primeira.pauta JORNAL LABORATÓRIO DO CURSO DE JORNALISMO IELUSC
SETEMBRO DE 2021 | EDIÇÃO 156 | GRATUITO
Mulheres revelam casos de violência na política do Brasil
Em 2021, o Brasil conta com apenas 13% de mulheres nas prefeituras e 16% nos cargos de vereança. A maioria esmagadora de homens em cargos políticos torna recorrente uma realidade movida pelo machismo estrutural PÁGINAS 8 E 9
2 | Opinião
Setembro, 2021
primeira.pauta
Editorial
Edição: Marcus Vinícius Foto: Beto Rodrigues
A ignorância é pior que a maldade O último 7 de setembro foi peculiar. A data que celebra a independência do Brasil desde 1822 foi usada com outro propósito. O significado do dia foi esquecido para dar lugar a um patriotismo diluído em atos antidemocráticos. As lembranças sobre as lutas passadas pela democracia foram omitidas para dar espaço a um nacionalismo religioso e armamentista, semelhante ao dos estadunidenses apoiadores de Trump. O tempo que remete à democracia foi gasto em súplicas por intervenção militar, voto impresso e liberdade de expressão. O Messias convocou seus seguidores para o ultimato. Nas 27 capitais brasileiras, milhares de civis manifestaram indignação contra o Supremo Tribunal Federal e, especialmente, contra Alexandre de Moraes e Gilmar Mendes, ministros da instituição. Muitos deles argumentavam sobre atitudes totalitárias por parte do Poder Judiciário, mas sequer sabiam diferenciar os três poderes que compõem o estado moderno. Na mesma maré, caminhoneiros bloquearam as rodovias, o que aumentou o preço do combustível em vários postos de gasolina.
Para a surpresa e decepção de seus apoiadores, que aguardavam ansiosamente pelo “Dia D”, o presidente mudou de ideia, da água para o vinho. Na última quinta-feira (9), Bolsonaro se reuniu com Michel Temer, de quem recebeu auxílio na redação da “Declaração à Nação”, onde diz que nunca teve “nenhuma intenção de agredir quaisquer dos Poderes” e que todas as palavras agressivas que vieram dele “decorreram do calor do momento”. Aproveitando a ocasião, ambos discutiram sobre a crise institucional e as atuações do STF. Temer, responsável pela indicação de Moraes ao supremo em 2017, mediou um diálogo entre Bolsonaro e o ministro. Entretanto, tudo isso já era de se esperar. Afinal, no movimento bolsonarista, a ideia do Duplipensamento de George Orwell sai da literatura para se apropriar de um lugar na vida real. No livro 1984, esse termo é dado à crença em dois discursos que se contradizem, à atitude de acreditar num presente que nega o passado. Uma mentalidade que amordaça a boca da história, dando aval à ignorância.
Editor-chefe Luiz dos Anjos
Expediente Diretor Geral | Silvio Iung Diretor Ens. Superior | Paulo Aires Coordenador do Curso | Marília C. de Morais Jornal Laboratório do Curso de Jornalismo Professor Responsável | Sandro Galarça
Editor-executivo Ana Dranka Diagramadora-chefe Isabela Peixer
Aprisionado durante a Segunda Guerra Mundial pelo nazismo alemão, um pastor luterano chamado Dietrich Bonhoeffer escreveu: “a tolice é um inimigo mais perigoso do bem do que a maldade”. Para ele, a ignorância é um problema mais sociológico do que psicológico, e o poder de uns precisa da tolice de outros. Esse é o motivo de diversas pessoas irem às ruas pela liberdade e pedirem por intervenção
Repórteres Pedro Simm, Anderson Marques, Raphael Furtado, Malu Venturelli, Luiz dos Anjos, Marcelo Henrique, Zuciane Peres, Marinne Ohara, Alessandra Nimer, Julia Venturi, Felipe Roque e Eduado Gums Rua Princesa Isabel, 438 - Centro 89201-270 | Joinville-SC (47) 3026-8000 jornalprimeirapauta@gmail.com
dos militares; de bradarem em favor da tolerância, mas apelando para jargões agressivosquando faltam justificativas; de clamarem por uma nação menos corrupta, colocando-se sob o jugo de um político investigado pela instituição contra a qual esbravejou vorazmente. Como Bonhoeffer disse, o mal carrega consigo o germe da autodestruição; contra a ignorância, porém, ficamos indefesos.
Diagramadores Pedro Simm, Ana Dranka, Marcelo Henrique, Raphael Furtado, Isabela Peixer, J. Gabriel Silva, Ana Carolina de Jesus, Marcelo Stein, Alessandra Nimer, Felipe Roque e Julia Venturi Fotógrafos Malu Venturelli e Ana Dranka
Foto Editorial Marcus Vinícius Nos acompanhe online primeirapauta.ielusc.br @primeira.pauta Distribuição | Acadêmicos Edição 156 | setembro de 2021 Tiragem | 1.000 exemplares Impressão | Gráfica Itapema
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Meio Ambiente | 3 Victor Moriyama-Greenpeace
Os reflexos do desmatamento da Amazônia no sul do Brasil Região Sul poderá sofrer as consequências da degradação da floresta com a diminuição do volume de chuva FELIPE ROQUE De acordo com o Instituto do Homem e do Meio Ambiente (Imazon), a Amazônia legal, uma área determinada da Floresta Amazônica pertencente ao Brasil perdeu 10.476km² entre agosto de 2020 e julho de 2021 — um dado alarmante, pois em 12 meses o bioma perdeu o equivalente a nove vezes o tamanho da cidade do Rio de Janeiro. O dado é 57% maior do que o índice da temporada passada e o pior dos últimos dez anos. Estudo realizado pelo Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA) aponta que uma árvore de 10 metros de diâmetro é capaz de bombear para a atmosfera mais de 300 litros de água em forma de vapor por dia. Desse modo, preservar a floresta amazônica é extremamente essencial para uma cadeia que inclui produção de alimentos, geração de energia e a própria economia. A Amazônia tem mostrado sinais dos seus desmatamentos e queimadas que já chegam à região sul do Brasil.
O professor do curso de Meteorologia da Universidade Federal de Pelotas (UFPEL), Douglas da Silva Lindemann explica que o principal sinal das queimadas da Amazônia chega no Sul do Brasil através das fumaças. “Algumas massas de fumaça foram propagadas da região amazônica pela pressão atmosférica até a nossa região”, diz o meteorologista. Além disso, o professor elucida que a região da Amazônia tem a capacidade de oferecer umidade para a atmosfera, a qual é transportada para outras regiões do Brasil. A preocupação do meteorologista é que, conforme a floresta seja degradada, o transporte de umidade enfraqueça. O professor ainda afirma: “não estamos sofrendo os impactos mais severos no clima, mas há uma boa possibilidade que, futuramente, os reflexos do desmatamento afetem diretamente o sistema de chuva na região sul”. A bióloga Karina Cari fala que as árvores da floresta amazônica são essenciais para o processo de evapotranspiração que ocorre nas árvores que compõem a floresta
e cria fluxos de vapor de água na atmosfera, que são transportados por correntes de vento podendo provocar chuva na região sul. O professor Lindemann, explica que esse fenômeno, conhecido como “rios voadores”, é um sistema meteorológico extremamente importante para a região sul. Ele ainda alerta que um dos reflexos do desmatamento do bioma poderá ser visto no fenômeno dos “rios voadores’’, pois sem a floresta amazônica para fornecer umidade, o volume de chuvas corre o risco de ser muito afetado. Karina explica que a degradação da amazônia prejudica também as pesquisas de farmacopeia pelo mundo. “Vários princípios ativos de diversas plantas e organismos são isolados e testados quanto ao seu potencial uso terapêutico”, porém com a fauna da floresta amazônica prejudicada, esses estudos serão comprometidos. “A manutenção da biodiversidade é imprescindível para a realização dessas pesquisas medicinais”, complementa a bióloga. No dia 29 de junho deste ano, passou a vigorar o decreto nº
10.735, que proíbe o uso de fogo na Mata Amazônica. Segundo o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), apenas no mês de agosto foram registrados 28.060 focos de calor na Amazônia, sendo todas ilegais. As altas em focos de desmatamento e incêndio ocorreram nos três anos consecutivos após a posse do presidente Jair Messias Bolsonaro (sem partido). Os dados da degradação da Amazônia divulgados pelo INPE e outros órgãos de pesquisas são de extrema importância. Apesar de Bolsonaro contestar os dados, mesmo sem provas, o presidente acusou o cientista Ricardo Galvão, ex-diretor do INPE, de revelar dados falsos sobre desmatamento. Segundo Bolsonaro, o cientista estava “a serviço de alguma ONG”, e por isso o fez deixar o cargo. Sobre isso, o professor Lindemann comenta que, quando um pesquisador diz, por exemplo, que o mundo atingiu 1° C ou 1,5° C de temperatura acima da média, ele não tira esse número do nada. “Não é um número mágico ou inventado, isso é consequência de anos e anos de estudo”, completa ele.
4 | Games
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Violência e preconceito nos games online Transfobia, estereótipos de gênero e outros preconceitos acontecem com frequência dentro dos espaços virtuais MARCUS HOFFMANN
LUIZ DOS ANJOS Com as inovações constantes no mundo dos games, competições online são cada vez mais uma tendência. Porém, ao mesmo tempo, gamers revelam recorrentes casos de assédio e violência nesse ambiente digital. Diana Izauro, 20, é mulher trans e reside em Joinville. Ela alega ter sofrido ataques transfóbicos enquanto jogava online. “É muito comum fazerem piadas de mau gosto a respeito da minha identidade de gênero”, afirma ela. “Quando passo por esse tipo de situação, simplesmente coloco a pessoa no mudo, para que não me prejudique”. Por outro lado, David Willian Sperber Sell, 22, homossexual, relata que não se recorda de ter sido atacado pessoalmente enquanto jogava, pois não tem o hábito de utilizar headsets durante as partidas. Mesmo assim, ele aponta: “comumente, muitos jogadores usam termos homofóbicos, racistas e misóginos para ofender alguém que não esteja sendo eficiente na competição”.
Em junho de 2019, o Supremo Tribunal Federal (STF) enquadrou atos de homofobia e transfobia como crimes de racismo. A legislação vai continuar assim até o Congresso Nacional aprovar uma lei sobre o tema. A pena para o delito pode ser de um a cinco anos, além de multa.
De acordo com a psicóloga Mariana Datria Schulze, mestre e doutora em Educação, as camuflagens propostas pelos ambientes digitais possibilitam a violência. “O jogador não precisa se expor, ele pode criar personagens para representar suas ideias”, diz a psicóloga. Mariana também explica que,
nesses espaços, muitas vezes alguns indivíduos se sentem mais confortáveis e aceitos. Ela ainda afirma: “empurrados para aquele lugar por nosso mundo caótico, nos games eles se sentem mais seguros e até incentivados para serem quem são, quando mostram seus defeitos”.
Mais da metade dos gamers no Brasil são mulheres A oitava edição da Pesquisa Game Brasil (PBG), realizada neste ano, mostra que 51,5% do público de jogos eletrônicos no Brasil é feminino. A análise se baseia em entrevistas feitas com 12.498 participantes entre os dias 7 e 22 de fevereiro. Isso, de acordo com o estudo, está relacionado ao tamanho do mercado de smartphones, onde 62,2% do consumo é por parte do público feminino. Mesmo assim, elas declaram ser assediadas frequentemente. “Já precisei sair de diversas partidas após ouvir comentários desconfortáveis e invasivos, sempre de cunho sexual”, declara Nadine Quandt, 20, residente
em Joinville, gamer e streamer na plataforma Twitch. “Já houve várias vezes em que jogadores me adicionaram e começaram a enviar mensagens de baixo calão, como se, por eu ser mulher, eles tivessem direito de ‘flertar ’ comigo”. Patrícia Yuri Carneiro Tomiyoshi, 21, é gamer e moradora do bairro Jardim Monte Kemel, em São Paulo, capital. Segundo ela, as experiências desagradáveis que sofreu em jogos online foram com homens em chats do League of Legends (LOL). “Quando descobrem que você é mulher, eles te xingam de tudo ou fazem flertes e comentários maldosos”, diz Patrícia.
“É inadmissível que você não seja boa nesses games”.
Patrícia Tomiyoshi, gamer “É bem comum sofrermos preconceito em jogos ao descobrirem que somos mulheres”, alega Isadora Marques, 22, também moradora da capital paulista e faz lives para a Twitch. “Uso nicknames (nome do perfil) que
não dão a entender qual é o meu sexo”, completa. Isadora ainda explica que é gamer há mais de 15 anos e que já foi assediada várias vezes durante todo esse tempo. O problema da violência nos games ocorre também em outros países. Um estudo da instituição estadunidense Anti-Defamation League (ADL), publicado em novembro de 2019, mostrou que 80% dos jogadores norte-americanos já sofreram assédio. Embora existam iniciativas das próprias produtoras de jogos contra isso, o preconceito e a violência virtual persistem e impossibilitam várias pessoas de desfrutarem desses ambientes digitais.
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Sociedade | 5 ARTE: ANA CAROLINA DE JESUS
Intolerância digital cresce no país ZUCIANE PERES
Pesquisa realizada pelo Instituto Ipsos Mori, localizado em Londres, sobre intolerância nas redes sociais, dentre 27 países envolvidos, coloca o Brasil em sétimo lugar em número de intolerância digital. O estado com maior número de menções foi
o Rio de Janeiro, seguido por São Paulo e Minas Gerais. Desde o início da internet, o mundo virtual facilitou a interação de pessoas e simplificou diversos aspectos da rotina. A distância foi abreviada a poucos cliques no computador ou e agora apenas com o deslizar de dedos no celular, mas ela também se transformou em um
De olho na lei
meio disponível para que os intolerantes se manifestem. O brasileiro é conhecido mundialmente como um povo gentil e tolerante às diferenças, tanto em relação a variações de raça, orientação sexual, aparência e religião. Esta ideia partiu do historiador Sérgio Buarque de Holanda, no livro “O Homem Cordial”, que teve sua primeira edição publicada em 1936. Mas na prática as coisas não são bem assim. Em 2020, a Central Nacional de Denúncias de Crimes Cibernéticos da SaferNet Brasil registrou aumento de 95% nos crimes contra a vida e o racismo, 245% nos cincos primeiros meses da pandemia. Mas a lista inclui pornografia infantil, misoginia, xenofobia, homofobia, intolerância religiosa e maus tratos contra os animais. Para a produtora de conteúdo Yasmim Fassbinder de Oliveira, 28 anos, os ataques virtuais se tornaram parte da sua profissão. “Vez ou outra surge algum comentário negativo sobre a minha aparência ou a forma como me visto, mas não me importo mais. Já deixei de postar conteúdos com medo de ser mal interpretada, mas hoje eu ten-
to deixar pra lá, porque já percebi que abrir espaço para discussão, só gera mais discussão”, declarou Fassbinder. Atualmente, a internet tem se tornado a maior fonte de disseminação de ódio. Ainda não há um filtro automático para eliminar as mensagens de intolerância nas redes sociais, além de não ser possível identificar com precisão quem são os verdadeiros personagens que estão por trás de um perfil. Em muitos casos, os intolerantes até se sentem familiarizados ao encontrar pessoas que concordam com esse tipo de discurso. É o efeito do curtir e compartilhar. Mas afinal, a internet deixou as pessoas mais intolerantes? Segundo o psicólogo especialista em saúde mental e dependência de drogas, Nasser Haidar Barbosa, o mundo virtual é um campo fértil onde as pessoas deixam aflorar aquilo que elas têm de pior. “Umas das coisas que precisamos aprender é a ideia que não devemos dar palco para quem traz a violência como seu discurso principal. Se você for alvo de algo assim, minha sugestão é que procure os canais competentes para denunciar”, alerta Nasser.
6 | Sociedade
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Moradores são ameaçados de despejo durante pandemia Famílias do bairro Boehmerwald e Fátima quase ficaram desalojadas no primeiro semestre de 2021 MARCELO HENRIQUE Duas tentativas de despejo em Joinville chamaram a atenção da população em meio à pandemia de Covid-19 neste ano. A primeira aconteceu em 23 de março, quando a prefeitura mandou uma retroescavadeira derrubar uma casa com moradores indígenas no bairro Fátima. Já a outra ameaça ocorreu no bairro Boehmerwald em 24 de maio, a pedido da proprietária dos imóveis ocupados na área. No Fátima, a família mora em uma Área de Preservação Permanente (APP). Com base no decreto municipal (n°36.070), a prefeitura alega que essa moradia irregular permite o procedimento de desocupação da área. No dia da ação, a família fez um cordão humano para impedir o avanço da retroescavadeira que procurava derrubar o imóvel. Segundo Tainá Santana, moradora do local, houve agressão da Polícia Militar (PM) contra vulneráveis. “Tacaram spray de pimenta sobre as crianças. Algumas passaram mal”, conta. Tainá revela que sua família não tinha conheci-
mento da irregularidade do terreno que adquiriu. “Compramos pela OLX. A gente viu que era um local onde famílias moravam, não tinha placa e nem identificação de que aqui é uma área de APP”, explica. A família de Tainá veio de Manaus para Joinville em busca de segurança e saúde. Eles continuam na casa, mas ainda são vigiados diariamente por fiscais da prefeitura. No Boehmerwald, a pedido da proprietária Aparecida Monteiro, a Justiça enviou uma ordem de despejo para oito famílias, que ocupavam as residências sem permissão dela. Aparecida afirma que a invasão aconteceu após a família de Ricardo Rodrigues não pagar o aluguel. Já Ricardo diz que as casas estão sendo ocupadas, pois a proprietária não cumpriu as cláusulas do contrato de aluguel. “Ela fez um contrato por 800 reais e após 15 dias ela quis aumentar para 900 reais. Falei que não tinha condição porque eu trabalho com reciclagem”, comenta. Ele também afirma que o terreno não pertence a Aparecida, e sim à prefeitura. Porém, a reportagem teve acesso à escritu-
Crise humanitária Tainá e Ricardo não são casos isolados. Um levantamento da campanha Despejo Zero, criada por movimentos e organizações sociais do país contra remoções durante a pandemia, apresenta dados alarmantes. Houve um aumento de 310% no número de famílias despejadas no último ano. Saindo das 6.373 registradas até agosto do ano passado, para 19.875 até agosto deste ano. Já o aumento no número de famílias ameaçadas foi de 495%: 18.840 até agosto de 2020, para 93.485 no mesmo período de 2021. A crise sanitária provocada pela Covid-19 evidenciou também uma crise humanitária no Brasil.
Reprodução/Facebook
Em meio a crise humanitária, muitas pessoas são removidas das casas ra e a documentação comprova que Aparecida tem a posse do terreno. A Justiça prorrogou o prazo de permanência dos moradores para dezembro deste ano. A advogada Juliana Augusto, especializada em direito imobiliário, recomenda não comprar ou alugar
um imovél às cegas. Ela também sugere que o interessado em alugar uma casa contrate um advogado da área imobiliária, pois ele vai fazer toda a checagem do terreno, verificando histórico de processos ou se pertence a uma preservação ambiental, por exemplo.
Projeto de lei que poderia melhorar o cenário foi vetado Um Projeto de Lei (PL 827/2020) que proibia despejos em imóveis urbanos durante a pandemia foi aprovado na Câmara e no Senado. Porém, o presidente Jair Bolsonaro vetou o PL no dia 5 de agosto de 2021. O veto ainda será revisto pelo Congresso. Para Bolsonaro, o projeto “daria um salvo conduto para os ocupantes irregulares de imóveis públicos” que, segundo ele, “frequentemente agem em caráter de má fé”. O presidente ainda cita
danos patrimoniais e ambientais como possíveis problemas. Com o veto, as remoções estão permitidas durante a pandemia. E para evitar problemas com a locação de imóveis, Juliana Augusto diz que é importante assegurar o direito do locador em receber e do locatário em morar. “Precisa fazer uma tratativa entre locador e locatário para flexibilizar e reduzir o valor do aluguel, tentando adequar para duas partes”, orienta.
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Política |
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Foto: Mauro Arthur Schlieck NOME DO FOTÓGRAFO
Pessoas em situação de rua buscam representatividade Essas pessoas precisam da ajuda do estado e do apoio popular para garantir Direitos Básicos de vida PEDRO SIMM Chinelo, bermuda, barba por fazer, alguns cobertores e uma mochila nas costas carregando os documentos. Esse é o perfil de Robson Souza, uma pessoa que vive em situação de rua em Joinville. Robson tem 40 anos e, assim como mais de 380 pessoas na cidade, vive à mercê dos órgãos públicos para ter o mínimo de dignidade nas ruas. Esse número é do Centro de Referência Especializado para População em Situação de Rua, o Centro Pop. Trata-se de um órgão público destinado a atender essas pessoas e que registrou uma média de 389 atendimentos por mês até julho de 2021. Para Robson, hoje ninguém fala pelas pessoas em situação de rua hoje. “Na mídia, na política, não tem ninguém para representar o que a gente pensa, o que a gente passa”, afirmou. Robson serviu por quatro anos no exército, tem filhos e uma longa caminhada. Na sua mochila, carrega sua identidade e seu certificado de serviço militar. Não se lembra há quanto tempo nem porque está na rua. Não existe um principal motivo para uma pessoa ir para a rua, as histórias são complexas para serem categorizadas. Apesar disso,
algumas situações impulsionam a necessidade de sair de casa. Situações de violência familiar são comuns em pessoas mais jovens, por exemplo. Outro fator é a desigualdade social. São pessoas que perderam ao longo do tempo o poder aquisitivo ou a capacidade de manter as contas em dia, e, aos poucos, abriram mão da dignidade para conseguir sobreviver de alguma forma. Traumas e eventos marcantes também são grandes influenciadores nesta decisão. As drogas não são a principal causa para levar uma pessoa a rua. De acordo com o professor de psicologia e coordenador do Centro de Direitos Humanos de Joinville, Nasser Haidar Barbosa, o uso de drogas geralmente é uma consequência da pessoa estar na rua, e não o oposto. Na teoria, quem está na rua tem direitos como qualquer outra pessoa. Na prática, elas dependem de ações do estado e ajuda popular para garantir condições básicas de vida, como o de se alimentar e de cuidar da higiene pessoal. Sem essa ajuda, as perspectivas são reduzidas. “De fato, quem está em situação de rua hoje, por conta própria, por seus próprios meios, não tem como sair”, afirmou o professor Nasser. Não existe um caminho fácil para
assegurar os direitos dessa população. É necessário que a sociedade se organize para criar coletivos que representem e permitam que essas pessoas exponham os próprios pensamentos. Um exemplo é o Movimento Nacional da População em Situação de Rua, uma iniciativa social e política apartidária brasileira que luta pelos direitos dessas pessoas e pela inclusão social delas. Apesar do grande impacto dos movimentos sociais, a forma mais eficaz de garantir os direitos é através dos serviços ofertados pelo Estado.
O que Joinville oferece?
Joinville tem uma política pública dedicada às pessoas em situação de rua e conta com alguns órgãos para auxiliar no dia a dia. É o caso do Centro Pop, que oferece alguns serviços essenciais, como banho, lavanderia, troca de roupas, ligações para familiares, acesso ao auxílio emergencial e jantar. Outro órgão é o Restaurante Popular, que oferece refeições no café da manhã, das 7h às 8h, e no almoço, das 11h às 14h. Se a pessoa estiver cadastrada no CadÚnico, serviço de coleta de dados de famílias de baixa renda e pessoas em desamparo social, a refeição é gratuita. Se a pessoa recebe
o Bolsa Família o custo é de um real. Existe também o Centro Público de Atendimento aos Trabalhadores, onde essas pessoas têm a oportunidade de ingressar no mercado de trabalho através de auxílio na elaboração de currículos e encaminhamento para cursos profissionalizantes. Outros serviços não são fixos, como o Consultório da Rua e o Serviço Especializado em Abordagem Social (SEAS). No primeiro, profissionais de saúde vão às ruas para oferecer prevenção e cuidados às pessoas em condição de vulnerabilidade. O Consultório tem uma média de 120 atendimentos por mês e percorre uma rota de 12 locais espalhados pelo município. Já o SEAS é responsável por percorrer a cidade para abordar as pessoas em situação de rua, oferecer atendimento e conforme a aceitação da pessoa, encaminhá-la para a rede de atendimento. Por conta do frio intenso de junho deste ano, a prefeitura também realizou a Ação de Inverno, em que o Ginásio Abel Schulz serviu como um abrigo emergencial. A população em situação de rua passou as noites no ginásio, além de receber jantar e café da manhã. Foram disponibilizados colchões e cobertores para quem recorreu ao local.
8 | Comportamento
DIVULGAÇÃO/REDES SOCIAIS
Vereadora Ana Lucia durante manifestação em Joinville
Mulheres revelam casos de violência na política do Brasil Em 2021, o Brasil conta com apenas 13% de mulheres nas prefeituras e 16% nos cargos de vereança. A maioria esmagadora de homens em cargos políticos torna recorrente uma realidade movida pelo machismo estrutural
MALU VENTURELLI Para as mulheres, não basta a árdua tarefa de conquistar a vitória nas eleições. Ao ocupar um cargo de poder na política, elas enfrentam um desafio ainda maior: a violência política de gênero. Os ataques são sentidos na pele por mulheres que recebem desde interrupções nas falas até ameaças e assédio sexual. Segundo uma pesquisa da Terra de Direitos e Justiça Global, na maioria das vezes, a violência vem não só dos oponentes como também dos colegas. Nos casos em que é possível identificar os autores das ameaças, os homens representam 100% dos responsáveis por assassinatos, atentados e agressões. Nas eleições de 2020, depois de se tornar a primeira vereadora negra de Joinville, com 3.126 votos, a professora e servidora pública aposentada Ana Lucia Martins sofreu ameaças e ataques racistas nas redes sociais. Em uma das mensagens enviadas para a vereadora, uma pessoa afirma: “Agora só falta a gente
matar ela e entrar o suplente que é branco”. Por meio de um perfil fake, ela também sofreu ameaças de morte, que evidenciaram que o problema central era ela ser a primeira mulher negra eleita da cidade. Em um debate de candidatos à prefeitura de Porto Alegre, no ano de 2020, a candidata Manuela D’Ávila foi vítima de violência política de gênero pelo ex-noivo, Rodrigo Maroni, do PROS, que também foi candidato a prefeito da cidade. Além de ofendê-la, Maroni ameaçou expor fatos da vida pessoal da candidata. Nesse contexto, a fala pode ser considerada uma ameaça de violação da intimidade feminina, crime previsto no artigo 7º da Lei Maria da Penha. Casos como esse são recorrentes e algumas vezes chegam até a violência sexual, como foi o caso da deputada estadual de São Paulo, Isa Penna, do PSOL. Em dezembro de 2020, uma câmera de segurança da Alesp flagrou o momento em que o deputado Fernando Cury passou a mão no seio da deputada durante a Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo (Alesp). O assédio
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aconteceu em um abraço por trás e foi presenciado por quem estava no local. Em Juiz de Fora (MG), a vereadora Laiz Perrut, de 30 anos, também viveu episódios de machismo. Antes de assumir uma das cadeiras da Câmara, ela foi assessora do sindicato dos metalúrgicos, um ambiente composto por maioria masculina. Para Laiz, passar por momentos de machismo se tornou algo recorrente, pois, na Câmara de Vereadores, a situação é a mesma. Além de vereadora, ela também é militante da Marcha Mundial das Mulheres no Coletivo Maria Maria, o núcleo da Marcha da cidade. Apesar de lutar diariamente pelo direito das mulheres, Laiz também precisa lidar com situações em que o machismo a deixa vulnerável. No início de 2021, ela foi atacada por apoiar a prefeita da cidade, Margarida Salomão, que fechou bares e comércios pela situação caótica da pandemia em que o município se encontrava. “Fui xingada de vários nomes, agredida verbalmente, cercaram e bateram no meu carro”, conta. Para Laiz, o machismo estrutu-
ral motiva situações em que mulheres acabam sendo diminuídas, apesar de ocuparem os mesmos cargos de quem as rebaixa. “Para a sociedade, o espaço da mulher é dentro de casa, fazendo as tarefas domésticas. Então quando a gente sai, quando estamos na política, as pessoas veem como se não fosse o nosso espaço”, explica.
82% das mulheres em espaços políticos já sofreram violência psicológica De acordo com o TSE, no Brasil, as mulheres são um total de 658 prefeitas (13%), contra 4,8 mil prefeitos (87%). Já como vereadoras, elas somam apenas nove mil das cadeiras, cerca de 16% do total. Os homens representam 47,3 mil do total de vereadores, equivalente a 84%. Além disso, 900 municípios não tiveram sequer uma vereadora eleita nas eleições de 2020. A situação é ainda mais preocupante quando se trata de mulheres negras, que correspondem ao maior grupo demográfico do país (28%). Elas compõem apenas 6% dos eleitos para vereança e prefeitura em 2020. Além disso, o país ocupa a 140ª posição do ranking da União Interparlamentar que avalia a participação política de mulheres em 192 países, atrás de todas as nações da América Latina, com exceção do Paraguai e do Haiti. A Câmara dos Deputados possui apenas 15% de mulheres e o Senado Federal, 12%. A deputada federal Marília Arraes, de 37 anos, é a quarta mulher eleita deputada federal na história de Pernambuco. Dos 25 deputados eleitos em 2018, ela é a única mulher que representa o estado na Câmara. As pautas de proteção às mulheres estão na lista de prioridades da deputada, como o Programa Nacional
COMO DENUNCIAR As mulheres contam com canais específicos para denúncia, como o Ministério Público Eleitoral de cada estado. Também é possível fazer denúncias no Fale Conosco da Câmara dos Deputados, canal de atendimento eletrônico ao cidadão. Além desses órgãos, também é possível denunciar por meio da Secretaria da Mulher da Câmara dos Deputados. Essa estrutura une a Procuradoria da Mulher e a Coordenadoria dos Direitos da Mulher, que representa a Bancada Feminina. A Secretaria recebe as denúncias em relação à violência da mulher e encaminha a vítima para os canais apropriados, dando todas as orientações e acolhimento.
de Proteção e Promoção da Saúde Menstrual. Graças aos esforços dela, autora do projeto, ele foi aprovado. “Se não fosse a minha disposição para fazer o projeto entrar em pauta e ser aprovado, a probabilidade de um assunto tão importante e fundamental para nossa sociedade ser discutido seria mínima”, explica. Apesar da dedicação para defender os direitos das mulheres, a deputada também sofre com os desafios da violência. “Fui para o segundo turno na eleição municipal de Recife em 2020, um marco na história da cidade. Os ataques contra mim e a nossa campanha foram recheados de machismo”, conta. Segundo dados da ONU Mulheres, 82% das mulheres em espaços políticos já sofreram violência psicológica, 45% sofreram ameaças, 25% sofreram violência física no espaço em que atuavam, 20% tiveram que lidar com assédio sexual e 40% afirmam que a violência de gênero atrapalhou a agenda legislativa em algum momento. Em Pinhais, na região metropolitana de Curitiba, a professora e ex-vereadora Rosa Maria, de 55 anos, foi eleita como vice -prefeita para o mandato que iniciou em 2021. Antes de assumir uma das cadeiras da Câmara, pelo partido Republicanos, ela atuou como professora de Língua Portuguesa e Secretária de Educação da cidade, entre 2009 e 2012. Rosa Maria conta que, em 2013, quando foi eleita vereadora pela primeira vez, alguns políticos encararam a situação com espanto. “Causou um certo desconforto para alguns mais antigos, bastante machistas. Acredito que, por conta da minha formação, não enfretei situações tão escancaradas, embora não negue alguns olhares surpresos com a minha atuação”, conta. Apesar de não sofrer um preconceito escancarado, a professora explica que já viu a situação ocorrer com outras mulheres. “Assisti por diversas vezes mulheres, jovens, negras sendo desrespeitadas e silenciadas por meio de falsas informações, difamando suas imagens e desencorajando-as a seguir em frente”, diz.
Maria Luiza Venturelli
Lei torna crime a violência contra mulheres na política Em agosto de 2021, foi sancionada a lei 14.192/21, que define normas para prevenção e combate à violência contra a mulher na política. A lei determina que o estatuto de cada partido político deve conter normas sobre prevenção, sanção e combate à violência contra mulheres que atuam na área política. O texto define como violência política contra a mulher “toda ação, conduta ou omissão com a finalidade de impedir, obstaculizar ou restringir os direitos políticos da mulher, bem como qualquer distinção, exclusão ou restrição no reconhecimento, gozo ou exercício dos seus direitos e das suas liberdades políticas fundamentais, em virtude do sexo”. Além disso, também faz alterações no Código Eleitoral para incluir a previsão de crimes contra as mulheres políticas. Dentre as mudanças, proíbe a propaganda que deprecie a condição da mulher ou estimule sua discriminação em razão do sexo feminino, ou em relação à sua cor, raça ou etnia. Oriunda do Projeto de Lei
349/15, da deputada Rosângela Gomes (Republicanos-RJ), a lei garante que a prática de violência política contra mulheres tenha pena de reclusão de um a quatro anos e multa. Ademais, a pena será aumentada em 1/3 se o crime for cometido contra mulher gestante, maior de 60 anos ou com algum tipo de deficiência. Diariamente, ela luta para proteger as mulheres e levar isso para a política. Na justificativa do projeto, ela faz um alerta para a desproporção entre homens e mulheres que ocupam cargos eletivos na Câmara dos Deputados e no Senado. “Compreendo que privar a mulher brasileira de uma vida política plena, como demonstrado pelos baixos índices participativos, também constitui uma forma de violência contra a mulher - violência de caráter político que precisa ser eliminada”, diz. Na política atual, cada partido ou coligação precisa reservar o mínimo de 30% e o máximo de 70% para candidaturas de cada sexo, mas não há previsão de participação proporcional nos debates.
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Joinvilenses se destacam e Brasil quebra recordes Paralímpicos Talisson Glock e Edenilson Floriani representaram Joinville nas Paralimpíadas de Tóquio 2020 Raphael Furtado Laurindo Naturais de Joinville, Edenilson Floriani e Talisson Glock ajudaram o Brasil a atingir números históricos nas Paralimpíadas de Tóquio 2020. A delegação brasileira contava com 259 atletas e conquistou 72 medalhas durante a competição, igualando os números de Londres 2012 como melhores resultados nos jogos. Os 22 ouros, maior número do país nas Paralímpiadas, somados às 20 pratas e 30 bronzes, garantiram a sétima colocação no quadro geral de medalhas, assim como nos jogos da capital inglesa. Após conquistar o bronze nos 200m medley na categoria S6, para pessoas com deficiência físico-motora, em 2016, Talisson Glock teve a preparação olímpica marcada por incertezas e contratempos. Entre março e julho de 2020, ele não tinha piscina para treinar devido a pandemia. Retomando os treinos em uma piscina gelada, lidou com cancelamentos consecutivos de suas seletivas até a confirmação da vaga em junho de 2021. Chegando em Tóquio, Talisson ficou uma semana afastado devido a um membro de sua comissão positivado para Covid-19, interrompendo sua rotina de aclimatação. Classificado para sete provas, Talisson conquistou sua primei-
ra medalha no revezamento 4x50 livre misto. Ele foi o último nadador a “cair na água” e em um final disputado, garantiu o bronze. Seis dias depois, foi a vez da primeira medalha individual, dessa vez o terceiro lugar nos 100 metros livres classe S6. Talisson ficou atrás durante praticamente a prova toda, e nos últimos quinze metros, ele acelerou o ritmo e na batida de mão desbancou o chinês Jia Hongguang por apenas um décimo. O nadador também conquistou a quarta colocação no revezamento 4x100 livre e a sexta posição no 200 metros medley. Depois dos dois bronzes, o ápice dos jogos foi na disputa dos 400 metros livres na categoria S6, onde conquistou a medalha de ouro. Talisson começou a prova em um ritmo forte e liderou até a batida de 150 metros, foi ultrapassado pelo atual campeão mundial Antonio Fantin, mas logo retomou a primeira posição e a manteve até o fim da disputa. “Nós sabíamos que quando ele caísse na água ele não ia deixar escapar a medalha. Fizemos o que podíamos fazer. Acreditamos e veio o tão sonhado ouro”, conta Diego Ferreira, técnico de Talisson. Edenilson Floriani compete pela CEPE (Centro Esportivo para Pessoas Especiais). Com 31 anos,
Edenilson Floriani competiu na categoria de Lançamento de Dardos na Classe F42
Ale Cabral/ CPB
Talisson Glock no pódio ele foi convocado para a primeira Paralimpíada da carreira. O projeto inicial era focar no ciclo paralímpico de Paris 2024, mas com a evolução dos resultados, com direito ao recorde mundial de lançamento de dardo paralímpico em 2019 (56,56 metros), Edenilson conseguiu antecipar em três anos a participação nos jogos. Com academias e estádios fechados devido a pandemia, treinar em casa foi a solução para manter a rotina de treinos que o atleta fazia desde 2016. Residente de Joinville, a cidade o ajuda cedendo pistas para treinamento e um técnico pessoal. Edenilson também
faz parte dos atletas contemplados com o Bolsa Atleta, programa do governo federal. Antes da competição ele se mostrou contente e preparado para as disputas. “É uma emoção muito grande poder representar meu país e estou muito bem preparado”, contou Edenilson. Logo na primeira prova da carreira, ele se classificou para a final e acabou na sexta posição no Lançamento de Dardo na Classe F42 (competidores com deficiência nos membros inferiores que competem sem prótese). Já no arremesso de peso F42, o atleta terminou na sétima posição. Wander Roberto
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Cultura | 1 1 CNN BRASIL
Pandemia impacta retomada de eventos Dados e declarações revelam o cenário das consequências da pandemia nos eventos de Joinville
EDUARDO LUKASINSKI GUMS A pandemia da Covid-19 afetou profundamente o setor de eventos. Porém, desde o fim de 2020, as campanhas de imunização da população têm impactado de outra forma essa esfera, permitindo o retorno de algumas atividades. O relatório Estudos dos Impactos da Covid-19 na Economia do Turismo de Joinville revela que 1040 de um total de 2770 serviços neste seguimento foram reagendados de 2020 para 2021 e que a volta dos eventos em 2021 deve movimentar cerca de 52 setores econômicos. A pesquisa foi realizada pela Joinville e Região Convention e Visitors Bureau em parceria com a Univille. O estudo mostra que em 2020 houve uma retração de 81% no setor, sendo que entre os anos de 2018 e 2019 cada acontecimento de grande porte gerou uma movimentação econômica de 15,3 milhões de reais. De acordo com os mesmos dados, os de pequeno porte geraram uma movimentação econômica de 200 milhões de
reais em Santa Catarina entre 2018 e 2019. Giorgio Augusto Souza é executivo do Joinville e Região Convention & Visitors Bureau, trabalha em uma empresa terceirizada de cerimônias e explica que o setor envolve uma cadeia extensa de fornecedores. Fazem parte dela montadoras de estandes, segurança, limpeza, cerimonial, decoração, locação de equipamentos, audiovisual, entre outros serviços. Ele ainda afirma: “todos ficaram, de uma hora para outra, sem receita, pois dependem diretamente do setor de eventos para sobreviver’’. De acordo com o relatório Estudos dos Impactos da Covid-19 na Economia do Turismo de Joinville, em 2020, 47,2% dos entrevistados tinham, como meio de vida, empresas que prestam serviços para confraternizações na cidade. Sobre a retomada de eventos em 2021, Giorgio explica que o processo está sendo gradativo, pois há ainda muita insegurança. Apesar disso, ele conta que a prefeitura e o estado têm tido uma maior flexibilização para aqueles
que são de pequeno porte. Porém, para os de grande porte, com mais de 500 participantes, há uma necessidade de uma “decisão tripartite”, ou seja, uma definição em conjunto com estado, município e órgão regional de saúde. O executivo joinvilense esclarece o processo: “encaminha-se um plano de contingência a Secretaria da Saúde do Estado, que avaliará se recomendam ou não a realização do evento, que por sua vez encaminha a Secretaria da Saúde do Município e ao Consórcio Regional de Saúde, para a decisão final’’. Segundo matéria divulgada pelo Jornal Nexo, no eixo entre Rio-São Paulo, o retorno já estaria em curso. Em 7 de julho, o governador João Doria anunciou que a cidade iria realizar trinta eventos, desde feiras até festas típicas. Já no Rio de Janeiro, o prefeito Eduardo Paes considerou a final da Copa América em 10 de julho um teste. Tais planos de retomada por todo o país influenciam na economia nacional. O professor de economia Ulises Garrido diz que os decretos baixados pelo gover-
nador do Estado, acatados pelo prefeito de Joinville, prejudicaram sensivelmente a economia municipal em todos os aspectos e o setor de eventos de forma particular. Além disso, o setor turístico representa 12% do PIB (Produto Interno Bruto) do estado, segundo Censo de 2019. A arrecadação do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), que tem relação com as atividades turísticas, foi de R$ 630 milhões em 2019. Isso tudo, entretanto, foi impactado pela pandemia. O Festival de Dança de Joinville é um dos eventos que precisou ser adiado por conta da pandemia.. Reagendado para os dias 5 a 16 de outubro de 2021 e em sua trigésima oitava edição, o tradicional festival joinvilense terá atividades híbridas e presenciais, segundo informações do site. Sobre o pós-pandemia e o ano de 2022, Ulises diz que a economia deve se recuperar em algumas áreas do mercado, como áreas industriais e periféricos de produtos e serviços, que trabalham com protocolos, explica ele.
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Coronavírus transforma cenário na educação básica brasileira FOTO: ALESSANDRA NIMER
Distanciamento social mostrou a necessidade de internet e computadores nas casas dos brasileiros ALESSANDRA NIMER Para conter a proliferação do Coronavírus, muitos estados brasileiros adotaram o método de ensino remoto para dar continuidade ao ano letivo. A dificuldade é maior quando se trata do ensino fundamental. Os contratempos da presença dos alunos nas aulas remotas são inúmeras, como aquisições de tecnologia e internet, condições sociais, e ainda aqueles que não recebem o apoio familiar. Vitor Ventura, estudante de Letras na Universidade Federal de Santa Catarina e auxiliar de turma em escola municipal no bairro Fátima, zona sul de Joinville, conta como está sendo a educação digital na escola. “A escola consegue planejar as aulas para o formato online, mas a recepção disso por parte dos alunos é negativa. A escola em que atuo é em uma região de vulnerabilidade social, portanto, alguns estudantes não conseguem ter plenamente acesso à internet. Boa parte dos alunos não
realiza as atividades online”, conta o auxiliar. A frequência dos alunos não é a mesma, o que faz com que sejam prejudicados. A escola conta com apoio dos professores para auxiliar os que precisam de atenção, mas a falta de frequência é preocupante. “Os alunos menos frequentes são os que apresentam mais dificuldade. Existe um número considerável de imigrantes na escola onde trabalho. A escola se articula para atender a comunidade, mas também compreende que cada um tem o seu contexto social e suas próprias demandas”, afirma Vitor. A falta de alfabetização digital significa que muitos pais não ajudam seus filhos na educação online, e alguns alunos têm que recorrer a outros em busca de ajuda. O trabalho diário dos pais impede que acompanhem o desempenho de seus filhos na escola. Por outro lado, teve aqueles alunos que com bom acesso à internet e boas ferramentas tecnológicas, conseguiram manter as aulas normalmente. Juliana Giovannangelo, 35, as-
Lado positivo Com o tempo, Rebecca Giovannangelo foi se habituando a ter as respostas de suas dúvidas respondidas tardiamente, houve uma melhora significativa com o passar do tempo em relação a comunicação aluno e escola”, conclui sua mãe. A frequência de Rebecca era 100 por cento pelo fácil acesso a internet. “A rotina de estudos dela era muito tranquila, ela fazia o mesmo horário que costumava estar na escola e tinha um local próprio para os estudos”, confirma a assistente técnica. Juliana ainda comenta de forma positiva o ensino remoto. “Para mim a experiência foi válida,
positiva e dou meu apoio para que se abra uma nova esfera na forma de ensino e aprendizado em face do modelo atual”. Com a vacinação em andamento em Santa Catarina, estudantes e professores deverão retornar para o ensino presencial 28 dias após a segunda dose ou dose única, incluindo os enquadrados em grupos de risco. A vacinação será obrigatória para todos os profissionais da educação. Os critérios sobre ensino remoto e a obrigatoriedade do presencial ficarão a cargo de cada rede de ensino.
Protocolos de distanciamento social são aplicados em salas de aula sistente técnica e mãe da Rebecca Giovannangelo, 14 anos, relata um pouco de como foi o ensino remoto durante a pandemia. “Inicialmente a maior dificuldade foi a percepção do que é ser autodidata, se instruir por esforço próprio sem ajuda dos professores, com certeza, foi o desafio maior enfrentado”, diz Juliana.
O diálogo com os professores era embaraçoso, o que dificultava para atender os estudantes. “Inicialmente o diálogo com os professores estava complicado, havia muito atraso em responder as dúvidas e isso prejudicava bastante toda a estrutura do ensino. Ao meu ver, faltou preparo da escola para suporte aos alunos.
É necessário investir em tecnologia De acordo com o IMD World Competitiveness Center, Brasil está na 64ª posição no eixo de educação, o país tevea pior avaliação entre as nações analisadas. Segundo o IBGE, entre as 183,3 milhões de pessoas com 10 anos ou mais de idade no país, 143,5 milhões (78,3%) utilizaram a internet nos últimos três meses. Jovens adultos entre 20 e 29 anos foram os que mais acessaram. O uso é maior entre estudantes (88,1%) do que entre não estudantes (75,8%). Os estudantes da rede privada (98,4%) usam mais do que os da rede pública (83,7%). A pandemia só apareceu para demonstrar a importância de investir em tecnologia educacional, para propiciar experiência dentro e fora da escola e promover educação de qualidade, equidade, além de subir o nível educacional e desenvolver a habilidade junto às grandes tecnologias.
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Alfabetização na pandemia tem lado bom e lado ruim na cidade Município precisa reverter maus resultados causados no aprendizado durante a onda de Covid-19 JULIA VENTURI Apesar da importância da alfabetização e do ensino para o progresso de qualquer nação, é evidente que o acesso à educação não é a realidade para uma grande parcela da população. Segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD Contínua) de 2019, divulgada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a taxa de analfabetismo dos cidadãos de 15 anos ou mais foi estimada em 6,6%, em torno de 11 milhões de brasileiros. Em Santa Catarina, de acordo com a PNAD Contínua, a porcentagem de analfabetos era 2,5% em 2018 e caiu para 2,3% em 2019, seguindo abaixo da taxa nacional. Esse índice faz com que o estado possua a segunda menor taxa do país, a primeira posição é ocupada pelo Rio de Janeiro, com 2,1%. Os dados mais recentes de alfabetização em Joinville são da Avaliação Nacional da Alfabetização (ANA) realizadas nas escolas públicas de 2014 e 2016. A ANA foi aplicada a estudantes do 3º ano do ensino fundamental para medir os níveis de alfabetização em três âm-
bitos: leitura, escrita e matemática. Joinville apresentou 73,5% de seus estudantes nos níveis 3 e 4 de leitura e 90,2% nos níveis 4 e 5 de escrita. Esses níveis são considerados suficientes para a aprendizagem. Apesar dos bons indicadores para Santa Catarina e uma boa perspectiva para Joinville, a pandemia da Covid-19 trouxe novos desafios para os professores, pais e alunos que precisaram se reinventar. Além das dificuldades naturais da fase de alfabetização para as crianças, elas precisaram se adaptar a uma nova forma de aprendizado: o ensino remoto. Para a psicóloga Aline Andreolla, mãe do Eduardo, de 5 anos, a maior dificuldade foi manter a atenção e o foco do filho na aula online. Além disso, outro obstáculo que a criança teve foi entender que a rotina escolar estava dentro de casa. Por esses fatores o rendimento do filho não foi o mesmo, já que parte da aprendizagem se dá pelo convívio social e interação. Para Andreolla, foi interessante ver o quanto a família se tornou mais responsável pelo auxílio ao aprendizado do menino, porém acredita que muitas crianças foram prejudi-
cadas por falta de acesso aos meios de comunicação e por pais que não conseguiram estar presentes. A assessoria de comunicação da Prefeitura Municipal de Joinville confirma que houve prejuízos de aprendizado dos alunos do ensino infantil que estão em fase de alfabetização. Segundo o secretário de comunicação do órgão, Thiago Boeing, o município no momento tem crianças no terceiro ano com dificuldades de leitura e escrita, alunos do segundo ano que nem chegaram a frequentar a escola, e alunos do primeiro ano chegando para as aulas presenciais somente no segndo semestre de 2021. Silmara Maciel, que é revisora de confecção de roupas e mãe da Nicole, que tem 7 anos, relatou que no começo foi difícil, mas aos poucos elas foram se adaptando à nova rotina. Ela acredita que a aprendizagem da filha foi prejudicada durante o ensino remoto, mas que agora com o retorno da aula presencial vai ser possível recuperar boa parte do conhecimento. O secretário explica que foi criado um programa de reforço escolar que já iniciou em algumas escolas e será ampliado para todas as uni-
dades para auxiliar no desenvolvimento do aprendizado. Além disso, o município está iniciando um programa de alfabetização para crianças estrangeiras para que alunos haitianos e venezuelanos não sejam prejudicados pelo idioma.
Dia Mundial da Alfabetização
No dia 8 de setembro é comemorado o Dia Mundial da Alfabetização. A data foi criada em 1967, por meio da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco). O objetivo é ressaltar a importância da alfabetização e impulsionar o desenvolvimento social e econômico mundial. A educação de qualidade é um dos 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), que são metas estabelecidas em diferentes campos com o objetivo de serem alcançadas até 2030, estabelecidos pela ONU. O propósito é assegurar ambientes escolares seguros e qualificados com a infraestrutura necessária, aumentar o número de professores capacitados e garantir que crianças e adultos tenham direito a um ensino relevante e igualitário entre todos os sexos. Foto: Freepik
Taxa de analfabetismo em brasileiros com 15 anos ou mais é de 6,6%
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Os desafios da falta de incentivo à leitura
Setembro, 2021 FOTO DIVULGAÇÃO/REDES SOCIAIS
Nova proposta de Paulo Guedes ameaça isenção de impostos sobre os livros MARINNE OHARA A proposta executiva da reforma tributária, anunciada em julho deste ano pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, prevê uma alíquota de 12% no setor literário. A taxação tem influência, na maioria dos casos, em um aumento no valor final do produto, já que pelo menos uma parte desse imposto será repassado ao consumidor, pois as editoras e livrarias não podem retirar o valor do próprio lucro. O aumento desse imposto também ressalta na queda de vendas e enfraquece ainda mais editoras, impedindo que invistam em novas publicações - diminuindo a diversidade de ideias. Em um Manifesto em Defesa do Livro, diversas associações do setor, como a ABDL (Associação Brasileira de Difusão do Livro), a ANL (Associação Nacional das Livrarias), a CBL (Câmara Brasileiro do Livro), criticam as ideias da equipe econômica, resumidas pela deputada Fernanda Malchionna, com a frase “só rico lê”. A coautora da audiência pública,
enfatiza que “famílias com renda inferior a dez salários mínimos correspondem a 50% do consumo de livros e cerca de 70% dos didáticos”. Dyeimine Schlindwein, ex-vendedora da livraria A Página, em Joinville, afirma que, assim como a questão econômica, a falta de incentivo à leitura causa um grande afastamento da população do assunto. Relata também uma situação onde a cliente afirmou que “não tinha nascido para leitura”, quando na verdade só não havia encontrado a relação de autoconhecimento dentro de um gênero. Segundo ela, “a literatura alimenta a alma, expande nossos horizontes e faz com que tenhamos um vocabulário mais diversificado, melhorando também nossa escrita.” Ela ainda se mostrou encantada com experiências onde via crianças e pré -adolescentes buscando, por meio da leitura, uma maior visão sobre o mundo. “Jovens de 14 anos liam livros considerados para adultos, de sociologia, filosofia, medicina, física. E crianças menores, de 7 anos, liam infanto-juvenis como Harry Potter, que é uma leitura mais densa. Ver crianças tão jovens já devorando tudo, era lindo”.
FOTO DIVULGAÇÃO/REDES SOCIAIS
Taxação afeta diretamente o consumidor
Aumento no valor dos livros faz com que consumidores leiam menos Júlia Martins, organizadora do movimento #DefendaOLivro, destacou durante o manifesto que “em vez de taxar, o governo deveria diminuir o preço dos livros.” Já para o estudante de Filosofia Israel Seixas, taxar livros só deixaria o hábito de leitura cada vez mais elitizado. “Se o governo faz isso é porque quer o
povo sem conhecimento, e para eles é mais fácil se manter no poder”. Sílvio Melatti, mestre em Literatura, afirma que os livros continuam sendo uma necessidade humana, e a Literatura “encontrará sua forma de expressão apesar das restrições de mercado, políticas culturais equivocadas e revoluções tecnológicas”.
Como a taxação pode afetar o mercado editorial? Para Joel Gehlen, jornalista e editor, a taxação é altamente prejudicial para várias áreas. “Um governo que quer roubar as poucas moedas de um setor indigente, é o retrato de um governo absolutamente incapaz de mensurar [seu] valor.” Nelson Rolim, editor e dono da editora Insular, uma das maiores de Santa Catarina, disse em entrevista ao Primeira Pauta, que a tributação só encarece o custo final de um produto cultural que “deveria estar na cesta básica dos brasileiros’’. O editor já abriu uma livraria e depois teve que fechá-la, mas afirma que continua publicando livros e
sente um enorme prazer e pelo que faz. Ele informou que “as editoras trabalham com grandes riscos de insucessos e o tributo apenas agrava seu balanço mensal.” Segundo ele, as editoras, em geral, têm um gasto de 30% com publicação sobre a capa e 50% para comercialização, restando 20% de lucro. Além da taxação afetar diretamente o consumidor, as editoras se ressentem com o fechamento e quebra de livrarias. Para ele, “uma recuperação só se vislumbra com uma mudança no governo do país. As armas e não os livros são objeto desse desgoverno”.
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Especial | 1 5
Joinvilense Zé Trovão está foragido da Justiça Caminhoneiro liderou protestos insuflados por empresários do agronegócio, o que refletiu na economia regional
MARINNE O’HARA Acusado de incitar atos antidemocráticos durante o Dia da Independência, o joinvilense Marcos Antônio Pereira Gomes, também chamado de Zé Trovão, está foragido da justiça no México. A ordem de prisão foi determinada por Alexandre de Moraes, ministro do Supremo Tribunal Federal (STF). De acordo com reportagem do jornal O Globo, a defesa de Zé Trovão afirma que se trata de perseguição política. Refugiado em outro país, Zé Trovão continua divulgando na internet comentários em favor do presidente Jair Messias Bolsonaro (sem partido). Em vídeo publicado no Instagram na última sexta-feira (10), Zé Trovão explicou que aguarda habeas corpus, solicitado pelos parlamentares da “bancada bolsonarista”. “Caso as pessoas achem que nós nos afrouxamos ou que nós simplesmente vamos baixar guardas, estão enganados”, apontou ele. “Estamos respeitando um pedido que o presidente Bolsonaro nos fez.” Ainda no mesmo vídeo, Zé Trovão alegou: “[Bolsonaro] disse que está fazendo um trabalho que ele nunca poderia ter feito se não fosse os movimentos do dia sete de setembro, oito, nove e dez. Hoje o Brasil alcança a sua liberdade de
expressão. Isso está garantido neste ‘acordo’”. Para o professor e sociólogo Gabriel Machado Alexandre, 39, os atos de 7 de setembro foram bancados com dinheiro público e a greve dos caminhoneiros, patrocinada por donos de frotas e pelo agronegócio. Ao falar sobre a motivação do movimento, ele explicou: “[Eles] não querem que se retome uma política de estoques reguladores para manter os preços altos e as exportações em dólar elevadas”. Além disso, de acordo com a socióloga Valdete Daufemback, “O evento de 7 de setembro teve um desfecho muito interessante, que começou com uma manifestação que pareceu ser incentivada pelo presidente na ideia de decomposição do STF e do governo; destruindo o estado e transformando em uma ditadura, tirando os dois poderes e deixando apenas um”, concluiu. O que as pessoas não entendiam é que por trás de tudo isso surgia o interesse do Agronegócio. Ele motiva parte dos caminhoneiros, que na verdade não eram caminhoneiros em si, e sim empresários - caminhões que estavam na rua sem nunca ter sido utilizado para transporte de mercadoria. A tendência era provocar uma crise, em que o dólar sobe beneficiando o Agronegócio.
Adriano Machado - Reuters
Manifestantes em ato pró-Bolsonaro junto ao Congresso Nacional Por outro lado, Jair Ferraz, um dos líderes do movimento, alegou em entrevista para a ND+ que nenhum sindicato da categoria estava envolvido na paralisação. “Vai ser exclusivamente paralisação por livre e espontânea vontade de todo mundo”, acrescentou. Um dos principais lugares em que os manifestantes bolsonaristas se encontraram foi a rodovia BR-101. Vários caminhoneiros se uniram no km 25 para bloquear o fluxo da es-
trada, o que provocou engarrafamento. A Federação das Empresas de Transporte de Cargas e Logística no Estado de Santa Catarina (Fetrancesc) se posicionou contra a paralisação emitindo uma nota: “O Sistema Fetrancesc repudia atos de bloqueio e impedimentos do tráfego de quaisquer veículos, sejam de pequeno ou grande porte, independente da quantidade de pessoas em seu interior”, anunciou.
A repercussão do dia da Independência em Joinville Joinville iniciou a Semana da Pátria com o hasteamento da bandeira na prefeitura municipal. Estiveram presentes o prefeito Adriano Silva, a vice-prefeita Rejane Gambin e os principais comandantes das forças de segurança e salvamento. Por conta da pandemia, o desfile cívico foi cancelado pelo segundo ano consecutivo. No lugar das tradicionais passeatas, ocorreram manifestações em vários pontos da cidade, tanto em apoio quanto em oposição ao atual governo federal.
Ainda houve manifestações na Praça da Bandeira contra e a favor do governo federal. No Parque da Cidade, ocorreu o ato político-cultural “FORA BOLSONARO” e também vários movimentos artísticos e políticos intitulados como “Grito dos Excluídos”, que denunciaram a fome, miséria e a desigualdade social. O evento foi marcado por apresentações musicais, danças e poesias que retrataram a importância de um país que valorize a cultura e a igualdade.
A estudante de artes cênicas, Clara Favero, 20, esteve presente na Praça da bandeira e informou ao Primeira Pauta que havia uma média de duzentos participantes no evento. A jovem, que manifestou sua luta por meio da poesia, abordou a importância da liberdade de se manifestar o ponto de vista, independente de qual seja. “Quando temos um pensamento sobre determinado assunto e achamos que ele é benéfico para a sociedade, a manifestação pacífica se torna uma forma bonita e poderosa para evo-
lução humana”, conclui. O prefeito Adriano não participou de nenhum dos eventos programados, mas enfatizou aos participantes a importância do uso da máscara. Por outro lado, o deputado federal de Santa Catarina, Coronel Armando, anunciou em sua rede social apoio a manifestações de patriotismo: “Vivemos em um país onde a liberdade de expressão é reconhecida na instituição. Qualquer cidadão deve ter o direito à livre manifestação, independente de sua ideologia política.”
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Ideias conservadoras apoiam monarquismo Na maior cidade do estado, movimento pede a volta da família imperial e dos bons costumes ANDERSON MARQUES As instabilidades políticas, crises econômicas e nas instituições, além da polarização reacendem o debate sobre a volta da monarquia como forma de governo no Brasil. É o que pensa o Círculo Conservador Joinvilense, fundado em novembro de 2019, na casa da família Schultz, no bairro Adhemar Garcia, zona sul da cidade. O grupo se declara de direita e diz ter o zelo pela propriedade privada como um dos principais objetivos. Além disso, os ativistas utilizam o mesmo lema “Deus, pátria e família” do integralismo, movimento presente no Brasil na década de 30 influenciado pelo facismo. Essa expressão é utilizada também pelo atual Presidente da República, Jair Messias Bolsonaro e seus apoiadores.
“Não é à toa que Joinville é conhecida como ‘Cidade dos Príncipes’ e existe a tentativa de reconectar a cidade à nobreza”.
Valdete Daufemback, historiadora
Os fundadores do Círculo são Leonardo Schultz, Luciane e Norton Marchon. “O grupo é composto por quase 90% de cristãos católicos conservadores, que acreditam que com bons costumes e práticas
civis patriotas somadas ao sistema monárquico, o Brasil poderá ser uma grande potência respeitada internacionalmente”, afirma Leonardo, 20, estudante de ciências políticas. A historiadora e socióloga Valdete Daufemback conta que as ideias monárquicas e conservadoras deste movimento político vieram junto com os imigrantes da cidade, ainda no século XIX, época de colonização de Joinville. “A maioria das pessoas que vieram da Europa para cá eram de áreas rurais, sendo muito conservadoras e religiosas. Na época que vieram dos seus países de origem, ainda havia ideia do rei, pois para eles era necessário o monarca como uma figura forte para suas nações”, explica a historiadora. Além disso, ainda na época da vinda dos europeus, Dom Pedro II era o imperador do Brasil. Porém, após quase 50 anos de governo (1840-1889), através de um golpe de estado em 15 de novembro de 1889, data conhecida como a Proclamação da República, o Brasil passou a ser comandado por um presidente eleito pelo povo. Já no século XX, com a chegada de migrantes, oriundos de outras partes do Brasil, acabaram reafirmando essa cultura conservadora, se adequando a uma cidade fundada por esses ideias. Porém, a partir das décadas de 80,90 e 2000 essa população com pensamentos mais tradicionais se deparam com uma nova realidade. “Eles não dão mais conta de manter no seu sistema de disciplinamento. Eles
ANA DRANKA
SC foi o segundo estado com mais votos a favor da monarquia em 1993 tem medo de perder esse controle e vêem movimentos feministas e os LGBTQIA+ como uma ameaça para aquela sociedade tradicional que queriam”,afirma a socióloga. A constituição federal de 1988 pedia um plebiscito, realizado em 1993, no qual o povo brasileiro teria que escolher entre monarquia e república para ser a forma de governo do país. Foi a partir dessa consulta que os descendentes da família Orléans e Bragança, encabeçados pelos bisnetos da princesa Isabel, Dom Bertrand e Dom Luiz - este o atual herdeiro do extinto trono brasileiro - começaram a difundir ideias sobre o retorno da monarquia no comando do Estado Brasileiro em palestras e em
clubes de simpatizantes por todo o país. Santa Catarina, na época, foi uns dos estados que mais teve adesão aos ideais de um governo liderado por um monarca. Segundo o portal do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), o estado teve na votação cerca de 11,05% da população a favor do sistema monárquico, só sendo ultrapassado pelo estado do Amazonas com 11,75% de adeptos. Hoje em dia, os conservadores monarquistas difundem suas ideias atráves das redes sociais, como perfis no Facebook e Instagram, além de grupos em aplicativos de mensagens, como o Whatsapp e o Telegram.
Afinal, o Brasil pode voltar a ser uma monarquia? Para o cientista político e jornalista João Kamradt, no cenário atual é impossível. Pois na sua visão “seria necessário um engajamento muito grande da maioria do povo brasileiro, coisa que não se vê nos dias atuais, além dos próprios ativistas, que ainda é muito pequeno para ter um vislumbre da volta do sistema monárquico em território
Brasileiro”. O cientista político ainda acrescenta: “Se houvesse essa volta da coroa brasileira, provavelmente quem tomaria o poder não seriam os atuais pretendentes ao extinto trono brasileiro, como os bisneto da princesa Isabel, mas, sim alguém que já está no poder ou faça parte do jogo político atual”, afirma. Além disso, deveria
ocorrer um golpe de Estado para retomada de poder após mais de 100 anos de república, coisa que os próprios monarquistas e os membros da família imperial não aceitam, como já foi especificado no site da organização da casa pró-monarquia e no portal de artigos e processos de advogados do Brasil, a JusBrasil que diz que
o Movimento Monarquista considera inaceitável sequer cogitar a hipótese de realizar ou apoiar um golpe de Estado para restaurar a monarquia. “A nossa proposta é que através de um Plebiscito onde o povo brasileiro irá manifestar sua vontade diretamente se deseja ou não o retorno da Monarquia”.