Revista valeparaibano - Agosto 2010

Page 67

Domingo 1 Agosto de 2010

dos para a preservação da 66. Na pequena barbearia que ainda funciona e na qual ele ainda trabalha todos os dias, uma pequena loja com tudo que se possa imaginar funciona anexa ao estabelecimento e ajuda nessa preservação. “Com nosso trabalho capturamos a imaginação do mundo. Hoje, a 66 tem essa visibilidade por nossa causa. Não é apenas uma estrada, estamos falando de pessoas. Fico feliz quando vejo viajantes passarem por aqui e se sentirem felizes. A felicidade não custa um dólar e ao mesmo tempo não tem preço”. Saímos de Seligman com uma sensação entranha. Fazemos parte dessa história agora, estamos viajando há 11 dias em contato direto com um asfalto que ganhou vida no imaginário das pessoas. A Rota 66, como diz Delgadillo, não é apenas uma estrada, é um lugar onde as pessoas construíram suas vidas, e esse suor derrubado nessa pista nenhum sol forte consegue secar. É para sempre. Seguimos direto para Laughlin sem parada. Hospedamos-nos num cassino repleto de turistas japoneses gastando seus ienes. O deserto de Mojave já começou e a temperatura lá fora ferve qualquer nervo. No dia seguinte enfrentaremos o restante deste fantasma. Décimo segundo dia Estamos com medo do deserto. “Às 9h o sol já está te queimando”, disse no dia anterior o manobrista do hotel. “Se eu fosse você sairia antes do sol nascer”, avisou. É o que fizemos. Acordamos às 4h30 com as malas prontas. Nem tomamos café da manhã, a tensão de enfrentar a sensação térmica de 50ºC é enorme. Durante os 340 kms teremos chance de abastecer somente duas vezes. Só existe um posto no meio do caminho. Ninguém é louco de se instalar no meio do nada. O Mojave recebe esse nome em razão de um tipo de cobra cascavel comum na região. É a parte mais elevada do deserto da Califórnia. Uma de suas regiões recebe o nome de Vale da Morte. São rios secos e repletos de sal. No filme “As Vinhas da Ira”, de 1946, o Mojave já existia para as pessoas como um lugar onde a morte era uma companheira próxima. Naquela época, muitos viajantes não aguentavam o percurso, abandonavam seus carros na beira da estrada e nunca mais eram vistos. “Vocês tem que usar mangas compridas, nenhum filtro solar aguenta aquele sol”, avisou Hurley quando ainda estávamos no clima gostoso de Oaklahoma. Entramos na interestadual com o dia na penumbra, é o único caminho para retomar a 66.

056-067_Rota66.indd 65

Aqui ela corre praticamente paralela à grande estrada, só que com algumas curvas a mais que vão nos distanciando da civilização. A cada pequena cidade, e são apenas três até Bristow, onde o deserto dá folga, a água é necessária. Andamos por duas horas e o sol já está quente. Entre as cidades de Amboy e Ludlow, fica um lugar especial para a 66, o “Bagdad Café”, local usado para as filmagens do filme homônimo. É do mesmo jeito que o filme. Ermo, quente e insignificante. Mais a frente fica a cidade de Newberry Springs, e outro bar dá nome a um filme, é o “Sidewinder Cafe”. Já estamos preocupados porque temos que chegar a Victorville antes do sol do meio-dia. Assim que a 66 volta para a interestadual conseguimos ganhar velocidade e terreno. Nossas bocas estão secas, nossos olhos ardendo e o calor está de matar. Chegamos em Victorville às 9h30. Passamos por essa prova em quatro horas e meia de viagem. Assim que chegamos no hotel o recepcionista pergunta:

65

“Vocês atravessaram o deserto?”. Respondemos que sim. “Dá para perceber”, retruca. Último dia Hoje foi o trajeto mais curto, mais feio e mais tenso de toda essa viagem. Depois de Victorville, a Califórnia mostra sua riqueza e cresce no tamanho. Pequenas cidades acabam engolidas pela grande Los Angeles e o que era um país pequeno do interior perde a identidade para um tráfego intenso nas estradas e trechos onde a Rota 66 se transformou em avenidas no subúrbio. Logo que saímos de Victorville entramos na I-15 para acessar “nossa estrada” depois de 48 km, no vale de San Bernardino. O sol sumiu nesse trajeto dando espaço para uma neblina densa e fria. Saímos de 40ºC do deserto para mínimos 13ºC. O tráfego nessa interestadual é completamente insano. Grandes carretas cruzam as quatro pistas, carros apressados para o trabalho e moto-

NAVAJO As reservas indígenas estão às margens da Rota desde que se entra no Novo México

6/6/2011 17:54:25


Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.