou por chegar a Inhambane e 60 horas depois, regressava a Lourenço Marques. Nos tempos que se seguiram, durante a fase crítica das operações, a lancha-canhoneira efectuou constantes transportes de pessoal e materiais e rebocou batelões carregados, apesar do risco que isso envolvia o que causava admiração a oficiais de navios estrangeiros. Ainda em 1895 foi nomeado secretário de António Enes, que viera ocupar o cargo de Comissário Régio de Moçambique.

Canhoneira "SABRE"

Porto de Lourenço Marques

De 1895 a 1899 foi capitão dos portos de Lourenço Marques, introduzindo então diversos melhoramentos. Entre outros, montou a balizagem e iluminação da baia, criou e organizou a corporação dos pilotos, e fundou ainda uma escola própria. Entretanto, em 1897, Mouzinho de Albuquerque, que era agora Comissário Régio da colónia em substituição de António Enes, nomeou-o presidente da Câmara Municipal de Lourenço Marques, onde a desordem nos serviços atingira um ponto tal que, para a debelar, eram necessárias uma energia e uma determinação excepcionais. Começou por demitir quase todos os funcionários, cobrou os impostos em dívida há seis anos, saldou as dívidas do município e levou ainda a importantes realizações, das quais se destacam a obra de aterro do pântano de Mehé, o estabelecimento de armazéns frigoríficos, o abastecimento de água canalizada à cidade, a iluminação eléctrica da cidade, a pavimentação das ruas, a construção do mercado e a limpeza pública da cidade utilizando viaturas apropriadas. Seguidamente foi nomeado comissário do governo português na delimitação das fronteiras da África Central, fazendo o seu levantamento e demarcação desde o Chilongo até Milange e daí aos lagos Chiruá, Chicuta, Amarambua e Niassa. Em 1903 procedeu a levantamentos hidrográficos na costa de Moçambique e, no ano seguinte, participou nas acções contra os assaltos, roubos e razias do gentio de Mantibane, no norte de Moçambique. Ainda em 1904 foi nomeado vogal do Supremo Conselho de Defesa Nacional. Em 1907, recém-promovido a capitão-tenente, desempenhou entre Junho e Outubro uma comissão no Ministério dos Negócios

Câmara Municipal de Lourenço Marques


Colégio Militar Berço de Grandes Portugueses

Estrangeiros, como delegado técnico naval coadjuvante dos plenipotenciários de Portugal na Conferência Internacional da Paz, em Haia. Anos mais tarde, em 1912, seria delegado do governo português nos Congressos de Navegação realizados em S. Petersburgo e em Filadélfia. Ascendeu a capitão-de-fragata em Junho de 1915 e, durante a 1.ª Grande Guerra, entre 1917 e 1918, exerceu o cargo de presidente da Comissão de Transportes das tropas portuguesas para o teatro de operações de França. Após o conflito mundial é promovido a capitão-de-mar-e-guerra em Dezembro de 1918 e, quatro anos depois, é-lhe confiado o cargo de director dos Serviços Marítimos e de Mobilização. Em 1925 é nomeado comandante da Escola Naval, mas no ano seguinte veio a ser nomeado comandante-chefe das Forças Navais no Oriente, devido ao agravamento situação de guerra civil na China, com reflexos que tornavam preocupante a situação em Macau, para onde seguiu comandando o cruzador “República”. Em 1927, face à proliferação de incidentes xenófobos em Shangai, tendo sido decidida uma intervenção internacional para proteger cerca de 50.000 estrangeiros residentes na área, seguiu, em representação de Portugal, a juntar-se às forças navais para ali destacadas, sendo então membro do respectivo Conselho de Almirantes reunido em Xangai, tendo granjeado com a sua actuação um notável prestígio internacional, de tal sorte que pelos serviços prestados a Portugal foi, em Setembro desse ano, promovido por distinção a contra-almirante. Em 1928, de regresso a Lisboa, foi nomeado comandante das Forças Navais no Tejo e, também no mesmo ano, Superintendente dos Serviços da Armada. Decorridos dois anos é Chefe do Estado-Maior Naval, passando à reserva em Junho de 1930 e à reforma em Setembro de 1935, com o posto de vice-almirante.

Associação Industrial Portuguesa

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Cruzador "REPÚBLICA".

Ao longo da sua carreira comandou os vapores «Auxiliar» e «Búfalo», a lancha-canhoneira «Sabre», o rebocador de alto-mar «Bérrio», a canhoneira-torpedeira «Tejo» e o cruzador «República». Foi deputado às Cortes, presidente da Liga Naval Portuguesa, vice-presidente da Associação Industrial Portuguesa, vice-presidente e presidente da Cruz Vermelha Portuguesa (entre Novembro de 1942 e Outubro de 1948, aí desenvolvendo durante a 2.ª Guerra Mundial uma notável acção humanitária), director da Companhia de Moçambique, presidente da Sociedade Portuguesa de Construção e Obras Marítimas, presidente do Conselho de Administração da Companhia Portuguesa de Pesca e presidente do Conselho Geral do Grémio dos Armadores de Pesca de Arrasto. Publicou: «Álgebra Elementar», «Manual de Pilotagem», «Manual do Navegante» e «O Cruzador República na China». Faleceu em Lisboa a 26 de Dezembro de 1956, com 91 anos. Era agraciado com os graus de oficial da Ordem da Torre e Espada, grã-cruz da Ordem de Avis, oficial da Ordem de Santiago, grande oficial da Ordem do Império Colonial e oficial

Edifício da Cruz Vermelha Portuguesa

da Ordem de N.ª S.ª da Conceição de Vila Viçosa, sendo também condecorado com a medalha prata de Valor Militar, duas medalhas «Rainha D. Amélia» das campanhas em África, medalha da Vitória, medalha de prata de Socorros a Náufragos, Cruz Vermelha de Benemerência, e ainda com a cruz de 3.ª classe e grã-cruz da Ordem de Mérito Naval (Espanha), grande oficial da Legião de Honra (França), comendador da Ordem de Saint Michael and Saint George (Inglaterra) e com a Cruz de Saxe Albertus Animosus (Saxónia).

Companhia de Moçambique

Companhia Portuguesa de Pesca


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Avis

Santiago

Império

N.ª Srª da Conceição de Vila Viçosa

Valor Militar

Rainha D. Amélia

Vitória

Filantropia e Caridade

Cruz Vermelha da Benemerência

Mérito Naval de Espanha

Legião de Honra

St.Michael and St.George

Cruz de Saxe Albertus Animosus

©Foto Sérgio Garcia (326/1985)

Torre e Espada

ANTIGO ALUNO USA A BARRETINA


Antigos alunos em Detaque

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Antigos alunos

em Destaque

José Carlos Costa da Silva Rosa (108/1965) Administrador-delegado da LFP - Lojas Francas de Portugal

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osé Carlos Rosa foi nomeado Administrador-delegado da empresa Lojas Francas de Portugal, empresa partilhada pelo Grupos TAP e Nuance, que integra cerca de 400 Trabalhadores numa rede que actualmente abrange mais de 29 lojas distribuídas pelos diversos aeroportos nacionais. Ao longo da sua carreira exerceu funções de responsabilidade em empresas tão diversificadas como a Richard Ellis (responsável da Área de Gestão Imobiliária), Mundicenter (Director do Amoreiras Shopping Centre), ANA Aeroportos de Portugal (Director da Área de Retalho), num percurso profissional que nunca foi planeado e que passou também pela Bolívia, Argentina, Equador e Uruguai, sempre com a ambição de liderar com sucesso as equipas com quem trabalha para alcançar objectivos de crescimento das empresas onde actua. Nos últimos 8 anos esteve no Brasil onde, como Director-geral, liderou a operação da Dufry Duty Free Shop, regressando a Portugal para exercer o cargo de grande responsabilidade em que foi investido. A sua meta actual é a da modernização e desenvolvimento das lojas francas em Portu-

gal, assegurando a renovação e manutenção dos contractos com os aeroportos onde a empresa opera. Terminado o curso do Colégio Militar, ingressou posteriormente na Academia Militar onde se licenciou em Engenharia Militar e Engenharia Civil. É Membro da Ordem dos Engenheiros. Casado, tem uma filha e três filhos. Como Oficial de Engenharia do Exército Português frequentou o Engineer Officer Advanced Course, na US Army Engineer´s School (Fort Leonard Wood, Missouri), com a classificação de Honour Graduate, curso que tem por objectivo preparar comandantes de Unidades de Engenharia de Combate, fez o Curso de Oficiais de Polícia do Exército, o curso CEDMA (Explosivos, Destruições, Minas e Armadilhas) e o curso de defesa NBQ (Nuclear, Biológica e Química). Serviu na Polícia do Exército como comandante de Pelotão e Instrutor, na Escola Prática de Engenharia como comandante da Companhia de Comando e Serviços e na 1ª Brigada Mista Independente como 2º Comandante da Companhia de Engenharia.


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Antigos alunos em Detaque

António Pedro Feio Ribeiro Mateus (57/1970) Os melhores de 2014 - "Olhar o Mundo"

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programa “Olhar o Mundo” apresentado por António Mateus (57/1970) e exibido na RTP1, foi o vencedor em “Relações Internacionais/Política Internacional” no conjunto dos “Melhores do Ano 2014”. António Mateus escritor e jornalista, foi destacado em 1990 para a África do Sul como delegado da agência Lusa, após a libertação de Nelson Mandela. Aí permaneceu durante dez anos, tendo entrevistado inúmeras personalidades mundiais como Desmond Tutu, Chester Croker, Joaquim Chissano, Frederik de Klerk, Nelson Mandela, Ahmed Kathrada e Graça Machel. Foi primeiro conselheiro na Comunidade dos Países de Língua Portu-

guesa, director-fundador da revista “Focus”, editor de Política Internacional da RTP e coordenador principal da RTP África. Correspondente da agência de notícias portuguesa LUSA e da cadeia de televisão RTP, em Moçambique e Joanesburgo, durante os 16 anos em que esteve destacado na África Austral cobriu diariamente os desenvolvimentos das guerras civis em Angola e Moçambique e respectivos processos de paz, as negociações para a retirada cubana de Angola, a independência da Namíbia e o fim do apartheid na África do Sul. Escreveu vários livros de que destacamos “Mandela - A Construção de Um Homem” e “Mandela, O rebelde exemplar” cujo lançamento teve lugar no Anfiteatro do Colégio. Ao nosso Camarada António Mateus desejamos a continuação dos êxitos que tem obtido na sua já longa e notável actividade jornalística e literária.

João Miguel Jardim de Abreu Ferreira Pinto (261/1980) Foi-lhe atribuída uma Menção Honrosa pela Agencia Española de Protección de Datos (AEPD) nos Prémios “Investigação 2014” numa obra colectiva sobre dados pessoais em países ibero-americanos.

J

1 http://www.agpd.es/portalwebAGPD/canaldocumentacion/ publicaciones/index-ides-idphp.php

oão Ferreira Pinto, Advogado e docente do ensino superior, representou Portugal na obra que contou com vinte e um especialistas de países ibero-americanos e está publicada pela AEPD em edição digital1. A entrega dos Prémios teve lugar durante a 7.ª Sesión Anual Abierta da Agencia Española de Protección de Dados, realizada no Teatro Real (Madrid), no passado dia 21 de Abril, a que assistiram mais de mil e duzentos especialistas. João Ferreira Pinto é pós-graduado em Segurança da Informação e Direito do Ciberespaço (2014/2015) (IST/FDUL/ EN); em Especialização de Segurança da Informação e Direito no Ciberespaço (2013/2014 IST/FDL/EN); em Protecção de Dados Pessoais (FDL, 2012); em Segurança de Informação e Direito no Ciberespaço (FDL,

2012); Actualização em Legística e Ciência da Legislação (FDL, 2005); Prática Forense e Assessoria Jurídica de Empresas (UCP, 2001); Direito da Sociedade da Informação e Comércio Eletrónico (FDL, 1999); Direito da Sociedade da Informação (FDL, 1998). Frequentou o Curso de Gestão de Crises no Ciberespaço (Instituto de Defesa Nacional, 2014) e outra formação especializada. Foi assessor jurídico na Vereação da Câmara Municipal de Lisboa e noutras autarquias e entidades municipais e é Técnico Superior (Jurista) no Departamento Jurídico da Câmara Municipal de Lisboa. Sócio fundador e Senior Partner da João Ferreira Pinto & Associados (JFPA) - distinguida como “PME Digital 2014” pela ACEPI, Associação de Comércio Electrónico - presta serviços nas principais áreas da advocacia dedicando particular atenção ao Direito Digital (Comércio Electrónico, Propriedade Intelectual online, Domínios, Cloud Computing, Bases de Dados, Marketing, Publicidade online) e à Protecção de Dados Pessoais.


Antigos alunos em Detaque

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É ainda Docente de “Direito Digital” no IPAM – Instituto Português de Administração e Marketing/IADE, na Pós-Graduação (Executive Master) de Marketing Digital, em Lisboa e no Porto, Docente convidado da Universidade Católica Portuguesa: “email Marketing” no “Curso Proteção de Dados Pessoais - Teoria e Prática” 2014 e Docente convidado da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa no “Curso Avançado sobre protecção de Dados Pessoais” 2015. Formador (Informática Jurídica) do Conselho Distrital de Lisboa - Ordem dos Advogados , é Membro das seguintes organizações: • ISOC (Internet Society) – Portugal Chapter; • CIIWA-Portugal (Competitive Intelligence & Information Warfare As sociation); • isms Fórum España; • IAPP (International Association of Privacy Professionals); • OIPRODAT (Observatorio Iberoamericano de Protección de Datos Personales); • IT4Legal.

Pedro Gonçalo Coelho Nunes de Melo (51/1982) Advogado, sócio da PLMJ - Coordenador da Área de Prática de Direito Público

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Pedro Melo ao receber, em Londres, o prémio que foi atribuído.

edro Melo recebeu em Londres, no passado dia 19 de Fevereiro, o prémio de Melhor Advogado de Direito Público Português (Client Choice Awards 2015). O prémio foi-lhe atribuído pelo International Law Office, um dos mais prestigiados Directórios Internacionais de Advogados, em resultado das análises anuais feitas em diversos países de todo o Mundo, estritamente com base em comentários de clientes. Pedro Melo, concluiu o ensino secundário no Colégio em 1987, é Licenciado em Direito e pós-graduado em Direito Administrativo pela Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, é pós-graduado em Direito da Energia pela Universidade Autónoma de Lisboa/Instituto Francês do Petróleo, Advogado especialista em Direito Administrativo reconhecido pela Ordem dos Advogados, Mestre em Direito (Direito Público) pela Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa. Na PLMJ – Sociedade de Advogados, R.L., de que é sócio, exerce a sua actividade profissional predominantemente na área do Direito Admi-

nistrativo, com especial incidência no domínio da contratação pública (procedimentos pré-contratuais e contratos administrativos), arbitragem e contencioso administrativo. Lecciona na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa na Pós-Graduação de Contratação Pública e na Pós-Graduação de Direito Administrativo do Mar. Tem experiência como advogado e árbitro em diversos processos arbitrais relacionados, inter alia, com contratos de concessão de obras públicas, com contratos de empreitada de obras públicas, com empreitadas em regime FIDIC e com parcerias público-privadas. Integra as seguintes “Listas de Árbitros”: da Câmara de Comércio e Indústria Portuguesa, do Centro de Arbitragem Administrativa, da Câmara de Arbitragem e Mediação da Federação das Indústrias do Estado do Paraná – Brasil. Tem diversos artigos e monografias publicados na sua área de especialidade, de que se destacam os seguintes: A Distribuição do Risco nos Contratos de Concessão de Obras Públicas (Almedina, 2011), O Direito das Obras Públicas – Tratado de Direito Administrativo Especial, Vol. VI (Almedina, 2012), A Força Maior nos Contratos de Concessão de Obras Públicas – Revista de Contratos Públicos n.º 6 (Almedina, 2013), As Concessões no Sector Portuário – Di-


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Antigos alunos em Detaque

reito Administrativo do Mar (Almedina, 2014), A execução de contratos de concessão de obras e serviços públicos – As Novas Fronteiras da Contratação Pública (Coimbra Editora, 2014). Foi atleta de alta competição na modalidade de esgrima (florete e espada), na categoria de juniores e de seniores. A nível nacional, destaca-se o facto de ter sido campeão nacional individual de espada (na categoria de seniores, em representação da AAACM em 1993) e, a nível internacional, a sua participação em diversos Campeonatos do Mundo e da Europa, em particular, nos Jogos Olímpicos Universitários (Sheffield, 1991). É vogal do Conselho Jurisdicional da Federação Portuguesa de Esgrima e Presidente do Conselho Jurisdicional da Federação Portuguesa de Pentatlo Moderno.

Nota da ZacatraZ Saudamos vivamente todos os Antigos Alunos que se destacaram por força do seu mérito e empenho no exercício das suas actividades profissionais, que motivaram o reconhecimento público do seu valor.

Taciano Alberto da Silva Correia (269/2000) Prémio Cecil Universidades Engenharia Civil 2013

N

Nota da ZacatraZ Com as maiores felicitações, a equipa que tem a responsabilidade da edição da ZacatraZ augura a este nosso Camarada uma promissora e brilhante carreira. Parabéns pelo mérito do ensaio e da demonstração efectuadas e pelo honroso prémio motivador para um futuro auspicioso.

o passado mês de Janeiro o antigo aluno Taciano Correia, 269/00, foi distinguido com o Prémio Secil Universidades Engenharia Civil 2013, pelo estudo que desenvolveu durante a execução da sua Dissertação de Mestrado, intitulada “Vigas de betão armado reforçadas à flexão com laminados de fibras de carbono (CFRP) instalados em rasgos ou colados à superfície. Estudo do efeito da colagem parcial”. O prémio tem como objetivo incentivar a qualidade do trabalho académico e o reconhecimento público de jovens oriundos das Escolas de Arquitectura e Engenharia Civil portuguesas. São premiados os 3 melhores projetos na área da indústria de construção, realizados no âmbito das disciplinas dos cursos de mestrado em Engenharia Civil. A sua dissertação foi desenvolvida com o objetivo de estudar o comportamento mecânico de vigas de betão armado reforçadas à flexão com laminados de CFRP (“Carbon Fiber Reinforced Polymers”). O estudo experimental incluiu o ensaio à flexão até à rotura de 13 vigas. Um dos objetivos centrais consistiu no estudo da influência do comprimento da ligação do laminado ao betão, no desempenho do comportamento da ligação. Procurou-se avaliar a importância de uma total colagem do laminado ao betão, face a uma colagem parcial, apenas nas extremidades do laminado, pretendendo-se simular, à temperatura ambiente, o comportamento “tipo tirante” observado em ensaios de resistência ao fogo anteriormente realizados. Além disso, estudou-se a influência da técnica de reforço - externally bonded reinforcement (EBR) ou near surface mounted (NSM) -, da aplicação de fixação mecânica na extremidade do reforço instalado pela técnica EBR, do tipo de ade-

sivo de colagem (epóxido ou cimentício) e do comprimento do laminado. Foram analisados os regulamentos vigentes mais relevantes para o dimensionamento de sistemas de betão armado reforçados à flexão com CFRP, particularmente o American Concrete Institute (ACI) “Committee 440” e o bulletin 14 da Fédération internationale du béton (fib). Aplicou-se o documento do ACI às vigas ensaiadas com colagem total do reforço de CFRP para prever as suas cargas resistentes e aferir a respetiva fiabilidade. O estudo numérico incluiu o desenvolvimento de modelos de elementos finitos, utilizando o programa ATENA, para simular as vigas ensaiadas. Calibrou-se o modelo com base nos resultados do programa experimental e realizou-se um estudo paramétrico, para se poder extrapolar os seus resultados para situações reais de dimensionamento, em vigas de dimensões superiores às ensaiadas. Observou-se que a perda de capacidade de carga das vigas com laminado totalmente colado, para as homólogas que possuem o laminado colado apenas nas extremidades, aumentou, à medida que se aumentou o comprimento do vão livre. Concluiu-se que fixar o reforço apenas nas extremidades, apesar de ter vantagens económicas, construtivas e de tempo, para vigas de dimensões consideráveis, acarretou perdas consideráveis de capacidade resistente, especialmente para vigas EBR.


A Nossa Luz e o Código de Honra

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A B C Representação do modelo de viga estudado em programa de elementos finitos (tirou-se partido da simetria da viga) D

F

E Distribuição de fendilhação de viga em modelo de elementos finitos (pormenor do descolamento do laminado).

Esquema de ensaio das vigas. A- macaco hidráulico; B – célula de carga; C – viga de distribuição de carga; D – apoio fixo; E – apoio móvel; F- defletómetro.

Luís Filipe Ribeiro Ferreira Barbosa 71/1957

A Nossa Luz e o

Código de Honra Q

uando entrei para o Colégio (já lá vão uns largos anos) não havia um Código de Honra afixado nas paredes do Colégio, em relação ao qual tomássemos, em cerimónia oficial, o compromisso solene de o respeitar. Apesar de nada nos ser dado por escrito, para nossa orientação, muito rapidamente aprendíamos qual era o comportamento que devíamos adoptar como «Meninos da Luz». Nessa aprendizagem, que era feita entre nós, passando-se o conhecimento informalmente dos mais velhos para os mais novos, o papel dos graduados era fundamental. Quando algum infringia as regras e «esquecia» de se comportar de acordo com o padrão de comportamento reconhecido pelo clã como

apropriado, lá estavam os graduados, prontos a levar o «esquecido» ao bom caminho, por métodos mais ou menos persuasivos e de sucesso garantido. Quando já me encontrava a meio do curso, a situação modificou-se, com a distribuição a todos os alunos, em 1959 ou 1960, de um pequeno livro intitulado «A Nossa Luz»1,que era uma espécie de «Manual de Boas Maneiras», em que nos era dito como nos devíamos comportar nas mais variadas circunstâncias, dentro e fora do Colégio. Recordo-me, por exemplo, de se referir nesse livro que quando se pousavam os talheres a meio de uma refeição, não deviam os mesmos ficar apoiados nas suas extremidades sobre a

mesa, na posição de «remos na água». Face às alarvidades que nós por vezes fazíamos à mesa no refeitório, esta nota de requinte foi objecto de muita galhofa. O referido livro «A Nossa Luz» tinha a particularidade de ter uma parte intitulada «Compromisso Solene», em que se apresentava o decálogo do Colégio, ou seja, aquilo que o livro indicava como sendo «os dez lemas que constituem o compromisso solene» dos Alunos do Colégio Militar. Para conhecimento geral, apresentamos de seguida uma transcrição do referido «Compromisso Solene». Como é evidente pela sua leitura, este texto é a fonte de onde foi, em boa hora, extraído o Código de Honra do Colégio Militar.

1 A capa, que se reproduz, é da autoria do Luís Miguel Alcide d'Oliveira (163/1952) e a fotografia foi cedida pelo Rui Manuel de Sá Leal (502/1959).


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A Nossa Luz e o Código de Honra

I

O aluno do Colégio Militar ama devotadamente a sua Pátria, cultivando o ideal de viver e transmitir aos vindouros as gloriosas e cristãs tradições que a fizeram grande.

II

Cumpre os princípios de disciplina estabelecidos e impõe-os a si próprio, consciente da sua necessidade e legitimidade.

III

Dedica aos deveres escolares todo o seu esforço e inteligência, por princípio e por reconhecimento para quem o educa e pela instituição que lhe assegura realizar-se na plenitude dum ideal superior. «Ao entrares no Colégio, começas uma vida nova, mais dura e exigente do que aquela que os teus colegas de ontem vão encontrar no Liceu. Mas desde que a missão seja bem cumprida, é precisamente a dificuldade que a torna honrosa. Ao teres a honra de vestir a tua farda-sonho que tantos ambicionaram sem que nunca se realizasse - não te deixes invadir pela vaidade, pela soberba ou por outro qualquer sentimento mesquinho. Procede sempre como se, considerando-te o mais modesto dos rapazes, recebesses o encargo de remir uma falta e demonstrar que o teu Colégio era o melhor de todos. Se te surgirem dúvidas sobre a atitude a tomar, lembra-te que os alunos do Colégio Militar têm por normas de procedimento os dez lemas que constituem o seu compromisso solene.

Nota da ZacatraZ Na biblioteca da nossa Associação não temos um exemplar do livro «A Nossa Luz». Se alguém tiver um exemplar e se disponha a prescindir do mesmo, agradecemos desde já a sua cedência à Associação.

IV

Assume a responsabilidade dos seus actos, acusando-se espontaneamente das faltas que comete.

V

Pratica uma sã e viril camaradagem, não denuncia, mas recusa-se intransigentemente a colaborar em acções contrárias à moral e à disciplina.

VI

Não mente e não comete fraudes, sendo irrepreensivelmente honesto em todos os seus actos, mesmo que com isso se prejudique.

VII

É modesto, pratica o bem desinteressadamente e enfrenta a adversidade com dignidade e confiança.

VIII

Combate a delapidação, a violência e o despotismo, auxilia e encaminha os mais fracos e mais novos.

IX

É afável para com os que o servem, atencioso para com os que por ele velam, respeitador para com os que o instruem e educam.

X

Honra a farda que enverga e impõe-se, tanto pela dignidade do seu porte e moderação de linguagem, como pelo seu trato social e cavalheirismo. Obedecer convictamente é tão nobre como comandar.»


Centenário do Moca 1915-2015 Cândido Gomes Alves

Centenário do Moca 1915-2015

Cândido Gomes Alves Nota prévia Com a concordância do José Alberto da Costa Matos (96/1950), transcrevemos a descrição feita na História do Colégio Militar da sua autoria e publicada quando do Bicentenário, que bem retrata a dimensão dum Homem que tudo deu à Instituição que Serviu durante mais de quarenta anos e descreve o amor que lhe dedicou bem como aos seus Alunos. A memoria de Cândido Gomes Alves, o Moca, ficará para sempre em todos aqueles que o conheceram e, pela sua simplicidade e grandeza, constituirá um marco imorredoiro na vida do Colégio Militar.

U

m inesquecível exemplo de dedicação foi o «Moca».

Cândido Gomes Alves de seu nome, nascera em Vilar de Vagos, Barcelos a 8 de Janeiro de 1915. Quando foi chamado ao serviço militar, o recruta Alves tinha a noção de que, mal sabendo ler e escrever1, seria um simples soldado; mas não podia imaginar que, uma vez passado a «pronto» da instrução da recruta iria cair nos braços do que, no dizer posterior da família, era a sua «amante»: o Colégio Militar. Aqui, ainda como praça, foi corneteiro, fazendo também serviços de limpeza e outros trabalhos na 2.ª Companhia de Alunos. Quando em 1943, após sete anos de serviço junto dos meninos da Luz, foi licenciado das obrigações militares, surgiu uma vaga de fâmulo no Colégio; o soldado Alves, cuja entrega ao trabalho, capacidade de adaptação à vida colegial e afinidade com os alunos se haviam tornado notadas, foi então o escolhido para o cargo, ficando em 17 de Novembro definitiva-

mente ligado ao Colégio Militar para o resto da vida. Começou por ser servente no refeitório mas, no final de 1944, transitou para a 1.ª Companhia, também como servente, e depois para a 2.ª, só mudando mais tarde para a 3.ª, já depois de inaugurado, em 1958, o edifício do Corpo de Alunos. «Aconteceu uma vez ter tido necessidade de tratar da vista, pelo que andou uns tempos com um remédio nos olhos que os fazia parecer pintados. Logo os alunos o alcunharam de «Mirna Loy», nome de uma linda actriz de cinema dessa época que usava os olhos bem pintados.»2 Mais tarde, e era ele próprio que o contava, encontrando-se fechada uma porta de uma das dependências da sua Companhia, não aparecendo a respectiva chave e urgindo abri-la, o «Mirna Loy», sempre pronto para o que fosse necessário, avançou lesto e zás!... qual potente moca, solucionou o problema com estrondosa cabeçada. E daí a alcunha que a ele ficará ligada para todo o sempre.

1 Fez exame do ensino primário elementar já depois de estar no Colégio, em Dezembro de1954. 2 FONTOURA (167/1931), Álvaro Nuno Lemos da, «O Porto, o Colégio e o Moca», in «O Colégio Militar no Porto»,

12 de Março de 1994, pp. 103 a 105.

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Centenário do Moca 1915-2015 Cândido Gomes Alves

Fato de ganga azul, vassoura sempre à mão, o «Moca» iria então revelar a grande dimensão da sua humanidade a par de uma espantosa capacidade educadora que a sua humildade mantinha oculta mas que os Alunos bem sentiam. Omnipresente, dele se esperava a censura merecida, o elogio sincero dos êxitos escolares ou desportivos, mas também o gesto ou palavra de alento, quase paternal, sempre que se lhe deparava algum rosto de criança fechado pelo desânimo ou pelas saudades. Conhecia todos aos Alunos pelos seus números, nomes ou alcunhas, a eles se dirigindo com frequência empregando rimas que lhe saíam espontaneamente e com grande oportunidade, do género: «Bom dia 43! Vê se estudas Português», «Tem cuidado óh Falcão que te falta um botão», «Porta-te bem 107, se não levas um tabefe!», e tantas outras. Na sua memória permaneciam todos os colegiais, catalogados por anos, a eles se dirigindo pelo número e alcunha sempre que os encontrava já Antigos Alunos, mesmo que tivesse decorrido muito tempo. E isso era frequente, pois não havia curso que se reunisse no Colégio que não fizesse questão em ter consigo a acompanhá-lo o inesquecível «Moca», demonstrando-lhe deste modo o grande respeito e o enorme carinho que por ele tinham e a inquestionável gratidão que lhe estavam devendo. Em 1949, o Cândido acompanhou o Batalhão Colegial na visita oficial que este efectuou a Espanha; em 1969 foi a vez de tomar parte na viagem dos alunos finalistas à Guiné, o mesmo sucedendo no ano seguinte, mas agora a Angola. Barba serrada - que escanhoava minuciosamente antes de vestir o casaco branco para ir servir à mesa do refeitório – sobrancelhas espessas, estatura baixa, o Cândido era extremamente exigente para consigo próprio, dedicando às tarefas que estavam confiadas uma infindável capacidade de trabalho que não conhecia dias nem horas. A dignidade que atribuía ao trabalho era muitas vezes o mote dos conselhos que dava aos alunos. «A rapaziada nova o que precisa é de trabalhar e lutar pela vida», afirmava, para depois acrescentar: «Se não lutarmos na vida, não temos nada». E o «Moca» deu durante a sua vida exemplo dessa luta, conseguindo fazer dos

seu três filhos, à custa de muito esforço, cidadãos de corpo inteiro, um dos quais3 ainda viu ser professor do Colégio Militar, onde ele era um simples servente. Mas havia outros valores que cultivava e que a sua modéstia não conseguia disfarçar: a verdade, o patriotismo e o amor. Certo dia, questionado sobre qual das tradições colegiais achava mais importante, não hesitou em responder: «O 1.º de Dezembro, porque relembra a todos que corremos com os espanhóis daqui para fora!». O amor era para o Cândido um sentimento essencial à vida. Amava em primeiro lugar a sua Família, mas amava logo a seguir o Colégio, tanto que, mesmo depois de reformado em 5 de Abril de 1983, ali comparecia todos os dias para refazer o ânimo, para alimentar a vida, para ver os Alunos, os professores e os seus companheiros de trabalho, e para com estes jogar uma partida de cartas. Em assembleia geral de 21 de Março de 1985, a Associação dos Antigos Alunos do Colégio decidiu homenageá-lo conferindo-lhe a distinção de seu «Sócio Honorário», em reconhecimento dos serviços prestados ao Colégio, e como demonstração do grande respeito, carinho e amizade que lhe dedicavam. Durante a sua vida foi louvado por 7 vezes e quatro anos depois de retirado do serviço foi condecorado com a medalha de 4.ª classe de D. Afonso Henriques, Patrono do Exército. Em 1994, «Quando o Colégio Militar foi ao Porto, o Moca também foi, acompanhando os seus «Meninos». Lá esteve na Avenida dos Aliados, aguardando o desfile, discretamente, num dos lugares traseiros duma das duas tribunas laterais, enquanto, à frente desta, a multidão constituída sobretudo por Antigos Alunos, se aglomerava em ruidoso e alegre convívio. Mas entre aquela rapaziada de várias gerações e cursos, houve alguém que descortinou o «Moca» no seu escondido poiso e chamou a atenção dos restantes. Quando reconheceram aquele funcionário modesto, mas grande no conceito dos seus valores sentimentais, a «malta» irrompeu, em uníssono, num chamamento misto de ternura e admiração: «Moca! Moca! Moca!». O público estranho não se apercebeu bem do que se passava e começou a procurar aquele a quem se dirigia tal chamamento.

3 Luís Miguel Conceição Alves, professor de Físico-Químicas de 1975 a 1977. 4 Ibidem. 5 DURÃO, Roberto, «Morre o Moca! Viva o Moca!», in Revista da AAACM n.º 130 de 1998, pp. 117 e 118.

Com calma, o «Moca» veio à frente na tribuna, correspondendo ao apelo. A multidão dos Antigos Alunos saudou-o então com uma estrondosa, sentida e carinhosa ovação. De novo o público se interrogou a quem se dirigia tal manifestação, pois não encontrava presente nenhuma personalidade de vulto que o justificasse. Só quando o «Moca» se descobriu, tirando o seu boné, e acenou agradecendo a ovação, os estranhos se capacitaram de que tal homenagem era dirigida aquele pequeno-Grande Homem. Quando retornou o seu lugar, a face do velho «Moca» exibia um sorriso comovido, por ela correndo incontidas lágrimas de emoção que não eram capazes de esconder a expressão de felicidade que lhe ia na alma, nem a ternura que continua a ter pelos seus «Meninos». Os acordes marciais da banda de música que à frente do Batalhão se aproximava, de pronto chamaram a atenção de todos. Mas no pensamento de cada um dos que haviam participado ou assistido a esta curta manifestação, que a ida do Colégio ao Porto possibilitara, um pensamento, por certo, lhe terá ocorrido: «Grandes corações forma o Colégio Militar para que aconteça fazerem brotar do peito dos ‘’Meninos da Luz’’, espontânea e pública homenagem de gratidão e amizade a um dos seus mais modestos servidores.»4 Com o andar dos anos, o Cândido foi tendo dificuldades de visão, depois veio a doença, a que tentava reagir com o optimismo, a determinação e a alegria de viver que lhe eram peculiares. Só que isso não bastou, e nos princípios de Dezembro de 1997, Deus decidiu que o «Moca» não precisava de voltar mais ao seu Colégio Militar para que as páginas da história perpetuassem a dignidade e a dedicação com que o servira. Quando a notícia chegou ao conhecimento dos Alunos, estes, «sem que ninguém lhes desse qualquer ordem, guardaram espontaneamente em todo esse dia um silêncio profundo, nas companhias, no refeitório, nos claustros, nas aulas. E nas formaturas desfilaram sem que os seus calcanhares se ouvissem martelando garbosamente o solo. Era toda a alma do Colégio que estava triste e sofria a perda de um dos seus maiores servidores de sempre»5.


O “expresso” da Professora Amélia

O “expresso” da Professora Amélia Nota prévia da ZacatraZ Recebemos do nosso Camarada Gustavo André dos Santos Lima (248/1994) um texto de sua autoria, muito marcante, em homenagem e recordação de uma Professora do Colégio Militar. A Professora Maria Amelia Reis Figueiredo Santos que nasceu a 25 de Maio de 1962 e faleceu a 20 de Agosto de 2011. A forma como é recordada mostra bem o verdadeiro valor de uma Professora exemplar e o modo como se dedicou ao ensino dos seus Alunos, sem facilitismos e deles granjeando admiração e profunda amizade. São exemplos destes que desde sempre fizeram e farão no futuro com que o Colégio Militar seja um estabelecimento de ensino diferente dos outros. Aqui fica esta Memória da Professora Amélia que, pelo exemplo, determinação, vontade de ensinar e cumprimento da sua missão, marcou os seus Alunos que a recordam muito sentidamente enaltecendo a sua amizade e o valor da docência por si praticada. São Professoras e Professores como a Professora Amélia Figueiredo que o Colégio precisa.

A Professora Amélia e os seus Alunos numa visita ao Lar de Runa dos Veteranos Militares

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O “expresso” da Professora Amélia

F

ui Aluno do Colégio Militar entre os anos de 1994 e de 2002. Não obstante o largo tempo já decorrido, dei por mim recentemente a ler um jornal que me trouxe à consciência, com vividíssimo detalhe, palavras de uma pessoa que firmemente me marcou desde então: a Professora Amélia Figueiredo. A Professora Amélia vincou de forma indelével a minha vida e a dos meus camaradas, seu primeiro curso de alunos colegiais e, nesse sentido, pareceu-me que aquela recordação era um sinal da necessidade de lhe redigirmos prontamente um merecido e justo texto de agradecimento e de testemunho. A Professora Amélia Figueiredo ingressou nesta Casa no mesmo ano de 1994 em que entrei. Recordo-me, com algum humor, da nossa primeira Aula de História. A Professora Amélia encontrava-se radiante por estar no Colégio Militar - uma Instituição que “fez, faz e fará História”. Estava, ainda mais, encantada por poder partilhar este momento de adaptação com alunos, os seus “ratas” do 1º ano (actual 5º) e incentivava-nos a animarmo-nos conjuntamente para a superação de tantos novos desafios. Cria que o 1º ano nos iria marcar a ambos, Alunos e Professora, e que assim ficaríamos “amigos para a vida”. “Que nunca nos esqueceríamos dela, nem vice-versa”. Causou-me estranheza na altura, contudo logo nessa primeira aula, em surdina, foi recebida com segura ironia por aqueles alunos que aspiravam apenas a ter um professor permissivo e pouco exigente: “sim, sim, setora, muito amigos!”. Considero hoje, num olhar retrospecto, que este inicial acolhimento de alguns alunos não foi, de modo algum, isolado naquele que viria a ser o seu percurso. De facto, desde cedo, que a Professora Amélia não cedeu a comodismos, estabelecendo uma elevada fasquia de exigência aos seus pupilos. Em resultado, proliferavam alunos com dificuldades a quem, sem reservas, eram dadas notas menos desejadas. A este grupo de antipatizantes, a Professora explicava que “Vocês hoje podem achar que não gostam de mim, mas, um dia, irão olhar para trás e perceber que os melhores professores que tiveram foram os mais exigentes, não os mais porreiros.” E não cessava de procurar cativar-nos para a História, bem como de fornecer-nos ferramentas objectivas de trabalho. Assegurava-nos que “a estudar História também podemos ser capazes de prever o futuro! Já repararam na semelhança entre os

problemas de ontem e os problemas de hoje? Reparem, os problemas são análogos e quem os resolve, ou complica, é sempre o Homem. Assim, poderemos até aprender com os erros do Passado e agir de modo a não os repetir hoje.”. Organizava valiosíssimas visitas de estudo. Numa delas, sobejamente recordada entre nós, levou-nos ao Lar dos Veteranos Militares de Runa. Nele confraternizámos com Antigos Alunos combatentes na 1a Grande Guerra, no famoso Corpo Expedicionário Português. Convidava ainda, para a sala de aula, Militares que combateram no ultramar e que nos deixaram o seu relato testemunhal de aventuras e desventuras vividas – posteriormente situadas no contexto programático. Fundou também um Clube de História para Alunos, como Actividade Extracurricular, onde podíamos aprofundar, para além do programa, temas do nosso interesse. Participei nesse Clube e nele fui agraciado com a possibilidade de conhecer o Antigo Aluno Carlos Vieira da Rocha, o fundador da revista da AAACM, profundo estudante da história de Timor e participante activo nas movimentações revolucionárias de Abril ao lado do General Spínola. Nasciam assim também bons Alunos e muitos interessados por História. Combinava o cultivo pela afeição à História com o ensino de métodos de trabalho que extravasavam largamente a especificidade da sua Disciplina. “Nas minhas aulas, vocês vão também aprender a tirar apontamentos. Precisam deles para História, mas acreditem que vos vão ser úteis durante toda a vida académica. Durante a faculdade, os professores vão debitar matéria a um ritmo que não espera pelos mais lentos e, depois, senão acompanharem, não voltarão atrás. Têm um calendário para cumprir." Concretizava: "tirar notas não é escrever ipsis verbis o que diz o Professora, mas antes redigir as suas ideias principais e o encadeamento lógico entre elas. Vejam como eu faço! Olhem para as abreviaturas que utilizo." (e escrevia no quadro árvores com premissas e conclusões, palavras encurtadas). Sabia ainda que a educação de cidadãos activos, responsáveis e interessados pelo colectivo nacional acima do seu próprio interesse, teriam que adoptar comportamentos de aprendizagem e de auto informação “fuori le mura”. Confessava assim, em nota de rodapé nas Aulas, que tinha um gosto pessoal, um hábito que considerava inviolável de ler o jornal “O Expresso” todas as semanas. Aquele que hoje leio, na minha vida adulta.

Ao ter eu próprio este hábito - independentemente dos méritos e desméritos que tem a publicação -, reconheço em mim, despropositadamente, um gosto que já me havia sido incentivado pela Professora Amélia há vinte anos atrás. Todavia, o legado da Professora Amélia está longe de se esgotar no fomento dos hábitos de leitura: a ela agradecemos traços de exigência da nossa personalidade, conhecimento de conteúdos históricos identitários, domínio de sistemas de trabalho que nos acompanharam até hoje, vivências irrepetíveis de partilha patriótica e profundamente colegial. Pergunto-me ainda, retoricamente, se seria possível a Professora Amélia ter deixado esta herança se não tivesse procurado a excelência, bem para além do simples cumprimento do que lhe era pedido. E agradeço a exposição que tive no Colégio a Professoras e a Professores que me ensinaram e estimularam a procurar sempre o máximo, honrando assim a história da Casa. Reconhecidos pelo “expresso” em que nos levou, enviamos-lhe um abraço, com sentida gratidão pelo que fez por nós pessoalmente e em colectivo. Descanse em Paz.

Gustavo André dos Santos Lima 248/1994


Entrevista a Catarina Moutinho

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Entrevista conduzida por Martiniano Gonçalves (9/1958)

Entrevista a

Catarina Moutinho C

atarina Moutinho, 41 anos, Mãe do Aluno Manuel Moutinho 529/2011. Licenciou-se em Design de Interiores pelo IADE em 1996. Em 2006 concretizou um dos seus sonhos ao criar a Brand Team, agência de design e publicidade, desempenhando a função de Direcção Criativa. Como criativa que é, nutre um sentimento particular em representar a óleo s/ tela retratos entre outros. A sua paixão pelo Colégio Militar, levou-a a criar uma marca, com a intenção de o divulgar.

Martiniano Gonçalves - Define-se a si própria como “Mãe-leoa” de um aluno interno que foi “Rata” aos 9 anos e está agora no 8º ano do Colégio. Pode contar-nos a história do seu processo de decisão para meter o seu Filho como aluno interno no Colégio? (…desde a fase em que o ameaçava de o pôr no Colégio quando ele se portava mal…) Catarina Moutinho - Sim, sou uma “Mãe– leoa”, com um instinto protector que desconhecia, até ser Mãe, com um amor sem fim pelos meus Filhos. Uma protecção que assumo, às vezes, um pouco exagerada, mas nenhuma Mãe é perfeita, e não existe a melhor Mãe do mundo, à excepção da minha, claro… (risos) Sou Mãe solteira, e para muitos não será o ideal para criar um filho, para mim, é um desafio diário, ser Mãe e Pai, um trabalho a dobrar, enfrentando todas as adversidades com amor, carinho e dedicação, sempre com o apoio da minha família. Mas ser Mãe a 100%, significa que temos de dar todo o carinho, com alguma rigidez pelo meio, sermos o “polícia bom” e o “polícia mau”. Quando me tornava no “polícia mau” dizia muitas vezes “continua assim que já sabes


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Entrevista a Catarina Moutinho

No primeiro dia no Colégio, aprendendo a fazer a cama.

onde vais parar: ao Colégio Militar…” Tantas vezes o disse, que acabei por acreditar que poderia vir a ser a nossa realidade. Tive a sorte de visitar o Colégio com o Major Nascimento, que com a sua paciência se disponibilizou para me mostrar as instalações e responder a todas as perguntas e dúvidas que naturalmente tinha. Confesso que o primeiro impacto me deixou aterrorizada! Como é que eu sendo “Mãe-leoa” ia conseguir abdicar da presença do meu Filho diariamente, privando-o do convívio com a Irmã (nesta altura com 8 meses) e minha, dos mimos que dávamos um ao outro, do quentinho de casa entre tantas outras coisas… Comecei à procura de Antigos Alunos para os conhecer melhor, as suas experiências, o que faziam hoje em dia, etc. O saldo foi francamente positivo. Decidimos, os dois, que iria fazer as provas necessárias de entrada no Colégio e logo decidiríamos. Em Junho lá estávamos nós, preparados para uma nova etapa nas nossas vidas. A vontade do Manuel não era muita, para não dizer nenhuma. “Mea culpa!” Demorei algum tempo a colocar-lhe o “chip” mas, com algumas conversas, uns vídeos no “youtube” e um contrato assinado pelos dois que dizia “Se ao final do ano, não estiver feliz, saio”, foi a base que se mantém até hoje. Nunca o obriguei a nada que ele não quisesse, as decisões são sempre tomadas pelos dois, de acordo com a sua idade, sendo a sua responsabilidade cada vez maior, e eu apenas a orientar.

Martiniano Gonçalves - Como Mãe, como viveu o ano em que ele foi “Rata”? Para ele, como foi? Houve muita “baba e ranho”? Como é hoje a relação com um já adolescente na “idade do armário”? Catarina Moutinho - O primeiro dia foi terrível para mim. Senti que estava a abandonar o meu Filho num sítio enorme, frio... com apenas 9 anos. Saí do Colégio de coração despedaçado. Chorei até desidratar (risos), pode parecer ridículo, mas é a mais pura das verdades, nessa noite pouco ou nada dormi, ansiosa por poder ir buscá-lo no dia seguinte. Fiquei em paz quando vi o olhar e sorriso do Manuel no dia seguinte. Percebi que tinha feito a escolha certa. Ele estava bem, e satisfeito, a contar a noite fantástica que tinham tido, a Noite dos Fantasmas! Contou tudo com um entusiasmo tão grande, que eu nem queria acreditar. Depois disse-me que a sua alcunha era Nestlé. “Nestlé?” Não me digas que choraste que nem um “bebé?!“ Lá me explicou, que era a alcunha do antecessor, o que me deixou mais descansada. Recordo-me, na semana seguinte, o Colégio permitia a visita dos Pais à terça-feira. Fi-lo durante 3 semanas, ao fim desse tempo, o Manuel disse-me que já não precisava de ir, que se sentia pior quando eu lá ia, e que estava bem. Senti uma reviravolta no estômago: o meu Filho estava a crescer e já não precisava de mim. E eu? Eu precisava dele! Precisava de o ver, de o ouvir e de o sentir perto! Era um misto de sentimentos comple-

tamente antagónicos… mas o importante era ele estar integrado e feliz, e eu tinha de aprender a lidar com isso. Agora está no 8º ano, com altos e baixos, naturalmente. Os 13 anos não são fáceis, nem para nós e muito menos para eles, é realmente a “fase do armário”, a fase mais temida por nós, Pais. É uma espécie de “gripe prolongada”, damos a mão, e esperamos que passe rápidoooo… É nas viagens de carro (30 minutos) do Colégio para casa, que conseguimos conversar sobre o que o preocupa, sem dramas e tentar ajudar naquilo que está ao nosso alcance. Claro que muitas vezes, o nariz no ar, os amuos e as certezas são enervantes, mas tudo é negociado, e as coisas acabam por fluir. Com o apoio incondicional do Prof. Miguel Santos (o seu director de turma desde o 5º ano) temos conseguido gerir esta fase da melhor maneira. Na realidade o Manuel tem sido um miúdo incrível, com princípios, bem disposto, um bom aluno e não me tem dado qualquer tipo de problemas, à excepção de uma ou outra punição, que considero normais quando falamos de rapazes, principalmente nesta idade. Martiniano Gonçalves - Que principais mudanças constata na personalidade do seu Filho desde a sua entrada no Colégio? Catarina Moutinho - São tantas! Sinto o Manuel mais sólido, disciplinado, assertivo e independente, mais “Homem”. Uma grande diferença para muitos miúdos da idade dele, que frequentam “escolas normais”. Para mim é um alívio saber que não usa as calças a meio do rabo (risos). Partindo do princípio que não é a escola que educa, somos nós Pais, que o devemos fazer em casa, e isso sei que o fiz, ao contrário de alguns, que pensam que o Colégio é uma escola de correcção das asneiras que eles como Pais cometeram. Vejo o Colégio como a continuação do que o Manuel tem em casa, sendo esta fusão (com a exigência e disciplina que lhe é incutida no Colégio), potenciadora do carácter e dos resultados positivos do Manuel, para além dos valores e princípios que o orientam para a vida. Sou uma Mãe “babada”, quando o vejo a ter atitudes incríveis com a sua tenra idade, como por exemplo ter opiniões formadas acerca de um conjunto de coisas. Pode até parecer excessivo, mas todas as grandes decisões que tenho de tomar, falo com o Manuel e tenho sempre a sua opinião como válida.


Entrevista a Catarina Moutinho

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Orgulho-me ao vê-lo a descer a Avenida debaixo de sol ou chuva, sempre impecável e orgulhoso da farda que enverga. Nestas alturas tenho a certeza que a escolha por este projecto foi a mais acertada. Martiniano Gonçalves - Como analisa o “internato” como forma de ser aluno no Colégio? Aspectos positivos e negativos? Catarina Moutinho - O Manuel está em regime de internato e de outro modo ele não aceitaria. Para ele, o internato faz parte de toda a vivência colegial, desde as brincadeiras nas camaratas, aos campeonatos de ping-pong e às “bolamadas” que eles tanto adoram. Como eu costumo dizer, eles vivem 24h sobre 24h juntos, uma espécie de “Big Brother”, e tudo tem uma intensidade enorme, e só assim, neste regime se pode sentir, como eles dizem “só o vivido é compreendido” e “o Colégio vive-se de noite”. Julgo que a forma como se vive o internato está intimamente ligada ao nível do amadurecimento de cada um, e isto é visível ao separarem os miúdos pelas diferentes companhias de acordo com o ano que frequentam. Mas nem tudo é um “mar de rosas”, e existem, para mim, algumas lacunas que deveriam ser corrigidas, no âmbito do desempenho escolar. Estamos a falar de crianças dos 9 aos 18 anos, que necessitam de orientação a todos os níveis, e nós Pais, por mais que tentemos, a quarta-feira e o fim-de-semana não chegam para os acompanharmos devidamente, como acontece com os alunos externos ou outros estudantes de outras escolas. As horas de estudo nem sempre são aproveitadas como deveriam, ou pelo excesso de actividades, ou por falta de acompanhamento da parte de alguns dos professores e obviamente do empenho dos alunos. O Colégio é o “dono do tempo” deles, é o Colégio que estipula os horários que eles têm de cumprir. Mas para eles, crianças é difícil fazer a gestão de tempo e compreenderem que agora estudam, e depois brincam.

No primeiro dia no Colégio, aprendendo a fazer a cama.

Vejo um projecto educativo diferente sem a excelência que teve em tempos que já lá vão. Preocupa-me o futuro… Mas apesar disso, espero tudo! Principalmente espero que todos estes Meninos da Luz, venham a ser grandes Homens, com princípios, e disciplina porque só assim poderão ser os Homens de amanhã, conseguindo ultrapassar todas as adversidades da vida, com sucesso, empenho e reconhecimento. Martiniano Gonçalves - Como vê os seus Antigos Alunos? Catarina Moutinho - Vejo pessoas sãs, equilibradas, solidários e acima de tudo amigos

Martiniano Gonçalves - Globalmente como vê o Colégio? O que espera do Colégio para o seu Filho? Catarina Moutinho - De uma forma geral vejo actualmente um Colégio diferente daquele em que inscrevi o meu Filho, um Colégio em constante mutação e pouco preparado para ela.

Cerimónia na véspera do 3 de Março.

para a vida. O espírito de entreajuda entre eles é simplesmente maravilhoso e fascinante. A palavra - desistir - não existe para nenhum deles. E a vida é mesmo isso, é sabermos ultrapassar os obstáculos que surgem no nosso caminho, em vez de voltarmos atrás, ou arranjar esquemas para os contornar. Nunca me vou esquecer de um dos primeiros graduados do Manel, o José Afonso (ex-20), que sempre se disponibilizou para o ajudar a ele, e a mim, como Mãe de primeira viagem e sem familiares Antigos Alunos. Obrigada Afonso! Vejo-os com alguma “inveja” de não ter podido viver o que eles viveram, porque só eles o sabem!


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Entrevista a Catarina Moutinho

cional do aluno encaminhando-os para o sucesso, enfrentando os desafios da visa presente e futura com uma estrutura emocional positiva. Um elogio ou um carinho pela parte dos professores, após cada pequena conquista podem, também, ser preciosos reforços. Só assim, poderão vir a ter resultados de excelência durante as suas vidas. Aos Graduados

Martiniano Gonçalves - E o que pensa da APEEACM e da sua participação na vida do Colégio? Catarina Moutinho - A nova Presidência da Associação - Coronel Cordeiro de Araújo - tem feito um trabalho excelente no acompanhamento a nós, Pais, apoiando-nos sempre que necessário, dando bons conselhos e demonstrando sempre a sua disponibilidade em variadíssimas situações. Tenho pena que, nas reuniões de Assembleia, estejam tão poucos Pais/ Encarregados de Educação. Sinto que muitos, tal como disse antes, depositam ali os Filhos e, nem querem saber. A união faz a força e só assim, poderemos ter alguma credibilidade, para tentarmos alterar algumas coisas menos boas com quem de direito. Martiniano Gonçalves - Se tivesse que dar conselhos a cada uma das seguintes entidades o que diria? Catarina Moutinho Ao Director do Colégio Militar Aproveite a tempestade para alterar o que não está bem, a seguir melhores tempos virão. A restruturação do Colégio não passa apenas por ser um Colégio misto, ter instrução primária, ensino básico e regime de externato, mas sim por uma lavagem fundamental e necessária de reestruturação dos professores e fun-

cionários - são eles que passam a maior parte do tempo com os nossos Filhos - e há muitos, que não merecem estar num Colégio que prima pela excelência. Assim como, nem todos os alunos deveriam ali estar, e isto passa, não só pelos exames de Português, Matemática e Aptidões Físicas, mas sim, por uma avaliação psicológica dos Pais. Também, relativamente a algumas disciplinas fundamentais (matemática, português, inglês) para a inserção no ensino superior e no mercado de trabalho, alguns alunos necessitam de explicações fora, algo que não considero razoável. Quem sabe se o Colégio fizesse uma parceria com o “British Council”, os alunos melhorariam o nível de Inglês? Ou até vir a ter a opção de acesso ao “International Baccalaureate (IB)” para os alunos do 3º ciclo e Secundário? Faço uma proposta, que considero importante e fundamental, principalmente para os que estão em regime de internato, embora seja importante para todos - uma hora quinzenal que os ajude a criar hábitos de trabalho e estudo, orientando-os a organizar o tempo, os cadernos, as horas de estudo etc. Só assim, podem ganhar competências alargadas, que devem ser gradualmente desenvolvidas criando o gosto (e hábitos) pela aprendizagem, que requerem motivação e organização, sendo o nosso papel e o da escola extremamente importantes. Desta forma, talvez com a ajuda de psicólogos estagiários (a custo 0 para o Colégio), iria contribuir para a organização pessoal e emo-

A responsabilidade de um Graduado é gigantesca, para além de terem de estudar para o ingresso no ensino superior, são eles que cuidam dos nossos Filhos. O seu papel é fundamental na vida deles, são eles que os orientam e são o exemplo a seguir. Tendo isto como base, até agora, quase todos os que acompanharam o meu Filho têm sido exemplares, uns mais que outros, mas têm cumprido o seu papel. Sinto-me orgulhosa de um dia o meu Filho poder vir a ser um deles, e conseguir ser um exemplo para outras crianças. Os Graduados foi algo novo para mim, e não me lembro de, em nenhum momento da minha vida escolar, ter tido colegas mais velhos que me apoiassem e fossem para mim como irmãos mais velhos. Nem o vejo actualmente noutras escolas. Parabéns a todos os que realmente ajudam e aconselham os mais novos! O meu conselho para os graduados é simplesmente para continuarem a ser o que têm sido, passando aos nossos filhos um conjunto de valores, honra e deveres para com o Colégio e para com a Sociedade. À APEEACM Uma estrutura fundamental para o projecto educativo e estruturante do Colégio, sendo a nossa voz activa e participativa, envolvendo toda a Família Colegial de uma forma activa e pacífica, sendo esta uma realidade incontornável e necessária. Só desta forma poderemos encontrar as melhores soluções para o desenvolvimento dos alunos e do Colégio. Espero que a APPEACM juntamente com o Director do Colégio consigam pôr em prática todas as acções de restruturação do mesmo, sempre com o objectivo de sucesso dos alunos. À AAACM Só os Antigos Alunos podem manter as tradições do Colégio, e tentarem que elas não morram. A união faz a força.


Entrevista a Catarina Moutinho

Penso que a Associação fez de tudo para tentar que o nosso “querido” ministro Aguiar Branco não levasse a sua avante, mas era muito difícil consegui-lo, quando as decisões são tomadas por um governo obtuso. Mas julgo que foram incansáveis, e apesar de termos perdido esta batalha, não se perdeu a guerra, e como desistir não faz parte do dicionário dos Antigos Alunos do Colégio Militar, é continuar a construir e fazer mais, e melhor. Nunca esquecendo os princípios, valores e tradições da Instituição. Martiniano Gonçalves - Conheci-a com uma “Sweatshirt” que diz com letras bem visíveis ”Eu sou Mãe de um Menino da Luz”. Para si o que é ser “Mãe de um Menino da Luz”? Catarina Moutinho - Sim, é verdade! Na véspera do 3 de Março, a minha “sweat” e o meu “pequeno, grande soldadinho” acabaram por chamar a sua atenção, esse é o meu objectivo. “Eu sou Mãe de um Menino da Luz” impresso sobre uma “sweat” vermelha, chama a atenção, não pela cor forte, mas pelo que diz. Todos gostamos de ler… somos curiosos. A dizer GAP ou GANT há aos milhares, a dizerem com orgulho, o que somos, não há muitas mas já vai havendo algumas! A ideia de criar as “t-shirts/sweats” surgiu no meio de uma campanha publicitária que apresentei ao Colégio em 2012. Uma campanha, para mim, original e necessária para o futuro do Colégio. Uma campanha dirigida às Mães, e foi assim que surgiu o conceito “Eu sou… (Mãe, Pai, Irmão, Irmã, Avô, Avó… ) de um Menino da Luz”. Em Setembro de 2013, com a campanha publicitária (não a minha) lançada em horário nobre nas televisões e rádios: “Querem matar o Colégio Militar porquê?” – com pessoas como Adriano Moreira, e Antigos Alunos como Rocha Vieira ou José Fanha, recebi alguns telefonemas de amigos e familiares a perguntar o que é que eu ia fazer ao Manuel, agora que o Colégio ia acabar. Tantas vezes expliquei que perdi a conta! Foi então que me lembrei de ir buscar a ideia que estava “guardada na gaveta”, e decidi fazer a minha primeira T-shirt “EU SOU MÃE DE UM MENINO DA LUZ”. Queria mostrar ao “mundo” o quanto eu sou orgulhosa e grata em ser Mãe de um rapaz, que tem o privilégio de frequentar uma Instituição que é o Colégio Militar há mais de 200 anos. A seguir, naturalmente vieram outras Mães perguntar onde eu tinha arranjado a t-shirt…

e assim, decidi criar uma marca, que começou não só com as” t-shirts/sweats” para o Colégio, como também me começaram a pedir para fazer para o Instituto de Odivelas. Imaginei a Avenida da Liberdade repleta de familiares vestidos com as “t-shirts/sweats” e mostrarmos ao mundo a nossa união, força e orgulho nos nossos Filhos. A marca tem tido alguma adesão principalmente pelos Antigos Alunos. Respondendo à sua segunda pergunta. Ser Mãe de um Menino da Luz, é ser uma Mãe especial de um Menino/Homem que sabe o que faz, o que quer e para onde vai, respeitando sempre o próximo. Mãe especial, porque temos de ter coragem de abdicar dos nossos Filhos ao nosso lado, em prol de algo maior… é não sermos egoístas e pensarmos primeiro neles e depois em nós. E sim, ele é um verdadeiro Menino da Luz, e eu Mãe de um Menino da Luz. Como costumo dizer em tom de brincadeira, e não me leve a mal: Somos uns iluminados! Martiniano Gonçalves - Tem uma filha com 4 anos. Se tivesse 9 anos encarava a hipótese de a pôr no Colégio Militar? Porquê? Catarina Moutinho - Para ser aluno do Colégio Militar é preciso ter “o” perfil. Não acho que todos o tenham. Embora a Inês me diga muitas vezes que quer ir para o colégio do mano, não me parece que tenha “o” dito perfil. “Porque não posso vir para a escola do mano?” No início explicava que não podia, porque era uma escola só de meninos. Até que um dia a Inês vê uma menina e me diz, com um grande sorriso: “Olha Mãe, uma menina, agora já posso vir para aqui também, vês?!” Mas no caso da Inês, que até eventualmente poderia vir a frequentar o ensino básico do Colégio, não é neste momento opção. Acho que é um ciclo que tem de ser mais amadurecido a todos os níveis, seja a nível pessoal como ao nível do projecto educativo. Mas é com orgulho que digo, que a minha Filha, aos 3 anos, já cantava o Hino Nacional nas Cerimónias do Colégio, e que vive o Colégio de uma forma muito engraçada, conhecendo muito bem os amigos do Manuel quer pelo nome, como pelo número. Para além de ter ensinado os colegas da escola a estarem formados e a marchar!

Manuel e Inês numa 3o Feira de visita.

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O Colégio Militar no Futuro, no Passado e no Presente

Luís Miguel da Costa Alcide d’Oliveira 163/1952

O Colégio Militar no Futuro, no Passado e no Presente. O problema que de facto preocupa todos os Antigos Alunos, (e é a eles que me dirijo), é o Futuro do Colégio Militar. Preocupa-nos no fundo por duas ordens de razões. Uma é a natural repulsa pelo atentado ao bom senso, à justiça e ao próprio sentido da Pátria que consiste em arrancar uma árvore que sempre deu tão bons frutos, ainda por cima, digo eu, para dar espaço para plantar um imenso joio que vemos alastrar um pouco por toda a parte. Essa repulsa é especialmente dolorosa porque fomos justamente educados no culto dos valores que a eventual destruição do Colégio ajuda também a destruir. A outra razão é por ventura ainda mais importante. É que nós amamos o nosso Colégio, no qual vemos uma espécie de “raison d´être” que dá um especial sentido às nossas vidas. Para lidarmos com este problema temos que perceber por que razão ele nasceu. Nunca notei que o meu Pai, também antigo aluno, e a gente do seu tempo, tivesse a mínima preocupação a este respeito. Então o que é que aconteceu de novo? Uma resposta simples e muito divulgada é que o Ministro, ou os políticos em geral, são os sinistros responsáveis pela situação que hoje se vive. Com a consciência de me estar a tornar impopular acho que não é por aí que as coisas se resolvem. A “fulanização” não funciona. Não conheço o Ministro, e só o vi uma vez, em que ele foi a uma Abertura do Ano Escolar, fazer

um discurso em que disse duas coisas. A primeira foi que uma Escola com mais de dois séculos e que deu tantos servidores ilustres à Pátria, desde heróis a intelectuais do nível mais alto que Portugal tem produzido, deve continuar a sua acção. A segunda, foi que os tempos mudam e que por isso o Colégio precisa de acompanhar o curso da História. Tanto eu como os muitos antigos alunos que o foram ouvir e com quem falei, considerámos o discurso sensato e uma resposta positiva às inquietações que se vinham adensando de alguns tempos a essa parte. É claro que presumimos que a adaptação aos tempos se referia à forma e não conteúdo. É que de facto há duas maneiras de destruir o Colégio, como de resto a AAACM tem enfatizado: o encerramento e a descaracterização. Não há indícios de que o encerramento aconteça. Antes pelo contrário. O perigo é pois a descaracterização. Será esse o Futuro? É altura de visitarmos o Passado, para tentar responder à questão que agora se impõe: o que é que “caracteriza” o Colégio Militar? Por outras palavras: o que é que o torna único, diferente dos outros estabelecimentos de ensino? Para mim as características mais relevantes são as seguintes: 1. Ter nascido de um acto generoso, fraterno e visionário. O Marechal Teixeira Rebelo e os Oficiais que a ele se juntaram para educar os filhos dos mi-

litares ausentes marcaram o Colégio de uma forma indelével, que ainda hoje o distingue das organizações criadas com vista ao lucro ou ao cumprimento de um imperativo mais ou menos burocrático. 2. A vivência pelos alunos de valores, não só os geralmente chamados “valores militares”, como a disponibilidade para defender a Pátria ou a lealdade, mas também valores cívicos que remontam por ventura à data da fundação do Colégio, como a Liberdade, a Fraternidade e a Igualdade. O facto de desde o primeiro dia os alunos usarem uma farda e estarem sujeitos às mesmas regras, apaga as diferenças associadas à riqueza, ao nascimento ou à raça. 3. Uma certa identidade de valores educacionais adquiridos na Família, normalmente militar, mas também reconhecíveis nos filhos de pais civis que, pelo simples facto de terem escolhido para os filhos uma educação enformada pelo ambiente militar, tacitamente os aceitavam. 4. Um sentimento partilhado de orgulho e de responsabilidade por pertencer a um Colégio que formou tanta gente ilustre. Basta assistir a um desfile do 3 de Março para ler isso na expressão de cada “Rata”. 5. A vivência de um ambiente escolar disciplinado e com regras claras, onde o estudo é acompanhado.


O Colégio Militar no Futuro, no Passado e no Presente

6. Um programa educacional muito completo, em que a componente de desembaraço físico tem uma grande relevância. 7. Aquilo que eu, à falta de outro nome mais adequado, chamarei de “experiência precoce de cidadania”, decorrente do facto de o Batalhão ser comandado pelos alunos mais velhos, o que induz o sentimento de “pertença ao grupo” e a interiorização das obrigações e dos direitos daí decorrentes. Estão talvez criadas as condições para pensar no Presente. As perguntas que naturalmente ocorrem são três: • Será que este tipo de edução ainda faz sentido? • Será que algumas das características diferenciadoras estão ameaçadas? • Será que é necessário modificar alguma coisa? Será que este tipo de edução ainda faz sentido? Esta é talvez a questão mais difícil. O Mundo está num processo de mudança tão acelerado que ninguém pode predizer com razoável aproximação que tipo de formação é a mais adequada para as pessoas agirem com sucesso, chamemos-lhe assim, daqui a 10 anos. Desde a área profissional, à relacional, passando pelo mesmo pelo equilíbrio psicológico. Parece pois sensato recusar soluções educacionais muito datadas ou muito optimizadas para o curto prazo. A sobrevivência bem sucedida é, neste contexto, um crédito muito relevante. Tem naturalmente a ver com a solidez da aposta em valores perenes e uma capacidade de adaptação ao mundo e ao “outro”. Neste capítulo, o Colégio dificilmente recebe lições seja de quem for. Será que algumas das características diferenciadoras estão ameaçadas? Esta segunda pergunta necessita de uma análise que ultrapassa o âmbito das presentes reflexões. Referirei apenas três questões: • A sustentabilidade económica, que é sem dúvida um requisito incontornável, exerce uma permanente pressão na gestão da coisa pública, o que, quando se trata de “investimentos” em áreas tão importantes e de longo prazo, como é o caso da formação das futuras gerações, tende a favorecer abordagens uniformes que desfavo-

recem “nichos educacionais” mesmo excelentes. A massificação, que parece ser uma tendência em muitos domínios, conduz facilmente ao chamado “cinzentismo” que é uma ameaça a tudo aquilo que é diferente, sobretudo se for diferente para melhor. • O ambiente familiar modificou-se muito em muito pouco tempo, no sentido de uma menor disponibilidade dos pais para acompanharem os filhos desde tenra idade. A Escola vê-se na necessidade de ultrapassar as consequências de um ambiente permissivo e contraditório, em que direitos e obrigações se contrapõem em vez de se harmonizarem e complementarem, como é indispensável à sua própria existência. • A ameaça mais grave, do meu ponto de vista, é a destruição do Batalhão Colegial, da sua orgânica e da sua insubstituível acção formativa. Essa destruição, mais do que qualquer outra coisa, atinge o Colégio na sua essência. Os factores de risco são de vária ordem, com relevância para os seguintes: • Enfraquecimento progressivo do ambiente militar que enforma o Batalhão Colegial, como consequência de uma desvalorização das Forças Armadas a nível nacional. • Bloqueamento dos mecanismos indispensáveis ao exercício de Comando por parte dos graduados, a pretexto de ele ser violento ou repressivo. • A existência de um número expressivo de alunos externos. • Uma estratégia errada na incorporação das raparigas. Será que é necessário modificar alguma coisa? Quanto à terceira e ultima pergunta, a resposta, no meu entender, é “sim”. Continuando o modo esquemático e resumido que tenho seguido, refiro as seguintes acções: • Obviamente, acautelar as ameaças atrás referida e outras que surjam, através de uma monitorização permanente acompanhada de uma avaliação competente e despreconceituosa. • Corrigir os impedimentos a um posicionamento do Colégio no topo dos “rankings”, tão valorizados pelos Pais e pelas instituições, e com reflexos fortes no recrutamento de novos alunos. O ambiente disciplinado que é apanágio do Colégio, é um trunfo muito relevante no aprovei-

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tamento escolar, mormente na fase difícil que o País atravessa na área educativa e que foi muito bem caracterizada no título de um livro famoso de um antigo ministro, referindo-se à indisciplina escolar: “O difícil é senta-los”. A acção efectiva de um Director Escolar competente seria muito vantajosa. • Apoiar a Formação dos Graduados, no sentido de os ajudar na sua difícil acção de comando sem instrumentos disciplinares formais. • Valorizar o acompanhamento psicológico dos alunos que por qualquer razão se revelam desconfortáveis no ambiente colegial. • Dinamizar iniciativas, por exemplo na área desportiva, que fortaleçam o espírito de corpo, com reflexos na promoção do Colégio na Sociedade civil. • Utilizar Oficiais e Sargentos fora do Serviço Activo, designadamente antigos alunos, que sirvam o Colégio sem preocupações de carreira, com disponibilidade e entusiasmo, na linha das actuais preocupações de estender a vida útil dos cidadãos. Defender o Futuro do Colégio passa pela percepção do essencial do Projecto Educativo que ele consubstancia. Do ponto de vista aqui apresentado, ele assenta na aprendizagem de valores morais e cívicos adquiridos através da vivência em grupo, no quadro da disciplina militar que enforma o Batalhão Colegial, adaptada à idade dos alunos e às circunstâncias que a experiência e o correr dos tempos recomendam. A valorização deste Projecto Educativo deve ser a base de partida para as diferentes formas de o concretizar. Na fase em que se encontra o Processo, uma monitorização contínua, uma reflexão inteligente e atempada que se concretize em acções oportunas são o método mais eficaz de garantir esse futuro.


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Curso de 1965/1972

Curso de 1965/1972 Romagem dos 50 Anos de Entrada 17 de Abril de 2015

Curso 1965/1972 – 50 Anos de Entrada – 17 de Abril de 20151 ©Fotos Leonel Tomaz

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omemorando os cinquenta Anos de Entrada, estiveram nesta Romagem de Saudade os Antigos Alunos António de Calça e Pina Duarte Silva (4/1965), José Joaquim Duarte Silva Lupi (9/1965), Francisco José Petrucci Guterres da Fonseca (13/1963), Luís Filipe de Almeida Correia Teixeira (26/1965), Francisco Manuel de Almeida Correia Teixeira (31/1965), João Manuel Franco Fernandes Santana (35/1965), Francisco Manuel Carvalhosa de Matos Silva (52/1965), José Luís Rocha Pereira do Nascimento (57/1965), João Nuno da Silva Serra Pereira (68/1965), José Eduardo da Silva Ferreira Leite (79/1965), Eduardo Marques Ferreira dos Santos (88/1963), Febo Nuno de Oliveira Vargas de Matos (93/1965), António Alexandre Castanheira Coelho (94/1965), Mário José Ferreira Barbosa (96/1965), José Manuel da Silva Pereira (97/1965), José Carlos Costa da Silva Rosa (108/1965), Miguel Joaquim de Quintanilha Torres Magalhães (111/1965), Mário Jorge de Sousa Lapido Lourenço (114/1965), Luís Manuel Duarte Vilhena de Mendonça (117/1965), Luís Carlos Fonseca Mourão da Costa Campos (118/1964), Nuno José Reynolds Telles Pereira (125/1964), Rui António Silvestre Duarte (138/1965), José Nuno do Rosário e Silva Leitão (153/1964), João António Feio Perei-

ra (57/1964), Manuel António dos Santos Madeira Lopes (158/1963), Luís Jorge Rodrigues Semedo de Matos (165/1965), José Manuel dos Santos Carvalho (167/1965), Carlos Manuel Monteiro Salgueiro Rego (174/1965), Luís Filipe Dias da Silva Castela Jacques (180/1965), José Manuel de Sousa Alves de Sá (181/1965),

Helder Manuel Dias Agrely Rebelo (190/1964), José Luís de Mendonça Mergulhão (191/1965), Fernando de Andrade Ramos (193/1965), Luís Alberto de Brito Correia de Matos (196/1965), José Manuel Machado dos Santos (200/1965),

Paulo Maldonado Coutinho (201/1964), Jorge Manuel Martins Casaca (207/1965), João Pedro Rodrigues Ferreira Quaresma (213/1965), António Pedro Gaspar Botelho Neves (215/1965), João Francisco Bastos de Teixeira Chaves (220/1965), Frederico Manuel Petrucci Guterres da Fonseca (232/1964), João Pedro Leal Barroso Hipólito (256/1965), José António da Costa Limão Gata (263/1965), António Ramos Pinto Teodósio (266/1965), António José de Almeida Ferreira Novo (273/1965), Joaquim Manuel Almada de Oliveira (278/1965), Luís Manuel dos Santos Fernandes (282 /1965), Rogério de Mesquita Pinto Ribeiro (283/1964), Fernando Henrique Matoso de Menezes Falcão (295/1965), Nuno António Pimentel Lopes dos Santos (298/1965), Manuel Luís Moreira Rato Rós (304/1964), José Augusto Castelhano Nunes Egreja (305/1965), Luís Filipe Júlio Ferrand de Almeida (312/1965), Miguel Ângelo Wang Acciaioli Tamagnini (353/1963), Luís Augusto Severo Teixeira Pinto (359/1965), João Manuel Porto Silva Frade (362/1963), António Carlos da Palma Estanislau (376/1964), Luís Alberto de Lacerda Morais (387/1965), António José Cecílio Gonçalves (397/1964), Carlos António do Lima Duarte Ferreira (398/1964), Joaquim Paleta Marreiros (413/1965), João

1 A fotografia do Curso foi feita junto da Chama Colegial e do Monumento dos 175 Anos, na Parada Marechal António Teixeira Rebelo, devido às obras de consolidação das guardas da Escadaria da Enferma.


Curso de 1982/1990

Jorge Marques de Oliveira Dores (418/1965), José Joaquim Ferreira dos Santos Tavares (433/1965), José Manuel de Paiva Fragoso e Almeida (434/1965), José António Breda Marques da Costa (445/1965), Rui Pedro Carreira Mendes (450/1965), José Sassetti Ramada Curto (451/1965), António José de Magalhães Silva Cardoso (455/1965), João Pedro Beregovoy de Abreu Pimenta (461/1965), João Mesquita de Faro Viana (463/1965), João Manuel Simões de Carvalho (464/1964), João António Guimarães Serôdio (467/1965), Fernando

Alberto Carvalheira Fernandes (475/1965), Manuel Filipe Gomes Marçalo (478/1964), António José Monteiro Afonso (479/1964), José Manuel Pais Sampaio (483/1965), José Pedro Duarte Lupi Fialho (515/1967), Carlos Eduardo Madail Manitto Torres (518/1965), Francisco José Dias Remédio (526/1965), José Paulo da Franca Sousa Ferro (528/1965), Rui Jorge Homem Bellino Morais de Sousa (541/1965), Mário Manuel Godinho Simonetti (544/1965), Pedro Manuel dos Santos Guimarães de Carvalho (549/1965), Rui Manuel dos Santos Guimarães

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de Carvalho (551/1965), José Celestino Arnaut Monroy (573/1965), António Cabral de Campos Felino (577/1965), José Dias da Silva Castela Jacques (589/1964), Pedro Baptista Esteves Virtuoso (616/1967), João Manuel de Faria da Conceição Marques (617/1965), Luís Manuel Matafome Lourenço Ferreira (625/1967), Luís Lavadinho Telo da Gama (628/1966).

Curso de 1982/1990 Romagem dos 25 Anos de Saída 10 de Abril de 2015

Curso 1982/1990 – 25 Anos de Saída – 10 de Abril de 20151 ©Fotos Leonel Tomaz

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pós vinte e cinco anos da sua saída, estiveram presentes nesta Romagem de Saudade os Antigos Alunos Rui Miguel de Sousa Ribeiro Rebordão de Brito (1/1982), José Ricardo Nazareth de Carvalho Figueira (17/1981), João Eduardo Castro e Campos de Brito Subtil (45/1983), Pedro Gonçalo Coelho Nunes de Melo (51/1982), António Carlos Pires Martins (85/1983), Rui Nuno Anciães da Silva (101/1982), Carlos Alexandre da Fonseca Pires (141/1982), João Rui Baptista Ferreira (155/1981), Alexandre Manuel Pegado Ferreira Fernandes (204/1983), Paulo Miguel Leão Monteiro Napoleão Fernandes (211/1982), Luís Ricardo da Silva e Costa Roncon Santos (226/1981), Nuno

Miguel Pereira Domingues de Figueiredo Carvalhosa (230/1982), Vasco Maria Tavela de Sousa Santos Pinheiro (254/1982), Luís Miguel Cabral de Sousa Aragão (271/1982), Vasco José Ribeiro Pinto Elvas (290/1982), Rui Pedro Nabais Nunes Ferreira (300/1982), Nuno Manuel Macias Gomes dos Santos Roldão (320/1981), Nelson Manuel Machado Lourenço (377/1982), António Mucharreira Azeredo Lopes (378/1981), Rui Pedro Azevedo da Silva (379/1982), Miguel de Oliveira Baptista Geraldes Freire (380/1981), Nuno Miguel da Silveira Pires Fernandes (381/1982), Sérgio Joaquim Raposo Filipe (389/1982), Daniel Jorge Boavida de Bastos Moreira (391/1982), Francisco José Rodri-

gues Aidos (398/1982), Pedro Miguel Vieira Dias (399/1982), Rui Pedro da Fonseca Cunha e Martins de Almeida (400/1982), Daniel Cabrita Alves Pires (406/1982), Rui Manuel Cabral Cabrita Coelho (407/1982), Ma-


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Curso de 1987/1995

nuel Albertino Nunes Carrilho (409/1982), João Pedro Pires Martins (416/1982), Francisco José Costa Marcos do Nascimento (418/1982), Rui Filipe Resende Melo Coelho de Moura (419/1982), Luís Miguel Ferreira

Morgado (421/1982), Nuno Alexandre Sousa da Silva Santos Lopes (422/1982), Nuno Miguel Spencer Salomão de Abreu (423/1982), Eugénio Miguel de Melo Azemel Zeferino Pereira (424/1982), José Manuel Barroca

Gomes (426/1982), Pedro Miguel Alpoim e Marques (433/1982), Alexandre Manuel de Moura Teixeira Vieira (482/1983).

1 A fotografia do Curso foi feita junto da Chama Colegial e do Monumento dos 175 Anos, na Parada Marechal António Teixeira Rebelo, devido às obras de consolidação das guardas da Escadaria da Enferma.

Curso de 1987/1995 Romagem dos 20 Anos de Saída 27 de Abril de 2015

Curso 1987/1995 – 20 Anos de Saída – 27 de Abril de 20151 ©Fotos Leonel Tomaz

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inte anos depois, nesta Romagem de Saudade, estiveram presentes como convidados os Professores José João Machado Carneiro Brito, Mário Garcia Carmo, Pedro Araújo Soares e os Antigos Alunos Rui Tiago Coutinho de Paiva e Pona (4/1987), Ricardo Alberto de Sousa Ribeiro Rebordão de Brito (8/1987), Nuno António Panaças Vilhena (14/1987), Alberto João Gomes Xavier de Brito (25/1987), Tiago Manuel da Gama Barros (49/1987), Miguel Alexandre Trindade de Miranda da Conceição Santos (83/1987), Jacinto João Rodrigues Aidos (86/1987), António João Alves de Campos (95/1987), Sérgio Paulo Macedo Alves (108/1987), Rui Pedro Pinheiro da Fonseca (123/1987), Pedro Ferreira do Amaral Ribeiro Laia (156/1987), Rodrigo Filipe dos Reis e Rosa

Rodrigues (162/1987), Tiago Simões Baleizão (200/1987), Pedro Queiroz Antão (202/1987), Pedro Miguel Domingues Pires (206/1987), Rui Gonçalo Pires Pintado (245/1987), Eduardo Hélder de Almeida Pinto Filipe (319/1987), Luís Manuel Nunes de Matos (324/1987), Carlos Jorge Rodrigues Valdrez (354/1987), Nuno Gabriel Barbosa Amado Lopes da Silva (376/1987), Pedro Alexandre Fernandes da Ponte (386/1987), Jorge Miguel Gomes Gonçalves (387/1987), João António da Silva Lopes Bordalo Matias (395/1987), Pedro Manuel Paulo Pontes (408/1987), Frederico João Pereira Veloso (425/1987), Mauro Filipe Romeiras Dias (467/1987), David Miguel Bramão Pais de Abrantes (477/1987).

1 A fotografia do Curso foi feita junto da Chama Colegial e do Monumento dos 175 Anos, na Parada Marechal António Teixeira Rebelo, devido às obras de consolidação das guardas da Escadaria da Enferma.


212º Aniversário do Colégio Militar

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João José Brandão Ferreira Oficial Piloto Aviador

O 212º Aniversário do Colégio Militar 1

“É assim que, por mais que espíritos desorientados tenham querido obliterar as tradições d’honra do Exército, a profissão entre todas, nobre, foi, é, há-de ser sempre, a militar...” Mouzinho de Albuquerque

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aso não tivéssemos presenciado, teríamos percebido pelo silêncio da Comunicação Social, de que as cerimónias comemorativas do aniversário, em título, tinham corrido bem. Mas fomos a algumas das muitas iniciativas levadas a cabo, com as quais a Direcção do Colégio e a Associação dos ex-alunos fazem gala em comemorar o evento. De facto no passado dia 8 de Março (apesar do aniversário ser a 3) entendi ir vivificar o corpo e retemperar o espírito: fui visitar outro país que ainda existe dentro do meu país. Um “país” que não passa a vida a fazer greves; que não exige direitos, sem os deveres correspondentes; que não se dilacera partidariamente numa “guerra civil” permanente; onde as recomendações da Comissão Nacional da Educação ainda não se aplicam; onde não existem “direitas” nem “esquerdas”, onde a corrupção não impera, etc., e onde se trabalha naturalmente, tentando fazer melhor amanhã do que hoje. Apesar - é de realçar - dos disparates ministeriais avulsos, acompanhados da aparente 1

demissão de algumas chefias militares, relativamente à defesa institucional dos Colégios Militares, cujo exemplo mais grave tem a ver com o criminoso encerramento do centenário Instituto de Odivelas. Chefias militares que se olvidaram de que são os descendentes e herdeiros dos antigos Condestáveis da Nação. A estas cerimónias, sobretudo ao desfile do Batalhão Colegial, na Avenida da Liberdade e à Missa, em S. Domingos, deveria assistir todo o Parlamento. Só lhes fazia bem lobrigarem o garbo imperturbável daquele “Corpo de Alunos”, desfilando avenida da Liberdade abaixo – eles que são um garante da nossa liberdade, presente e futura; a camaradagem esfuziante dos ex-alunos, saudosos dos tempos passados; o entusiasmo das famílias e amigos e à alegria de todos - até os turistas que passam ganham um bónus extra, ficando de olhos esbugalhados a olharem para o que se passa! Seguramente que a maioria dos nossos deputados não entenderia muito do que, por

Texto reproduzido na ZacatraZ por amável deferência do seu Autor.

graça de Deus, lhes seria dado ver, mas estou certo que não se lhes negaria a caridade das explicações necessárias. Talvez ganhassem uma nova postura quando regressassem ao Parlamento… Verificariam que a cerimónia começou a horas, que o cerimonial é tradicionalmente mantido segundo das regras da ordenança, e também vislumbrariam aqui e ali, cidadãos que apanhados no meio dos eventos, não se sabem comportar perante uma formatura militar nem respeitam os símbolos nacionais, neste caso a bandeira e o hino, não mantendo uma atitude respeitosa em face deles. Ora respeitar os símbolos nacionais é dever de todos, onde não se aplica o livre alvedrio e que deve estar sujeito a sanções adequadas. Um âmbito que devia constituir especial interesse para a agora chamada “Casa da Democracia”. E é o Estandarte Nacional com a divisa camoniana “Esta é a ditosa Pátria minha amada”, à guarda do Colégio Militar – por sinal um dos mais condecorados do país – que rompe


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212º Aniversário do Colégio Militar

a marcha aos ombros do aluno nº198/2007, José Pedro Ribeiro Gomes, a quem foi confiada essa Honra. Honra extensiva a todos os Alferes Porta-Estandarte, das Forças Armadas Portuguesas e que representam a “reencarnação” actual de Duarte de Almeida, “o Decepado”, porta-bandeira na Batalha de Toro, em 1 de Março de 1476, que golpeado sucessivamente, lutou heroicamente, para evitar que o sagrado símbolo lhe fosse sacado ou derrubado. Desde então que, aos sucessores na função, lhes é relembrado este exemplo. Assim deve continuar a suceder. Exemplo que, aos deputados da Nação, que supostamente representam o povo português, deve merecer, também, ponderada meditação. É certo que o alinhamento das diferentes companhias de alunos não foi perfeito, quiçá milimétrico, como nas paradas orientais. Mas tem que se ter em conta que não estamos a falar de profissionais, nem tão pouco aqueles marcham em fileiras abertas com frente de seis…

Concedo que não conseguia ver reflectida a minha cara no lustro de todos os sapatos dos uniformes, mas levo isso à conta da cada vez mais diminuta verba distribuída às FA, o que já se deve reflectir na falta de escovas e na graxa; mas já me preocupa o ter vislumbrado alguma ferrugem em muitas baionetas. Afinal nós nunca sabemos quando vamos precisar delas! Enfim, e numa palavra, continua a ser a unidade militar que melhor desfila em Portugal (bom, a Academia Militar, no meu tempo, fazia-lhes concorrência…)! Encerra a formatura a “Escolta” a cavalo, em galope curto – o clímax do evento. Salienta-se que esta “Escolta”, juntamente com a “Reprise” de Mafra, o ensino de equitação na Academia Militar e o Ex-Regimento de Cavalaria (recuso-me a soletrar o novo nome que lhe deram), da GNR, são o que resta de todas as tradições equestres do Exército Português… Muitas mentes questionam-se se lidar com armas é próprio para menores.

Poderia responder simplesmente que, sendo o Colégio Militar, uma unidade militar, não faria sentido algum que o uso de armamento estivesse afastado do seu quotidiano; mas não quero deixar de defender que tal “convívio” só lhes faz bem, pois desde novos aprendem a usar e a respeitar uma arma, tendo o enquadramento, a disciplina e a instrução adequada para tal. Por último, aprendem a utilizar as armas no sentido do Bem, pois as armas não são em si, boas ou más: a mão que as manuseia é que o pode ser! O Batalhão destroça no Largo de São Domingos e, enquanto os acompanhantes se quedam em algazarra, confraternização, gritos de “Zacatraz” e alguma ginjinha, as cerimónias prosseguem na nunca reconstruída, mas lotada, Igreja de S. Domingos, onde casaram reis e de onde se contempla Lisboa desde há sete séculos. Presidiu o novo Bispo das Forças Armadas e de Segurança, D. Manuel Linda, a quem saúdo, nesta primeira aparição pública que presenciei e em que esteve feliz, por abordar na sua homilia temas importantes de forma equilibrada. Também, por seguramente ter tido uma agradável surpresa com o que, por mercê do Senhor, lhe foi dado presenciar. A missa acaba por ser uma mistura de cerimónia religiosa, de acção de graças, adornada de todo o cerimonial militar correspondente, à mistura com um toque distintivo da matriz cultural da grande família colegial. De tudo resultando o encontro de gerações, a renovação com a perenidade; a plenitude da alma, a unidade telúrica de um todo. O Colégio Militar – os colégios militares – são pois Instituições verdadeiramente nacionais, que formam portugueses, nos diferentes níveis do seu ser. São seiva da Nação e, se não estiver enganado, poderemos vê-los sempre na linha da frente, ou na derradeira linha da Defesa e desenvolvimento do País. Não é pois de estranhar, que os queiram deitar abaixo… Parabéns por mais um aniversário. E contem muitos, pois enquanto existirem Portugal vai ter alguma dificuldade em desaparecer.


Colégio 2015

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Roberto Ferreira Durão (15/1942)

Colégio 2015 212 Anos! Parabéns Colégio Militar... 3 de Março... Aleluia Sempre!

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o dia 7 de Março, de manhã (não foi possível ser mesmo a 3), nos Claustros, repletos de gente por todo o lado, pelas varandas superlotadas, quase que "até à cúpula"... teve lugar este ano o início dos festejos de mais um aniversário do nosso Colégio da Luz. Foi tudo bonito: a formatura impecável de todo o Batalhão (agora misto), armado e enchendo, cá em baixo, os Claustros, frente às altas entidades representativas, a evocação aos mortos com os toques de silêncio e alvorada e culminando com o curto mas brilhante desfile no qual as raparigas só se distinguiam dos rapazes pelos curtos rabos de cavalo. O brio e aprumo era igual em todos. Lá fora, na rua, os entusiásticos e vibrantes Zacatraz, acompanhando a marcha, da "malta", em especial os mais jovens antigos alunos que seguiu depois em cortejo atrás do Batalhão.. Manhã de sol estival, ardente! Durante a longa espera dos alunos formados nos claustros, alguns desmaiaram como, por vezes, também, no meu tempo, acontecia (agora mais). Uma enfermeira que socorria os que caíram, cansados, cerca de 20 disse-me que de entre eles foram mais os rapazes do que as raparigas. Isso me deixou algo perplexo, confesso, mas só veio demonstrar que as raparigas, quando querem, têm tanto ou mais capacidade de sacrifício e determinação do que os próprios rapazes. Foi a pensar nisto e noutras coisas, nomeadamente na injusta medida de acabarem (ou quase?!...) com o Instituto de Odivelas,

prestigiada Instituição de ensino mais que centenária, que fui almoçar à Parreirinha de Carnide com muitos dos antigos professores do meu tempo. Também servi no Colégio 22 anos, como mestre de Educação Física (juntando a esses anos (1976 a 1998), 2 anos de comandante do Corpo de alunos (1971/1972) os 7 de aluno (1942/1949) soma 31 anos que se pode considerar metade de uma vida. Nesse almoço, concorrido e animado, li esta breve mensagem para todos os presentes e ausentes. No meio de toda uma algazarra de alegria e confraternização tive de puxar por toda a energia e poesia que ainda guardo cá dentro e para que me ouvissem todos acabei por ficar rouco. Eis o que disse em breve poema a que chamei a Toada dos Mestres:

«O professor ensina, mas o mestre aprende» Eis de Aristóteles a melhor Teoria... Mas outra voz nos dignifica e prende: -Sê mestre na Ciência e na Poesia. Pois casando-se a Arte com a Ciência Se encontraria a mais sublime união... E assim, em nós, nasceria a Sapiência Da Humildade a florir na nossa mão. No silêncio dos Claustros sagrados, Não morremos, ficámos gravados: Ensinar-aprendendo, talvez, Eis um dom que aprendi com vocês Alunos somos todos nós Somos Povo, um Destino, uma Voz Que só busca o Saber no encanto De ofertarmos da Esperança o seu Canto!

Temos dúvidas, fé e cansaço Mas erguemos, convictos, o braço, Ensinar o Caminho aprendendo A sabermo-nos dar, oferecendo O que temos ou Somos, a Esperança De que o mundo se esquece e se cansa. Nunca sós, percorremos a estrada Da Cultura, na Pátria sonhada. Só colhemos os louros de sermos Professores e Aprendizes, mais nada! No dia seguinte (8 de Março) teve lugar o exemplar e tradicional desfile pela Avenida da Liberdade. Foi magnífico! No final a Missa em São Domingos e na qual o Bispo das Forças Armadas (Dom Manuel Linda), fez um Homilia notável, na linha do nosso Papa Francisco. Referiu-se a São João de Deus e frisou que o dia 8 era também o dia da Mulher que tem um papel importante na sociedade, em termos de humanismo e alto sentido de fraternidade, justiça e honestidade, salientou também a necessidade de se construir um elevado sentido de liderança justo e correcto contra a ganância, corrupção, hipocrisia e radical fundamentalismo ou fanatismo que assola este mundo. Das suas sábias palavras extraí esta passagem que me sensibilizou muito: «Jovens rapazes e raparigas, felicito-vos neste dia dos 212 anos do Colégio Militar que tendes a honra de frequentar. Hoje a Avenida da Liberdade foi curta para vós face à galhardia e brio com que desfilastes. Conservai e alimentai sempre em vós, como um desafio, esse anseio nobre e elevado de uma Liberdade vivida com Responsabilidade e nunca percam a Esperança


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Confraternização do 3 de Março

num Futuro para o qual podereis desempenhar pela vossa generosidade e sentido de missão um papel de grande valia.» Ao fim do dia deu-se o tradicional jantar do "amarelo" da "malta" de todas as idades e cursos que passaram por este Colégio e que

nunca esquecerão os anos que nele viveram e os Valores que esta Casa lhes ensinou. Apenas sinto uma leve tristeza por me parecer (estarei enganado?...) que os meios de comunicação social, nomeadamente a televisão, não deram o devido relevo a este evento.

E também a ausência de membros do Governo. Mas bem depressa venço esse sentimento ou simples percepção (é ano de eleições...) pois teimo em não deixar morrer em mim a Esperança e Fé em dias melhores.

Confraternização do 3 de Março 3 de Março na Madeira

3 de Março na Guarda

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omemorando o 212º Aniversário do Colégio teve lugar no dia 4 de Março, no Funchal, um jantar de confraternização em que estiveram os seguintes Antigos Alunos: Rui Alexandre Carita Silvestre (115/1956), Francisco Manuel Geraldo de Faria Paulino (265/1956), António José Oliveira Marques de Abreu (599/1967), Frederico Manuel Resende Alves Martins (188/1973), Nuno Bettencourt Sardinha Portela Ribeiro (396/1976) e Marco Paulo Pereira Nunes (192/1987).

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pesar das distâncias que é preciso percorrer no interior do país para um encontro de convívio, houve quem, a viver nas Beiras, tivesse viajado até à Guarda para festejar o 212.º aniversário do Colégio Militar. Algumas desistências de última hora reduziram a seis o número de convivas, mas as horas passadas à volta da mesa e na conversa permitiram recordar os tempos passados no Colégio, com a particularidade dos presentes, terem estado, quase todos, ao mesmo tempo nos claustros. Isso permitiu recordar histórias, momentos e professores, que nos marcaram e que ficaram para sempre nas nossas memórias. O convívio foi tão bom que aqueles que vivem nas Beiras agendaram, desde já um jantar de Natal, para 12 de Dezembro, aberto a todos quantos queiram participar. Este jantar contou com a presença dos seguintes Antigos Alunos António Carlos de Lemos Lepierre Tinoco (500(1959), Manuel Pedro da Costa Pereira Roriz (519/1959), Eduardo Manuel Saraiva Henriques de Oliveira (113/1960), Manuel Filipe Gomes Marçalo (478/1964), Luís Filipe Júlio Ferrand Almeida (312/1965), Vasco Júlio Morão Teixeira Lino (300/1966).


Confraternização do 3 de Março

3 de Março em Moçambique

3 de Março no Porto

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omemorando o 212º Aniversário do Colégio realizou-se, na Casa do Peixe (Maputo), um jantar de confraternização em que estiveram os seguintes Antigos Alunos: Manuel Ferrão de Castelo Branco (384/1954), Luís Ernesto Albuquerque Ferreira de Macedo (8/1957), Mário Rui Cardoso Belo de Carvalho (314/1961), Vítor Manuel Patrício Corrêa Mendes (524/1963), Alexandre da Silva Pereira Duarte Silva (19/1965), Rui Caseiro Viana (204/1966), Nuno Cid da Costa Álvares (421/1966), Luís Jorge Fialho de Oliveira Martins (600/1966), José Eduardo Almadanim do Vadre Santa Marta (212/1967), Pedro Baptista Esteves Virtuoso (616/1967), Paulo Jorge Lino da Gama Pombeiro (308/1968), Vasco José Duarte Raposo (332/1971), Miguel Nuno do Rego Barreto de Almeida Bruno (235/1973), Luís Humberto Paulo Marinho Falcão (330/1974), Jorge Manuel Macias Gomes dos Santos Roldão (493/1974), José Pedro Freitas Pereira da Silva (285/1980), Pedro Eduardo Laboreiro Risques da Costa Ferreira (304/1981), Luís Filipe dos Santos Paulo Antunes (73/1982), Marco Bruno Soares da Cruz dos Santos (243/1984), Nuno Alexandre de Jesus Afonso (394/1984), Nuno Carlos de Jesus Gomes (220/1985), Pedro José Nunes Pereira David Pereira (286/1985), Jorge Miguel Afonso Marques (119/1986), Luís Miguel Lauret Albuquerque Ferreira de Macedo (7/1988), Nuno Miguel Tavares Corrêa Mendes (39/1988), João Nuno Rosa Carronda Rodrigues (205/1988), Filipe André Miranda da Silva Pinheiro (438/1988),Paulo Alexandre Alves Gonçalves de Campos (1/1990), Tiago Miguel de Oliveira Dias (435/1990), Nuno Miguel Miranda Santos (102/1992), Joaquim Tobias Dai (125/1993), Cláudio Isaac Ivan Moty Julaia (250/193), Luís Narciso Lopes Rodrigues Morais (253/1993), José Maria Limpo Serra Marques Paixão (296/1995), Higino Sigma José Mateus Katupha (422/1995), Francisco Lourenço de Oliveira Pegado (285/1996), João Nuno Varela Tomé (380/1997), Artur Danilson Pereira Augusto (165/1998).

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omemorando a passagem de mais um aniversário do Colégio, o 212º, realizou-se no Oporto Cricket and Lawn Tennis Club um jantar que contou com a boa organização do Delegado da AAACM, Bruno Pinto Basto Soares Franco (281/1970). Do “caldo verde” e do “amarelo”, bem confeccionados, a par das magnificas instalações, resultou um animado convívio de mais de três dezenas de Antigos Alunos que recordaram o Colégio e os bons tempos que aí passaram na sua juventude. O Presidente da Direcção, António Saraiva de Reffóios (529/1963), deu uma informação sucinta da evolução dos aspectos relacionados com o Colégio na versão actual de misto, respondendo às questões que lhe foram postas. Participaram neste jantar os seguintes Antigos Alunos residentes no Porto e nas zonas limítrofes desta cidade: Manuel José Martins Rodrigues (261/1940), João Manuel Mendes de Araújo (84/1950), José Alberto da Costa Matos (96/1950), José Manuel Simões Ramos de Campos (319/1950), José Faceira Teixeira (234/1952), Raul Manuel Tamagnini Mendes de Carvalho (87/1953), Luís Manuel Ferraz Pinto de Oliveira (138/1954), Rui Carlos Aires Ferreira (314/1955), Francisco Xavier de Barros Cardoso de Menezes (6/1956), Afonso Henriques Mendes de Araújo (31/1958), António Norton de Matos Carmo Pereira (522/1959), Albino Manuel Pereira de Sousa Botelho (342/1961), José António Marques Salgado Lameiras (281/1963), José Manuel Duarte Presa Fernandes (403/1963), Manuel Maria de Castro e Lemos (423/1963), Rogério de Mesquita Pinto Ribeiro (283/1964), António José Mesquita da Cruz (329/1965), Paulo Manuel Ferreira Lobo Fernandes (487/1966), Álvaro Manuel Cruz Cordeiro (48/1967), José Manuel da Silva Pinto dos Reis (100/1967), José Faia Marinha (301/1967), José Carlos Magalhães da Silva Cardoso (604/1967), João Manuel Sanches Roma Moreira Lobo (572/1969), Bruno Pinto Basto Soares Franco (281/1970), Paulo César Alves Bacelar (403/1970), António Jaime Tavares Coutinho Lanhoso (176/1971), Vasco Manuel Felgueiras Ferreira (340/1971), Guilherme Eduardo Lickfold de Novais e Silva (488/1971), Jorge Gentil de Sousa Pinto Faustino (100/1974) e Luís Filipe Pinto Leite (384/1994), a que se juntaram, idos de Lisboa, António José Sousa Valles e Saraiva de Reffóios (529/1963), Presidente da Direcção, Martiniano Nunes Gonçalves (9/1958), Presidente do Conselho Supremo, José Eusébio Pereira Barata Cordeiro de Araújo (591/1973), Presidente do Conselho de Delegados de Curso, Luís Filipe Ribeiro Ferreira Barbosa (71/1957) e Gonçalo Salema Leal de Matos (371/1949), ambos da Revista ZacatraZ.


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Zum Zaravalho

Zum Zaravalho J

osé Galaor Ribeiro, Coronel Engenheiro do Exército Brasileiro, Antigo Aluno do Colégio Militar do Rio de Janeiro, Antigo Presidente da Associação dos Antigos Alunos dos Colégios Militares do Brasil, Sócio Honorário da AAACM, grande impulsionador de laços fraternos entre os Colégios Militares do Brasil e de Portugal, enviou-nos uma explicação do Zum Zaravalho, Brado dos Colégios Militares Brasileiros equivalente ao nosso Zacatraz. Quem teve oportunidade de o ouvir executado de forma marcante em uníssono por muitas centenas de Alunos em Parada, ja-

mais esquecerá o impacto que ele tem. É um Brado muito intenso que nos transmite uma sensação de grandeza e forte determinação. Fica a ecoar nas nossas cabeças durante um tempo indeterminado. Por intermédio do nosso Camarada e Amigo José Galaor foram feitas diligências para obter dos autores, que prontamente acederam com regozijo, a autorização para reproduzir na ZacatraZ os desenhos do Zum Zaravalho e respectiva explicação do seu significado. Com os nossos agradecimentos a José Galaor Ribeiro (1113/1948-CMRJ), a Hugo

Ribeiro (393/1951-CMRJ) e a Maurício Teixeira da Costa (873/1963-CMRJ), aqui fica a história do Zum Zaravalho para conhecimento dos leitores da ZacatraZ.

Gonçalo Salema Leal de Matos 371/1949

Ilustração de Hugo Ribeiro (393/1951-CMRJ) Texto de Maurício Teixeira da Costa (893/1963-CMRJ)


VII Festival dos Estabelecimentos Militares de Ensino

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Luís Filipe Ribeiro Ferreira Barbosa 71/1957

VII Festival dos Estabelecimentos Militares de Ensino A

o longo dos últimos anos têm-se realizado festivais anuais, reunindo os três Estabelecimentos Militares de Ensino, com rotatividade do estabelecimento encarregue da sua organização. Este ano a organização coube ao Colégio, tendo-se realizado o festival no passado dia 20 de Março, no Pavilhão Polidesportivo da Câmara de Odivelas, pavilhão de grandes dimensões, com excelentes condições para receber um evento desta natureza. Há largos anos atrás, os festivais que o Colégio organizava eram festivais de ginástica, em que, para além das classes dos vários anos do Colégio, participavam como convidadas as classes da nossa Associação, da Academia Militar e dos Pupilos do Exército. Esta última era a grande rival da nossa classe especial. Essa rivalidade começou no tempo do Professor Reis Pinto no Colégio e do Professor Robalo Gouveia nos Pupilos, tendo posteriormente o Professor Reis Pinto passado o testemunho ao nosso Dario Fernandes, que ao longo de mais de três décadas levou a classe especial do Colégio a exibições inolvidáveis, tanto no País como no estrangeiro. O baptismo de fogo do Dario deu-se em Setembro de 1965, no Brasil, por ocasião das comemorações dos quatrocentos anos da cidade do Rio de Janeiro, onde se deslocou uma delegação portuguesa, chefiada pelo então Chefe do Estado Maior do Exército, o General Câmara Pina, um autêntico senhor, e composta pelas classes especiais da Academia Militar, de que fiz parte, do Colégio e dos Pupilos do Exército. Exibimo-nos no Colégio Militar do

Rio de Janeiro, no Clube Ginástico Português na mesma cidade e na Academia Militar das Agulhas Negras, sempre com grandes manifestações de agrado por parte das diferentes assistências. A classe do Colégio, preparada à pressão na Feitoria durante o mês de Agosto, não deixou os seus créditos por mãos alheias. Mas tudo isto é outra história, que um dia contarei. Os festivais dos Estabelecimentos Militares de Ensino que nos últimos anos se têm organizado

incluíram também o Instituto de Odivelas e para além da ginástica abrangeram a música, sendo assim mais variados. No festival este ano realizado, contou-se com a participação da Orquestra Ligeira do Exército, que deu uma ajuda valiosa na parte musical, enquanto que na parte da ginástica, se contou com a participação de classes convidadas do Ginásio Clube Português, do Ginásio Clube de Odivelas e da Sociedade Filarmónica União Ar-


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VII Festival dos Estabelecimentos Militares de Ensino

©Foto Renato Oliveira

tística Piedense, que também constituíram um importante reforço. O festival foi apresentado pelo aluno Comandante de Batalhão Francisco José de Jesus Santana Cordeiro de Araújo (591/2007), tendo-se iniciado com um pequeno discurso de boas vindas, proferido pelo Director do Colégio, Coronel Tirocinado José António de Figueiredo Feliciano. Logo de seguida, entraram no pavilhão os guiões do Colégio, de Odivelas e dos Pupilos, tendo sido então entoados os seus hinos, pelos respectivos Alunos e Antigos Alunos presentes, o que deu logo para aquecer o ambiente. Sucedeu-se uma pequena homenagem, prestada pela Direcção de Ensino do Comando da Instrução e Doutrina do Exército, às Associações de Antigos Alunos e de Pais e Encarregados de Educação dos três Estabelecimentos de Ensino participantes no Festival. O Festival teve como tema «Os Colégios Militares no Mundo», o que deu origem à apresentação de projecções, ao longo do espectáculo, relacionadas com as instituições Colégio Militar de Meknes (Marrocos), Valley Forge Military Academy (EUA) Colégio Militar do Rio de Janeiro e Colégio Militar de Porto Alegre (ambos do Brasil), Rashtriya Indian Military College (India), Les Maisons de Education de la Legion de Honneur (França), The Duke of Yorks Royal Military School (Inglaterra) e The Kings School (Austrália). Algumas destas instituições são mais próximas de Academias Militares, não constando haver outra com as características do nosso Colégio, que esperamos que perdure no tempo, apesar do ataque de que tem sido alvo nos últimos anos, por parte de quem tinha obrigação de defendê-lo.

Talvez pelo facto de ser novidade para mim, a parte do Festival que mais me agradou foi a parte relativa à música. Os três Estabelecimentos de Ensino apresentaram não só coros, mas também orquestras. O Instituto de Odivelas, este ano lectivo reduzido ao 9º ano e ao 12º ano, conseguiu ainda assim apresentar um coro muito bem composto e uma pequena orquestra com quatro violinos e quatro flautas, que tiveram um desempenho meritório. O Colégio apresentou o seu orfeão e uma orquestra (reforçada com as meninas vindas de Odivelas) e os Pupilos apresentaram também um coro e uma orquestra. O facto de o Colégio ter agora uma orquestra é algo assinalável e fez-me lembrar os tempos idos, que eu já não vivi, em que o Colégio tinha uma Tuna, do tipo das que agora estão na moda, por esse País fora, nas várias universidades. Uma das coisas que achei engraçadas na parte musical do festival, foi o grande contraste entre as músicas agora tocadas e cantadas e as músicas cantadas pelo orfeão no meu tempo de aluno. Nesse tempo cantávamos, sob a mão firme do inolvidável «Carioca» (maestro Jaime Silva), árias que eram cantadas pelos coros de várias óperas, marchas militares, música sacra para o acompanhamento das missas do 3 de Março, músicas com letra de «Os Lusíadas» e por vezes, para aligeirar as sessões, músicas do nosso cancioneiro popular. O que agora me foi dado ouvir neste festival, foi algo completamente diferente. As meninas de Odivelas começaram por «atacar» com o «Surfin USA» dos Beach Boys, que me ia quase pondo a dançar na plateia. O coro dos Pupilos respondeu com a «Garota de Ipanema», do Vinicius de Morais e do Carlos Jobim, verdadeiras legendas intem-

porais da música brasileira, que me deixou logo a sonhar com aquela «coisa mais linda, mais cheia de graça, é ela menina, que vem e que passa num doce balanço, a caminho do mar». O orfeão do Colégio não quis ficar para trás e depois de ter cantado «Dry your tears Africa», atacou o «Hallelujah» de Leonard Cohen, com um solista com uma bela voz. Na segunda parte do festival, o coro e orquestra dos Pupilos puseram todo o pavilhão a cantar o «Navegar, Navegar» do Fausto, batendo palmas a ajudar a marcar o ritmo da música. O orfeão do Colégio respondeu com o «Sempre Nós», a acompanhar o Gustavo Pinto Basto (227/2000), que veio dar uma preciosa ajuda à função. Seria injusto terminar a referência à parte musical do Festival, sem voltar a mencionar a Orquestra Ligeira do Exército. Foi pontuando o festival, com uma série de intervenções, com um cantor e uma cantora que nos encheram as medidas, deram uma ajuda à pequena orquestra das meninas de Odivelas e em conjunto com o orfeão do Colégio e os coros de Odivelas e dos Pupilos terminaram, em beleza, com o «E depois do adeus» do José Calvário e do Paulo de Carvalho, que terá transportado os mais velhos, em espirito, àquela longínqua madrugada de Abril. Feita a história da parte musical, que foi do agrado geral, vamos à parte da ginástica, em que me sinto mais à vontade para dar uma opinião, na qualidade de antigo praticante, que até hoje vai fazendo os exercícios que o esqueleto ainda permite. Sobre as classes convidadas, direi que a classe do Ginásio Clube Português esteve ao nível dos pergaminhos da Instituição, que teve um papel pioneiro no nosso País e que continua a ter um


VII Festival dos Estabelecimentos Militares de Ensino

papel do maior relevo no panorama ginástico nacional. Quando eu estava no 6º ano do Colégio fomos lá, pela mão do Reis Pinto, fazer uma exibição de saltos de mesa alemã, em conjunto com uma classe do 4º ano, que apresentou um esquema muito bom para a sua idade. As instalações do Ginásio Clube da altura eram muito exíguas e antiquadas, de tal maneira, que a corrida de balanço para os saltos de mesa alemã era feita ao longo de um estreito corredor de acesso ao ginásio, entrávamos a correr disparados na sala, voávamos por cima da mesa alemã e «aterrávamos» nos colchões, que já estavam em parte colocados sob um mezanino, em que se encontrava parte da assistência. Era a chamada «exploração aos limites» das exíguas instalações existentes. Um saltador de categoria que se atrevesse a fazer um duplo mortal, corria o risco de ficar pendurado no corrimão da guarda do mezanino e deixar lá os dentes da frente. Quanto às classes do Ginásio Clube de Odivelas e da Sociedade Filarmónica Artística União Piedense, fiquei agradavelmente impressionando. Fora de Lisboa já se encontram muitas instituições desportivas com trabalho de qualidade. Quanto às classes «militares», tenho de dizer que gostei francamente da classe das meninas de Odivelas. Fiquei agradavelmente surpreendido. Já há anos as tinha visto, na altura sob a orientação da professora Jeni Candeias, e tinham-me agradado. Agora apresentaram um esquema gracioso, correcto e não fácil, actuaram muito bem como um todo e ao mesmo tempo mostraram alguns elementos de real categoria, que poderão ter futuro na modalidade, se assim o quiserem e trabalharem para tal. Os Pupilos apresentaram uma demonstração simples de Takwondo e uma classe especial, muito distante das classes que o Instituto tinha em tempos idos. Não sei o que o Professor Robalo Gouveia pensaria daquilo que nos foi dado ver. Bem sei que as suas classes eram masculinas e esta era mista, o que é uma coisa complicada. Não é por acaso que na ginástica de competição não há mistura de sexos. Se não se consegue uma combinação de grande nível, tirando partido das particulares aptidões dos elementos de cada sexo, o que resulta é qualquer coisa que nem é carne, nem é peixe, ou seja, insipida para meu gosto. O Colégio apresentou três classes, uma do 1º ciclo (escola primária, para os mais velhos), com a designação de ginástica infantil, uma mista de elementos de «meia idade» (13, 14 anos?) e a classe especial. A ginástica infantil foi a possível para aquela idade, deu para os pais e avós ficarem encanta-

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Os Orfeões do Colégio, Odivelas e Pupilos e a Orquestra Ligeira do Exército Português

dos com as habilidades da miudagem. Registamos as expressões, a alegria, uma certa traquinice própria de crianças com idades tão tenras mas com uma vontade fortemente manifestada de boa execução dos exercícios simples mas bem complexos para quem, seguramente, pela primeira vez se viu nestes “assados”. Ali estava o “alfobre” que certamente vai garantir futuro ao Colégio. A classe mista, como foi anunciado na altura, está ainda no seu início, não deu para tirar conclusões. A classe especial esteve espectacular, como é seu timbre, com saltadores destemidos, a fazerem torrentes bem apertadas, com três saltadores a passarem em simultâneo sobre a mesa alemã e a fazerem piruetas e duplos mortais. Pareceu-me a classe mais pequena do que o habitual e já terá conhecido melhores dias. Espero que não a transformem numa classe mista, por ser agora moda, ou por ser «politicamente correcto». Espero que não estraguem o que tanto custou a fazer e que respeitem a obra que herdaram. Terminadas as várias intervenções, entraram no pavilhão todas as classes participantes no Festival, que receberam lembranças pela sua participação. Ao Vereador Paulo César Teixeira, em representação da Presidente da Câmara de Odivelas Drª Susana Amador, foi feito o agradecimento pela cedência do magnifico espaço do Pavilhão Multiúsos, tendo-lhe sido entregue também uma lembrança. Num breve improviso, o Vereador Paulo César Teixeira reafirmou a disponibilidade do pavilhão para a realização destes acontecimentos, referindo que o Instituto de Odivelas é património do concelho de Odivelas e que a autarquia tudo fará

para que ele não seja destruído e continue a sua missão no local onde sempre esteve há mais de um século. Deus o ouça. De seguida o Comandante de Batalhão do Colégio bradou um Zacatraz por todas as instituições participantes, após o que as meninas de Odivelas bradaram o seu grito de guerra e os Pupilos responderam com o seu brado pelo IPE. A encerrar o Festival foi entoado por todos os presentes o Hino Nacional, com a vibração própria destes momentos. Para terminar este escrito, há dois factos que não posso deixar de referir. Esta foi a última vez que tivemos oportunidade de ver e ouvir as meninas de Odivelas. É com o maior pesar que o digo. Mais uma vez, não posso deixar de lamentar e reprovar publicamente a funesta decisão de encerrar este centenário Instituto, um verdadeiro atentado ao Património Nacional. Resta-nos a consolação de poder testemunhar que as meninas de Odivelas têm sabido dar uma grande lição de dignidade. Neste Festival mostraram a sua grandeza. Disseram-nos, sem precisar de palavras, «O INSTITUTO DE ODIVELAS MORRE, MAS MORRE DE PÉ». Notei que as classes, tanto do Colégio como dos Pupilos, deixaram de fazer, por razões que desconheço, as suas entradas e saídas com o garbo, o aprumo e a «panache», que eram seu timbre. A rivalidade entre as classes começava logo, de forma saudável, nas suas marchas de entrada. Eram de tal ordem, que as classes, sem terem feito um único exercício ou salto, já estavam a ser aplaudidas e já tinham o público na mão. Não se inibam. Voltem a fazê-lo. A VELHA GUARDA AGRADECE.


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As Eleições Presidenciais de 1958 no Colégio Militar O "General Sem Medo", o 398 de 1916

Pedro Manuel do Vale Garrido da Silva (53/1961) pmvgarrido@gmail.com

As Eleições Presidenciais de 1958 no Colégio Militar O "General Sem Medo", o 398 de 1916 P

or curiosa coincidência, neste ano de 2015 comemoram-se vários eventos indelevelmente ligados à figura de Humberto Delgado: • 70 anos da fundação da TAP; • 57 anos das eleições presidenciais em que foi candidato; • 50 anos do seu assassinato. Este nosso artigo, contudo, irá debruçar-se sobre as eleições que se realizaram há 57 anos, as quais foram com toda a certeza as mais célebres eleições para a presidência da República durante o regime do Estado Novo. Durante as minhas pesquisas para o artigo “Os Antigos Alunos e a Política”, fui descobrindo que, durante os mais de 200 anos da sua história, o Colégio Militar cruzou a História do nosso país de tantas formas e com tantas histórias, que achei que não podia deixar de contar algumas delas. A maioria, foram as histórias dos feitos individuais dos seus Antigos Alunos, através dos quais se engrandeceu, através deles, a história do nosso Colégio. Outras, foram protagonizadas pelo próprio Batalhão Colegial, como foram os casos aquando das Invasões Francesas, da Guerra Civil, dos vários “cavanços colectivos”, das eleições presidenciais de 1958, da greve da fome de 1962 e de mais umas quantas de que tivemos conhecimento, mas que ainda faltam documentar e


As Eleições Presidenciais de 1958 no Colégio Militar O "General Sem Medo", o 398 de 1916

confirmar devidamente. Se as primeiras tiveram maior visibilidade pública, por mérito das personalidades que as protagonizaram, as segundas, embora com muito menos visibilidade pública, também contribuíram para o engrandecimento da nossa história e consolidação dos nossos valores, razão porque devem ser recordadas, para não acabarem por se perder na escuridão do tempo. Agora, que tanto se fala de praxes, mais uma boa razão para que não deixemos que se confundam as nossas tradições, com esses desmandos folclóricos que agora abundam por aí. É bom lembrar que no nosso Colégio, nunca tivemos este tipo de praxes, as quais não passam de pseudo práticas de iniciação, e que mais não são, num grande número de

casos, que um arrazoado de parolices, humilhações e muitas vezes até, a afirmação de alguns recalcamentos individuais. O que nós tivemos e temos no Colégio, são estórias e vivências diárias, que durante mais de dois séculos de vida se foram desenvolvendo e se sedimentaram nas nossas tradições (speliking, 1º de Dezembro/mocada, pinturas, visita do Marechal, etc., etc.) e cujos valores essenciais estão eloquentemente plasmados no nosso Código de Honra. A revista ZacatraZ tem sido um espelho onde se têm reflectido e contado muitas dessas vivências, sejam elas sobre a vida colegial, sejam dos seus Antigos Alunos, desde os mais simples e anónimos, até aqueles que, com a sua estatura intelectual, carácter,

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honra, coragem e grande sentido cívico e de serviço aos outros, engrandeceram a nossa pátria, engrandecendo assim o nosso Colégio e a sua alma imortal. Ora é precisamente uma dessas histórias — de como foram vividas as eleições presidenciais de 1958 no Colégio Militar — que me proponho agora contar, depois de ter andado dum lado para o outro a desenterrar memórias, umas vezes muito apagadas, outras ainda cheias de vivacidade e tantas vezes com relatos tão diferentes e contraditórios. É também uma feliz coincidência, que este número da ZacatraZ coincida precisamente com esse mês de Junho de há 57 anos.

Breve Biografia de Humberto Delgado

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ntes de contarmos os episódios que foram vividos em 1958 no Colégio, iremos biografar, mesmo que de uma forma muito breve, a controversa figura de Humberto da Silva Delgado (398/1916), um dos protagonistas desta história. Humberto Delgado era uma força da natureza que levava tudo pela frente. De uma enorme coragem física, com um temperamento irascível, era vaidoso, extrovertido e simpático, chegando mesmo a ser doce. Era arrogante e pouco dado a consensos. Autoritário e obsessivamente determinado, mas acima de tudo, era de uma enorme ingenuidade. Frequentou o Colégio Militar de 1916 a 1922, indo depois para a Escola do Exército. Desde a sua juventude que foi um apoiante incondicional e da primeira hora do 28 de Maio, tendo mesmo participado no Largo do Rato, no violento combate de esmagamento da revolta de Fevereiro de 1927, em Lisboa.

Em 1928 escreve a peça radiofónica “28 de Maio”, um elogio à chamada “Revolução Nacional”. Mais tarde, em 1938, publicou na revista Defesa Nacional, n.º 58, um texto laudatório a Salazar, a propósito da sua nomeação como ex-aluno honorário do Colégio Militar “Que maior oferta [ex-aluno honorário], Chefe da Revolução e Chefe do Exército, lhe poderíamos dar, que essa honra, modesta talvez, perante tantas a que V. Ex.ª tem direito, mas tão elevada para os nossos corações”. Teve um papel muito relevante e eficiente nas negociações secretas que conduziu de 1941 a 1943, para o estabelecimento de uma base aérea britânica nos Açores. Em 1945, como Secretário-Geral da Aeronáutica Civil, criou a TAP, Transportes Aéreos Portugueses, os quais celebram este ano o seu 70º aniversário. Foi Membro da Câmara Corporativa, pela secção de Defesa Nacional de 1951 a 1952. Foi ainda Adido Militar em Washington e membro do comité dos Representantes Militares da NATO. Em 1953, com 47 anos, torna-se o mais novo general das Forças Armadas Portuguesas, sendo logo nomeado, ainda nos Estados Unidos, chefe da Missão Militar junto da NATO. Após o seu regresso a Portugal foi nomeado Director-Geral da Aeronáutica Civil.

A rotura com o Estado Novo não surge de maneira precisa, de forma mais ou menos relacionada com factos ou situações definidas. Não se descortina claramente um possível processo evolutivo na direcção da democracia. Sabe-se que Humberto Delgado sempre teve uma mágoa profunda com o regime, por nunca lhe ter sido dado o comando de uma unidade militar. Sabe-se também, que já em 1950, possivelmente reagindo à prisão de Henrique Galvão, seu amigo de longa data, terá escrito algumas linhas sobre o carácter autoritário de Salazar. Se esta não foi a primeira demonstração do começo do afastamento, foi certamente das primeiras. Também o Marechal Costa Gomes (254/1929) irá anos mais tarde referir em livro, que em conversas que tivera com o General, este manifestara um certo espírito democrático e referira já a necessidade de mudanças. Contudo, parece ter sido a sua passagem pelo comando NATO nos Estados Unidos e a sua vivência e confronto diário com a democracia americana, a razão mais vezes apontada como uma das causas principais da sua conversão aos valores da Democracia. Aliás, parece que foi esse contacto, que também terá sido responsável na época, pelo despertar de sentimentos democráticos em muitos outros oficiais generais e superiores.


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As Eleições Presidenciais de 1958 no Colégio Militar O "General Sem Medo", o 398 de 1916

As Eleições no País

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om o fim da guerra em 1945, e mau grado o governo de Salazar ter decretado luto oficial de três dias pela morte de Hitler, a derrota do Eixo e a pressão dos aliados forçaram Salazar a fazer algumas encenações "democráticas", nomeadamente a instituição de eleições, para tentar dar uma boa imagem do regime às democracias ocidentais que saíram vitoriosas do conflito. Assim, nessa onda de expectativas, a oposição preparou-se para as eleições, (tanto presidenciais como legislativas), tendo o MUNAF (Movimento de Unidade Nacional Antifascista) sido substituído pelo Movimento de Unidade Democrática (MUD), logo em 1945. Esta era uma organização política autorizada por Salazar, que tinha como um dos seus objectivos,

proporcionar um debate público em torno da questão eleitoral, dadas as sucessivas manipulações e falsificações impostas pela ditadura. Este movimento democrático rapidamente recebeu grande apoio popular e conseguiu agrupar muitos opositores ao Estado Novo, principalmente intelectuais e profissionais liberais, razão porque o MUD acabou por ser dissolvido pelo regime, logo em Janeiro de 1948. Apesar da sua ilegalização, muitos dos antigos membros do MUD continuaram a opor-se ao regime e integraram-se, ainda em 1948, na comissão de apoio à candidatura do general Norton de Matos à Presidência da República, candidatura essa que por falta de condições desistiu à boca das urnas. Em consequência desta tentativa frustrada, muitos opositores foram perseguidos e obrigados à clandestinidade e ao exílio. Mais tarde, em 1951, voltaram a apoiar a candidatura do Almirante Quintão Meireles, a qual, pelas mesmas razões, acaba por desistir. Até que finalmente em 1958, estiveram na base do lançamento da candidatura de Humberto Delgado à presidência da República, candidatura que, naturalmente, se esperava que acabasse por ter o mesmo desenlace que as anteriores… Eis senão quando, inesperadamente, numa conferência de imprensa da campanha eleitoral, realizada a 10 de Maio de 1958 no café Chave de Ouro, em Lisboa, quando lhe foi perguntado por um correspondente dum jornal estrangeiro, se fosse eleito, que posição tomaria em relação ao Presidente do Conselho Oliveira Salazar, respondeu com a célebre e fatal frase — "Obviamente, demito-o!". Esta frase foi o rastilho que incendiou os espíritos de to-

dos os que se sentiam oprimidos pelo regime salazarista, de norte a sul, levando a uma mobilização popular até aí nunca vista em Portugal. Acabava de nascer o General Sem Medo! De facto, a chegada de Delgado ao Porto, a 15 de Maio, foi apoteótica. Calcula-se que a acompanhá-lo desde a estação de S. Bento até à Praça Carlos Alberto, estiveram mais de 200.000 pessoas. À noite, no Coliseu do Porto, realizou-se o maior comício de campanha, com a sala e as ruas adjacentes a transbordar de povo vibrante e empolgado. O pânico deve ter sido tão grande nas hostes do regime, que no final do comício a GNR a cavalo carrega violentamente sobre a população. O regime deixava assim cair mais umas das tantas máscaras atrás das quais se escondia nesta farsa de eleição. A partir dessa altura, o pânico de que o mesmo acontecesse em Lisboa, levaram o regime a impor severas medidas repressivas, que impedissem qualquer mobilização popular igual à que Humberto Delgado tivera no Norte do país. Para se precaver da má experiência do Porto, o governo preparou-se para impedir qualquer manifestação de apoio a Delgado na sua chegada a Santa Apolónia, vindo do Porto. Com esse fim, mobilizou uma força de legionários comandados por Góis Mota (256/1918) e da Guarda Nacional Republicana comandada por António de Spínola (33/1920), que forçaram o automóvel em que seguia Humberto Delgado, a desviar-se da sua rota original, impedindo com isso qualquer proximidade da multidão que desde cedo o aguardava, espalhada por várias ruas de Lisboa. A enorme mobilização do Porto, que de uma forma ou outra se estendeu ao resto do país, lançou o pânico nas hostes do regime, que a partir daí, passou a reprimir tudo que parecesse apoio ao general, e a preparar a viciação do acto eleitoral, não fosse Humberto Delgado, ao contrário dos seus antecessores, persistir em se apresentar nas urnas. De facto, o acto eleitoral realizou-se a 8 de Junho de 1958 — e desta vez, Humberto Delgado não desistiu e foi até à boca das urnas! É claro que o regime não deixava as coisas ao acaso, fazendo com que o acesso aos cadernos eleitorais e a fiscalização da votação propriamente dita fossem interditas aos delegados do general e, por mais paradoxal que possa parecer, os delegados de cada candidatura é que tinham de imprimir e distribuir os boletins de voto!?


As Eleições Presidenciais de 1958 no Colégio Militar O "General Sem Medo", o 398 de 1916

Em conferência de imprensa no dia seguinte às eleições, Humberto Delgado afirma categoricamente: FUI ROUBADO! A trafulhice foi tal, que o escrutínio oficial deu 76,4% (758.998 votos) a Tomás e cerca de 23% (236.528 votos) a Delgado. Com este resultado — Obviamente que Salazar não foi demitido! Logo em Dezembro de 1958, Humberto Del-

gado foi investigado e demitido de Director-Geral da Aeronáutica Civil, tendo-se asilado na embaixada do Brasil, após o insucesso do golpe militar que tinha vindo a ser preparado para se realizar a 28 de Dezembro de 1958. Seguir-se-iam ainda algumas tentativas de sublevação, como a que agregou no chamado "Golpe da Sé" (Março de 1959) um novo sector apoiante:

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a Igreja Católica. Outra dessas tentativas foi o assalto ao quartel de Beja, em Dezembro de 1961. Mas todos eles sem sucesso. A partir daqui, começava o calvário de Humberto Delgado, o qual só terminaria aquando do seu cobarde assassinato em 13 de Fevereiro de 1965.

As Eleições no Colégio

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o Colégio Militar, no ano lectivo de 1957/1958, a vida corria tranquilamente, seguindo as suas rotinas escolares, militares e físicas1 (alvorada às 6:45, pequeno-almoço, fazer as camas, marcha ordenada das turmas para as aulas, almoço, lanche, regressar às Companhias, jantar, seguido de “reinação” no “geral”, formatura para ler a ordem de serviço, recolher e silêncio). Essa tranquilidade, apesar de espartana, não deixava antever qualquer alteração ou perturbação da rotina colegial. Contudo, “lá fora”, a vida palpitava numa agitação nunca vista, a qual iria encarregar-se de perturbar a rotina colegial. Como o Colégio Militar é uma escola onde se cultivam os valores, foi por causa dum desses mesmos valores — a camaradagem — que aliado à solidariedade que nos é devida para com um Antigo Aluno, fizeram então soar entre aquelas colunas centenárias dos claustros, o nosso grito de “Um por Todos, Todos por Um”. E então, o impensável, aconteceu! A situação política portuguesa estava então ao rubro com a candidatura à Presidência da República do General Humberto Delgado, candidatura essa que gerou de norte a sul de Portugal uma enorme onda de adesão e esperança até então nunca vista. Ora em 1958, no Colégio Militar, durante as eleições presidenciais em que Humberto Delgado se opôs ao candidato da situação, o almirante Américo Tomás, fez-se de uma forma muito original, um simulacro de eleições. As nossas eleições. Tudo se terá passado espontaneamente, sem qualquer premeditação ou organização, pois julgo que não haverá dúvidas que no Colégio Militar, tal como no resto do país, o 1 Rotinas daquele tempo muito diferentes das actuais.

grau de politização e consciência cívica era mínimo, senão mesmo quase nulo. Além do mais, não nos podemos esquecer que estamos a falar de miúdos de 16, 17 e 18 anos, razão por que não era de esperar um movimento político consciente e estruturado dentro dos muros do Colégio. Além do mais, nem sequer tinham idade para votar. Mas tudo isso não impediu que a entrada de Humberto Delgado no combate eleitoral, e logo para Presidente da República, não tivesse criado um grande entusiasmo entre a “malta” e uma grande mobilização, principalmente entre os alunos mais velhos. Afinal, mais um dos nossos iria ser o próximo Presidente da República! E foi assim que os alunos, maioritariamente do 6º e 7º ano, a que se associaram outros de outros anos, começaram a preparar, à nossa maneira, uma forma de apoiar o nosso candidato. Até na forma como se manifestou esse apoio, o Batalhão Colegial foi original. Esse apoio, não se fez através de uma votação formal. Não houve ninguém a pôr papelinhos dentro de uma qualquer caixa de sapatos e depois contou os votos. Em vez disso, organizou-se, imagine-se só, uma marcha ao flambó — marcha das tochas. Antes de prosseguirmos, uma pequena explicação do que era essa marcha ao flambó. Em meados do século XVIII, os franceses durante o período napoleónico, iniciaram a moda de dançar nas marchas que se realizavam em Junho

para celebrar a tomada da Bastilha. A essas marchas chamavam “marche aux flambeaux” em que o povo desfilava com uns archotes acesos na mão, cantando, dançando e fazendo barulho. No nosso país, uma forma popular que subsistiu destas “marche aux flambeaux”, foram as chamadas marchas populares, que se fazem por altura dos santos populares e em que as tochas foram substituídas por balões iluminados. Fez-se então uma enorme, ruidosa e muito participada marcha de regozijo e de festa, de homenagem e apoio a Humberto Delgado, em que a malta ora desfilava com uma tocha acesa nos claustros, ora acenava com essas tochas do cimo das varandas, batia palmas e fazia barulho. O Artur Mário Bentes Penedo (132/1951), o Comandante do Batalhão (CB) de então, recorda-se bem desta marcha, mas diz que foi um brincadeira, sem nenhuma intenção ou consciência política. Não temos dúvida que assim terá sido, senão para todos, pelo menos para a esmagadora maioria. Mas uma coisa é certa, apesar de todas estas manifestações de uma enorme espontaneidade e ingenuidade, a verdade é que os ânimos aqueceram para alguns alunos, mas principalmente para alguns oficiais e professores.


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As Eleições Presidenciais de 1958 no Colégio Militar O "General Sem Medo", o 398 de 1916

Mas quer tenha sido brincadeira, ingenuidade ou falta de intenção, a verdade é que a irritação e o incómodo do regime, perante tão inofensiva boiada foi de tal modo visível, que logo nessa mesma noite, o oficial que então estava de dia, o capitão Guedes, o ”Guedes florista”, (Comandante da 1ª Companhia), através de um telefonema do próprio ministro da Guerra, Santos Costa, foi intempestivamente transferido para Chaves. No dia seguinte à marcha ao flambó, numa “aula de estudos" na sala da Santa, o Capitão Galhardo (comandante da 2ª Companhia) quis avisar que podia haver problemas com alguns oficiais por razões políticas. De facto, esse aviso não era totalmente descabido, pois havia entre os oficiais e pro-

5/1938

180/1934

fessores, vários oposicionistas ou do contra, como então se dizia, entre os quais, para além dos Tenentes Luiz Manuel Bilstein de Menezes Luiz Sequeira, o “Bi Dom” (5/1938) e José Manuel Inglês Gancho Pereira Carvalho, o “Porco” (180/1934), que eram Antigos Alunos, também estavam alguns professores, como o Tenente Almeida, o “Galinha”, o Capitão Cunha Serra2, o “serrote” e o Professor Dias Miguel, os quais parece que estariam na disposição de ir ainda mais além no seu protesto. Talvez por essa razão, ainda nessa noite, o Bilstein Sequeira terá feito uma encenação junto da sala de armas, com um pequeno grupo de alunos, que incluía o Artur Penedo (CB), sobre a eventual necessidade de pegar em armas. Mas o Artur Penedo levou isso como uma atitude do tipo capa e espada, "uma poesia" com pouca relação com

a realidade, apesar do Sequeira insistir que o ataque poderia estar eminente para essa mesma noite. A verdade é que o ataque esperado para essa noite não aconteceu, mas isso não impediu que a mão de ferro da ditadura ficasse quieta perante tamanho desaforo, por mais ingénuo e inocente que tivesse sido. Por essa razão, não se limitou a transferir o capitão Guedes e iria ainda fazer mais vítimas dentro do Colégio. Foi o caso das exonerações do Director, o “BC”, Coronel Luís Maria Bastos de Carvalho (29 Novembro 1956-11 Julho 1958) e do Subdirector, o “Seca” Major Pedro Alexandre Brun do Canto e Castro Serrano (16 Outubro 1956 - 23 Setembro 1958). Essas exonerações intempestivas foram a

Prof. Dias Miguel

razão porque estes oficiais só exerceram estas sua funções no Colégio, apenas um ano completo! O “BC”, embora não fosse Antigo Aluno, fora professor de matemática e físico-química no Colégio Militar durante 16 anos de 1937 a 1953 e era indiscutivelmente um grande amigo do Colégio. Quando foi exonerado, foi-o com a desculpa de que iria fazer o curso de Altos Comandos no ano lectivo seguinte. Mas de facto, acabou por passar à situação de reserva, ainda em Outubro de 1959, por despacho do então ministro da Guerra, Santos Costa. O “dito” e o “sub” exonerados foram então substituídos pelo Coronel Tirocinado Raul Cordeiro Pereira de Castro (365/1916), o “Lambadanas” ou “careca gajão”, um incondicional do regime, que tinha sido o VII Comissário Nacional da Mocidade Portugue-

2 Anos mais tarde, quando estava preso em Lanceiros 2, para não ser preso pela PIDE, suicidou-se por enforcamento. 3 Esta é uma outra história que deverá ser contada num dos próximos números da ZacatraZ.

sa (talvez por essa razão correu no Colégio, que uma das missões porque teria sido nomeado, seria a de aqui instaurar a “Bufa”, como era depreciativamente conhecida a Mocidade Portuguesa) e pelo Major Frederico Alcide de Oliveira (266/1926), o “Olho”. De notar que este dois oficiais eram ambos Antigos Alunos. Apesar do curriculum político do “Lambadanas”, o “sub” é que veio a assumir um papel de maior visibilidade no Colégio, durante este período conturbado e nos anos que se lhe seguiram. Aliás, e segundo algumas opiniões, o Alcide de Oliveira era quem dava a cara, e oferecia o peito às balas, embora quem decidisse de facto fosse o “Lambadanas”, que preferia ficar resguardado na fila

Director Bastos de Carvalho

de trás. Provavelmente fruto destes acontecimentos, esta Direcção especialmente nomeada terá instalado então no Colégio Militar, um clima de grande autoritarismo e uma rígida disciplina, que veio a dar origem a um aumento e endurecimento das punições, de que será de realçar, entre outras, três anos depois, a desproporção dos castigos que estiveram na origem da greve da fome de 19623.


As Eleições Presidenciais de 1958 no Colégio Militar O "General Sem Medo", o 398 de 1916

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Epílogo

E

mbora estes acontecimentos no Colégio não tenham passado de uma forma ingénua, emocional, espontânea e solidária, embora muito original, de os alunos de então manifestarem o apoio a um camarada Antigo Aluno, não duvidamos que estas eleições e todo o movimento que então se gerou foi, não só dentro, como principalmente fora das portas do Colégio, e no contexto nacional de então, o prenúncio das mudanças irreversíveis que se iriam seguir nos anos seguintes e que acabariam por se tornar na antecâmara do fim do regime. Aquela inocente marcha ao flambó jamais deixaria prever a todos os seus intervenientes, tudo aquilo que estava para acontecer no nosso país. Senão vejamos.

Ainda no ano de 1958: • Eleições presidenciais - 8 de Junho • Carta do Bispo do Porto a Salazar - 13 de Junho • Exílio do Bispo do Porto - Setembro • Prisão de Azevedo Gomes, Vieira de Almeida, Jaime Cortesão e António Sérgio (178/1894) e instauração de processo disciplinar a Humberto Delgado (398/1916) - 22 de Novembro Ano de 1959: • Aposentação compulsiva de Humberto Delgado - 7 de Janeiro • Humberto Delgado pede asilo político na embaixada do Brasil - 12 de Janeiro • Henrique Galvão pede asilo político na Embaixada da Argentina - 17 de Janeiro • Revolta da Sé - 12 de Março • Aparece na praia do Guincho4 o corpo do capitão Almeida Santos, que foi o oficial de ligação de Craveiro Lopes (27/1904) na revolta da Sé - 7 de Abril • Massacre de Pidjiquiti, Guiné (16/50 mortos) - 3 de Agosto Ano de 1960: • Álvaro Cunhal e outros dirigentes do PCP evadem-se de Peniche - 3 de Janeiro • Revolta de Mueda, Moçambique - 16 de Junho • Prisão de Mário Soares - 5 de Outubro

O annus horribilis de 1961: • Assalto ao Santa Maria (Operação Dulcinea) dirigida por Henrique Galvão e apoiada por Humberto Delgado - 23 Janeiro • Assalto do MPLA à prisão de Luanda, Angola - 4 de Fevereiro • Funeral das vítimas do assalto em Luanda, provoca 17 mortos - 5 de Fevereiro • Terrorismo da UPA, na zona do Uíge - 14 de Março • Golpe abortado de Júlio Botelho Moniz (106/1911), também conhecido como a Abrilada - 13 de Abril • Ataque e ocupação do Forte de S. João Baptista de Ajudá, Daomé - 1 de Agosto • Operação «Vagô», organizada por Henrique Galvão - tomada, em pleno voo, do avião da TAP, “Mouzinho de Albuquerque”, que fazia a linha Casablanca-Lisboa) - 10 de Novembro • Integração dos enclaves de Dadrá e Nagar Aveli na União Indiana - 16 de Agosto • Ocupação da Índia Portuguesa pelas forças da União Indiana - 18 de Dezembro • Humberto Delgado entra clandestinamente em Portugal para assumir o poder, após o assalto ao quartel de Beja - 30 de Dezembro • Assalto ao quartel de Beja (segundo Humberto Delgado, a revolta de Beja representou o fim do planeamento e da acção simbólica, em prol da acção directa) - 31 de Dezembro

mentos foram algo que acabou por se tornar para alguns, no despertar da sua consciência política e cívica. De facto, para muita gente desta geração dos anos 50 e 60, estes tempos foram também um ponto de viragem e o prelúdio de uma maior consciencialização e comprometimento cívico, político e social, viragem essa que assumiu ainda uma maior amplitude, após o início da Guerra Colonial, das grandes greves estudantis de 1962 e 1969 (incluindo as eleições de 1969 para a Assembleia Nacional), dos movimentos estudantis de 1970-73, e novamente das eleições de 1973 para a Assembleia Nacional, movimentos esses que eram já o estertor do regime e o prenúncio do próprio 25 de Abril de 19745. Infelizmente, esta história teve um fim trágico — o assassinato de Humberto Delgado em Badajoz, por uma brigada da PIDE comandada pelo inspector Rosa Casaco, em 13 de Fevereiro de 1965. Moral desta historieta: tal como como tantas outras do nosso passado colegial, algumas já contadas na nossa revista, mais uma vez, quando foi preciso dizer PRONTO!, os Meninos da Luz fizeram jus à sua divisa — Um por Todos, Todos por Um.

Ano de 1962: • Agitação e Greve Geral estudantil em Lisboa - 6 de Abril • Tumultos em Lisboa, Porto, Almada e Póvoa de Santa Iria (2 mortos) - 1º de Maio • Início da guerrilha na Guiné - 19 de Dezembro Como atrás dissemos, o que então se passou no Colégio, não terá passado de um acto romântico, um gesto de capa e espada, e fundamentalmente, um terno gesto de solidariedade para com um camarada Antigo Aluno. De certeza que não terá sido mais do que isso, pois entre os alunos, poucos ou nenhuns teriam então alguma consciência política, quiçá mesmo a noção da responsabilidade dos actos que estavam a praticar. Mas na verdade, consciente ou inconscientemente, estes aconteci-

4 Assassinato esse que deu origem ao livro de José Cardoso Pires, “Balada da Praia dos Cães” 5 Dos 6 elementos do Posto de Comando da Pontinha, 3 eram Antigos Alunos do Colégio – Nuno Manuel Guimarães Fisher Lopes Pires (115/1941), José Eduardo Fernandes

de Sanches Osório (210/1951) e Luís Ernesto Albuquerque Ferreira de Macedo (8/1957). Para já não falar dos vários membros do Conselho da Revolução e do MFA.


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O Mirolho Alberto Sanches de Castro (219/1898)

Luís Filipe Ribeiro Ferreira Barbosa 71/1957

O Mirolho

Alberto Sanches de Castro (219/1898)

Alberto Sanches de Castro no Cockpit.

N

o artigo intitulado 100 Anos de Aviação Militar publicado no nº 198 da nossa revista, indiquei que o primeiro português a realizar um voo em Portugal, tinha sido Alberto Sanches de Castro (219/1898). Quis o acaso que ao procurar material para um outro artigo, de natureza completamente diferente, eu tropeçasse de novo neste notável Antigo Aluno, ao folhear o nº 39, de 1975, da então designada Revista da Asso-

ciação dos Antigos Alunos do Colégio Militar. Nesse exemplar da revista, publicou-se um artigo intitulado “A Aviação Portuguesa e o Colégio Militar - O primeiro voo de um português em território nacional”, da autoria de Edgar Cardoso (272/1919), o autor da história da Força Aérea Portuguesa. Quis ainda o acaso, que um Antigo Aluno do meu tempo, o 282/1953, César Neto Portugal, oficial piloto-aviador da nossa Força Aérea, fizes-

se chegar às mãos do director desta revista, o Gonçalo Salema de Matos (371/1949), uma cópia de um artigo intitulado “Este foi o primeiro português”, da autoria de Pedro Jorge Castro, publicado no nº 436 da revista “Sábado”, de 6 a 12 de Setembro de 2012, ou seja, por ocasião do centenário do feito de Alberto Sanches de Castro. O Gonçalo passou-me essa cópia do artigo e disse-me qualquer coisa do género “Tens de escrever sobre este homem”. Este é o tipo de ordens que eu percebo, directa, clara e concisa, e que não admite qualquer réplica. Assim sendo, aqui estou eu de novo a escrever sobre a nossa aviação, começando por transcrever o artigo publicado na nossa revista em 1975. «A Aviação Portuguesa e o Colégio Militar - O primeiro voo de um português em Portugal. Ao longo de 63 anos de existência da aviação nacional, valiosa e avultada tem sido a contribuição dada à mesma - no capítulo de expansão e índice de glória - por antigos Meninos da Luz. Pode afirmar-se mesmo que as primeiras raízes do roble frondoso da nossa aeronáutica, tiveram origem no Colégio Militar. Assim, verifica-se que no dia 10 de Setembro de 1912, se realizou o primeiro voo de um português, em território nacional. Convêm por razões de rigor histórico acentuar que os primeiros voos efectuados no


O Mirolho Alberto Sanches de Castro (219/1898)

nosso país, tiveram lugar no antigo Hipódromo de Belém, a 27 de Abril de 1910, e foram levados a cabo com êxito absoluto, pelo aviador francês Julien Mamet, perante a assistência do Infante D. Afonso e de cerca de uma dezena de milhar de espectadores. Enquanto que o feito português foi realizado no decorrer de tentativas experimentais no mouchão da Póvoa de Santa Iria, em segredo, por Alberto Sanches de Castro, que tivera o nº 39 do Curso inicial de 1898, no Colégio Militar, e a alcunha de “Mirolho” por usar monóculo. Saído do Colégio como sargento-cadete, interrompeu o curso superior a que se destinava, para seguir com o seu irrequietismo de sempre, a carreira jornalística, onde se impôs como uma figura de valor, além de ser um notável caricaturista. Natural de Viana do Castelo, resolveu em 1911, ir a França a fim de frequentar a escola de aviação Voisin, em Maumelon-le-Grand, o que conseguiu com o auxílio monetário de seus conterrâneos, entusiastas como ele da Aviação nascente e em via ascensional de interesse. Sentia enorme atracção pelas coisas do ar nomeadamente pela locomoção aérea, contudo não conseguiu o seu diploma de aviação, por quase a consegui-lo, ter partido o avião que pilotava, facto natural numa era em que não existia o duplo comando. O aparelho ficou completamente destruído e Sanches de Castro, obrigado a pagar uma avultada importância por esse facto, viu-se impossibilitado de continuar a aprendizagem. No entanto o desaire não fez esmorecer o seu entusiasmo e no seu regresso a Lisboa, afirmaria numa palestra realizada no Aero Club de Portugal em Fevereiro de 1912: “Se nessa escola não aprendi a voar, aprendi no entanto o que era a aviação em França, que é uma coisa bem diferente do que se pensa. E sei por isso mesmo que é preciso perseverar e trabalhar para que a aviação seja uma realidade no nosso País”. De acordo com o que pensava, instalou-se no Mouchão da Póvoa, improvisou um hangar e começou a preparar os seus primeiros voos nos céus do Ribatejo. Com o auxílio dos seus indefectíveis amigos e conterrâneos, havia adquirido para o efeito o monoplano “Blirist”, tipo “Antoinette” com motor “Anzani” de 25 cv. Depois de alguns insucessos e consequentes reparações, Alberto Sanches de Castro, finalmente no já citado dia 10 de Setembro

desse ano, aproveitando uma pista com 1200 metros de comprimento e 40 metros de largura, logrou levar avante os seus intentos: efectuou nessa data 4 voos, todos em linha recta, sem voltas, sendo dois no sentido leste-oeste e os outros em sentido inverso. A maior distância atingida foi a de 450 metros, percorrida em 30 segundos e a maior altura alcançada foi a de 5 metros. No último voo a velocidade do vento era superior a 6 metros por segundo e a aterragem fez-se em más condições, o que deu lugar a sérias avarias no frágil aparelho, que impediram esse “glorioso maluco das máquinas voadoras” de, temporariamente, continuar as suas tentativas. As experiências acima designadas foram presenciadas pelo pessoal de serviço na propriedade do Mouchão da Póvoa, pertencente a Eduardo de Araújo e de alguns seus amigos, sendo daqueles lavrada uma acta, que é do seguinte teor:

ACTA Nós abaixo assinados, testemunhamos ter visto, no dia 10 de Setembro de mil novecentos e doze, o Sr. Alberto Sanches de Castro voando num aeroplano à altura aproximada de cinco metros, atravessando parte do mouchão da Póvoa; e a fim de que este voo, o primeiro realizado por um Português em terras de Portugal, em aeroplano com motor, fique registado, lavramos a presente acta. Mouchão da Póvoa de Santa Iria, 10 de Setembro de 1912. a) Norberto Gonçalves, António Canelas, José Canelas, Eugénio Ferreira, António Pinóia, Francisco Gonçalves.

É evidente que o voo de Sanches de Castro foi demasiado modesto para ser considerado uma proeza. Atendendo mesmo à época, imparcialmente deverá antes considerar-se um salto aéreo, do que propriamente um verdadeiro voo, uma vez que depois da descolagem, sem manobra ou preparação, o avião pousou em frente. Contudo o acontecimento ficou vinculado como postal da história da nossa Aviação. Era o começo, o primeiro passo em frente… Sanches de Castro prosseguiu depois nos treinos, na ideia de melhorar os seus resultados, mas a infelicidade, ou a carência de preparação adequada, deram origem a que

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sofresse um novo acidente, que o lesionou fortemente, mas que terminou num verdadeiro romance, tão ao gosto da época. Caindo por avaria do motor próximo da Póvoa de Santa Iria, foi recolhido numa propriedade da família Leherfeld onde foi desveladamente tratado dos seus ferimentos pela filha daquele proprietário. Tempos depois, Sanches de Castro contraía matrimónio com a sua carinhosa e improvisada enfermeira e punha termo á sua carreira “icárica”. Melhor recompensa não poderia ter, quem tão galharda e intrepidamente arriscava a vida em prol do ideal do Ar.» O que a revista “Sábado” publicou no centenário do feito de Sanches de Castro é interessantíssimo, pois revela-nos traços bem pitorescos da sua personalidade. No que se segue transcrevemos partes do artigo desta revista. «O único jornal que noticiou o feito de Alberto Sanches de Castro foi ”A Capital”, mas publicou apenas a inicial do seu primeiro nome ”No mouchão da Póvoa de Santa Iria, na propriedade do Sr. Eduardo de Araújo fez um voo á altura de aproximadamente 5 metros, no dia 10 e num aeroplano Bleriot (25 HP Auzan) o Sr. A. de Castro, realizando-se assim por um aviador português o primeiro voo em aeroplano com motor em terras de Portugal. Apesar de ter saído três dias depois, a notícia acabava de forma desconfiada ”Desconhecemos os resultados dessa experiência que nos dizem ter causado grande admiração entre os numerosos empregados e jornaleiros da propriedade onde ela se efectuou”. Além de curto e discreto o artigo é impreciso, segundo a Revista de Aeronáutica editada na época pelo Aero Club de Portugal não se tratava de um, mas sim de quatro voos numa mesma tarde, dois para cada lado, em linha recta, sem curvar o avião no ar, numa pista de 1200 metros. A maior distância de voo foi de 450 metros percorrida em 30 segundos e a maior altura obtida foi de 5 metros. O aeroplano era um Voisin Antoinette de 40 cavalos e o voo foi registado numa acta de meia dúzia de linhas assinada por seis sócios do Aero Club de que o piloto era membro. Sanches de Castro apareceu de novo 17 dias depois, quando mandou para ”A Capital” uma carta irreverente a desmentir um entrevistado que tinha dito que havia voado


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O Mirolho Alberto Sanches de Castro (219/1898)

à altura de 3 metros com ele no Mouchão da Póvoa ”Esse senhor que uma só vez aqui veio quando o aparelho estava desmontado, subiu à altura de 3 metros num… escadote que aqui tenho no hangar”. Não foi por acaso que Sanches de Castro se tornou pioneiro da aviação portuguesa. Tinha jeito para mecânica, como demonstrou quando foi o aluno nº 219 do Colégio Militar, onde montou um pequeno barco a vapor

tes aos espectadores, que entrassem num recinto fechado para verem mais de perto. Sanches de Castro foi então enviado para França, para aprender a pilotar, e estreou-se num avião Maurice Farman na escola de aviação Voisin. Mas o curso acabou por ser mais caro do que os investidores esperavam, pelo que rapidamente deram ordem para regressar a Portugal e trazer um aeroplano desmontado no comboio.»

Foi assim que Sanches de Castro conheceu a futura mulher e mãe de dois dos seus três filhos.» Revela-nos de seguida o artigo da “Sábado” que com o casamento a aviação passou para segundo plano e que Sanches de Castro passou a sobressair como caricaturista, tendo participado no 1º Salão dos Humoristas, em 1912 e vendido um trabalho seu ao então Presidente da República Manuel de Arriaga.

Alberto Sanches de Castro junto do avião por si montado no hangar do Mouchão da Póvoa de Santa Iría.

com motor, um brinquedo tão surpreendente que até os príncipes D. Luís e D. Manuel, filhos do Rei D. Carlos, foram assistir a uma demonstração num tanque do Colégio. Quando voltou à sua terra natal, Viana do Castelo, dava nas vistas por se deslocar numa Grande Bi, a antecessora das bicicletas, com uma roda enorme à frente e uma minúscula atrás. O facto de usar um monóculo valeu-lhe a alcunha de “Mirolho” e ajudava a compor um perfil excêntrico. Quando um grupo de capitalistas de Viana do Castelo procurou um candidato a piloto, viu nele o homem certo. A ideia era dar espectáculos de aviação, cobrando bilhe-

Instalou então um hangar no mouchão da Póvoa, uma ilhota no Tejo, com sete quilómetros de comprimento em frente à Póvoa de Santa Iria, onde realizou os primeiros quatro voos. Um deles terminou de forma brusca, como relatou um primo António da Costa Macedo, numa entrevista que deu ao Correio da Manhã em 1992 ”O motor terá parado e aquela geringonça despenhou-se no pátio de uma fábrica de cortiça a poucos quilómetros de distância do local de descolagem. A propriedade pertencia a um alemão, que ficou preocupado quando viu o aviador com as costelas partidas, e encarregou a filha, Dora, de tratar das suas feridas.

Familiares de Sanches de Castro disseram à revista “Sábado” que foi ele que desenhou o Don, a silhueta negra de um homem de chapéu de aba larga e de capa, que é o símbolo da Sandeman, silhueta essa que se encontrava, com fins publicitários, um pouco por todo o país. A firma não confirmou porém esta autoria. Ainda segundo a “Sábado”, Sanches de Castro teve várias actividades, tendo dado aulas de Mecânica na Escola Marquês de Pombal e em 1926 lançou o jornal ”Auto” um jornal sobre automóveis de que era ”redactor, editor e proprietário” por esta ordem como se lia no cabeçalho.


O Mirolho Alberto Sanches de Castro (219/1898)

Era patrocinado pela Fiat e as capas tinham quase sempre personalidades a posar em automóveis da marca italiana. Até as manobras militares da instauração da ditadura foram capa do ”Auto” com Gomes da Costa a deslocar-se num Fiat com a bandeira nacional e a legenda ”Nas alturas em que se torna necessário um carro rápido é sempre a marca Fiat a preferida”. Depois de tantos elogios à Fiat, Sanches de Castro abriu um stand de vendas da Opel na Avenida da Liberdade em Lisboa. Enquanto geria este negócio, lançou um desafio a seu primo Carlos Costa Macedo, que viria a ser piloto aviador e presidente do Supremo Tribunal Militar, para ir buscar carros à Alemanha e transportá-los até Lisboa de camião, em vez de virem de comboio, para ver se sairia mais barato. A viagem foi descrita em 1992 por António Costa Macedo, irmão de Carlos, num artigo nos Cadernos Vianenses, publicação de Viana do Castelo. Passaram três dias a divertir-se nos cabarés de Paris, experimentaram os melhores restaurantes que encontraram no caminho e quando iam perto de Biarritz acabou-se o dinheiro. Foram então à porta do casino daquela praia francesa e venderam um dos quatro carros que transportavam, para arranjarem forma de pagar o resto da viagem. Mas mesmo assim não foi suficiente. Sanches de Castro teve de deixar o relógio na bilheteira de Cacilhas, para pagarem o barco e atravessarem o Tejo. Os conhecimentos turísticos desta viagem foram certamente úteis para uma das suas últimas aventuras, em 1933, quando trabalhava no Noticias Ilustradas, na organização da Exposição o Hotel Modelo. Oito projectos de hotéis correspondentes a oito províncias do país, foram montados num comboio que deu a volta a Portugal, para divulgar a ”arte da hospedagem”. Ensinava como é que devia ser servido o vinho aos turistas, como devia apresentar-se a fruta ou como devia ser posta a mesa. No ano seguinte, em 1934, Sanches de Castro foi esquiar para a Serra da Estrela e pediu os esquis emprestados ao cunhado, mas fez uma ferida num pé que gangrenou e obrigou ao seu internamento no Hospital de São José, no meio de outros doentes, numa altura em que atravessava dificuldades financeiras. Acabou por morrer de sépsis, porque não queria ser amputado, segundo uma das suas netas Maria Emília Osório, que admira os feitos do avô, mas admite que era

“namoradeiro e mulherengo” e tinha uma vida completamente ”tresloucada”. Segundo indica a “Sábado”, um dos últimos amores de Sanches de Castro foi a avó de Maria Emília que, apesar de nunca ter sido casada com ele, teve um enorme desgosto com a sua morte. Embora se tenha casado quatro anos após a morte de Sanches de Castro, mandou ramos de rosas vermelhas todas as semanas para o seu jazigo, até ela própria morrer. Termina o artigo da revista “Sábado” da seguinte forma: “O primeiro piloto português a voar em Portugal continua a ser quase ignorado, merece apenas umas escassas linhas nos livros de história da aviação nacional, o seu nome está numa taça entregue anualmente ao piloto civil com mais horas de voo em todo o País. Há apenas uma rua Alberto Sanches de Castro na Póvoa de Santa Iria, mesmo à frente da ilhota onde voou e se despenhou na quinta da futura mulher”. O artigo da revista “Sábado” é interessantíssimo. Para além de nos revelar a personalidade singular de Sanches de Castro, um espírito vivíssimo e irrequieto, um homem de coragem, um aventureiro e um ”bon vivant”, permite-nos esclarecer alguns factos, que considero relevantes, que de seguida menciono: Os “generosos” entusiastas da causa do ar de Viana do Castelo, que suportaram as despesas da estadia de Sanches de Castro em França, não eram afinal tão generosos quanto isso. Queriam fazer uns dinheiros com as exibições aéreas do piloto. Como se costuma dizer ”Não há almoços grátis”. O número de Sanches de Castro no Colégio Militar não foi afinal o 39, como afirmou Edgar Cardoso, mas sim o 219. Quem consultar o nosso ”Quem é Quem”, verifica que não está identificado ninguém com o número 39 entre os anos de 1892 e 1906. No entanto, lá se indica que em 1898 dá entrada no Colégio, onde permanece até 1906, um senhor aluno de nome completo Caetano Alberto da Silva Sanches de Castro, o nosso ”Mirolho”. A ”Fraulein” que cuidou do nosso herói e com o qual veio a casar, era conhecida por Dora. Apurei, por mero acaso, que Dora era o diminutivo do seu nome de baptismo, que era Theodora, nome germânico de difícil pronúncia para um qualquer namorado ou marido. Tiveram dois filhos, Ilda e Rui. O ”Mirolho” tinha dois primos de apelido Costa Macedo, sendo que um deles, o Car-

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los, foi seu companheiro naquela épica e picaresca viagem, de certeza inolvidável para eles, entre a Alemanha e Lisboa. Eu até teria dado dinheiro para poder participar na mesma. Os primos Costa Macedo foram ambos Alunos do Colégio Militar. O António Alfredo Sanches de Castro da Costa Macedo foi o 306 de 1919, foi engenheiro, colaborou várias vezes com a nossa revista, onde publicou um artigo que não esqueço, relativo à sua participação, como sargento-cadete do Regimento de Artilharia Um, num combate que teve lugar na praça do Rato, contra um grupo de marinheiros que se tinham revoltado e que estavam colocados à entrada da Rua da Escola Politécnica. Nesse combate ele estava ombro a ombro com um tio meu, que ele cita no referido artigo. O Carlos Mário Sanches de Castro da Costa Macedo foi o 394 de 1916. Foi uma figura de relevo na Força Aérea, onde se notabilizou como piloto de elevado mérito. Foi Chefe do Estado Maior da Força Aérea e terminou a sua carreira militar como Presidente do Supremo Tribunal Militar, cargo que ocupou até poucos dias antes da sua morte, em Janeiro de 1974. É um dos biografados pelo nosso historiador José Alberto da Costa Matos (96/1950), no seu livro ”Colégio Militar, Berço de Grandes Portugueses”. Essa breve biografia é apresentada noutro local desta revista. O ”Mirolho” teve um fim inglório para um homem do seu calibre, morreu com uma sépsis causada por um acidente a praticar esqui. De certeza que teria preferido morrer voando.


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Os Gloriosos Malucos das Máquinas Voadoras

Luís Filipe Ribeiro Ferreira Barbosa 71/1957

Os Gloriosos Malucos das Máquinas Voadoras T

al como anunciado no nosso artigo intitulado os 100 Anos da Aviação Militar, apresentamos de seguida a breve história dos seus pilotos pioneiros, focando a nossa atenção sobre os Antigos Alunos do Colégio Militar. A 14 de Agosto de 1915, a Ordem do Exército noticiava que era aberto concurso para dez oficiais do Exército ou da Armada, para serem enviados ao estrangeiro a fim de praticarem numa escola de aviação. Concorreram e foram admitidos os onze oficiais seguintes: • • • • • • • • • • •

Capitão de Cavalaria, Salvador Alberto Cifka Duarte; Tenente de Cavalaria, Francisco Xavier da Cunha Aragão; Alferes de Cavalaria, João Barata Salgueiro Valente; Alferes de Infantaria, Carlos Esteves Beja; 1º Tenente de Marinha, Artur Freire de Sacadura Cabral; Tenente de Infantaria, José Barbosa dos Santos Leite; Guarda-Marinha da Administração Naval, Joaquim Caseiro; Tenente de Cavalaria, Óscar Monteiro Torres; Tenente de Cavalaria, António de Sousa Maya; Alferes de Cavalaria, Alberto Lelo Portela; Capitão de Artilharia, Norberto Guimarães.

É curioso verificar, que dos onze oficiais admitidos mais de metade (6) eram da Arma de Cavalaria e dois eram oficiais da Armada, sendo o mais antigo destes últimos o 1º Tenente Sacadura Cabral, que anos mais tarde se viria a celebrizar com a sua travessia aérea do Atlântico Sul, em que teve como navegador o não menos célebre Comandante Gago Coutinho. É também curioso verificar, que dos onze oficiais admitidos quatro eram Antigos Alunos do Colégio Militar. Eram eles o Tenente Cunha Aragão (93/1901), o Herói de Naulila, acabado então de regressar de África, onde tinha sido feito prisioneiro pelas tropas alemãs, o Alferes Salgueiro Valente (150/1899), o Tenente Óscar Monteiro Torres (228/1900) e o Tenente Sousa Maya (186/1899). Os primeiros quatro oficiais da lista apresentada, Cifka Duarte, Cunha Aragão, Salgueiro Valente e Esteves Beja seguiram para os Estados Unidos da América, a fim de frequentarem a «Signal Corps Aviation School», em San

Diego, na Califórnia. Devido à entrada de Portugal na 1ª Guerra Mundial, em Março de 1916, não puderam concluir os seus cursos na América, que na altura ainda se mantinha neutral, e vieram a concluir os seus cursos em França, no «Centre de Aviation Militaire» de Chartres. Sacadura Cabral, Santos Leite e Joaquim Caseiro iniciaram a sua aprendizagem na referida escola de Chartres. Obtidos os seus diplomas de voo foram de seguida especializar-se. Sacadura Cabral na Escola de Aviação Marítima de São Rafael, Santos Leite na Escola de Aviação de Pau e Joaquim Caseiro na Escola de Aviação de Amberieu. Quanto aos quatro últimos oficiais, os seus destinos foram os seguintes: Monteiro Torres, Sousa Maya e Lelo Portela seguiram para Inglaterra, onde frequentaram primeiramente a escola civil «Ruffy-Bauman» em Hendon e em seguida a Escola Militar de Northold. Por sua vez Norberto Guimarães seguiu para França, onde frequentou as escolas de Tours e Pau. Destes onze pioneiros morreram voando os cinco seguintes: Monteiro Torres, Sacadura Cabral, Joaquim Caseiro, Salgueiro Valente e Santos Leite. A Escola de Aeronáutica Militar de Vila Nova da Rainha foi inaugurada em 1 de Agosto de 1916, tendo começado a ministrar instrução de pilotagem em Novembro do mesmo ano, sendo instrutores parte dos pilotos que no ano anterior tinham ido tirar as suas licenças de voo ao estrangeiro. O primeiro curso de pilotagem formado na novel escola era composto por dezasseis oficiais e ficou conhecido para a posteridade como o «Curso Histórico de Vila Nova da Rainha». Concluído este curso, no inicio de Maio de 1917, foi feita a distribuição dos respectivos diplomas de voo, em sessão solene realizada na Sala Algarve da Sociedade de Geografia de Lisboa, sob a presidência do Coronel Hermano de Oliveira, Director do Aero Clube de Portugal, como representante da Federação Aeronáutica Internacional. Foram distribuídos diplomas de voo aos seguintes oficiais: • • • •

2º Tenente de Marinha, Eduardo Azeredo de Vasconcelos; Tenente de Engenharia, José Manuel Sarmento de Beires; Tenente de Cavalaria, Jorge de Sousa Gorgulho; Tenente de Cavalaria, João Luís de Moura;


Os Gloriosos Malucos das Máquinas Voadoras

• • • • • • • • •

Tenente de Infantaria, Luís da Cunha e Almeida; Tenente de Infantaria, António da Cunha e Almeida; Alferes de Cavalaria, Miguel Paiva Simões; Alferes de Infantaria, José Pereira Gomes Júnior; Tenente de Infantaria, José Olímpio Ferreira Chaves; Alferes Picador, Eduardo do Rosário Gonçalves; Tenente de Infantaria, Alfredo Duvalle Portugal; Tenente de Engenharia, Aurélio de Castro e Silva; Capitão de Cavalaria, José Joaquim Ramires.

Não concluíram este curso, Pinheiro Corrêa, Correia de Matos e Alfredo Guimarães. Obtiveram mais tarde os seus brevets, Pinheiro Corrêa em Portugal e os dois restantes oficiais em França.

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É curioso verificar que de novo são os oficiais de Cavalaria que acorrem em maior número à prática da pilotagem e que há dois oficiais engenheiros que também não resistem ao chamamento da que viria a ser posteriormente a nova Arma do Exército. Deste curso histórico faziam parte quatro Antigos Alunos do Colégio. Eram eles, o 1º Tenente Azeredo de Vasconcelos (191/1899), o Tenente Sarmento de Beires (36/1903), o Tenente Sousa Gorgulho (214/1905) e o Tenente Luís da Cunha e Almeida (156/1898). Daqui resulta, que dos primeiros vinte e quatro oficiais pilotos aviadores portugueses, oito foram Antigos Alunos do Colégio Militar. Em homenagem a estes nossos GLORIOSOS MALUCOS DAS MÁQUINAS VOADORAS, aqui apresentamos umas reduzidíssimas notas relativas às suas carreiras aeronáuticas.

Francisco Xavier da Cunha Aragão (93/1901)

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egressado de África com 24 anos, o «Herói de Naulila» tinha ao peito as seguintes condecorações: Torre e Espada, Valor Militar e Cruz de Guerra; Uma trindade eloquente! Iniciou a sua aprendizagem como piloto nos Estados Unidos da América e terminou-a em França. Regressado a Portugal vai servir na Escola de Vila Nova da Rainha como instrutor. Em 1917 é organizada a Esquadrilha de Aviação Expedicionária a Moçambique, para a qual Aragão se oferece de imediato. A esquadrilha é sediada em Mocímboa da Praia, mas acaba por não entrar em operações contra os alemães, por ter perdido logo de inicio um piloto (Tenente Gorgulho) e o seu avião, num grave desastre de aviação.

Aragão opta então por servir nas tropas em operações, sendo nomeado oficial de ligação junto do quartel-general das forças inglesas em Moçambique. Regressa a Lisboa no final de 1918 e presta serviço por algum tempo no Grupo de Esquadrilhas de Aviação Republica. Em 1921 regressa á sua Arma de origem, a Cavalaria, onde permanece até 1926, ano em que volta à aviação, sendo adjunto da Direcção de Aeronáutica em 1926, comandante da esquadrilha de aviação de treino em 1927, membro da comissão para o estabelecimento de um aeroporto nos Açores em 1928, terminando a sua carreira como Inspector da Arma de Aeronáutica em 1931. Democrata intransigente foi perseguido político, colaborou na criação da Aviação Civil portuguesa e foi secretário do Conselho Nacional do Ar.

João Barata Salgueiro Valente (150/1899)

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al como Cunha Aragão, iniciou a sua aprendizagem de piloto nos Estados Unidos da América, concluindo-a em França. De seguida foi nomeado instrutor na Escola de Vila Nova da Rainha, de onde seguiu para França integrado no Corpo Expedicionário Português (CEP). Transitou a seu pedido para a Esquadrilha de Observação nº 263, onde pela sua acção foi condecorado com a Ordem Militar de Cristo.

Morreu voando em 30 de Novembro de 1928, em Alverca, quando o avião Breguet, em que seguia com o seu camarada do curso de pilotagem Santos Leite, embateu com o cabo metálico do balão da Companhia de Aerosteiros, que estava em ascensão. Era então capitão e contava 40 anos de idade;


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Óscar Monteiro Torres (228/1900)

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oi diplomado em Inglaterra na Escola de Northold, do Royal Flying Corps, com a classificação máxima possível. Regressado a Portugal é Instrutor na Escola de Vila Nova da Rainha e, em 1917, criado o Serviço de Aviação do CEP em França oferece-se de imediato para aí prestar serviço. Dado os ingleses não terem fornecido aviões ao CEP, como tinha sido prometido, Monteiro Torres foi como voluntário prestar serviço na Esquadrilha de Observação Inglesa nº 10, onde desempenhou múltiplas missões. Posteriormente, graças à sua amizade com o grande ás da aviação francesa Guynemer, conseguiu a sua aceitação como piloto de caça na Esquadrilha SPAD nº 55, a celebérrima «Esquadrilha das Cegonhas», onde só tinham lugar pilotos de prestígio e rara classe. A 19 de Novembro de 1917, encontrando-se em missão de patrulha aérea sobre as linhas alemãs, fazendo parelha com o capitão francês Lamy, que comandava a formação, avistaram dois aviões bilugares germânicos, que pretendiam regular o tiro da sua artilharia. Imediatamente se lan-

çaram sobre os adversários, sem notarem que sobre eles manobravam três aviões «Fokker» inimigos, que picando os atacavam pela retaguarda. O capitão francês conseguiu livrar-se, com uma manobra acrobática, dos aviões perseguidores e relatou mais tarde ter visto desaparecer o seu companheiro por detrás de um bosque, picando sobre os dois aviões de observação, que conseguiu abater. Foi, por sua vez, abatido pelos três aviões que o perseguiam, despenhando-se no solo sobre o território ocupado pelo inimigo. Foi enterrado no cemitério de Laon, na Flandres, com honras militares prestadas pelos seus camaradas de armas alemães. Este cavaleiro do ar, que morreu combatendo, voltou à Pátria pelos caminhos dos Céu, escoltado por uma esquadrilha francesa, no dia 22 de Junho de 1930, para ter funerais nacionais de rara imponência, a que se associou o povo de Lisboa, indo repousar no cemitério do Alto de São João. A título póstumo foi promovido a major e condecorado com a Legião de Honra e a Cruz de Guerra francesas e com a Cruz de Guerra e a Torre Espada de Portugal.

António de Sousa Maya (186/1899)

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requentou em Inglaterra a escola de aviação civil «Ruffy and Baumann» onde obteve o brevet da FAI. Frequentou em seguida, em Northold, a Royal Flying Corps School, onde terminou a sua especialização com muito bom aproveitamento. Regressado a Portugal foi instrutor do primeiro curso de pilotagem da Escola de Aeronáutica Militar de Vila Nova da Rainha. Oferece-se de seguida para combater em França, onde se iria integrar na esquadrilha do CEP, que não chegou a constituir-se, por não lhe terem sido fornecidos os meios aéreos necessários. A seu pedido foi então servir numa esquadrilha inglesa de observação (10th Squadron), onde cumpriu diversas missões de guerra, tendo de seguida transitado, em Outubro de 1917, para a esquadrilha francesa SPAD nº 124 «Jeanne de Arc», que operava integrada no Grupo nº 13 (franco americano), com base em La Noblette, pilotando então um biplano SPAD 13-C1 em que colocou na fuselagem listas com as cores de Portugal. Voou centenas de horas em missões de guerra no espaço aéreo inimigo e, por actos de coragem e de notável virtuosismo foi condecorado com as medalhas da Cruz de Guerra de França e de Portugal, sendo por várias vezes citado em Ordem de Campanha do Comando Aliado. De regresso a Portugal, em 1919, foi indigitado para comandar o Grupo de Esquadrilhas de Aviação República, com sede na Amadora, em terrenos por si próprio escolhidos (actual Academia Militar). Desloca-se a França, para adquirir aviões para a nova unidade e, em voo de experiência dos aviões a adquirir, efectuado à Holanda, estabelece em tem-

po recorde a ligação Paris-Bruxelas-Amesterdão, o qual foi reconhecido pela Federação Aeronáutica Internacional. No final dessa missão pretende fazer uma ligação directa Paris-Lisboa, o que não consegue por percalços no percurso, que o obrigaram a duas aterragens intermédias de emergência. Apesar de todos os contratempos, consegue fazer o percurso em três dias, tendo completado 1248 Quilómetros, em 8 horas e 27 minutos utilizando um avião Bréguet XIV-A2. Em Junho de 1924, devido a um decreto do Ministro da Guerra com o qual não concordavam, os pilotos do Grupo de Esquadrilhas de Aviação República manifestam-se colectivamente contra o mesmo, movimento que ficou conhecido como a «Revolta dos Aviadores», de que resultou a detenção dos manifestantes no Forte de São Julião da Barra. O então Major Maya não foi detido, devido à imunidade parlamentar resultante de ser deputado pela Guiné. Fez no Parlamento uma defesa veemente dos seus camaradas, que deu origem a uma crise ministerial, que provocou a queda do governo daí resultando uma amnistia para os seus camaradas detidos. Como major e tenente-coronel comanda em Tancos, de 1927 a 1937, o Grupo Independente de Aviação e Combate, de onde segue para Espanha para integrar, até 1938, a Missão Militar Portuguesa de Observação da guerra civil naquele país. Como coronel foi Inspector da Arma de Aeronáutica e, como brigadeiro, foi 2º Comandante do Comando Geral da Aeronáutica Militar. Em Outubro de 1946 é passado compulsivamente à reforma, por estar envolvido numa alegada rebelião armada.


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José Manuel Sarmento de Beires (36/1903) Em Maio de 1917 obteve o seu brevet de piloto. Dois meses mais tarde segue para França, para os serviços de Aviação do CEP, onde frequenta as Escolas de Aviação de Chartres, Chateauroux e Avord, qualificando-se como piloto de caça. Em 1918 é colocado no Grupo de Esquadrilhas República e em 1920 efectuou o primeiro voo nocturno da aviação portuguesa. Ainda em 1920, juntamente com o seu camarada Brito Pais, sem autorização ministerial, mas com o beneplácito do seu comandante Major Maya, tenta fazer a ligação da Amadora à Madeira. Sobrevoam a Madeira, mas as más condições atmosféricas impedem a sua aterragem na ilha e empreendem o regresso ao Continente, mas acabam por amarar por falta de combustível, sendo salvos por um navio inglês, que os localizou. O ministro da guerra ficou com um problema entre mãos, tendo hesitado entre a punição ou o louvor dos destemidos pilotos, acabando por optar pelo louvor em Ordem do Exército. Em 1921, já como capitão, foi nomeado comandante da Esquadrilha de Combate do seu Grupo de Esquadrilhas. Em 1924, de novo na companhia de Brito Pais, parte de Vila Nova de Milfontes com destino a Macau, tripulando o «Pátria», um Breguet Br 16 e, em escala em Tunes, o mecânico Manuel Gouveia completa a tripulação. A viagem decorre sem incidentes até à Índia e, próximo da cidade de Jodhpur, fazem uma aterragem de emergência devido a sobreaquecimento do motor. O avião fica destruído mas a tripulação saiu ilesa. Na Índia é comprado um outro avião, um DeHavilland DH9, baptizado de «Pátria II», com que é reatada a viagem. Atingem Macau, onde não conseguem aterrar devido às más condições atmosféricas seguindo para Cantão, onde a situação se repete. Rumo a Hong Kong, acabam por aterrar a alguns quilómetros desta cidade, em terreno não preparado, onde o avião partiu o hélice e o trem de aterragem. De Hong Kong os aviadores foram levados na canhoneira «Pátria» para Macau, onde foram recebidos apoteoticamente. Foram voados 16000km em 115 horas; De 1925 a 1931 fez parte direcção da revista «Seara Nova», de oposição ao regime do Estado Novo. Em 1927, na companhia de Jorge Castilho, Duvale Portugal e do mecânico Manuel Gouveia, parte de Alverca com o hidroavião «Argos», para dar a volta ao mundo. Escalam Casablanca, Vila Cisneiros e atingem Bolama, na então Guiné Portuguesa, onde por necessidade de redução de peso da tripulação Duvale Portugal se sacrifica e deixa a missão. De Bolama seguem para Fernando Noronha, no Brasil, voando 18 horas, a maior parte das quais de noite, cobrindo uma distância de 2500km. No Brasil recebem instruções do governo para regressarem a Portugal, via Cabo Verde e Madeira.

A conselho de Gago Coutinho, com quem estavam em contacto, optam por regressar via América do Norte, Terra Nova e Açores. Partem então de Belém, no Brasil, rumo às Guianas, mas após algumas horas de voo um rasgão de grandes dimensões na tela da asa esquerda obriga-os a amarar. Ao pôr do sol são recolhidos por dois pescadores e regressam a Lisboa onde ninguém estava à sua espera para os receber. No entanto, em 1928, a Liga Internacional dos Aviadores envia a Sarmento de Beires um diploma considerando o seu voo de 1927 como um dos feitos aeronáuticos mais importantes desse ano. Em Julho de 1928, Sarmento de Beires participa numa tentativa de golpe militar contra o Estado Novo, é demitido da Aeronáutica e abandona o país, indo-se fixar em França, onde continua a sua actividade anti-regime. Em 1929/1930, ao serviço do governo francês, foi conselheiro aeronáutico em Hanói. Regressou clandestinamente a Portugal em 1931 e faz parte do grupo organizador do golpe de Estado de Agosto do mesmo ano, tendo feito sair de Alverca 4 aviões, que bombardearam várias instalações militares em Lisboa e Almada. O golpe foi dominado e Sarmento de Beires abandona de novo o país, voltando porém em 1933, para ser preso pela policia politica. É julgado em 1934, sendo condenado a 7 anos de desterro e 10 anos de perda de todos os direitos cívicos. Depois de passagens por Espanha, França, Macau e Moçambique fixa-se no Brasil e, em 1951, é amnistiado sendo reintegrado no Exército na situação de major na reserva. Em Agosto de 1972 é promovido por distinção a Coronel. Era agraciado com os graus de comendador das Ordens Militares da Torre e Espada, de Cristo e de Santiago da Espada e da Ordem do Império. Era cavaleiro da Legião de Honra de França e da Ordem do Rei de Camboja.


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Jorge de Sousa Gorgulho (214/1905)

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ez parte do «Curso Histórico de Vila Nova da Rainha», sendo dos primeiros a ser largado. Demonstrando magnificas qualidades de piloto e desembaraço obteve o seu diploma, que era o nº 3 concedido pelo Aero Club de Portugal, então delegado da Federação Aeronáutica Internacional, no dia 11 de Abril de 1917, em avião Farman, F-41, com 37,30 horas de voo. Mobilizado para a Esquadrilha Expedicionária a Moçambique, embarca a 3 de Julho de 1917, vindo a desembarcar 32 dias mais tarde no norte de Moçambique, em Mocímboa da Praia. Aí chegado competia-lhe pôr a voar e testar os 3 aviões F40, que constituíam os meios aéreos da esquadrilha, dado que os outros dois

pilotos da esquadrilha (Tenentes João Luís de Moura e Francisco Aragão) só mais tarde seguiram para Moçambique. Ao fim de um mês de trabalho árduo o primeiro avião ficou pronto a voar. No dia 7 de Setembro de 1917 o Alferes Jorge Gorgulho faz o seu primeiro voo, que é o primeiro voo de um português em terras de África. No dia seguinte Jorge Gorgulho faz o seu segundo e derradeiro voo - ao executar uma volta apertada o avião entra em perda, cai estrondosamente e incendeia-se em seguida. Gorgulho é prontamente socorrido e retirado ainda com vida do avião, mas acaba por falecer, ao fim de cinco horas, não resistindo às extensas queimaduras que sofrera.

Eduardo Francisco Azeredo de Vasconcelos (191/1899)

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oncluído o seu curso no Colégio Militar, assentou praça no Exército, em Outubro em 1906. Vindo do Regimento nº 4 de Cavalaria do Imperador da Alemanha, onde era 1º sargento graduado cadete, foi transferido para a Armada, em 19 de Setembro de 1907, ingressando no respectivo Corpo de Alunos. A 31 de Março de 1911 foi promovido a Guarda Marinha e a 29 de Novembro de 1913 foi promovido a 2º Tenente. A 8 de Dezembro de 1916 faz a sua apresentação na Secretaria da Guerra, a fim de seguir para a Escola Aeronáutica Militar para frequentar o curso de piloto aviador. A 29 de Março de 1917 presta provas satisfatórias para piloto aviador. A 9 de Abril de 1917 regressa à Armada apresentando-se na Majoria General, seguindo no início de Maio para França para frequentar a Escola de Aviação de S. Raphael. Obtido o brevet de piloto de hidroaviões a 29 de Junho de 1917, regressa a Portugal no mês de Agosto seguinte para se apresentar de novo na Majoria General da Armada. Em Outubro de 1917 é promovido a 1º Tenente. A 5 de Dezembro de 1917, em requerimento ao Ministro da Marinha solicita a sua passagem para o Ministério da Guerra, a fim de ser agregado à Esquadrilha que devia partir para a frente de batalha em França. Esta petição não teve efeito, sendo o requerente transferido, a 2 de Fevereiro de 1918, para a Direcção dos Serviços de Aeronáutica Naval. Como 1º Tenente morre em patrulha aérea de guerra ao largo da barra de Lisboa, a 23 de Agosto de 1918.

Na sequência da sua morte é louvado, por Portaria de 4 de Outubro de 1918, porque «sendo piloto de hidroaviões no Centro de Aviação Marítima do Bom Sucesso e tendo saído no dia 23 de Agosto de 1918 em reconhecimento, por virtude de um alerta de submarino, acompanhado por outro aparelho que amarou com avaria, não o abandonou sem lhe ter trazido socorro, continuando sozinho o reconhecimento, com o maior espírito de abnegação e sacrifício, pois não ignorava o perigo que assim corria, lembrando-se somente que poderia encontrar e atacar o submarino assinalado, encontrando a morte nesse reconhecimento». Por decreto de 18 de Outubro de 1918 foi condecorado com o 1º grau da Cruz de Guerra e, por decreto de 20 de Março de 1919, foi-lhe concedida a medalha de prata comemorativa das campanhas do Exército Português «1916-17-18». A 31 de Maio de 1919 foi promovido, a título póstumo, por distinção, ao posto de Capitão-Tenente, a contar de 23 de Agosto de 1918 por, «como piloto de hidroavião, ter ao largo do Cabo da Roca morrido no seu posto de combate».


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Luís Carlos da Cunha e Almeida (156/1898)

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endo concluído o seu curso de pilotagem, em 1917, em Vila Nova da Rainha, segue para França para frequentar um estágio de treino de adaptação ao ambiente de guerra que aí se travava. Iniciou o seu treino na Escola de Chateauroux, passando depois para a Escola Avord de Aperfeiçoamento, em Nieuport. Daí seguiu para a Escola de Combate e Acrobacia em Pau, terminando a sua preparação na Escola de Tiro Aéreo em Cazeaux. Concluído o seu período de treino pede para prestar serviço numa esquadrilha francesa, sendo colocado na esquadrilha SPA 79 «Os Lobos», que era comandada pelo grande às da aviação Robert Frank. Nessa esquadra, o já Capitão Cunha e Almeida, praticou actos de grande coragem e abnegação na execução de reconhecimentos aéreos a grande distância, os quais mereceram o louvor do comando francês, sendo agraciado em Portugal com o grau de cavaleiro da Ordem Militar de Cristo. Terminada a guerra regressa a Portugal e oferece-se de imediato para integrar uma esquadrilha de aviação expedicionária a instalar no Sul de Angola, no Lubango. Aí chegado houve que preparar instalações, montar e testar o material aéreo e garantir a sua manutenção continuada. A esquadrilha teve uma curta vida atribulada, devido à falta de verbas para a compra de combustível para as aeronaves.

É

pois esta, em traços gerais, a história dos oito «filhos do Colégio Militar» pioneiros da Aviação Militar portuguesa, que muito honraram o Colégio, as Forças Armadas e Portugal. Alguns deram a vida pela Pátria voando, quatro tiveram as suas carreiras militares prejudicadas por se oporem ao regime do «Estado Novo». Honramos as suas memórias e prestamos-lhes a nossa homenagem, não deixando cair no esquecimento os seus nomes. Chegado ao termo deste escrito, admito que haja leitores que se interroguem acerca do destino do grande entusiasta e precursor da aviação, Pedro Fava Ribeiro de Almeida (164/1892), repetidamente referido no meu artigo «100 anos de Aviação Militar». Como puderam constatar não foi piloto, mas não deixou a aviação. De acordo com indicado na obra «Colégio Militar. Berço de Grandes Portugueses», da autoria do nosso historiador Costa Matos (96/1950), em 1915/16 terminou de forma brilhante o curso de engenharia aeronáutica na Escola Superior de Aeronáutica e Construção Mecânica de Lausanne (Suíça), tornando-se assim o primeiro engenheiro

Em Agosto de 1920 foi extinta a esquadrilha, sendo criada em sua substituição o Grupo de Esquadrilhas de Aviação de Angola, que ficou sob o comando de Cunha e Almeida. Em 1921 o Grupo de Esquadrilhas é transferido para o Huambo e os problemas com a falta de gasolina só são resolvidos no inicio de 1923, sendo efectuada em Maio desse ano a primeira viagem aérea em Angola, que ficaria conhecia como o «Circuito do Sudoeste de Angola» ou «Raid dos Três Distritos». A viagem realizou-se com um Breguet XIV, tripulado por Cunha e Almeida, acompanhado pelos pilotos capitão Castro e Silva e tenente Cunha. A primeira etapa foi de Huambo a Benguela, a segunda etapa foi de Benguela a Moçâmedes, a terceira etapa foi de Moçâmedes a Humpata e a última etapa foi de Humpata ao Huambo. Cumprida esta missão Cunha e Almeida regressa à Metrópole em Maio de 1923. Chegado à Metrópole Cunha e Almeida é nomeado Director do Parque de Aeronáutica em Alverca, que a partir de 1928 passa a ter a designação de Oficinas Gerais de Material Aeronáutico (OGMA). Durante doze anos aí realizou uma obra notável. Promovido a tenente-coronel em 1929, foi reformado em 1938, por motivos políticos, dado ser contra o regime ditatorial então vigente.

aeronáutico português. Regressado a Portugal em fins de 1916, passou a Chefe de Mecânicos da Escola de Aeronáutica Militar de Vila Nova da Rainha. Após a reorganização da Aeronáutica Militar, levada a cabo em 1918, foi nomeado director do Parque de Material Aeronáutico, então instalado no campo de Alverca do Ribatejo, que passou a ser conhecido por «Feira do Major», posto que então ocupava. Aqui permaneceu até 1922, ano em que pediu exoneração do cargo.

NOTAS FINAIS • Este artigo baseou-se na História da Força Aérea Portuguesa, da autoria do Coronel Piloto Aviador Edgar Pereira da Costa Cardoso (272/1919); • Os dados biográficos de Eduardo Francisco Azeredo de Vasconcelos (191/1899) foram obtidos no Arquivo Histórico da Marinha. • O título é idêntico ao traduzido do filme intitulado no seu original «Those magnificent men and their flying machines». Vejam-no, ou revejam-no, se puderem, para se deliciarem com o seu humor e a sua elevada qualidade técnica.


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José Fanha (289/1961)

Pedro Manuel do Vale Garrido da Silva (53/1961) pmvgarrido@gmail.com

José Fanha (289/1961)

Poeta, escritor infantil, declamador, animador cultural e tantas coisas mais!

O

Zé Fanha, camarada e amigo de há 55 anos, sempre foi um artista. Durante os tempos do Colégio lembro-me de ele ser sempre um domador de palavras e um declamador encantatório e vibrante. Não me recordo já com exactidão quando isso aconteceu, mas passou-se numa aula de estudos em que o professor pergunta se alguém tinha uma caneta que lhe emprestasse. Levanta-se então o Zé Fanha, que em tom sério e irónico responde: Não tenho. Mas tenho pena! Licenciado em Arquitectura. Foi professor, Orientador Pedagógico e formador de professores do Ensino Secundário nas áreas artísticas. É mestre em Ciências da Educação (2007) com uma tese sobre Comunidades de Leitores. Doutorando na área de História da Educação e da Cultura Escrita na Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação de Lisboa, prepara neste momento tese sobre “Estratégias editoriais e formação de Comunidades Interpretativas entre 1958 e 1974”. Poeta, divulgador de poesia e declamador em milhares de sessões em Portugal e no estrangeiro desde 1969. Autor de textos para rádio, teatro, televisão e cinema, de centenas de letras para canções, de histórias e poesia para a infância. Orientador de Comunidades de Leitores, Ateliers de Poesia, Ateliers de formação para contadores de histórias e Oficinas de Escrita Narrativa e Poesia. Tem percorrido as escolas do país num trabalho de promoção e divulgação do livro e da leitura. Já no Colégio o Zé Fanha andava à volta do teatro e da poesia. Daqui sai em 1968 como um foguetão. Participa no movimento estudantil de contestação ao regime salazarista, integra o Grupo de Teatro da Associação de Estudantes do Instituto Superior Técnico, estuda Arquitectura, torna-

Último livro publicado do Zé


José Fanha (289/1961)

-se jornalista no Record, colabora em "A Mosca", suplemento humorístico do Diário de Lisboa. Em 1969 começou a declamar poesia, acompanhando Zeca Afonso, Xico Fanhais, Manuel Freire, Adriano Correia de Oliveira e vários outros cantores nos chamados Cantos Livres na Universidade e em Sociedades Populares de Cultura e Recreio. Em 1973 é co-fundador do Grupo de Teatro "Lídia a mulher tatuada e os seus actores amestrados". Ficou particularmente conhecido do grande público pela sua participação num famoso concurso de televisão intitulado “A visita da Cornélia” em 1977. Tem escrito para rádio, teatro, cinema e televisão, destacando-se: - a participação na equipa do programa de rádio “Pão com Manteiga”; - a participação como autor em inúmeros programas televisivos como “Rua Sésamo”, a telenovela “Na Paz dos Anjos”, as séries “Docas”, “Meu querido Avô”, “Nós os ricos”, “SOS Crianças”, “Ana e os Sete”, “Casos da vida”; - os guiões dos filmes “Ilhéu de Contenda” e “Viúva Rica solteira não fica”; - a colaboração com João Lourenço na adaptação de textos ao teatro como “Oiçam como eu respiro” de Dario Fo e Franca Rame, “Ópera dos três vinténs!” de Bertolt Brecht ou “Sweeny Todd” de Stephen Sondheim; - autoria das peças de teatro "Conversa da treta", "O Trombone", "Zarabadim" e "A Porta". Na literatura trabalha em quatro áreas: Poesia própria, organização de antologias temáticas de poesia, romance e literatura para a infância e juventude. Tem uma longa lista de participações de carácter científico em Simpósios e Congressos, nomeadamente na área da Psicologia, tendo recentemente apresentado uma conferência T-DEX na Faculdade de Ciências da Universidade Nova de Lisboa. Animador incansável do livro e da leitura, cúmplice de projectos múltiplos de Bibliotecas Municipais, é padrinho de várias Bibliotecas Escolares que adoptaram o nome de BIBLIOTECA JOSÉ FANHA (EB23 de Pombais, Odivelas, EB1 do Olival Basto, EB1 nº 3 do Cacém, EB23 Mestre Domingos Saraiva, Algueirão) e CENTRO DE RECURSOS JOSÉ FANHA (EB23 da Venda do Pinheiro). Não se cansa de afirmar, mesmo através dos meios de comunicação onde aparece, que o Colégio Militar é a sua matriz de vida e que foi aqui que adquiriu os valores de dignidade, ética e cidadania por que se rege. Foi Prémio Barretina Notoriedade em 2009.

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Publicações Poesia

de um sorriso” (Porto Editora, 2014), “Era uma vez o 25 de Abril” (Objectiva/Alfaguara, 2014).

"Cantigas da dúvida e do perguntar" (Ed. AEFCL, 1970), "Olho por olho" (Ed. Autor, 1976), "Busca" (Ed. Autor, 1977), "Cartas de marear" (Ed. Barca Nova, 1985), "O riso das aves" (Ed. Autor, 1987), “Eu sou português aqui” (Ed. Ulmeiro, 1995), “Breve tratado das coisas da arte e do amor” (Ed. Ulmeiro, 1995), “Elogio das pedras, dos peixes e dos simples” (Ed. Campo das Letras, 1999), “Tempo azul” (Ed. Campo das Letras, 2003), “Poemas da linha da frente – a guerra”, reunião de poemas seus e de José Jorge Letria (Ed. Ausência, 2003), “POESIA” reunião da poesia publicada e alguma inédita de 1971 a 2011 (Ed. Lápis de Memórias, 2012).

Autor em conjunto com Alice Vieira, João Aguiar, José Jorge Letria, Luísa Beltrão, Mário Zambujal e Rosa Lobato Faria dos romances “Os novos mistérios de Sintra” (Ed. Oficina do Livro, 2005), “O código d’Avintes” (Ed. Oficina do Livro, 2006) e “Eça agora” (Ed. Oficina do Livro, 2007). Autor em conjunto com Afonso Cruz, Alice Vieira, André Gago, Catarina Fonseca, David Machado, Isabel Stilwell do romance “A misteriosa Mulher da Ópera” (Ed. Casa das Letras, 2013).

Para crianças e jovens

Teatro

"Grande, grande, era o mágico Marlini" (Ed. Fungágá, 1977), "A porta" (Ed. Quetzal, 1990), “La porta” (Ed. Adriano Salami, Itália, 1995), “A noite em que a noite não chegou” (Ed. Campo das Letras, 2001), “Cantigas e cantigos” (Ed. Terramar, 2004), “Poemas com animais” antologia de poemas portugueses sobre animais (Ed. Gailivro, 2004), “Diário Inventado de um Menino já Crescido” (Ed. Gailivro, 2004), “O dia em que o mar desapareceu” (Ed. Gailivro, 2005), “Poemas da natureza” antologia de poemas portugueses sobre a natureza (Ed. Gailivro, 2006), “Alex Ponto Com” (Ed. Texto, 2006), “Poemas para um dia feliz” antologia de poemas portugueses (Ed. Gailivro, 2007), “O dia em que a mata ardeu” (Gailivro, 2007), “Zulaida e o Poeta – e outros contos” (Ed. Gailivro, 2007), “Alex Ponto Com 2 – Joe Silicone vai à escola” (Ed. Texto, 2007), “Missão em Happy-Cosmos”, em conjunto com Luísa Beltrão, (Ed. Presença, 2008), “Os sapatos do pai Natal” (Ed. Galivro, 2008), “A porta” (Ed. Gailivro, 2ª dição 2009, 3ª edição), “Sol Negro”, em conjunto com Luísa Beltrão, (Ed. Presença, 2009), “O dia em que a barriga rebentou” (Ed. Gailivro, 2009), “Alex Ponto Com 3 – Mary Lob, a lagosta assassina” (Ed. Texto, 2009), “Histórias para contar em noites de luar” (Ed. Gailivro, 2010), “Era uma vez a República” (Ed. Gailivro, 2010), “O meu amigo Zeca Tum-Tum e os outros” (Ed. Gailivro, 2010), “Esdrúxulas, graves e agudas, gordinhas e barrigudas” (Ed. Texto, 2010), “Cantigas e cantigos para formigas e formigos” (Ed. Terramar, 2010), “Dentinho Dentola e Dentão” (Ed. Gailivro, 2011), “A namorada japonesa do meu avô” (Ed. Gailivro, 2011), “As orelhas voadoras” (Edições Paulinas, 2013), “Quando o sol está a brilhar” (Ed. Gailivro, 2013), “Mãos no chão e pés no ar” com Daniel Completo (Oficina dos sons e das cores, 2014), “Histórias na ponta

Ficção

Versão (em conjunto com João Lourenço) de "Baal" de Bertolt Brecht (Ed. Barca Nova, 1982). Versão (em conjunto com Vera San Payo Lemos e João Lourenço) de “Sweeny Todd" de Steven Sondheim (Ed. Relógio d’Água, 2008).

Antologias organizadas

“De palavra em punho” – antologia da poesia da resistência de Fernando Pessoa ao 25 de Abril (Ed. Campo das Letras, 2004).

Antologias organizadas em conjunto com José Jorge Letria “Cem sonetos portugueses” (Ed. Terramar, 2002), “Cem poemas portugueses do Adeus e da Saudade” (Ed. Terramar, 2002), “Cem poemas portugueses sobre Portugal e o mar” (Ed. Terramar, 2003), “Cem poemas portugueses do riso e do mal dizer” (Ed. Terramar, 2003), “Cem poemas portugueses sobre a infância” (Ed. Terramar, 2004), “25 de Abril, 30 anos, trinta poemas” (Ed. Campo das Letras, 2004), “Cem poemas portugueses no feminino” (Ed. Terramar, 2005) e “LIRA DO POVO – 500 quadras populares” (Ed. Terramar, 2008).

Testemunhos

“Zeca Afonso – O que faz falta” (Ed. Campo das Letras, 2004), recolha de testemunhos sobre José Afonso, feita em conjunto com José Jorge Letria.

Textos de Intervenção

“Manifesto anti-leitura” (Editora Pássaro na Cabeça, 2013). José Fanha queridasbibliotecas.blogspot.com 7leitores.blogspot.com


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Deambulações pela Literatura, Matemática, Física e Filosofia...

António Rafael Passarinho Franco Preto 67/1950

Deambulações

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pela Literatura, Matemática, Física e Filosofia...

T

endo lido um primeiro livro dum escritor Americano chamado Adam Fawer2 (romance que pode ser considerado do tipo “thriller”) cujo título é simplesmente “IMPROBABLE”, decidi “passar ao papel” algumas reflexões, pensamentos e conceitos de certa maneira relacionados (ou mesmo expressamente descritos no romance em causa): uns do tipo mais ou menos filosófico, outros mais ou menos científicos (outros ainda – os de maior complexidade – estabelecendo relações e interdependências entre as duas áreas). Começo por relembrar um filme que vi há anos (o título é secundário…) em que a certa altura, um anjo inexperiente era severamente admoestado pelo seu supervisor, devido a ter interferido indevidamente no binómio “probability and outcome”. Resumidamente, o anjo nunca deveria ter interferido (provocando ele próprio o desenlace duma situação) sem que as leis das probabilidades tivessem dado o seu veredicto (que até podia eventualmente ser a decisão que o anjo tinha tomado antes de tempo… o que não tinha sido o caso). Aliás, entendo que o título do livro de Adam Fawer também podia ser precisamente “Probability and Outcome”. Deixei pois a minha mente vaguear a seu belo prazer por várias áreas “científicas”: Cálculo de Probabilidades e Estatística, Esquizofrenia, Experiências Mentais, Paradoxos, Filosofia, Física

Clássica e Quântica, ... Nota para o leitor - Sempre que ao longo do texto surja uma designação nova tentaremos dar sucintamente o seu significado. Comecemos então a nossa viagem, abordando a área das probabilidades que são o objecto de uma palestra da personagem principal de IMPROBABLE (de nome David Caine). Qual o assunto envolvendo probabilidades que é provavelmente o preferido da maioria? Talvez a lotaria (qualquer tipo de lotaria)! Consideremos que a probabilidade de ganhar o euromilhões é de aproximadamente uma para 75 milhões e que a de ganhar o powerball (o euromilhões americano) é de aproximadamente uma para 120 milhões; no entanto, desde que há powerball (1997), mais de 50 pessoas desafiaram as probabilidades e venceram o jackpot (derrotando o mais que provável “outcome”)! Falemos de um outro acontecimento com probabilidades mínimas de se concretizar: a nossa civilização ser aniquilada pela colisão de um asteróide gigante com o nosso planeta. Calcula-se que a probabilidade de isso acontecer num dado ano é de aproximadamente uma num milhão. Assumindo que o planeta Terra tem uns 7 milhões de anos, a probabilidade de um qualquer asteróide já ter destruído o nosso planeta é de aproximadamente 700 por cento! Por outras palavras, já deveríamos estar todos

mortos, umas sete vezes! Contudo isso – felizmente – ainda não aconteceu! Com os dois exemplos apresentados quis somente lembrar que há acontecimentos (“positivos” ou “negativos”) que, não obstante as suas muito reduzidas probabilidades de se realizarem, acabam mesmo por acontecer. Em resumo: “SOMETIMES, SHIT HAPPENS!” (O leitor perdoe-me a liberdade de expressão… ) O personagem imaginário David Caine é muito complexo. O romance aborda acontecimentos fictícios ocorridos com o “herói”, que sofre de convulsões epilépticas e é esquizofrénico; David é assistente universitário de estatística e um jogador compulsivo de “poker”; tem problemas com a máfia russa por dívidas de jogo e com a CIA e outras “agências” Americanas devido à sua capacidade de prever os mais improváveis desenlaces (“outcomes”); para além disso, consegue descrever ao leitor grande parte do que se passa na sua mente esquizofrénica em diversas situações, conseguindo controlá-la dentro de certos limites… O autor Adam Fawer elucida o leitor – antes de iniciar o seu livro – sobre os seus objectivos: I wanted to create a story that would not only keep readers up at night but give them something to think about, when they were through3.

1 Da minha mente. Este artigo é uma versão reduzida – especificamente feito para a nossa revista – do meu Ensaio original com o mesmo título. 2 Nascido em 1970 em New York. Adam Fawer é licenciado e mestre pela University of Pennsylvania e tem um MBA pela Stanford Graduate School of Business. 3 Eu quis escrever uma história que não só mantivesse os leitores acordados à noite mas que também lhes desse que pensar quando acabassem de ler o meu livro.


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PROVÁVEL”; no “website” do autor http:// www.improbablebook.com existe - entre outras coisas – um jogo para computador baseado no enredo do livro…). Já que falamos de probabilidades, devemos mencionar dois nomes de cientistas que se distinguiram nesta área: Abraham de Moivre e o Marquês Pierre Simon Laplace.

John Forbes Nash

Abraham de Moivre

O que eu vou escrever ao longo deste artigo vai mostrar que – pelo menos comigo – o escritor teve sucesso! Note-se que alguns dos conceitos desenvolvidos por vários filósofos e cientistas como Laplace, Einstein, Heisenberg, Schrödinger, John von Neumann e outros, são objecto de discussões vivas entre o “herói” do livro (David Caine) e amigos seus… Uma vez que o nosso “herói” era esquizofrénico, procuremos um esquizofrénico famoso. É ele John Forbes Nash, falecido em Maio de 2015 num acidente de automóvel, a quem se devem importantes contribuições científicas nas áreas da economia, biologia e teoria dos jogos (nos seus aspectos mais complexos). Doutorado aos 22 anos (!) pela Universidade de Princeton (USA) em 1950, recebeu em 1994 o “Bank of Sweden Prize in Economic Sciences”, também conhecido como o verdadeiro Prémio Nobel da Economia (pelas consequências práticas desenvolvidas ao longo dos anos, com base no trabalho científico iniciado com a sua tese de doutoramento!).

de os vencerem. (John von Neumann foi outro dos cientistas que também dedicou parte do seu tempo ao desenvolvimento da “teoria dos jogos”). Tão complexo como descrever o que se passa dentro do cérebro dum esquizofrénico - que durante parte do tempo está completamente lúcido, inteligente e “liberto da doença” - é a enumeração das drogas usadas e das várias consequências conhecidas que poderão causar. Tudo isto é incomparavelmente mais complexo que o cálculo das probabilidades num jogo de “poker” e noutras situações difíceis (a que o “herói” do romance IMPROBABLE sobrevive). É pois um facto, que de vez em quando surge um “génio maluquinho esquizofrénico” como John Forbes Nash; uma interpretação filosoficamente possível é a de que efeitos secundários das drogas (algumas experimentais...) actuando sobre um cérebro já extraordinário, leva-o a ter o poder de alcançar/construir raciocínios e princípios teóricos matemáticos e físicos “impossíveis” de serem desenvolvidos por seres normais (como nós julgamos ser...)

Como se sabe, a “teoria dos jogos” é uma área científica com uma componente extremamente intensa de matemática avançada e cálculo de probabilidades que todas as potências mundiais que se prezam (vulgo, Americanos… entre outros) usam até “à exaustão” nos chamados “jogos de guerra” para tentar prever todos os cenários possíveis geradores de conflitos e – evidentemente – o processo

John Forbes Nash - No livro IMPROBABLE, os espiões e a máfia russa servem de “background” introduzindo evidentemente grande parte da acção, possibilitando assim ao livro ser considerado um “thriller” mais vendável (e o facto é que já foi traduzido em 17 línguas, incluindo a nossa, com o título “IM-

Abraham de Moivre, 1667-1754, foi um matemático francês famoso pela Fórmula de Moivre, que relaciona os números complexos com a trigonometria, e pelo seu trabalho na distribuição normal e na teoria das probabilidades, de que foi um precursor; viveu em Inglaterra – onde a estatística estava ainda na sua infância – durante muitos anos (fugindo às perseguições religiosas existentes em França), ganhando a vida dando aulas e vendendo “palpites” para acontecimentos sujeitos a apostas. Embora não acreditando em acontecimentos aleatórios4 (Moivre era adepto do Determinismo – “não há acaso, tudo tem uma razão de ser ou acontecer”; não há acontecimentos aleatórios ou imprevisíveis; acontece simplesmente que “ainda” não somos capazes de os prever por não conhecermos em profundidade todas as variáveis que os condicionam…) compreendia que, para efeitos de calcular probabilidades, havia um sem número de acontecimentos que se podiam tratar matematicamente como aleatórios, devido à impossibilidade de se conhecerem e/ou executarem medições correctas de todas as variáveis (incluindo as “estranhas” ou “parasitas”) que afectavam esses mesmos acontecimentos. Esta sua maneira de pensar não impediu que publicasse um livro de 50 páginas intitulado “A Doutrina do Acaso” em que descrevia algumas das mais importantes bases da teoria das probabilidades (que explicava através de jogos de dados). É uma das personalidades cujas teorias são objecto de vivas discussões entre David Caine e os seus amigos. O Marquês Pierre Simon de Laplace (17491827) foi um matemático, astrónomo e físico francês. Foi chamado o Newton da França, sendo considerado o fundador da moderna teoria das probabilidades. A teoria das probabilidades tem como um

4 Pormenor interessantíssimo. Na realidade ele precisava de considerar a sua existência para ganhar a sua vida a “vender palpites” (resultantes da aplicação da “sua teoria das probabilidades” a casos da vida real).


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da caverna de Platão6. As experiências mentais em física remontam pelo menos à época de Galileu Galilei. Muitas experiências mentais incluem aparentes paradoxos sobre factos conhecidos ou aceites, e têm permitido reformular ou precisar em maior profundidade, diferentes teorias científicas.

Marquês de Laplace

Albert Einstein

dos objectivos principais a minimização dos erros estatísticos (da maior importância na indústria seguradora, por exemplo). Laplace é conhecido principalmente pelo seu trabalho sobre equações diferenciais, pela Transformada de Laplace e Equação de Laplace, tendo ficado também famoso pelo Demónio de Laplace, que é uma experiência mental por si concebida (e que é utilizada pelo autor de “IMPROBABLE”, possibilitando que o seu herói – em circunstâncias muito específicas – “veja” o futuro):

riment) constitui um raciocínio lógico sobre uma experiência não realizável na prática, mas cujas consequências podem ser exploradas pela imaginação, pela física ou pela matemática. Essas experiências são utilizadas para se compreenderem aspectos não experimentáveis do Universo. A expressão foi popularizada pelos Gedankenexperiment utilizados por Albert Einstein para explorar algumas das consequências da teoria da relatividade. Uma experiência mental clássica permite, por exemplo, demonstrar a conhecida equivalência massa-energia expressa pela equação: E = mc2 Quando um corpo tem massa m podemos dizer que esse corpo tem um conteúdo energético E definido por E = mc2. Esta equação estabelece a relação entre a energia E (expressa em “joules”) e a massa m (expressa em “quilogramas”). O valor c é o valor da velocidade da luz no vácuo (expressa em “metros por segundo”). O conteúdo energético dum corpo é a soma de sua energia cinética com todas as energias armazenadas no seu interior e com a energia da radiação que pode ser obtida pela conversão das suas partes materiais. Contudo, o conceito de experiência mental é muito mais antigo e remonta à tradição grega. Um exemplo famoso é a alegoria do mito

Eis o enunciado do “Demónio de Laplace”: De posse de todas as variáveis que determinam o estado do universo num instante t, é possível prever o seu estado no instante t”>t. Tal conceito é sustentado, conforme aponta o filósofo francês Jean-François Lyotard (19241998) no seu clássico "Condição pós-moderna", "pelo princípio de que os sistemas físicos, inclusive o sistema dos sistemas que é o universo, obedece a regularidades; por conseguinte, a sua evolução constituirá uma trajectória previsível e dará lugar a funções contínuas “normais” (abrindo logicamente caminho à futurologia...)"5. Tendo sido mencionado o termo “experiência mental” torna-se necessário a sua definição: Em filosofia e em física, uma experiência mental (da expressão alemã Gedankenexpe5

O MITO DA CAVERNA DE PLATÃO

Caverna de Platão

Da autoria do filósofo Platão (século IV antes de Cristo), e encontra-se na obra intitulada A República. Trata-se da exemplificação de como nos podemos libertar da condição de escuridão que nos aprisiona, através

da luz da verdade. A metáfora de Platão define a realidade como sendo composta de dois domínios: o domínio dos sentidos e o domínio das ideias. Para ele, a maioria da humanidade vive na infeliz condição da ignorância, ou seja, vive no mundo ilusório das coisas sentidas, as quais são mutáveis, não são universais (nem necessárias) e, por isso, não são objectos de conhecimento. O mundo das ideias, percebido pela razão, está acima dos sentidos e é controlado pela subjectividade. SOBRE O TERMO PARADOXO Como ilustração de um paradoxo, o frasco com auto-fluxo de Robert Boyle (16271691) está representado neste diagrama

A dificuldade é o conhecimento de todas as variáveis e das suas variações. Mas o princípio matemático posto em evidência pelo “Demónio de Laplace” é incontroverso!

6 Todos os leitores que se interessarem por algumas das áreas específicas mencionadas neste artigo, deverão investir o seu tempo a estudá-las, sendo a internet um veículo ideal

para isso. Eu limito-me praticamente a enumerá-las e pouco mais, por elas terem aparecido como áreas de discussão no romance IMPROBABLE. Aliás, utilizo ao longo deste texto algumas descrições tiradas directamente da internet.


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(mas – evidentemente – as máquinas de moto contínuo não existem). Um paradoxo é uma declaração aparentemente verdadeira que leva a uma contradição lógica, ou a uma situação que contradiz Paradoxo a intuição comum. Em termos simples, um paradoxo é “o oposto do que alguém pensa ser a verdade”. A identificação de um paradoxo baseado em conceitos aparentemente simples e racionais tem, por vezes, auxiliado significativamente o progresso da ciência, da filosofia e da matemática. Deve ser notado que muitos paradoxos dependem de uma suposição essencial: que a linguagem (falada, visual ou matemática) representa / traduz de forma exacta a realidade que descreve. Em mecânica quântica, podem ser observados muitos comportamentos paradoxais: o princípio da incerteza de Heisenberg, é um dos seus exemplos mais importantes. A junção de uma experiência mental com um paradoxo é, mais à frente, magistralmente descrita por Erwin Schrodvinger. SOBRE A MECÂNICA QUÂNTICA A Mecânica Quântica é a parte da física que estuda o estado de sistemas onde não valem alguns dos conceitos usuais na mecânica clássica, como por exemplo o de trajectória (tal como é nela definida); estuda usualmente o movimento das “partículas muito pequenas”, ou seja, a nível microscópico. O conceito de “partícula muito pequena”, mesmo de limites muito imprecisos, relaciona-se com as dimensões nas quais começam a ficar evidentes certos efeitos específicos, como por exemplo, a impossibilidade de conhecer com exactidão “infinita” e em simultâneo, a posição e a velocidade de uma partícula. Os efeitos referidos chamam-se "efeitos quânticos". Assim, a Mecânica Quântica, é a ciência que descreve o movimento de sistemas nos quais os “efeitos quânticos” são relevantes. Experiências mostram que estes são relevantes em escalas de (digamos…) até 1000 átomos. Não há experiências “realizadas” com macrossistemas, e a sua aplicabilidade a eles é – de certa maneira – uma incógnita…

SOBRE O PRINCÍPIO DA INCERTEZA DE HEISENBERG Consiste num enunciado da mecânica quântica, formulado inicialmente em 1927 por Werner Heisenberg impondo restrições à precisão com que se podem efectuar medições. Werner Heisenberg A explicação disso é fácil de se entender, embora o raciocínio clássico e os aspectos formais da análise matemática tenham levado os cientistas a pensarem diferentemente durante muito tempo. Quando se quer encontrar a posição de um electrão, por exemplo, é necessário fazê-lo interagir com algum instrumento de medida, directa ou indirectamente. Por exemplo, faz-se incidir sobre ele um certo tipo de radiação. Tanto faz que se considere a radiação no modo “clássico” – constituída por ondas electromagnéticas – ou no modo “quântico” – constituída por corpúsculos (fotões); esta situação é aliás conhecida como o princípio da dualidade onda-corpúsculo da radiação. Se quisermos determinar a posição do electrão, é necessário que a radiação utilizada para a sua medição, tenha um comprimento de onda da ordem de grandeza da incerteza com que se quer determinar a posição do electrão. Neste caso, quanto menor for o comprimento de onda, maior é a precisão da medição. Contudo, maior será também a energia cedida pela radiação (“onda” ou “fotão”) no acto de medida e o electrão sofrerá uma alteração na sua posição (podemos dizer, um recuo motivado pelo impacto), que será tanto maior, quanto maior for essa energia. Como consequência, a sua velocidade sofrerá também uma alteração não de todo previsível (ao contrário do que afirmaria a mecânica clássica). Em conclusão, demonstra-se que, para tentarmos medir a velocidade de algo “quântico” com precisão, alteraremos a sua posição de modo não totalmente previsível. SOBRE A DUALIDADE ONDA-CORPÚSCULO DA RADIAÇÃO Experiências efectuadas provam que as naturezas ondulatórias e corpusculares do electrão não podem ser determinadas simulta-

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neamente. A tentativa de determinar uma, inviabiliza a determinação da outra. Essa constatação da dupla natureza da matéria (e da luz) tem a designação de princípio da complementaridade. SOBRE O PRINCÍPIO DA COMPLEMENTARIDADE O princípio da complementaridade foi enunciado por Niels Bohr em 1928 e afirma que a natureza da energia e da matéria é dupla e os seus aspectos ondulatório e corpuscular não são contraditórios, Niels Bohr mas complementares. Daí vem o nome do princípio. Isto significa que a natureza corpuscular e ondulatória são ambas detectáveis separadamente e surgem de acordo com o tipo de experiência efectuada. Enquanto há experiências em que é evidenciada a natureza ondulatória da luz, há outras em que a natureza que é evidenciada, é a corpuscular. O mesmo acontece no que se relaciona com a matéria. Assim, o princípio da complementaridade atesta a ambiguidade e natureza dupla (corpuscular e ondulatória) da energia e da matéria. SOBRE O PARADOXO DO GATO DE SCHRODINGER O Gato de Schrödinger é uma experiência mental que procura ilustrar as dificuldades decorrentes com problemas filosóficos provenientes das teorias da mecânica quântica, numa eventual passagem dos sisteParadoxo de Schrodinger mas sub atómicos para os sistemas macroscópicos. Em 1935, Erwin Schrödinger, ilustrou este ponto, com uma experiência mental (ideal), agora famosa, que tem a ver com um gato. Um gato está fechado numa câmara de aço, junto ao seguinte dispositivo diabólico (que assume que o gato não pode interferir no desenrolar dos acontecimentos): num contador Geiger há um pedacinho de uma substância radioactiva, de que talvez, no decorrer de uma hora, se desintegre um átomo (mas


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Universos paralelos?

também pode acontecer com igual probabilidade, que nenhum átomo se desintegre); se acontecer o primeiro caso, produz-se uma descarga no tubo, libertando um martelo que rompe um frasquinho de ácido cianídrico, matando o gato. Assumindo que a experiência dura uma hora, diremos que o gato sobreviverá, se nesse intervalo de tempo não se tiver desintegrado nenhum átomo. A primeira desintegração atómica, matará o gato. Nas nossas mentes está absolutamente claro que, finda a experiência, o gato deve estar vivo ou morto. No entanto, segundo as regras globais da mecânica quântica, o sistema total dentro da caixa, encontra-se numa sobreposição de dois estados, um com o gato vivo e o outro com o gato morto. Mas que sentido podemos dar a um gato vivo-morto? O Paradoxo do Gato de Schrödinger estudado até ao seu último detalhe (o que é impossível fazer nesta descrição), neutraliza qualquer esperança que possamos ter de que a mecânica quântica seja só aplicável ao “micromundo sombrio” dos átomos, ou que a natureza paradoxal da realidade no domínio atómico, seja totalmente irrelevante para a nossa realidade quotidiana. Se a mecânica quântica for aceite como uma descrição correcta de todo o tipo de matéria, a referida esperança é claramente falsa. Seguindo a lógica da teoria quântica até à sua conclusão final, a maior parte do universo físico parece diluir-se numa fantasia de sombras e incertezas. Isto é ilustrado pelo princípio da complementaridade de Niels Bohr, baseado na natureza da luz (a dualidade onda-corpúsculo). Eis o que Einstein escreveu em 1938 sobre o assunto: O que é a luz? Uma onda ou um conjunto de fotões? Não conseguimos uma descrição consistente do fenómeno luminoso. Parece que por vezes temos de usar uma das teorias, mas outras vezes só a outra teoria permite uma explicação para certos aspectos do fenómeno luminoso (e ainda há aspectos que podem ser explicados por qualquer delas!).

Estamos perante duas imagens contraditórias duma mesma realidade. Nenhuma delas explica completamente o fenómeno luminoso, mas em conjunto, conseguem-no! As considerações preGilbert Ryle cedentes estão intimamente relacionadas com a eterna questão do problema “mente-corpo” na filosofia. Durante muito tempo, muita gente aderiu ao que o filósofo Gilbert Ryle (1900-1976) chamava "ponto de vista oficial" sobre a relação entre a mente (ou alma) e o corpo (ou cérebro), que remonta pelo menos até Descartes. Segundo este ponto de vista, a mente (ou alma) é um tipo especial de substância efémera e intangível, diferente do tipo muito tangível do material de que é feito o nosso corpo (ou cérebro), mas ligada a ele. A mente (ou alma), é então uma “COISA” que pode ter estados - estados mentais - que podem alterar-se (ao receber dados sensoriais) como resultado da sua ligação com o corpo (ou cérebro). Mas isso não é tudo. O acoplamento entre a mente (alma) e o corpo (cérebro) funciona nos dois sentidos, dando-nos a capacidade de gravar a nossa vontade sobre os nossos cérebros e, através dele, sobre os nossos corpos. Hoje em dia, entretanto, estas ideias dualísticas têm caído em desgraça entre muitos cientistas que preferem considerar o cérebro como uma máquina eléctrica enormemente complexa, mas sem nenhum mistério, sujeito portanto às leis da física como qualquer outra máquina. Os estados internos do cérebro devem estar determinados, portanto, devido aos seus estados passados, mais do que pelos efeitos de quaisquer dados pessoais que entrem nele. Do mesmo modo, os sinais emitidos pelo cérebro, que controlam o que chamamos "comportamento", estão completamente determinados pelo estado interno do próprio cérebro em cada momento. A dificuldade com esta descrição materialista do cérebro é a de que parece reduzir as pessoas a simples autómatos, não deixando lugar algum para uma mente independente ou uma vontade livre. Se todos os impulsos nervosos são regulados pelas leis da física, como pode a mente introduzir-se na sua operação? Mas se a mente não se introduz, como é que aparentemente controlamos os nossos corpos, segundo a nossa vontade pessoal?

Uma analogia melhor, talvez mais adequada para a era moderna, pode encontrar-se nos conceitos de hardware e software na informática. Num computador, o hardware desempenha o papel do cérebro, Descartes enquanto o software é análogo à mente. Podemos aceitar com agrado que o resultado proporcionado por um computador está rigorosamente determinado na sua totalidade pelas leis dos circuitos eléctricos mais os dados utilizados. Raramente perguntamos “como se regula o programa para fazer que todos esses pequenos circuitos actuem de acordo com a sequência correcta”? Não obstante, sentimo-nos satisfeitos por sabermos dar uma descrição equivalente em linguagem de software, usando conceitos como input, output, cálculo, dados, respostas, etc. As descrições de hardware e software aplicadas à operação dos computadores são mutuamente complementares, não contraditórias. A situação tem, portanto, um estreito paralelismo com o princípio de complementaridade de Bohr. Certamente, a analogia é visível quando consideramos a questão da dualidade onda-corpúsculo. Como temos visto, uma onda quântica é realmente uma descrição do nosso conhecimento do sistema (quer dizer, um conceito de software), embora um corpúsculo seja uma peça de hardware. O paradoxo da mecânica quântica é que, de certo modo, os níveis de descrição de hardware e software, se entrelaçam inextrincavelmente. Parece que não entenderemos “o espírito no átomo” enquanto não conseguirmos entender “o espírito na máquina”.


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NOTAS FINAIS (para o leitor que conseguiu chegar a este ponto do artigo)

• Os meus sinceros agradecimentos pela sua coragem! • Quando as células cerebrais se tornam hiperactivas, enviam sinais descontrolados que podem provocar convulsões epilépticas; não obstante os progressos da medicina, os médicos continuam a não ter a mínima ideia sobre as causas da maior parte dessas convulsões. • Se com este artigo o dissuadi de ler o livro “IMPROBABLE”, a minha intenção não era – honestamente – essa! • Como deve calcular tive que “surfar” na Internet e consultar livros da época universitária da minha vida, já há muitos arrumados em prateleiras, e estudar e relembrar descrições de carácter filosófico e científico durante dias! • Resta-me a consolação de que, depois de todo este esforço, percebi melhor o livro “IMPROBABLE”! • Tive o cuidado de evitar incluir as dúzias de equações de Matemática e Física avançada, constantes de alguns dos vários assuntos em causa! • As minhas sinceras desculpas pelas “dificuldades filosóficas e técnicas”, nomeadamente as incluídas na descrição do Paradoxo do Gato de Schrödinger, mas – como já tive oportunidade de mencionar – englobam situações vitais que David Caine (o “herói” de “IMPROBABLE”) diz ter vivido. • Fiz o meu melhor para tentar apresentar duma maneira simples, conceitos, definições (e algumas contradições) que foram objecto dos meus pensamentos (e dúvidas) ao ler o livro “IMPROBABLE”. Espero a vossa compreensão para as minhas deficiências / lacunas e eventual falta de clareza em algumas descrições. • Uma confissão: Quando comecei a fazer pesquisas para escrever este artigo, não fazia a mínima ideia onde iria parar! • E, como sempre digo, não teria escrito este artigo, se o desafio representado por ele, não me tivesse dado prazer! E a terminar, não resisto a descrever um episódio específico, dos muitos do livro IMPROBABLE que não incluí no artigo: Descrição da situação - O nosso “herói” está preso no laboratório experimental do médico que lhe administrava as drogas e que achava ter chegado o momento de testar os “novos” poderes mentais de David Caine. Nota: para garantir a boa vontade e empenho do seu paciente nas experiências, tinha também preso o seu irmão gémeo, que igualmente era esquizofrénico (!!!...)

Desafio/ordem do médico ao nosso “herói”: tens de atirar esta moeda 50 vezes ao ar e tem de sair sempre “caras”! …A parte cognitiva do cérebro de David quer gritar, soltar-se dos limites da sanidade e fugir para a eternidade que se estende perante si. Mas outra parte, a parte primitiva, encontra-se em casa. David deixa que essa parte o conduza… Eis o tipo de informações que poderiam aparecer na sua mente: …Há uma ligeira corrente de ar vinda dos ventiladores; é quase imperceptível, mas David consegue vê-la mover as moléculas de oxigénio e de azoto de um lado para o outro. A moeda é de 25 cêntimos e o lado da cara é 0,00128 gramas mais pesado que o lado da coroa. A periferia do padrão da cara é também maior e menos aerodinâmica do que o lado da coroa. Mas estes factores são triviais, quando comparados com a força dos seus dedos e o impulso que der com o pulso algemado e que serão responsáveis, em conjunto, por 98,756 por cento da trajectória da moeda, se bem que a trajectória seja responsável apenas em 58,2451 por cento pelo facto de sair cara ou coroa. Para compreender completamente as causas do resultado final, David analisa a constituição da moeda (o núcleo é 100 por cento de cobre, a superfície é constituída por uma liga de 75/25 de cobre e níquel), bem como o pavimento onde a moeda irá cair (mosaicos de linóleo de 90 centímetros). Estes dois factores são responsáveis por 34, 84322 por cento do resultado final. Outros 0,55164 por cento resultam da proximidade aos pólos magnéticos, 1,12588 por cento da velocidade da rotação da Terra e 2,23415 por cento do estado de limpeza do pavimento. Os restantes 0,00001 são ruído. Tudo analisado (com as variáveis todas conhecidas e procedendo de acordo com essa análise) em 100.000 lançamentos da moeda, David falhará apenas uma vez. E David procede como deve, tirando (sem qualquer surpresa para ele…) 50 vezes seguidas, caras! Se o acontecimento fosse de facto verdadeiramente aleatório, a probabilidade de sair 50 vezes seguidas caras era de 1 para 1.125899.906.842.620! Neste episódio do livro IMPROBABLE facilmente se detectam evidências da “Teoria do Determinismo”, do “Demónio de Laplace”, e do “Paradoxo do Gato de Schrödinger”. Que tal? …Dá que pensar? Especulemos um pouco mais: Consideremos que a fronteira entre o inverosímil e o desconhecido é relativamente ténue. Reparemos que no episódio descrito, estão a ser aplicados na área da macro física princípios da micro física/mecânica quântica (a dualidade de estados simultâneos dum ser humano esquizofrénico e drogado com drogas experimentais)... o que ninguém sabe se e em que condições podem ser válidos... Não é uma questão de acreditar... é para além disso... Parecendo ser geralmente aceite (honestamente, não sei com que bases…) que o ser humano normal ainda não conseguiu utilizar mais de 20% do seu

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potencial de inteligência, será que um ser humano esquizofrénico, drogado e com a capacidade de “ver em simultâneo dois dos seus estados quânticos” (como na experiência do “Gato do Schrödinger”) e de certa maneira controlá-los, poderá fazer coisas “impossíveis” (como, por exemplo, utilizar perto de 100% da sua inteligência)? E a partir daí... que tipo de mundo passará a existir? Por essas e por outras, é que à medida que me aproximava do final de DEAMBULAÇÕES, foi aumentando o conteúdo filosófico e aparecendo uma sua interdependência com a Física... Quer o leitor uma conclusão? Eu sei lá! Por isso é que me diverti tanto a perceber IMPROBABLE e a escrever este artigo (cujo original é mais um “Ensaio” que um artigo...). Espero ter-lhe dado algo em que pensar (“enough food for thought”)! E – simultaneamente – deixei a minha mente vaguear a seu belo prazer!

Com um abraço amigo do autor.


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A Laranja Maculada


Os que nos deixaram

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Os que nos deixaram António Ferreira Alves (84/1934) Licenciado Reformado da Administração Pública Nasceu a 11 de Novembro de 1923 - Faleceu a 27 de Fevereiro de 2015

À

medida que os anos vão passando, pela ordem natural da vida, vamos ficando privados do convívio de Amigos que parecia que nunca desapareceriam. Desta vez foi o “Bóbó” que, reformado na sua terra natal – Penafiel, persistia em conservar acesa a recordação do Colégio e não se poupava a esforços para manter contacto com os Amigos, mesmo os que viviam longe. Em 1934, entrou para o Colégio Militar onde lhe foi atribuído o número 86 e recebeu a alcunha de “Bóbó” que sempre manteve voluntariamente até aos seus 92 anos. Saído do Colégio, licenciou-se na Escola Superior Colonial e em 1949 partiu para Ango-

la integrado, mediante concurso, nos Serviços de Administração Civil. Começou por Chefe de Posto em Forte República e foi desempenhando funções de Norte a Sul de Angola como secretário e administrador de Concelho, presidente de Comissões Municipais e Câmaras Municipais, etc. Nesta carreira, que se prolongou até 1975 como administrador do concelho de Ambriz, adquiriu uma experiência invulgar de Administração Ultramarina e, graças à sua personalidade de uma integridade e rectidão inexcedíveis, granjeou um prestígio indiscutível. Acompanhado da mulher e dos filhos, viveu tempos felizes, com períodos de dificuldades maiores ou menores que sempre ultrapassou. Exerceu uma actividade de grande proximidade e de convívio com as populações mais diversas e com episódios de toda a ordem que se desenvolveu no vasto território angolano. E, curiosamente, durante Reunião em Penafiel a convite do António Ferreira Alves “Bóbó” (86/1934) o período de instabili-

dade e guerra, talvez pelo tipo de relacionamento que sempre manteve com as populações, nunca foi muito afectado directamente. A descrição desta convivência constitui um contributo de real valor para a história da vida ultramarina portuguesa. E essa descrição felizmente existe sob a forma dum “livro de memórias”, elaborado durante a reforma e baseado em apontamentos pessoais, abrangendo um sem número de situações vividas, relatadas numa agradabilíssima prosa e que denominou “TEMPO IAVULU – Memórias de Danje Ia Menha”. Por ser em dialecto africano, este título merece um esclarecimento. "IAVULU” refere-se ao tempo passado e “Danje Ia Menha” foi a sua “alcunha” africana, traduzindo um tipo de procedimentos acolhedores que as populações apreciavam. Trata-se de um livro de leitura obrigatória por todos os que se interessam pela actividade administrativa civil durante um longo período de um quarto de século num território extensíssimo, heterogéneo e de etnias variadas. Fica-se com uma ideia muito rica do que era a vida desses funcionários e das suas famílias em zonas, na maior parte dos casos, desprovidas do mínimo de comodidades; e como era possível, desempenhando funções de autoridade, deixar um rasto de simpatia e gratidão em populações muito díspares, algumas pouco instruídas mas muitas bastante “sabedoras”. E da leitura deste livro, não ignorando que havia condições propícias para muitos desmandos, fica-nos o consolo de constatar que houve gente de muito

mérito e correcção de procedimentos que emergiu e merece ser recordada. O nosso “Bóbó” é um deles !... Em 1975, bastante diminuído fisicamente devido a um acidente rodoviário em África, deixou aquela que se tornara a sua verdadeira terra e voltou para Penafiel. Aí, continuou a exteriorizar a sua vocação dando o melhor da sua experiência e dedicação ao bem comum no exercício de funções autárquicas, nomeadamente, de Presidente da Câmara. Ultimamente, vivia a recordar a sua brilhante vida ultramarina. Dando largas à sua simpatia, atraiu para o seu convívio os seus Amigos, nomeadamente os companheiros da juventude do Colégio Militar. E, neste particular, tomou a iniciativa de convidar em vários anos seguidos para sua casa uns tantos antigos alunos do seu tempo. Eram reuniões que ficaram inesquecíveis pela maneira amável com que nos recebia, com um primoroso banquete e sem nunca faltar com lembranças para cada um. Mas, acima de tudo, o que notabilizava estas reuniões era, para além da amabilidade da sua simpática Família, um evidente ar de felicidade que deixava transparecer por estar umas horas com os Amigos, antigos alunos do Colégio. Deixou em todos os que com ele convivemos uma grande saudade. Assim, em nome da comunidade colegial a que se sentia fortemente vinculado, tomo a liberdade de expressar à sua Família, a nossa respeitosa solidariedade e sentido apoio nesta adversidade. Luiz Manuel de Freitas Teixeira Diniz 110/1936


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Os que nos deixaram

Pedro José Rodrigues Pires de Miranda (372/1940) Engenheiro Civil Nasceu a 30 de Novembro de 1928 - Faleceu a 20 de Abril de 2015

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oi com profunda mágoa que recebemos a triste notícia do falecimento do nosso Camarada Pedro José Rodrigues Pires de Miranda (372/1940). Ao longo da sua vida profissional desempenhou inúmeros cargos de prestígio e de grande responsabilidade, tendo sido um notável especialista no sector da energia petrolífera. Pedro Pires de Miranda com a sua grande integridade de carácter, foi sempre pessoa de elevada craveira, de grande simplicidade e de trato muito afável. Quando alguém parte, por força da lei natural da vida, há sempre um vazio que dificilmente se preenche. À causa Colegial e à nossa Associação dedicou empenho, foi Presidente do Conselho Supremo e era seu Membro Vitalício. Foi agraciado com o Prémio Barretina Exemplo em 2009.

Natural de Leiria, frequentou o Colégio de 1940 a 1946, licenciou-se em engenharia civil no Instituto Superior Técnico e, em 1955, foi para Londres onde exerceu funções técnicas numa empresa de projecto e construção, sendo posteriormente admitido para a Área de Operações e Marketing da BP (British Petroleum Company). Em 1957 regressa a Portugal e dando continuidade a uma longa carreira no mundo das petrolíferas, ingressa nos quadros da BP Portuguesa onde permanece até 1967, ano em que partiu novamente para Londres ainda ao serviço desta empresa (onde era Director de Marketing) para desempenhar as funções de Assistant Regional Co-Ordinator South Europe. Em 1971 ingressa na Petrosul como Director e, posteriormente,

em 1972 na SONAP como Administrador. Na sequencia do 11 de Março de 1975 parte para o Brasil aí permanecendo ao serviço da companhia petrolífera Ipiranga durante mais de um ano. Em 1976, convidado pelo primeiro-ministro Alfredo Nobre da Costa ingressa na administração da Petrogal onde, em 1979, ascende à sua presidência. Durante cerca de um ano faz parte do III Governo Constitucional como ministro do Comércio e Turismo. Em 1980 assumiu a presidência da Comissão de Integração Europeia tendo sido nomeado embaixador itinerante para os assuntos petrolíferos do VI Governo Constitucional liderado por Sá Carneiro. Em Junho de 1985 foi empossado ministro dos Negócios Estrangeiros

Jorge Manuel Cid de Juzarte Lopes Jonet (99/1945) Oficial da Armada – Capitão-Tenente Nasceu a 30 de Janeiro de 1935 - Faleceu a 27 de Fevereiro de 2015

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omem tranquilo e íntegro, excelente camarada, exemplar Menino da Luz, é com um enorme desgosto e imensa saudade que o vemos partir. Que descanse em paz, são o nossos votos.

Eduardo Maria Rato Martins Zúquete (20/1945) e o Curso de 1945/1952

do X Governo Constitucional presidido por Cavaco Silva, cargo onde se manteve por dois anos. Nos anos 90 presidiu à Fundação Luso-Americana para o Desenvolvimento e exerceu funções de Curador na Fundação Oriente. Em 1991 preside ao Conselho de Administração da Alcantara, subsidiária portuguesa da Tate & Lyle. Era agraciado com a Grã-Cruz com Banda da Ordem da Águia Azteca (México), Grã-Cruz da Ordem de Rio Branco (Brasil), Grã-Cruz da Ordem Real da Estrela Polar (Suécia), Grã-Cruz da Ordem Nacional do Cruzeiro do Sul (Brasil), Grã-Cruz da Ordem do Libertador (Venezuela), Grande-Oficial da Ordem Nacional da Legião de Honra (França), Grã-Cruz da Ordem de Honra (Grécia) e Grã-Cruz da Ordem Militar de Cristo (Portugal) imposta a 8 de Junho de 2009. Que descanse em paz. A Todos os seus Familiares apresentamos as nossas mais sentidas condolências.

Gonçalo Salema Leal de Matos 371/1949


Os que nos deixaram

Óscar Gomes Pacheco (68/1953) Engenheiro Civil Nasceu a 5 de Dezembro de 1943 - Faleceu a 17 de Abril de 2015

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pós doença prolongada, faleceu no passado dia 17 de Abri o nosso camarada e amigo Óscar Pacheco, o 68 de 1953. Foi com pesar e enorme tristeza que recebi a notícia da sua partida, bom amigo e companheiro de viagens e patuscadas. Nasceu em Luanda a 5 de Dezembro de 1943 e cedo rumou ao Colégio, onde entrou em 1953 para o 1º ano. O seu percurso colegial desenrolou-se normalmente, terminando em 1961 com a graduação de duas estrelas da 4ª Companhia. Seguiu para o Instituto Superior Técnico e depois para a Academia Militar, acabando por regressar a Angola onde terminou o curso de Engenharia Civil na Universidade de Luanda em 1972. A sua vida profissional foi cheia

e gratificante, tendo ocupado variados cargos desde Director de Obra a Director Geral, em diversas empresas ligadas à construção civil. Por último e com as limitações da doença que o apoquentava, ainda desempenhou cargos de assessoria, coordenação e fiscalização de obras e foi docente do curso de Pós-Graduação em Direcção e Fiscalização de Obras na Universidade Lusíada. Pela vivência mais próxima que com ele mantive nos últimos anos destaco o seu nobre carácter e enorme gentileza, amizade, lealdade e camaradagem, nunca esquecendo a malta colegial que o acompanhou desde a juventude e com a qual se sentia sempre bem. Apesar de ser algo reservado, sempre se mostrou alegre e feliz quando na companhia de amigos

e família. As suas qualidades revelavam-se de modo natural e espontâneo. Apesar do grande sofrimento que a doença lhe causava, tudo aguentou sem um queixume mostrando sempre alegria quando algum amigo o visitava. À sua Viúva Senhora D. Odete de Amorim Pacheco, companheira de sempre, aos seus 3 Filhos e 5 Netos, a quem o Óscar sempre foi extremamente dedicado, deixamos as nossas sentidas condolências. Partiu prematuramente, mas recordá-lo-emos com saudade apesar da tristeza em que nos deixou. Descansa em paz, Óscar. Voltaremos a ver-nos um dia. José Manuel Fontes dos Santos Ferreira (342/1955)

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Os que nos deixaram

José João Abudarham da Cruz Azevedo (268/1960) Oficial do Exército – Coronel de Cavalaria Nasceu a 31 de Outubro de 1949 - Faleceu a 5 de Maio de 2015

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osé Cruz Azevedo não foi meu contemporâneo no Colégio e o facto de eu não ser militar de carreira, fez com que apenas nos conhecêssemos mais de perto quando desempenhou as funções de Subdirector do Colégio no período de Maio de 2004 a Outubro de 2006. De trato afável e muito correcto, sempre manifestou uma disponibilidade franca e atenciosa nas solicitações que lhe eram apresentadas, procurando as melhores e mais adequadas soluções. Concluiu o Curso do Colégio Militar que frequentou com o número

268 nos anos que decorreram entre 1960 e 1968. Em Abril de 1973, como Oficial Miliciano, foi incorporado na Escola Prática de Cavalaria, tendo servido nesta Unidade Militar e, posteriormente, nos Regimentos de Cavalaria 7 e de Lanceiros 2, em Lisboa. Para frequentar e concluir o Curso de Cavalaria, ingressa na Academia Militar no ano 1976. Concluído o Curso de Cavalaria em 1980, é colocado no Regimento Cavalaria de Braga onde comandou o Esquadrão de Instrução, o Esquadrão de Reconhecimento, e o Esquadrão de Serviços.

Entre 1985 e 1988, é colocado No Regimento de Cavalaria de Santa Margarida, nos anos de 1985 a 1986, desempenha as funções de Adjunto do Esquadrão de Reconhecimento da Brigada Mista Independente e de Comandante do Esquadrão de Apoio de Combate do Grupo de Carros de Combate dessa Brigada. De regresso à Escola Prática de Cavalaria, de entre as diversas funções que lhe foram atribuídas, destacam-se as de Comandante do Grupo de Instrução, de Chefe do Gabinete de Estudos e Planeamento da Direcção de Instrução e de Chefe da Secção de Operações Informações e Segurança. De volta a Santa Margarida exerce as funções de Comandante do Esquadrão de Reconhecimento da Brigada Mista Independente e de Chefe da Secção de Operações Informações e Segurança do RC 4. Na sua primeira colocação no Colégio Militar, em 1994, exerce o cargo de Comandante do Corpo de Alunos e mais tarde o de Chefe do Gabinete da Direcção.

Em 1998 volta ao serviço da Escola Prática de Cavalaria, comandando o Grupo de Comando e Serviços e depois, o Grupo Escolar. No Estado-Maior do Exército, onde é colocado no ano 2000, exerce as funções de Chefe da Repartição de Estudos da Divisão de Informações Militares. De regresso ao Colégio em 2001 desempenha as funções de Adjunto e Chefe do Serviço Escolar até 2004, sendo posteriormente nomeado Subdirector exercendo este cargo até 30 de Outubro de 2006. Da sua folha de serviços constam oito louvores, dos quais cinco conferidos por oficias generais, tendo sido condecorado com a Medalha de Prata de Comportamento Exemplar e com a Medalha de Ouro de Comportamento Exemplar. Que descanse em paz. A Todos os seus Familiares, muito especialmente a sua Mulher e aos seus Filhos, apresentamos as nossas mais sentidas condolências. Gonçalo Salema Leal de Matos 371/1949

Alexandre Teotónio Miranda dos Santos (559/1961) Comerciante Faleceu a 24 de Abril de 2015

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hegou à ZacatraZ a notícia do falecimento deste nosso Camarada, ocorrência que muito lamentamos. A Todos os seus Familiares apresentamos as nossas mais sentidas condolências. Que descanse em paz.


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